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segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

JURID - Ação de indenização. Responsabilidade civil. Erro médico. [01/02/10] - Jurisprudência


Ação de indenização. Responsabilidade civil. Erro médico. Não exigência de exame necessário. Negligência.


Tribunal Regional Federal - TRF 4ª Região.

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2005.70.00.008031-7/PR

RELATOR: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

APELANTE: UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANA

ADVOGADO: Procuradoria-Regional Federal da 4ª Região

APELADO: GERONILDA DA APARECIDA ANTUNES e outro

ADVOGADO: Fabricio Verdolin de Carvalho

REMETENTE: JUÍZO SUBSTITUTO DA 05A VF DE CURITIBA

EMENTA

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. NÃO EXIGÊNCIA DE EXAME NECESSÁRIO. NEGLIGÊNCIA.

- Tratando-se de ato omissivo do poder público, responsabilidade civil por tal ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, numa de suas três vertentes, negligência, imperícia ou imprudência, não sendo, entretanto, necessário individualizá-la.

- A morte da criança foi produto de um serviço público mal prestado, pois caso fossem adotadas as medidas preconizadas na inicial (realização de exames complementares, antecipação de parto etc), o diagnóstico médico seria exato, evitando-se o evento fatal, através de pronto e eficaz tratamento médico-hospitalar.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 16 de dezembro de 2009.

Juiz Federal Sérgio Renato Tejada Garcia
Relator

RELATÓRIO

Trata-se de ação de indenização ajuizada por Geronilda da Aparecida Antunes e Odenir Luiz Serqueira, contra a Universidade Federal do Paraná, objetivando o pagamento de indenização por danos morais, em decorrência da morte prematura do filho do casal, ainda no ventre materno.

O Juízo a quo julgou procedente a ação, para condenar a UFPR ao pagamento de R$ 228.000,00, sendo R$ 114.000,00 para cada autor, a título de indenização de danos morais. Condenou, ainda, a UFPR ao pagamento do dos honorários advocatícios fixados em 10% do valor da condenação.

A UFPR apela, requerendo a reforma da sentença, sustentando que as razões de procedência são atécnicas, pois desprestigiam a perícia designada pelo próprio julgador e fundam-se na invocação de passagens do depoimento pessoal feitas pela parte autora, desprovidas de comprovação, e em supostas falhas ou omissão do perito, sem que o julgador tenha se interessado ou não tenha querido saná-las antes do julgamento.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

A sentença, da lavra do M.M Juiz Federal, Dr. Vicente de Paula Ataide Júnior, analisou com precisão a matéria de fato, o que deve ser mantido por seus próprios fundamentos, inclusive quanto ao valor da indenização, verbis:

"2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. Preliminarmente

Não há necessidade de desentranhar a contestação e os documentos juntados pelo co-réu excluído, conforme requerido pelos autores, à f. 258, pois reputo que tais elementos podem contribuir para o esclarecimento da verdade; indefiro, portanto, tal requerimento.

Como as partes não argüiram preliminares processuais, e constatando a presença dos pressupostos processuais e das condições da ação, estou autorizado a enfrentar o mérito da causa, conforme fundamentação adiante.

2.2. Responsabilidade civil da UFPR

Os autores imputam à ré a responsabilidade pela morte de seu filho, ainda quando no ventre materno, afirmando que houve negligência no atendimento realizado pelo médico Gerson Tadeu Maia Sant'Ana, pertencente aos quadros da Maternidade Victor Ferreira do Amaral, órgão da Universidade Federal do Paraná.

Sendo a Universidade Federal do Paraná uma autarquia federal, portanto pessoa jurídica de direito público, sua responsabilidade é objetiva, conforme preceitua o artigo 37, § 6º, da Constituição da República:

"§ 6º. As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa."

No entanto, observo que, no presente caso, a imputação de responsabilidade à autarquia não se perfaz por ato comissivo, uma vez que não se alega que o referido médico provocou a morte da criança.

As alegações contidas na inicial, e ratificadas durante o processo, são no sentido de que médico, agente da UFPR, deixou de adotar as providências médicas necessárias para proceder a um diagnóstico acertado e, a partir daí, destinar um tratamento adequado ao nascituro.

Em outras palavras, afirmou-se que a morte da criança foi produto de um serviço público mal prestado, pois caso fossem adotadas as medidas preconizadas na inicial (realização de exames complementares, antecipação de parto etc), o diagnóstico médico seria exato, evitando-se o evento fatal, através de pronto e eficaz tratamento médico-hospitalar.

Diante disso, entendo que a imputação de responsabilidade à Universidade Federal do Paraná se apresenta em função de ato omissivo (no sentido de que serviço público que funcionou mal, equivale a serviço público que não funcionou), o que impede a aplicação do sistema de responsabilização estatal objetiva, estatuído no transcrito artigo 37, § 6º, da Constituição da República, o qual pressupõe que o dano causado a terceiro seja produto de uma atuação positiva do agente público.

É caso, portanto, da aplicação da teoria da culpa do serviço público (faute de service), com a exigência de comprovação de dolo ou culpa do funcionário, muito embora de forma atenuada, sem a necessidade de individualização, dado que pode ser atribuída ao serviço público de forma genérica.

LÚCIA VALLE FIGUEIREDO, tratando da responsabilidade do Estado por atos omissivos (in Curso de direito administrativo, 2 ed, São Paulo, Malheiros, 1995, p. 176), bem caracteriza essa posição, ao afirmar que...

"No tocante aos atos ilícitos decorrentes de omissão, devemos admitir que a responsabilidade só poderá ser inculcada ao Estado se houver prova de culpa ou dolo do funcionário. Esta é a posição do Prof. Celso Antônio Bandeira de Mello e do ilustre, querido e saudoso mestre Oswaldo Aranha Bandeira de Mello.

Deveras, ainda que consagre o texto constitucional a responsabilidade objetiva, não há como se verificar a adequabilidade da imputação ao Estado na hipótese de omissão, a não ser pela teoria subjetiva.

Assim é porque, para se configurar a responsabilidade estatal pelos danos causados, há de se verificar (na hipótese de omissão) se era de se esperar a atuação do Estado.

Em outro falar: se o Estado omitiu-se, há de se perquirir se havia o dever de agir. Ou, então, se ação estatal teria sido defeituosa a ponto de se caracterizar insuficiência da prestação do serviço.

Não há como provar a omissão do Estado sem antes provar que houve "faute de service". É dizer, não ter funcionado o serviço, ter funcionado mal ou tardiamente" (negritos acrescentados).

Também nesse sentido, é o paradigmático acórdão da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, proferido no julgamento do Recurso Extraordinário n.º 179147/SP, cujo relator foi o Ministro Carlos Velloso (DJU 27/02/98):

"EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CIVIL. DANO MORAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO E DAS PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PRIVADO PRESTADORAS DE SERVIÇO PÚBLICOATO OMISSIVO DO PODER PÚBLICO: MORTE DE PRESIDIÁRIO POR OUTRO PRESIDIÁRIO: RESPONSABILIDADE SUBJETIVA: CULPA PUBLICIZADA: FAUTE DE SERVICE. C.F., art. 37, § 6º.

I.- A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público, responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo, ocorre diante dos seguintes requisitos: a) do dano; b) da ação administrativa; c) e desde que haja nexo causal entre o dano e a ação administrativa.

II. - Essa responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo, admite pesquisa em torno da culpa da vítima, para o fim de abrandar ou mesmo excluir a responsabilidade da pessoa jurídica de direito público ou da pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público.

III. - Tratando-se de ato omissivo do poder público, responsabilidade civil por tal ato é subjetiva, pelo que exige dolo ou culpa, numa de suas três vertentes, negligência, imperícia ou imprudência, não sendo, entretanto, necessário individualizá-la, dado que pode ser atribuída ao serviço público, de forma genérica, a faute de service dos franceses.

IV. - Ação julgada procedente, condenado o Estado a indenizar a mãe do presidiário que foi morto por outro presidiário, por dano moral. Ocorrência da faute de service.

V. - R.E. não conhecido."

Fixadas essas diretrizes para o julgamento do pedido, passo a analisar as peculiaridades do caso concreto.

Parto da constatação dos fatos incontroversos, admitidos como verdadeiros por todas as partes:

1. A autora Geronilda da Aparecida Antunes, grávida de aproximadamente 34 semanas (8,5 meses), foi atendida no dia 11/9/2001, por volta das 18h 35min, pelo médico Gerson Tadeu Maia Sant'Ana, na Maternidade Victor do Amaral, pertencente à UFPR (ficha de atendimento, assinada pelo médico, à f. 74); ela reclamava de dores, tipo cólica, no baixo ventre (DTCBV), além de referir diminuição dos movimentos fetais.

2. Nesse atendimento, o médico constatou que o bebê estava vivo, pois foram verificados batimentos cardíacos fetais (bcf) (f. 74).

3. O médico realizou apenas exames clínicos; não foi realizado exame especular, nem de toque (f. 74); não foi realizado exame ecográfico, nem qualquer outro exame complementar. A autora foi liberada para retornar para casa e orientada a tomar buscopan, de 8/8h, se necessário.

4. No dia 15/9/2001, por volta das 12h, a autora retornou à mesma maternidade e foi novamente atendida pelo médico Gerson Maia, agora relatando a perda do tampão mucoso, perda de líquido e falta de movimentos fetais (ficha de atendimento à f. 67). Desta vez, ao exame clínico, não foram constatados batimentos cardíacos fetais, confirmando-se o óbito do bebê através de ecografia. O médico Gerson, ante o término do seu plantão, foi embora do hospital, sendo substituído pelo médico Carlos Miner, o qual realizou a indução do parto para a extração do feto.

5. Causa da morte: retardo do crescimento intra-uterino, com anoxia intra-uterina e aspiração de líquido amniótico, conforme relatório de necropsia da UFPR, f. 20.

Interessa notar, de início, que decorreram apenas quatro dias entre o primeiro e o segundo atendimento médico na Maternidade Victor do Amaral. No entanto, em 11/9/2001, o bebê estava vivo; em 15/9/2001, estava morto.

A primeira questão que importa esclarecer é se o médico Gerson, no primeiro atendimento, poderia prever os riscos a que estava submetida a gestação. Em outras palavras, se era previsível a morte do bebê.

A senhora Perita Judicial, respondendo a essa questão (f. 191), entendeu que não.

Mas a instrução processual que completei me fez convencer que sim, conforme passo a motivar.

Na ficha de pronto atendimento obstétrico de f. 74, preenchida pelo próprio médico Gerson, foi anotada, no campo exame tocoginecológico, que a altura uterina na autora (AU), medida pelo médico, era de 26 cm; na mesma ficha, consta que a gestação era de 34 semanas.

Em relação a esses dados, o próprio médico Gerson, em seu depoimento (fls. 242-244), afirmou que "a altura uterina (AU) constatada deveria ser um pouco maior para a idade gestacional indicada na própria ficha (34 semanas)."

Mais do que isso, afirmou que "as informações da ficha de f. 74, especificamente uma altura uterina menor que a idade gestacional sugere retardo do crescimento intra-uterino" (f. 243, parte de baixo, grifei).

Por seu próprio depoimento (além da ficha de atendimento por ele mesmo preenchida), constato que o próprio médico obstetra, Dr. Gerson Maia, no atendimento que realizou à autora, em 11/9/2001, percebeu, pelos dados e medições do exame clínico, que o feto apresentava retardo do crescimento intra-uterino.

O que isso quer dizer?

Segundo a senhora Perita Judicial, respondendo ao quesito 7, de f. 186, "retardo do desenvolvimento e retardo do crescimento significam que o feto não atingiu o crescimento (tamanho) habitualmente encontrado para aquela idade gestacional. Por exemplo, um feto de 24 semanas apresenta um volume uterino compatível com tal idade. Se houve volume inferior, diz-se que há um retardo no desenvolvimento. Há uma Tabela (Tabela de Pilla) que permite fazer o cálculo, ainda que aproximado, da idade provável da gravidez, pela relação entre a altura do fundo uterino (tamanho do útero) e o mês da gestação".

E foi em função do retardo no crescimento intra-uterino, percebido pelo médico, já em 11/9/2001, ensejando sofrimento fetal crônico (conforme seu depoimento, f. 243), que o óbito do bebê ocorreu, segundo laudo de necropsia (f. 20).

Em outras palavras, o médico Gerson, da UFPR, no primeiro atendimento à autora, em 11/9/2001, diagnosticou a ocorrência (ou ao menos a possibilidade) de retardo no crescimento intra-uterino, em função da altura uterina (AU), comparada com a idade gestacional.

Nesse ponto, vem a segunda questão: qual foi a reação do médico em função desse diagnóstico?

No seu depoimento, ele deixa claro: "receitou Buscopan para aliviar as dores e orientou a autora para que procurasse seu médico pré-natalista para verificar a situação, inclusive para investigar a diferença da altura uterina e idade de gestação" (f. 243).
Essa posição foi relatada perante o Conselho Regional de Medicina, conforme se encontra no relatório de f. 78:

"Foi atendida pelo denunciado, que identificou a presença de altura uterina menor que o esperado para a idade gestacional (ainda que a paciente em sua denúncia afirmasse estar tudo bem até aquele momento), tendo sido realizado anamnese, exame clínico com avaliação de dados vitais, exame obstétrico, com identificação dos batimentos cardíacos fetais através do Doppler, tendo os bcf sido identificados pela própria denunciante. Diante de condições fetais normais para aquele momento [sic], já que se realizou estímulo fetal com resposta adequada, foi a paciente orientada para retorno ao posto de saúde, para investigação de retardo no crescimento fetal intra-uterino." (os grifos são os meus, não os do CRM)

A autora foi liberada para retornar para casa, mesmo com a possibilidade de retardo no crescimento intra-uterino percebida e registrada na ficha de atendimento.

Convenço-me que aqui residiu a negligência médica.

Com a constatação, mesmo que por exame clínico, da possibilidade de retardo no crescimento intra-uterino, deveria o médico ter lançado mão, ao menos, de um exame de ecografia para se certificar dessa anomalia fetal.

No depoimento de Gerson, ele mesmo afirma que "o exame de ecografia, pela medidas do feto (biometria fetal), pode constatar o retardo do crescimento intra-uterino, comparado com o número de semanas de gestação" (f. 243).

Se o médico Gerson, em 11/9/2001, tivesse adotado a simples cautela de realizar a ecografia, teria constatado, sem sombras de dúvida, o retardo no crescimento fetal, o que ensejaria a imediata antecipação do parto, que certamente salvaria a vida da criança!

Digo isso, amparado, mais uma vez, pelas palavras do próprio médico Gerson, em juízo: " que caso a médica do posto de saúde, que atendeu a autora no dia 12/09, tivesse realizado a ecografia e constatado o retardo no crescimento intra-uterino, isso por si só seria hipótese para a antecipação do parto; que caso constatado o retardo no crescimento intra-uterino e realizada a antecipação do parto, a criança poderia ser salva;" (grifos meus).

Ao contrário do que entendeu a senhora Perita Judicial, em conclusões que não levaram em conta todo o acervo probatório, especialmente nas respostas aos quesitos dos autores 12, 14, 19, 23, 24 e da ré 1, 4 e 5, era exigível por parte do médico a realização de exames complementares, especialmente a ecografia, a qual possibilitaria um diagnóstico preciso sobre o retardo do crescimento intra-uterino, já constatado pelo exame clínico, gerando a certeza sobre a necessidade de antecipação do parto, como forma de salvar a criança.

E essa conclusão é reforçada pelo fato, não considerado pela perícia judicial, que "autora no dia da primeira consulta afirmou ao depoente [médico Gerson] que já tinha tido um parto prematuro anteriormente" (depoimento de Gerson, f. 242, ao pé).

A autora, em seu depoimento pessoal, esclareceu que "à época, a autora tinha uma filha, a qual nasceu de cesárea, com 37 semanas, apresentando baixo peso e redução de líquido amniótico; que posteriormente o casal teve um filho, nascido em 08/06/2005, o qual também nasceu de cesárea, com 38 semanas e apresentando redução de líquido amniótico" (f. 233).

Mas qual a reação do médico a essa informação? Ele mesmo diz: "esse dado, muito embora relevante, deveria ser levado em consideração pelo médico pré-natalista" (depoimento de Gerson, fls. 242-243).

Se a simples suspeita de retardo no crescimento intra-uterino (que por si só autorizava a antecipação do parto para salvar a criança) já exigiria a realização de uma ecografia, o que dizer do quadro clínico apresentado pela autora, no momento do atendimento realizado em 11/9/2001, no qual, além desses indícios de retardo, somavam-se o histórico de parto prematuro, dores e diminuição de movimentos fetais?

Esses dados não fizeram parte das análises da senhora Perita Judicial para afirmar, entre outras coisas, que "nos autos nada consta que possa caracterizar a gestação da Sra. Geronilda Aparecida Antunes como sendo uma gravidez de alto risco" (f. 190, quesitos 2, 3 e 4). Note-se que as conclusões da senhora Perita sobre a "normalidade" da gestação basearam-se, muito intensamente, na freqüência dos batimentos cardíacos fetais registrada na ficha de atendimento (quesito 1, f. 190).

Afirmo, pois, que o médico Gerson Tadeu Maia Sant'Ana foi negligente ao dispensar exames complementares, diante do quadro clínico apresentado pela autora.

Uma ecografia e não estaríamos aqui.

Aliás, a criança, filho do casal, estaria.

Caso a ecografia fosse determinada em 11/9/2001 - e o médico Gerson tinha um conjunto de evidências para determiná-la - o diagnóstico de retardo do crescimento intra-uterino seria certeiro, possibilitando a imediata antecipação do parto, com o salvamento da criança, que até então estava viva.

Mas o médico preferiu lavar as mãos, agarrando-se ao fato de ser um plantonista de emergência, para declinar dos deveres médicos exigidos no caso para um incerto médico pré-natalista.

Não posso admitir essa justificativa.

Os problemas da gestação foram diagnosticados no plantão de emergência. Basta ler o depoimento pessoal do próprio médico. Ao invés de adotar as providências que poderiam ser realizadas naquele hospital, dotado de toda infra-estrutura para isso, preferiu delegá-las ao posto de saúde.

E, confiando na recomendação médica, a autora foi ao posto de saúde de Lotiguaçu, no dia seguinte (12/9/2001), sendo inquirida, pela médica que a atendeu, sobre o porquê do médico plantonista da maternidade não ter realizado a ecografia. A ecografia, no posto de saúde, foi marcada, porém, para uma semana depois. Tarde demais (depoimento da autora, f. 234).

Uma ecografia separou o bebê da vida. Nada tão dispendioso. Sabia o médico que o exame era necessário. Não o fez. Conduta negligente comprovada.

Para ilustrar minhas conclusões, recorro ao sempre preciso magistério de MIGUEL KFOURI NETO (Responsabilidade civil do médico. 2 ed. São Paulo, RT, 1996. p. 71-72), afirmando que "não é propriamente o erro de diagnóstico que incumbe ao juiz examinar, mas sim se o médico teve culpa no modo pelo qual procedeu ao diagnóstico, se recorreu, ou não, a todos os meios a seu alcance para a investigação do mal, desde as preliminares auscultações até os exames radiológicos e laboratoriais - tão desenvolvidos em nossos dias, mas nem sempre ao alcance de todos os profissionais - bem como se à doença diagnosticada foram aplicados os remédios e tratamentos indicados pela ciência e pela prática. O médico, portanto, que não revela o cuidado exigível na conduta diagnóstica, certamente incorrerá em responsabilidade civil" (negrito acrescentado).

Oportuno salientar que o Código de Ética Médica (Resolução n.º 1246/88, do Conselho Federal de Medicina, DOU 26/01/88), consigna, em seu artigo 57, que "é vedado ao médico deixar de utilizar todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento a seu alcance em favor do paciente."

Assim, avalio que a morte da criança, no ventre materno, tem nexo com a omissão do médico da UFPR em determinar os exames complementares e a conseqüente antecipação de parto. Foi ato inescusável, pois um médico prudente, nas mesmas circunstâncias, teria agido diferente, precavendo-se contra o erro na avaliação do caso, determinando, para isso, a ecografia e, posteriormente, a antecipação do parto.

Portanto, vejo nestes autos a congruência dos requisitos necessários para tipificar a responsabilidade por omissão da autarquia ré e para condená-la a pagar indenização aos autores:

1) omissão administrativa culposa (falta do exame de ecografia e, conseqüentemente, ausência da antecipação do parto pelo médico, no dia 11/9/2001, enquanto a criança vivia);

2) danos (morte da criança, ocasionando danos pessoais aos seus pais);

3) nexo de causalidade (a omissão da ré privou a criança da chance de sobreviver, já que a antecipação do parto, se determinada a tempo, salvaria sua vida).

Acrescento, por fim, que não foram alegadas pela ré, como matéria de defesa, nem foram evidenciadas no decorrer do processo, as ocorrências de força maior ou de culpa exclusiva da vítima, como hipóteses excludentes da responsabilidade estatal. Também não se alegou, como atenuante, que houve culpa concorrente da vítima, hipótese em que a responsabilidade seria repartida entre o Estado e a vítima, proporcionalmente.

Para esse efeito, não me parecem suficientes as alegações trazidas pela UFPR, apenas nos memoriais finais, fls. 272-273, no sentido que a autora teria parcela de culpa na ocorrência do óbito, pois não comunicara ao seu médico uma informação que teria sido passada, no momento de uma das ecografias realizadas durante o pré-natal, sobre a possibilidade de redução no crescimento do feto. Primeiro, porque a autora jamais afirmou que não repassou essa informação ao seu médico; segundo, porque qualquer anomalia constatada seria objeto do laudo do próprio exame, repassado para o médico; terceiro, porque esse fato não altera o deslinde do feito, pois, caso o médico Gerson cumprisse seu dever ao analisar a autora, teria evitado a morte.

Anoto, concluindo essa primeira parte da fundamentação, que, em casos semelhantes, já decidiram, no mesmo sentido, a 3ª e a 4ª Turmas do Egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

ADMINISTRATIVO. INDENIZAÇÃO. ATO OMISSIVO. SERVIÇO PÚBLICO. NEGLIGÊNCIA. NEXO CAUSAL. EVENTO DANOSO.

Comprovada a negligência do serviço médico prestado, bem como os evento danoso e nexo de causalidade, a indenização deve ser deferida.

(TRF4, 3ª Turma, AC 2001.70.00.028749-6/PR, Rel. Des. Fed. Luiz Carlos de Castro Lugon, j. 20/4/2004, DJU 02/6/2004, unânime)

ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. MORTE DE NASCITURO. OMISSÃO MÉDICA. NEXO DE CAUSALIDADE DEMONSTRADO. DANOS MORAIS - FIXAÇÃO DO QUANTUM.

1. Para operar a responsabilidade civil do estado, é reconhecida a falha do serviço público em virtude de omissão médica em prestar atendimento adequado à parturiente quando da internação para o parto.

2. Hipótese em que a atuação do corpo clínico, que deixou de realizar procedimentos simples de verificação dos sinais vitais da paciente, teria provavelmente evitado o óbito da criança.

3. Quantum indenizatório fixado em observância às circunstâncias do caso concreto e a precedentes jurisprudenciais.

(TRF4, 4ª Turma, AC 2001.72.00.006717-8/SC, Rel. Des. Fed. Amaury Chaves de Athayde, j. 13/7/2005, DJU 17/8/2005, unânime)

2.3. Valor da indenização

Definida a responsabilidade civil da ré, resta fixar o valor da indenização devida aos autores, pelos danos morais sofridos em razão da morte prematura do filho.

A indenização por dano moral visa a "neutralizar os sentimentos negativos de mágoa, dor, tristeza, angústia, pela superveniência de sensações positivas, de alegria, satisfação, pois possibilitaria ao ofendido algum prazer, que, em certa medida, poderia atenuar seu sofrimento" (in DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. 14 ed. São Paulo, Saraiva, 2000. p. 91-92).

Entendo, por essa definição, que a indenização por dano moral deve proporcionar felicidade para os autores, de modo a compensar, de alguma forma, a irreparável perda do filho, ainda no ventre materno.

Em outra sentença já tive a oportunidade de dizer que a dor pela perda de um filho é incomensurável. Perde-se o sentido da vida, a razão de viver. Macula-se a esperança, objeta-se a perfeição do Criador. Não há trégua para o espírito que sofre.

Essa dor é permanente e insistirá em perseguir os autores pelo resto de suas vidas.

Compreendo que para a autora, Geronilda da Aparecida Antunes, esse sentimento é ainda mais terrível. Ela carregou o pequeno bebê por quase nove meses. A barriga estava grande, visível, pesada. Ela sentia, dentro si, a vida que evoluía. Não escutou o coração do bebê bater, quatro dias antes da constatação do óbito?

De repente, dizem a ela que carrega, em seu ventre, um pequeno cadáver! Induzem um parto, não para gerar vida, mas para consumar o erro médico! Quem poderá avaliar o sentimento de Geronilda nesse momento?! De onde essa mulher tirou forças para continuar sua vida e, pasmem!, para ter um novo filho? E, por obra da Providência, mesmo este novo filho apresentando as mesmas dificuldades de gestação, nasceu com vida, para resgatar seus pais, em parte, do padecimento.

Chego a acreditar que, para melhor julgar este caso, o magistrado deveria ser uma mulher, que pudesse melhor conhecer, em seu próprio íntimo, a magnitude da maternidade.

Mas a tarefa é minha e não posso delegar a ninguém.

Isso tudo machuca a consciência comum - seja das mulheres, seja dos homens - provoca desalento e desesperança, porque os requerentes fizeram o que podiam para salvar o filho, mas, por negligência alheia, seu empenho foi em vão.

Confesso que cheguei a refletir se, caso o casal fosse atendido por uma obstetra particular, mesmo que plantonista, de um hospital privado, pagando diretamente pela consulta (ou mesmo através de um plano de saúde), a ecografia teria sido realizada? O parto seria antecipado? A criança estaria viva?

Essa sentença - como outras - espelham o retrato do sistema de saúde pública do Brasil e de tudo aquilo que essas pessoas, menos abastadas economicamente, têm que se submeter cotidianamente.

Por todas essas razões, a indenização deverá ser fixada em valor considerável, para bem compensar os danos morais causados e para intimidar a reiteração de condutas negligentes, mas de acordo com os rendimentos dos autores, os quais, pelas suas profissões, podem ser considerados baixos.

A UFPR tem significativo patrimônio, não se podendo afirmar que a indenização por dano moral lhe causará grande impacto financeiro.

Com essas ponderações, entendo razoável o valor pretendido pelos autores, na petição inicial (f. 14), de 600 (seiscentos) salários-mínimos como indenização para o casal (300 salários-mínimos para cada qual), considerando que o salário-mínimo, no momento desta sentença, está fixado em R$ 380,00 (trezentos e oitenta reais).

Cuido que esse valor é compatível com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA. NEGLIGÊNCIA MÉDICA. MORTE DO FILHO NO PARTO. DANO MATERIAL DESCABIMENTO. DANO MORAL QUANTUM. RAZOABILIDADE. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE.

I - A perda do filho recém-nascido causa sofrimento e dor à mãe e a todos os familiares, a atingir o patrimônio moral. Contudo, na esfera patrimonial, inexiste prejuízo a ser reivindicado pelos pais, porquanto a indenização por dano material, em forma de pensão, visa restabelecer a situação financeira anterior ao ato ilícito, recompondo a renda que não mais será auferida em razão da morte de quem a recebia. Sem a caracterização de um prejuízo econômico, não se indenizam os danos materiais.

II - O valor da indenização por dano moral sujeita-se ao controle da instância especial apenas quando manifestamente exagerado ou irrisório.

III - Na espécie, o valor equivalente a 300 (trezentos) salários mínimos mostra-se razoável e moderado, a contar sobretudo a negligência dos médicos e o sofrimento pela perda de um filho recém-nascido em decorrência do parto.

(STJ, 4ª Turma, Resp 402874-SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 6/6/2002, DJU 1º/7/2002) [negrito acrescentado]

RECURSO ESPECIAL - RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE EM PLATAFORMA DE EXPLORAÇÃO DE PETRÓLEO - MORTE DE FILHO - DANOS MORAIS - QUANTUM INDENIZATÓRIO - NÚMERO DE LESADOS - RAZOABILIDADE - RECURSO NÃO CONHECIDO.

1. Aos parâmetros usualmente considerados à aferição do excesso ou irrisão no arbitramento do quantum indenizatório de danos morais - gravidade e repercussão da lesão, grau de culpa do ofensor, nível socioeconômico das partes -, perfaz-se imprescindível somar a quantidade de integrantes do pólo proponente da lide. A observância da eqüidade, das regras de experiência e bom senso, e dos princípios da isonomia, razoabilidade e proporcionalidade quando da fixação da reparação de danos morais não se coaduna com o desprezo do número de lesados pela morte de parente.

2. Ante as peculiaridades da espécie, a manutenção do quantum indenizatório arbitrado pelo Tribunal a quo, em valor equivalente a 500 salários mínimos para cada um dos autores, pais da vítima do acidente laboral, denota eqüidade e moderação, não implicando em enriquecimento sem causa.

3. Recurso Especial não conhecido.

(STJ, 4ª Turma, Resp 745710-RJ, Rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 5/12/2006, DJU 9/4/2007) [negrito acrescentado]

Assim, fixo a indenização por danos morais, em R$ 228.000,00 (duzentos e vinte e oito mil reais), metade para cada um dos autores, o que lhes possibilitará uma vida de razoável conforto e estabilidade, condição que reputo indispensável para o enfrentamento das angústias decorrentes da perda do filho, sem, no entanto, enriquecê-los em demasia.

Como arremate, deixo o magistério profundo e sensível de CLAYTON REIS, segundo o qual, "a reparação dos danos morais, além de constituir um direito maior do indivíduo, é também um dever que a sociedade impõe aos seus componentes. Somente os indivíduos que vivem insulados e, portanto, não convivem no meio social, não sabem compreender a extensão dessa regra comunitária. Afinal, o maior sentimento que une os homens e os leva a conviver em sociedade, é exatamente o sentimento de fraternidade e amor ao próximo que os une os mantêm ligados através de uma moral social" (Dano moral. 4 ed. Rio de Janeiro, Forense, 1997. p. 103).

3. DISPOSITIVO

Pelos fundamentos acima expendidos, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO formulado por GERONILDA DA APARECIDA ANTUNES e ODENIR LUIZ SERQUEIRA, para o fim de condenar a UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ ao pagamento de R$ 228.000,00 (duzentos e vinte e oito mil reais), sendo R$ 114.000,00 (cento e quatorze mil reais) para cada autor, a título de indenização de danos morais, valor esse que deverá ser corrigido monetariamente, pelo INPC, a partir da publicação desta sentença, com a incidência de juros moratórios, contados a partir da data do evento danoso (15/09/2001), conforme súmula 54 do STJ, de 0,5% (meio por cento) ao mês até 10/01/2003 (artigo 1062 CC 1916) e de 1% (um por cento) ao mês após essa data (artigo 406 do CC 2002)."

No mesmo sentido, o parecer do Ministério Público Federal, da lavra da Exma. Procuradora Regional da República, Drª. Márcia Neves Pinto, verbis:

"ln casu, foi ajuizada ação ordinária visando à obtenção de indenização por danos morais, em decorrência de erro médico. Relata que, em 11/09/2001, estando grávida de aproximadamente 36 semanas, sentiu fortes dores no ventre e começou a perder líquido amniótico, bem como a ausência dos movimentos fetais. Logo, no mesmo dia, dirigiu-se à Maternidade Vitor Feneira do Amaral. Lá, foi atendida pelo médico Gerson Tadeu Maia Sant'Ana, que apenas auscultou o coração do bebê, sem pedir ecografia ou exames complementares, encaminhando a autora para casa. No dia seguinte, como os problemas continuassem, a autora procurou o posto de saúde, sendo uma ecografia marcada para 17/09/2001. Em 15/09/2001, tendo notado sangramentos, a autora procurou novamente a maternidade. Desta vez, o médico Gerson Sant'Ana pediu a ecografia e constatou a morte do feto. Assim, procedeu-se à extração do natimorto. Alega a autora que se o médico da Maternidade da UFPR tivesse pedido os exames complementares na primeira ocasião, o bebê poderia ter sido salvo. Sobreveio sentença de procedência. A UFPR apelou, alegando que: a) o julgamento foi em sentido contrário às provas produzidas nos autos; b) há litisconsórcio passivo necessário com o Município de Curitiba/PR; e, c) a indenização por danos morais deve ser reduzida.

Correto o MM. Juízo a quo.

Em se tratando de conduta omissiva de agente do Estado, a responsabilidade é subjetiva, ou seja, quando há descumprimento de dever legal de evitar a ocorrência do ato lesivo. No caso em comento, temos um serviço público que não funcionou, o atendimento médico que falhou na tentativa de salvar a vida de um nascituro.

Consoante a ficha de pronto atendimento obstétrico da fl. 74, preenchida pelo médico Gerson Tadeu Maia Sant'Ana, em 11/09/2001. apesar das queixas de diminuição dos movimentos fetais, não foram realizados o exame de toque e o especular, tampouco a ecografia. De fato, a autora foi liberada com orientação de apenas tomar Buscopan de 8 em 8 horas, para aliviar as dores ventrais. Ao retomar à Maternidade no dia 15/09/2001, pois apresentava sangramento, perda de líquido e falta de movimentos fetais, a autora foi atendida pelo mesmo médico, tendo sido constatada a morte do feto através de ecografia (fl. 67). Consoante o relatório da necropsia (fl. 20), a causa mortis foi anoxia intra-uterina, decorrente de retardo do crescimento intra-uterino e aspiração do líquido amniótico.

Além disso, o prontuário de fl. 74 mostra que o médico Gerson já havia constatado que a altura uterina da autora não era compatível com a idade gestacional. Tal é um indicativo de retardo do crescimento intra-uterino, demandando, pois, maiores exames, ainda mais diante do histórico de nascimentos prematuros da autora.

Ademais, em seu depoimento (fl. 243), o médico Gerson afirmou que seria necessário investigar a diferença entre a altura uterina e a idade de gestação. Isso porque o retardo do crescimento intra-uterino é causa de antecipação de parto, o que poderia ter salvo a criança, o que também foi confirmado pelo médico (fI.243). Assim, tem-se que a conduta do médico foi negligente, ao recomendar apenas um analgésico e aconselhar a autora que se dirigisse ao posto de saúde, o qual notadamente possui menos infra-estrutura que um hospital e cuja demora no atendimento é notória.

É descabida a alegação de que o julgamento foi contra as provas produzidas durante a instrução. De fato, o MM. Juízo a quo formou a sua convicção com base na prova documental e testemunhal, como se observa claramente na sentença de fIs. 278/294.

Inexiste o litisconsórcio passivo necessário com o Município de Curitiba/PR, haja vista que a conduta omissiva se deu exclusivamente na Maternidade Vitor Ferreira do Amaral, da UFPR. A autora foi atendida no posto de saúde municipal em 12/09/2001, após não ter sido adequadamente atendida na maternidade. O posto de saúde deu o atendimento e encaminhamento corretos, inclusive para a ecografia, dentro de suas possibilidades. Os danos sofridos pela autora decorrem tão-somente da negligência ocorrida na Maternidade, não existindo incidibilidade da relação jurídica a justificar o litisconsórcio passivo necessário.

Por fim, em relação à indenização por danos morais, concordo com quantum fixado na r. sentença. Em casos análogos, o STJ já entendeu que o valor de 300 salários mínimos é razoável:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. VIOLAÇÃO DO ART. 535, I E II, DO CPC. NÃO. CONFIGURADA. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. PLEITO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. MORTE DE MENOR EM DECORRÊNCIA DE INFECÇÃO GENERALIZADA. ATUAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA ENTIDADE HOSPITALAR MUNICIPAL. ONUS PROBANDI.

(..) 2. Ação de indenização por danos materiais e morais ajuizada em face de Hospital Municipal, em decorrência de

falecimento de filha, menor, que diagnosticada por médico plantonista, foi encaminhada para casa, sendo certo que, dois dias após, constatou-se erro na avaliação anteriormente realizada, vindo a menor a falecer em decorrência de Infecção generalizada (Septicemia).

(..)6. A 2ª Turma desta Corte no julgamento de hipótese análoga - responsabilidade civil do estado decorrente de ato danoso praticado por seus prepostos - em sede de Recurso Especial 433.514/MG, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJ de 21.02.2005, decidiu, verbis: "ADMINISTRATIVO RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - ATO OMISSIVO - MORTE DE PORTADOR DE DEFICIÊNCIA MENTAL INTERNADO EM HOSPITAL PSIQUIÁTRICO DO ESTADO.

1. A responsabilidade civil que se imputa ao Estado por ato danoso de seus prepostos é objetiva (art. 37, § 6º, CF), impondo-lhe o dever de indenizar se se verificar dano ao patrimônio de outrem e nexo causal entre o dano e o comportamento do preposto.

2. Somente se afasta a responsabilidade se o evento danoso resultar de caso fortuito ou força maior ou decorrer de culpa da vítima.

3. Em se tratando de ato omissivo, embora esteja a doutrina dividida entre as correntes dos adeptos da responsabilidade objetiva e aqueles que adotam a responsabilidade subjetiva, prevalece na jurisprudência a teoria subjetiva do ato omissivo, de modo a só ser possível indenização quando houver culpa do preposto.

4. Falta no dever de vigilância em hospital psiquiátrico, com fuga e suicídio posterior do paciente.

5. Incidência de indenização por danos morais.

7. Recurso especial provido.

7. Deveras, consoante doutrina José dos Santos Carvalho Filho: "A marca da responsabilidade objetiva é a desnecessidade de o lesado pela conduta estatal provar a existência da culpa do agente ou do serviço. O fator culpa, então, fica desconsiderado com. pressupostos da responsabilidade objetiva (..)", sendo certo que a caracterização da responsabilidade objetiva requer, apenas, a ocorrência de três pressupostos: a) fato administrativo: assim considerado qualquer forma de conduta comissiva ou omissiva, legítima ou ilegítima, singular ou coletiva, atribuída ao Poder Público; b) ocorrência de dano: tendo em vista que a responsabilidade civil reclama a ocorrência de dano decorrente de ato estatal, latu sensu; c) nexo causal: também denominado nexo de causalidade entre o fato administrativo e o dano, consectariamente, incumbe ao lesado, apenas, demonstrar que o prejuízo sofrido adveio da conduta estatal, sendo despiciendo tecer considerações sobre o dolo ou a culpa.

8. Assim, caracterizada a hipótese de responsabilidade objetiva do estado, impõe-se ao lesado demonstrar a ocorrência do fato administrativo (diagnóstico errôneo), do dano (morte da filha da autora) e nexo causal (que a morte da criança decorreu de errôneo diagnóstico realizado por médico de hospital municipal).

9. Consectariamente, os pressupostos da responsabilidade objetiva impõem ao Estado provar a inexistência do fato administrativo, de dano ou ausência de nexo de causalidade entre o fato e o dano, o que atenua sobremaneira o princípio de que o ônus da prova incumbe a quem alega.

10. Deveras, na hipótese vertente, o acórdão deixou entrever que o Hospital Municipal São José não produziu prova satisfatória e suficiente de que o óbito da vítima não resultou de imperícia, imprudência ou negligência dos médicos que a atenderam, consoante se infere do voto de fls. 280/287, o que revela o provimento do recurso especial.

11. A indenização devida a título de danos materiais, segundo a jurisprudência desta Corte e do STF, pacificada pela Súmula 491, implica no reconhecimento do direito dos pais ao pensionamento devido pela morte de filho menor, independentemente de este exercer ou não atividade laborativa, quando se trate de família de baixa renda, como na hipótese dos autos. Precedente do STJ: RESP 514384/CE, Relator Ministro Aldir Passarinho Júnior, DJ de 10.05.2004.

12. No que pertine aos danos morais, esta Corte, aplicando o princípio da razoabilidade, tem reconhecido o direito à referida indenização, nestes termos: ''ADMINISTRATIVORESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - DANOS MORAIS E MATERIAIS - INDENIZAÇÃO.

1. A jurisprudência do ST J sedimentou-se no sentido de fixar a indenização por perda de filho menor, com pensão integral até a data em que a vítima completaria 24 anos e, a partir daí, pensão reduzida em 2/3, até a idade provável da vítima, 65 anos.

2. Razoabilidade na fIXação dos danos morais em 300 (trezentos) salários mínimos.

3. Recurso parcialmente provido." (RESP 50 71201CE, Relatora Ministra Eliana Calmon, DJ de 10.11.2003) 13. Recurso especial provido para a) determinar que a pensão mensal seja paga desde o falecimento da vítima, à razão de 213 do salário mínimo, até a data em que completaria 25 anos de idade; a partir daí, à base de 113 do salário mínimo, até a data em que a vítima completaria 65 anos de idade; b) fixar a indenização por danos morais em 300 salários mínimos. Invertidos os ônus de sucumbência.

(REsp 674. 586/SC, ReI. Ministro LUIZ FUX PRIMEIRA TURMA, julgado em 06.04.2006, DJ 02.05.2006 p. 253)

Isto posto, opina o Parquet pelo conhecimento e improvimento do apelo."

A condenação deve ser mantida até para efeito pedagógico, para que eventos da espécie não se repitam.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e à remessa oficial.

Juiz Federal Sérgio Renato Tejada Garcia
Relator

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 16/12/2009

APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 2005.70.00.008031-7/PR

ORIGEM: PR 200570000080317

RELATOR: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

PRESIDENTE: Valdemar Capeletti

PROCURADOR: Drª Márcia Neves Pinto

APELANTE: UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANA

ADVOGADO: Procuradoria-Regional Federal da 4ª Região

APELADO: GERONILDA DA APARECIDA ANTUNES e outro

ADVOGADO: Fabricio Verdolin de Carvalho

REMETENTE: JUÍZO SUBSTITUTO DA 05A VF DE CURITIBA

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 16/12/2009, na seqüência 791, disponibilizada no DE de 09/12/2009, da qual foi intimado(a) o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 4ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL.

RELATOR ACÓRDÃO: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

VOTANTE(S): Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER

: Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA

: Juiz Federal MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA

Regaldo Amaral Milbradt
Diretor de Secretaria

D.E. Publicado em 19/01/2010




JURID - Ação de indenização. Responsabilidade civil. Erro médico. [01/02/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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