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quarta-feira, 7 de outubro de 2009

JURID - Pronúncia. Homicídio simples tentado. Inconformismo do réu. [07/10/09] - Jurisprudência


Recurso em sentido estrito. Pronúncia. Homicídio simples tentado. Inconformismo do réu.


Tribunal de Justiça do Mato Grosso - TJMT.

SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 28049/2004 - CLASSE CNJ - 426 - COMARCA DE SINOP

RECORRENTE: JOSÉ ANTÔNIO DE SOUZA

RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO

Número do Protocolo: 28049/2004

Data de Julgamento: 23-9-2009

EMENTA

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - PRONÚNCIA - HOMICÍDIO SIMPLES TENTADO - INCONFORMISMO DO RÉU - ALEGADA LEGÍTIMA DEFESA - PRETENDIDA ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA OU DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÃO CORPORAL - IMPOSSIBILIDADE - INDÍCIOS DE AUTORIA PRESENTES E MATERIALIDADE COMPROVADA - INTELIGÊNCIA DO ART. 413, § 1º DO CPP - INCERTEZA QUANTO À OCORRÊNCIA DA EXCLUDENTE DE ILICITUDE OU COM RELAÇÃO À REAL INTENÇÃO DO RECORRENTE - VIGÊNCIA DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO SOCIETATE - MATÉRIA A SER DECIDIDA PELO CONSELHO DE SENTENÇA - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO IMPROVIDO.

Restando comprovados nos autos a materialidade e os indícios de autoria do crime de homicídio, com assim, incerta a alegada legítima defesa, impõe-se a pronúncia do réu.

Por disposição Constitucional, a apreciação do mérito da acusação de crimes dolosos contra a vida compete ao seu Juiz natural, o Tribunal Popular do Júri.

Sentença mantida.

R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. TEOMAR DE OLIVEIRA CORREIA

Egrégia Câmara:

JOSÉ ANTÔNIO DE SOUZA interpôs RECURSO EM SENTIDO ESTRITO contra a r. decisão de fls. 98/100, proferida pelo d. Juízo da Vara Criminal da Comarca de Sinop/MT, porquanto restou pronunciado pela prática de crime de tentativa de homicídio (art. 121, caput, c/c art. 14, II, ambos do Código Penal), devendo ser submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri.

Em síntese, pugna pela reforma do r. decisum profligado, no sentido de ser absolvido sumariamente com fulcro no art. 415, IV, do Código de Processo Penal, ante a aventada tese de legítima defesa. Em não sendo este o entendimento, subsidiariamente, requer a desclassificação do delito para o de lesões corporais. (fls. 112/113)

Em contrarrazões (fls. 116/122), o Ministério Público pugna pelo improvimento do recurso, mantendo-se incólume a decisão de pronúncia.

Em juízo de retratação (fls. 123), a pronúncia foi mantida por seus próprios fundamentos.

A Ilustrada Procuradoria de Justiça em parecer da lavra do culto Procurador de Justiça Dr. Gill Rosa Fechtner igualmente opina pelo improvimento do recurso.

É o relatório.

P A R E C E R (ORAL)

A SRA. DRA. KÁTIA MARIA AGUILERA RÍSPOLI

Ratifico o parecer escrito.

V O T O

EXMO. SR. DES. TEOMAR DE OLIVEIRA CORREIA (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Consoante relatado, JOSÉ ANTÔNIO DE SOUZA interpõe RECURSO EM SENTIDO ESTRITO visando reformar a decisão de 1º Grau, a qual o pronunciou por tentativa de homicídio simples (artigo 121, caput, c/c artigo 14, II, ambos do Código Penal), para submetê-lo a julgamento pelo Tribunal do Júri.

Objetiva o recorrente a sua absolvição sumária sob o fundamento de legítima defesa, nos termos do art. 415, IV do Código de Processo Penal. Alternativamente, pugna pela desclassificação do delito para o de lesões corporais.

Malgrado os argumentos deduzidos na peça irresignativa, o presente recurso não merece prosperar sob pena de a competência constitucional do Tribunal do Júri restar suprimida.

Deveras, narra a exordial acusatória: no dia 22 de dezembro de 2001, por volta das 11h00min, nas dependências do estabelecimento comercial denominado "Bar Jato", situado na Av. das Castanheiras, na Comarca de Sinop, o recorrente, utilizando-se de uma faca, desferiu vários golpes na vítima Manoel Pereira de Souza (vulgo "Neguinho"), vindo a causar-lhe ferimentos.

A materialidade do delito está comprovada pelo Auto de Exame de Corpo de Delito (fls.29) e pelo Mapa Topográfico para localização das lesões (fls.30), tendo a vítima sofrido 04 (quatro) facadas.

Com relação à autoria delitiva, o recorrente confessou ter alvejado a vítima com uma faca, todavia, alegou ter agido em legítima defesa haja vista ter sido agredido pela vítima a qual supostamente pretendia lhe subtrair a quantia de R$2,00 (dois reais).

Extrai-se do caderno processual, consoante depoimento da única testemunha presencial, Cláudia Santana Lamar, proprietária do estabelecimento no qual ocorreram os fatos, estar a vítima em seu estabelecimento comercial quando ali chegou o recorrente. Este, supostamente, teria passado a agredir o ofendido com golpes de faca. Vejamos o teor das declarações da testemunha na fase administrativa, verbis:

"(...) Que a vítima é freguês do bar, que sempre vai lá, que hoje de manhã passou cedo e tomou duas doses de pinga e foi embora; que a declarante conhece a vítima apenas por "Neguinho Tiziu", não sabendo o seu nome; que por volta das 11:00 horas mais ou menos, a vítima chegou e sentou num banco perto do balcão e começou a conversar com a declarante, percebeu que a vítima estava embriagada; que de repente entrou um outro homem no bar com uma faca na mão e partiu para cima do Neguinho, que este segurou o braço armado, foram para fora do bar; (...) mandou Neguinho correr, que tentava se defender com uma mesa, que outro homem dando golpe de faca; que o agressor estava embriagado, que acertou várias facadas no Neguinho (...)." (fls. 08)

A mesma testemunha inquirida em juízo declarou, verbis:

"... que de repente o réu, que a depoente reconhece nesta oportunidade, entrou no bar e foi seguro pelo braço por "Neguinho", saindo ambos para fora do bar; que lá fora "Neguinho" pegou a mesa e começou a se defender, uma vez que o réu estava munido de faca e tentava se defender; que ambos estavam embriagados; que em certo momento o réu conseguiu furar a vítima; que a vítima ainda conseguiu bater com um objeto na cabeça do réu que meio zonzo conseguiu cair; que "Neguinho atravessou a rua e nesse momento a viatura do policia chegou (...) que a testemunha acredita que o réu não atravessou a rua para pegar "Neguinho"; que acredita que o réu não foi para o lado de "Neguinho" para lhe furar após ter caído no chão, uma vez que se assim quisesse fazer teria levado consigo a faca (...) que a vítima "Neguinho" é maior que o réu; que depois do acontecimento "Neguinho voltou no bar e disse que o réu não tinha a culpa, e que tinha a intenção de retirar a queixa..." (fls. 58/59)

Conquanto invoque em seu benefício a excludente da legítima defesa sob o argumento de que a vítima havia tentado lhe roubar R$2,00, não existem nos autos, ao menos nesta fase, provas suficientes a corroborar tal afirmação e autorizar a absolvição sumária.

Ao contrário, tal argumento se encontra duvidoso em face dos elementos de prova encontradiços nos autos. Outrossim, não há provas nos autos de qualquer agressão anterior por parte da vítima ao réu, como afirmado por ele.

Dessa forma, a descriminante em comento resta duvidosa, devendo tal tese ser submetida ao crivo do Conselho de Sentença, porquanto o arcabouço probatório, como já asseverado, não transmite a indubitável certeza de ter o recorrente agido com intenção de se defender de injusta, atual ou iminente, agressão provocada pela vítima.

Desse entendimento perfilha a jurisprudência, verbis:

"Para ensejar a absolvição sumária, como é cediço, impõe-se que as provas sejam plenas, que não mereçam a mínima dúvida e se apresentem nítidas e irretorquíveis." (TJSP - RT 735/580)

"RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TENTATIVA DE HOMICÍDIO. TESE DE DESISTÊNCIA VOLUNTÁRIA. DESCLASSIFICAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. IN DUBIO PRO SOCIETATE. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. 1. O princípio do in dubio pro societate incide na fase da pronúncia, devendo as dúvidas serem resolvidas pelo Tribunal do Júri. 2. Nos termos do art. 410 do Código de Processo Penal, o magistrado somente desclassificará a infração penal quando a acusação de crime doloso contra a vida for manifestamente inadmissível, o que não ocorreu no caso em apreço. 3. Recurso conhecido e provido." (STJ - RESP N. 775.062/DF - RELATOR: MINISTRA LAURITA VAZ - ÓRGÃO JULGADOR: QUINTA TURMA - DATA: 12-5-2008) .

"Absolvição Sumária - Inadmissibilidade - Inexistência de prova segura e incontroversa, escoimada de qualquer dúvida pertinente à justificativa - Hipótese em que exsurgem dos autos duas versões conflitantes dos fatos, afigurando-se controversa a tese de legítima defesa. (...) A absolvição sumária exige prova segura, incontroversa, plena, límpida, cumpridamente demonstrada e escoimada de qualquer dúvida pertinente à justificativa, moldura inconciliável com o caso vertente em que a ocorrência da legítima defesa afigura-se controversa ante a existência de duas versões conflitantes nos autos." (TJPR - RT 775/664)

De outro lado, com relação à pretensa desclassificação do delito, melhor sorte não assiste ao recorrente.

Sustenta a defesa não ter o recorrente intenção de matar a vítima, pois se assim fosse, teria consumado o crime quando a vítima atravessou a rua fugindo, bem como não teria deixado a faca em frente ao estabelecimento comercial.

Não obstante, as agressões à vítima só vieram a cessar quando esta, para se defender, deu uma "mesada" na cabeça do recorrente, fazendo-o cair ao solo, não restando claramente qual a real intenção do recorrente.

Ademais, conforme Mapa Topográfico para localização de lesões, o recorrente alvejou a vítima em quatro regiões (queixo; no tórax, debaixo do braço esquerdo; mão direita; e na coxa direita).

Dessarte, em se tratando de decisão de pronúncia, proferida em autos cujos requisitos para a admissibilidade da acusação se encontram presentes, ante a confissão do recorrente e a materialidade do delito, comprovada pela prova técnica, impõe-se a confirmação da decisão monocrática de molde a permitir aos Jurados apreciar todas as versões existentes nos autos e decidir pela mais verossímil.

Demais disso, haverá a possibilidade de produção de prova em plenário, dirimindo-se as dúvidas porventura existentes.

Com o escopo de demonstrar que este provecto Tribunal de Justiça não discrepa do entendimento aqui esposado, trago à colação o aresto relatado pelo Desembargador José Luiz de Carvalho, ilustre integrante da Egrégia Terceira Câmara Criminal, cujo julgado ficou assim ementado:

"RECURSO EM SENTIDO ESTRITO - TRIBUNAL DO JÚRI - CRIME DE HOMICÍDIO QUALIFICADO - SENTENÇA DE PRONÚNCIA - RECURSO DEFENSIVO - PLEITO DE ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA OU DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÕES CORPORAIS SEGUIDA DE MORTE - IMPOSSIBILIDADE - COMPETÊNCIA DO CONSELHO DE SENTENÇA - PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL - RECURSO IMPROVIDO. Tratando-se de crimes dolosos contra a vida, as teses de absolvição e desclassificação não demonstradas de forma incontestável devem ser submetidas ao Tribunal do Júri, por seu conselho de sentença, que é o Juiz natural constitucionalmente competente para a apreciação de tais questões. Autoria admitida e materialidade comprovada pela prova técnica, requisitos suficientes para o juízo de admissibilidade da acusação." (TJMT - SER N. 26243/2008 - RELATOR: DESEMBARGADOR JOSÉ LUIZ DE CARVALHO - TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL - DATA DO JULGAMENTO: 28-7-2008).

A pronúncia é mero juízo de admissibilidade da acusação, não se exigindo prova irrefutável a fim de o réu ser submetido à Corte Popular, bastando meros indícios da autoria e prova da materialidade conforme preconiza o art. 413, § 1º do CPP, verbis:

"Art. 413. O juiz, fundamentadamente, pronunciará o acusado, se convencido da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação.

§ 1º. A fundamentação da pronúncia limitar-se-á à indicação da materialidade do fato e da existência de indícios suficientes de autoria ou de participação, devendo o juiz declarar o dispositivo legal em que julgar incurso o acusado e especificar as circunstâncias qualificadoras e as causas de aumento de pena."

É o caso dos autos, onde há prova material do crime supostamente perpetrado pelo recorrente assim como indícios seguros quanto à autoria.

A pronúncia, por possuir caráter meramente processual, consubstanciando simples juízo de admissibilidade da acusação, desloca a competência do julgamento para o Tribunal Popular do Júri, razão pela qual, diante dos fundamentos expostos, é imperiosa a confirmação da decisão reexaminanda de forma a permitir aos Srs. Jurados apreciar todas as versões existentes nos autos e decidir pela mais consentânea com as suas convicções.

Ante o exposto, em consonância com o parecer da ilustrada Procuradoria de Justiça, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO, para manter inalterada a sentença de pronúncia objurgada.

É como voto.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. GÉRSON FERREIRA PAES, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DES. TEOMAR DE OLIVEIRA CORREIA (Relator), DR. CARLOS ROBERTO C. PINHEIRO (1º Vogal convocado) e DES. GÉRSON FERREIRA PAES (2º Vogal), proferiu a seguinte decisão: POR UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. DECISÃO DE ACORDO COM O PARECER.

Cuiabá, 23 de setembro de 2009.

DESEMBARGADOR GÉRSON FERREIRA PAES - PRESIDENTE DA SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL

DESEMBARGADOR TEOMAR DE OLIVEIRA CORREIA - RELATOR

PROCURADOR DE JUSTIÇA

Publicado em 02/10/09




JURID - Pronúncia. Homicídio simples tentado. Inconformismo do réu. [07/10/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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