![]()
Mandado de segurança. Execução. Penhora sobre dinheiro em conta bancária. Cabimento.
Tribunal Superior do Trabalho - TST.
NÚMERO ÚNICO PROC: ROMS - 32100/2004-000-10-00
PUBLICAÇÃO: DEJT - 05/02/2010
A C Ó R D Ã O
SBDI-2
EMP/rnb
MANDADO DE SEGURANÇA. EXECUÇÃO. PENHORA SOBRE DINHEIRO EM CONTA BANCÁRIA. CABIMENTO.
No caso de bloqueio e penhora em conta corrente e/ou aplicações financeiras, a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de cabimento do mandado de segurança, em abrandamento do óbice contido na Súmula nº 267 do Supremo Tribunal Federal e na Orientação Jurisprudencial nº 92 da SBDI-2 do Tribunal Superior do Trabalho, porque a utilização do recurso específico só seria possível após a concretização do ato tido por ilegal e a reparação do dano só seria possível após o transcurso do tempo necessário até a solução final do litígio, fato a acarretar dano irreparável ou de difícil reparação para a parte. É o que se extrai do teor da Súmula nº 417 do Tribunal Superior do Trabalho.
PENHORA EM CONTA BANCÁRIA. ESTADO ESTRANGEIRO. IMUNIDADE RELATIVA DA EXECUÇÃO. BEM AFETO À MISSÃO DIPLOMÁTICA. ILEGALIDADE.
Apesar do novo quadro delineado no plano do direito internacional e no âmbito do direito comparado adotar a teoria da imunidade relativa de execução dos Estados soberanos, sobretudo em litígios trabalhistas, os bens afetos à missão diplomática e consular ficam imunes à execução forçada. Dentre estes, estão inclusos os valores creditados em conta corrente de Embaixada de Estado estrangeiro, devido à impossibilidade de se distinguir os créditos de natureza comercial daqueles destinados exclusivamente à manutenção e administração da própria Embaixada, conforme precedentes desta Corte.
Recurso ordinário não provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n° TST-ROMS-321/2004-000-10-00.1, em que é Recorrente EDVALDO MOREIRA DE AZEVEDO e Recorrido ESTADO DA FINLÂNDIA e Autoridade Coatora JUIZ TITULAR DA 3ª VARA DO TRABALHO DE BRASÍLIA. ESTADO DA FINLÂNDIA impetrou mandado de segurança, com pedido de liminar, contra ato do Exmº Sr. Juiz da 3ª Vara do Trabalho de Brasília-DF, o qual, nos autos da Reclamação Trabalhista nº 418-2000-003-10-00-0, em fase de execução definitiva, determinou a penhora de numerário existente em conta-bancária do impetrante (fls. 15-18).
O pedido de liminar foi deferido às fls. 29-30.
A autoridade apontada como coatora prestou informações às fls. 36-39.
O egrégio Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, por meio do venerando acórdão às fls. 91-101, concedeu a segurança pleiteada.
Embargos declaratórios opostos pelo litisconsorte passivo necessário às fls. 114-120 e parcialmente providos às fls. 125-127 para prestar esclarecimentos.
Inconformado, recorre ordinariamente o litisconsorte passivo (fls. 129-138). Insiste no alegado não-cabimento da ação, bem como na inexistência de violação a direito líquido e certo do impetrante.
Foram apresentadas contra-razões às fls. 146-152.
O recurso ordinário foi admitido pelo despacho de fl. 153.
A Procuradoria-Geral do Trabalho manifestou-se pelo conhecimento e provimento do apelo (fls. 158-160).
É o relatório.
V O T O
I - CONHECIMENTO
Conheço do recurso ordinário, uma vez que encontram-se preenchidos os pressupostos de admissibilidade.
II MÉRITO
Conforme já relatado, trata-se de mandado de segurança impetrado por ESTADO DA FINLÂNDIA, em face do ato do Exmº Sr. Juiz da 3ª Vara do Trabalho de Brasília-DF, o qual, nos autos da Reclamação Trabalhista 418-2000-003-10-00-0, em fase de execução definitiva, determinou a penhora de numerário existente em conta-bancária do Impetrante (fls. 15-18). O impetrante alega ofensa a seu direito líquido e certo consistente na imunidade de execução, por se tratar de um Estado estrangeiro, conforme previsto nas Convenções de Viena de 1961 e 1963. Invoca a independência entre as Nações e o princípio da não intervenção. Aponta, ainda, violação dos artigos 620 do CPC, 4º, inciso IV, e 5º, incisos XXII, LIV e LV, da Constituição Federal.
O egrégio Tribunal Regional concedeu a segurança pleiteada para desconstituir a penhora realizada e determinar a restituição dos valores penhorados ao impetrante. Após concluir pelo cabimento da ação no presente caso, considerou que os valores creditados em conta bancária do Estado estrangeiro são abrangidos pela imunidade de execução, a qual não se confunde com imunidade de jurisdição. Adotou a seguinte fundamentação:
" (...)
Entretanto, como já mencionado acima, aqui não se trata de imunidade de jurisdição baseada em uma regra consuetudinária, e sim de impenhorabilidade de bens protegidos por convenções internacionais a que o Brasil se obrigou, promulgadas e em pleno vigor em nosso país.
Observa-se que, ao se afastar a imunidade de jurisdição do Estado estrangeiro em matéria trabalhista, não se pode imediatamente e em conseqüência desse afastamento, proceder à execução forçada do título judicial, sob o argumento de que, havendo jurisdição, não há mais impedimento para o processo de execução. É que, para o processo de execução, há necessidade de que seja suplantada a penhorabilidade do bem que possui o Estado estrangeiro, normalmente adquirido para que aqui possa desempenhar sua missão diplomática.
Tal medida se impõe porque o estado estrangeiro, para que possa atingir a finalidade de manter relações com o país onde instala a sua missão de representação, há de ser considerado em sua soberania, como parte igual integrante da comunidade internacional. Ele não pode ser constrangido ou molestado na sua condição de estado, ou ver os bens e o numerário necessários ao bom e fiel desempenho de sua missão sujeitos a medidas judiciais de nenhuma natureza. Esse é o fundamento que norteou a inserção, nas Convenções de Viena já antes mencionadas, das cláusulas relativas à inviolabilidade dos bens da missão diplomática e/ou consular, convenções, como dito alhures, ratificadas pelo Brasil, promulgadas e em pleno vigor
CONVENÇÃO DE VIENA SOBRE RALAÇÕES DIPLOMÁTICAS (...); CONVENÇÃO DE VIENA SOBRE RELAÇÕES CONSULARES (...).
Portanto, assentadas essas premissas, faz-se mister indagar se o bem sobre o qual recaiu a penhora destina-se à missão diplomática e/ou consular da Reclamada, à luz do sempre atual ensinamento de Francisco Rezek:
A execução forçada da eventual sentença condenatória, entretanto, só é possível na medida em que o Estado estrangeiro tenha, no âmbito especial de nossa jurisdição, bens estranhos à sua própria representação diplomática ou consular visto que estes se encontram protegidos contra a penhora ou medida congênere pela inviolabilidade que lhes asseguram as Convenções de Viena de 1961 e 1963, estas seguramente não derrogadas por qualquer norma ulterior [...]. (JOSÉ FRANCISCO REZEK. IN Direito Internacional Público. 7ª edição. São Paulo: Saraiva, 1998, pág. 176/177.)
No mesmo sentido é a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:
(...)
Em razão disso é que também defendi nos trabalhos já antes mencionados a possibilidade de que a execução contra Estado estrangeiro possa recair em bens que o estado aqui possua fora daqueles destinados à missão diplomática:
(...)
O juízo da execução asseverou, com suporte nas disposições do art. 22 da Convenção de Viena de 1961, que são invioláveis apenas e tão-somente os locais da missão, seu mobiliário e demais bens nele situados, além dos meio de transporte da missão. Todo e qualquer outro bem, ainda que pertencente à Missão ou ao Estado estrangeiro, não estaria abrangido pela proteção convencional, pelo que reputou válida a penhora realizada sobre a conta corrente indicada pelo Exeqüente.
Na análise do pedido liminar, asseverei que a Convenção ratificada pelo Congresso Nacional, ao assumir o caráter de lei em sentido material dentro do nosso ordenamento jurídico, preconiza a inviabilidade dos bens afetos à missão estrangeira, aí compreendidos todos os necessários ao cumprimento de seu desiderato.
A interpretação firmada pelo Juízo da execução aos dispositivos consulares ateve-se ao caráter literal da norma, e o espírito que a norteia é o de garantir a impenhorabilidade de tudo aquilo que assegura a regular consecução dos objetivos da missão estrangeira. Basta que se atente ao que dispõe o preâmbulo das ditas Convenções, parte delas integrantes.
No caso dos autos, o Impetrante assevera tratar-se de numerário destinado a implementar o pagamento dos salários dos seus funcionários e a quitação de outras obrigações de gestão ordinária, indispensáveis para o funcionamento adequado do seu órgão representativo, pelo que impossível a penhora sobre o montante existente na conta corrente apresentada. Aliás, é esse o posicionamento manso e remansoso do STF sobre o assunto, como se vê do excerto antes transcrito " (fls. 97-100).
Em suas razões de recurso ordinário, o litisconsorte passivo sustenta o desacerto da decisão recorrida. Insiste no não cabimento do mandamus, com base no artigo 5º, inciso II, da Lei nº 1.5333/51, sob a alegação de haver recurso específico para atacar o ato impugnado, qual seja o agravo de petição. Alega que a superação de tal óbice implicou em afronta ao princípio constitucional da igualdade (artigo 5º, caput, da Constituição Federal). No mérito, sustenta que os valores depositados em conta bancária não estão abrangidos pela vedação prevista na Convenção de Viena de 1961, não se revestindo de ilegalidade a sua constrição judicial. Ao final, requer a reforma do julgado para restabelecer o ato impugnado, bem como a concessão dos benefícios da justiça gratuita.
Inicialmente, concedo ao recorrente os benefícios da justiça gratuita, ante o requerimento de fls. 129 e 138 e a declaração de fl. 140, nos termos do § 3º do artigo 790 da CLT.
Sem razão o recorrente quanto à reforma do acórdão do regional.
A jurisprudência desta Corte tem abrandado o rigor do óbice levantado pelo recorrente ao cabimento do mandado de segurança também reproduzido na Súmula nº 267 do STF e na Orientação Jurisprudência nº 92 da SBDI-2 do TST quando o recurso cabível não puder, de pronto, reparar a ilegalidade e evitar o dano irreparável ou de difícil reparação. No caso em exame, a medida judicial específica seriam os embargos à execução (ou à penhora).
Mas ela só poderia ser utilizada quando já consumada a violação ao direito da parte, porque exige, como pressuposto, a garantia total da execução.
Também o agravo de petição não seria eficaz para reparar o dano, uma vez que não é possuidor de efeito suspensivo e demandaria algum tempo até a solução final.
Finalmente, a controvérsia, no aspecto, não comporta mais discussão no âmbito desta Corte, ante o teor da Súmula nº 417 do TST, a qual pressupõe exatamente o cabimento da ação mandamental contra ato de penhora de dinheiro em conta corrente e aplicações financeiras.
No tocante ao mérito da controvérsia, como já exposto no acórdão recorrido, não há que se confundir imunidade de jurisdição com imunidade de execução. Aquela diz respeito à possibilidade ou não do Estado estrangeiro ser processado e julgado pelo judiciário do Estado acreditado (local), ou seja, a possibilidade dos juízes e Tribunais locais conhecerem de controvérsias nas quais estão envolvidas por entes públicos de direito externo e sobre elas decidir. Já esta diz respeito à possibilidade ou não do Estado estrangeiro sofrer a execução forçada da sentença transita em julgado obtida na fase de conhecimento. A situação dos autos diz respeito a esta, à imunidade de execução. Assim, os precedentes citados pelo recorrente à fl. 137 dizem respeito à imunidade de jurisdição, situação diversa da ora em exame. No mesmo sentido a notícia exposta na fl. 136, acerca do entendimento do Ex-Presidente desta Casa, Ministro aposentado Francisco Fausto.
A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, seguindo o entendimento predominante no Supremo Tribunal Federal, tem abrandado o princípio da imunidade absoluta de execução dos entes públicos de direito externo, nas demandas trabalhistas, em primazia aos Princípios Fundamentais da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho elencados no artigo 1º da Constituição da República Federativa do Brasil. Reconhece-se, no caso, a imunidade relativa da execução aos Estados estrangeiros nos litígios trabalhistas. A propósito, digno de citação o voto do eminente Ministro Celso de Mello, verbis:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - ESTADO ESTRANGEIRO - RECLAMAÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA POR EMPREGADOS DE EMBAIXADA - IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO CARÁTER RELATIVO - RECONHECIMENTO DA JURISDIÇÃO DOMESTICA DOS JUÍZES E TRIBUNAIS BRASILEIROS - AGRAVO IMPROVIDO - IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO - CONTROVÉRSIA DE NATUREZA TRABALHISTA - COMPETÊNCIA JURISDICIONAL DOS TRIBUNAIS BRASILEIROS.
A imunidade de jurisdição do Estado estrangeiro, quando se tratar de litígios trabalhistas, revestir-se-á de caráter meramente relativo e, em conseqüência, não impedirá que os juizes e Tribunais brasileiros conheçam de tais controvérsias e sobre elas exerçam o poder jurisdicional que lhes é inerente.
ATUAÇÃO DO ESTADO ESTRANGEIRO EM MATÉRIA DE ORDEM PRIVADA - INCIDÊNCIA DA TEORIA DA IMUNIDADE JURISDICIONAL RELATIVA OU LIMITADA.
O novo quadro normativo que se delineou no plano do direito internacional, e também no âmbito do direito comparado, permitiu - ante a realidade do sistema de direito positivo dele emergente - que se construísse a teoria da imunidade jurisdicional relativa dos Estados soberanos, tendo-se presente, para esse específico efeito, a natureza do ato motivador da instauração da causa em juízo, de tal modo que deixa de prevalecer, ainda que excepcionalmente, a prerrogativa institucional da imunidade de jurisdição, sempre que o Estado estrangeiro, atuando em matéria de ordem estritamente privada, intervier em domínio estranho àquele em que se praticam os atos jure imperii. Doutrina. Legislação comparada. Precedente do STF. A teoria da imunidade limitada ou restrita objetiva institucionalizar solução jurídica que concilie o postulado básico da imunidade jurisdicional do Estado estrangeiro com a necessidade de fazer prevalecer, por decisão do Tribunal do foro, o legítimo direito do particular ao ressarcimento dos prejuízos que venha a sofrer em decorrência de comportamento imputável a agentes diplomáticos, que, agindo ilicitamente, tenham atuado more privatorum em nome do País que representam perante o Estado acreditado (o Brasil, no caso). Não se revela viável impor aos súditos brasileiros, ou a pessoas com domicílio no território nacional, o ônus de litigarem, em torno de questões meramente laborais, mercantis, empresariais ou civis, perante tribunais alienígenas, desde que o fato gerador da controvérsia judicial necessariamente estranho ao específico domínio dos acta jure imperii - tenha decorrido da estrita atuação more privatorum do Estado estrangeiro.
OS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA E A DOUTRINA DA IMUNIDADE DE JURISDIÇÃO RELATIVA OU LIMITADA.
Os Estados Unidos da América - parte ora agravante - já repudiaram a teoria clássica da imunidade absoluta naquelas questões em que o Estado estrangeiro intervém em domínio essencialmente privado. Os Estados Unidos da América - abandonando a posição dogmática que se refletia na doutrina consagrada por sua Corte Suprema em Schooner Exchang v. McFaddon (1812) - fizeram prevalecer, já no início da década de 1950, em típica declaração unilateral de caráter diplomático, e com fundamento nas premissas expostas na Tate Letter, a conclusão de que tal imunidade, em certos tipos de caso, não deverá continuar sendo concedida. O Congresso americano, em tempos mais recentes, institucionalizou essa orientação que consagra a tese da imunidade relativa de jurisdição, fazendo-a prevalecer, no que concerne a questões de índole meramente privada, no Foreign Sovereign Immunities Act (1976).
(...) (AI-AgR 139671/DF, Rel. Min. Celso de Mello, 1ª Turma, DJ de 29/03/96).
Como conseqüência do reconhecimento da relatividade da imunidade de execução dos Estados estrangeiros, ficam imunes à constrição judicial todos os bens afetos à missão diplomática ou consular, em respeito ao disposto no artigo 22, item 3, da Convenção de Viena de 1961, da qual o Brasil é signatário e, até a presente data, não foi derrogada. Sujeitam-se à penhora todos os demais bens desafetos ao exercício da missão oficial.
Resta, pois, saber se valores depositados em conta bancária do ora impetrante estão afetos à missão diplomática. Devido à impossibilidade de se distinguir os créditos de natureza meramente comercial daqueles destinados exclusivamente à manutenção e administração da Embaixada, a jurisprudência deste Colegiado tem se orientado no sentido de considerar os créditos em conta bancária como afetos à missão diplomática, portanto não passíveis de sofrer penhora, conforme os precedentes a seguir ementados:
I) MANDADO DE SEGURANÇA ESTADO ESTRANGEIRO IMUNIDADE RELATIVA NO PROCESSO DE EXECUÇÃO PENHORA DE NUMERÁRIO EXISTENTE NA CONTA CORRENTE DO REINO DA ESPANHA BEM AFETO À SUA REPRESENTAÇÃO DIPLOMÁTICA INVIOLABILIDADE PROTEGIDA PELO ART. 3º DA CONVENÇÃO DE VIENA LIBERAÇÃO DO BEM CONSTRITO.
1. Trata-se de mandado de segurança preventivo impetrado pelo Reino da Espanha, com pedido liminar, contra ato a ser praticado pelo juízo da execução, em sede de execução definitiva, ante a iminência da penhora de bens ou numerário existente em sua conta corrente.
2. No curso do presente writ, especificamente após a interposição deste recurso ordinário, o Impetrante atravessou petição noticiando que o juízo da execução efetuou a penhora de sua conta corrente, a pedido da Reclamante.
3. Por decisão monocrática deste Relator, foi atribuído efeito suspensivo ao recurso ordinário e determinada a suspensão do processo de execução, com o imediato desbloqueio da conta corrente do Impetrante, por afronta ao art. 3º da Convenção de Viena, cuja decisão foi mantida incólume pela SBDI-2 do TST, em sede de agravo regimental.
4. No mérito, o Impetrante visa ao reconhecimento da imunidade absoluta (e não relativa) no processo de execução, dos entes de direito público externo, que, ao seu ver, se equiparam aos entes públicos internos, por entender que tal imunidade não comporta exceção, de modo a alcançar não apenas a sua conta corrente (afeta à sua representação diplomática), mas também os demais bens não afetos à referida representação, já que se trata de bens públicos do País acreditado, sob pena de perpetrar ofensa aos princípios da reciprocidade, soberania e inviolabilidade.
5. De plano, ressalte-se que a jurisprudência do TST e do STF tem abrandado o vetusto princípio da imunidade absoluta no processo de execução, capitaneadas pelo voto do eminente Ministro Celso de Mello, da Suprema Corte, no sentido de que a imunidade de jurisdição do Estado estrangeiro, quando se tratar de litígios trabalhistas, revestir-se-á de caráter meramente relativo e, em conseqüência, não impedirá que os juizes e Tribunais brasileiros conheçam de tais controvérsias e sobre elas exerçam o poder jurisdicional que lhes é inerente, pelos seguintes fundamentos: a) o novo quadro normativo que se delineou no plano do direito internae também no âmbito do direito comparado, permitiu - ante a realidade do sistema de direito positivo dele emergente - que se construísse a teoria da imunidade jurisdicional relativa dos Estados soberanos, tendo-se presente, para esse específico efeito, a natureza do ato motivador da instauração da causa em juízo, de tal modo que deixa de prevalecer, ainda que excepcionalmente, a prerrogativa institucional da imunidade de jurisdição, sempre que o Estado estrangeiro, atuando em matéria de ordem estritamente privada, intervier em domínio estranho àquele em que se praticam os atos jure imperii; b) a teoria da imunidade limitada ou restrita objetiva institucionalizar solução jurídica que concilie o postulado básico da imunidade jurisdicional do Estado estrangeiro com a necessidade de fazer prevalecer, por decisão do Tribunal do foro, o legítimo direito do particular ao ressarcimento dos prejuízos que venha a sofrer em decorrência de comportamento imputável a agentes diplomáticos, que, agindo ilicitamente, tenham atuado more privatorum em nome do País que representam perante o Estado acreditado (o Brasil, no caso); c) não se revela viável impor aos súditos brasileiros, ou a pessoas com domicílio no território nacional, o ônus de litigarem, em torno de questões meramente laborais, mercantis, empresariais ou civis, perante tribunais estrangeiros, desde que o fato gerador da controvérsia judicial necessariamente estranho ao específico domínio dos acta jure imperii - tenha decorrido da estrita atuação more privatorum do Estado estrangeiro.
6. Desse modo, em face dos precedentes do TST e do STF, é de se reconhecer a imunidade relativa (e não absoluta) da lide executória, em relação aos entes de direito público externo, razão pela qual não há que se falar em ofensa aos princípios da reciprocidade, soberania e inviolabilidade, como alegado pelo Impetrante.
II) FORMA DE EXECUÇÃO DECRETO 166/91, QUE PROMULGOU O CONVÊNIO DE COOPERAÇÃO JUDICIÁRIA EM MATÉRIA CIVIL, ENTRE O GOVERNO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL E O REINO DA ESPANHA CARÁTER PROCEDIMENTAL E FACULTATIVO (ART. 2º DO REFERIDO CONVÊNIO) EXECUÇÃO DIRETA CONCESSÃO PARCIAL DO WRIT.
1. Sustenta o Impetrante que a execução, in casu, deve se dar mediante o necessário envio de carta rogatória (CPC, arts. 210 a 212), observados os requisitos da Portaria 26/90 do Departamento Consular e Jurídico do Ministério das Relações Exteriores do Brasil, a fim de receber o Exeqüatur da Suprema Corte do Reino da Espanha, nos mesmos moldes adotados pela Constituição Federal do Brasil (art. 105, I, i).
2. Desde logo, pontuo que, se não mais existe controvérsia, na doutrina e na jurisprudência de nossos tribunais, sobre o fato de a imunidade do processo de execução ser relativa no tocante aos entes de direito público externo, o mesmo não ocorre quanto à forma de execução, vale dizer, sobre a constrição (direta, via diplomática ou por carta rogatória, e sua amplitude) e expropriação de bens do estado estrangeiro.
3. In casu, verifica-se que foi promulgado na cidade de Madri, em 13/04/89, o Convênio de Cooperação Judiciária em Matéria Civil, entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Reino da Espanha, que, após ter sido aprovado por meio do Decreto Legislativo 31, de 16/10/90, resultou na edição do Decreto 166, de 03/07/91, que, em seu art. 1º, preceitua que o referido convênio será executado e cumprido tão inteiramente como nele se contém, ambos publicados no Diário Oficial da União de 04/07/91.
4. Da leitura do referido Decreto, que se encontra em plena vigência, verifica-se que o art. 2º atribui como faculdade (e não obrigação) dos Estados contratantes a transmissão das cartas rogatórias originadas dos processos referentes às matérias que são objeto do Convênio, de modo a revelar tão-somente o seu caráter procedimental, razão pela qual deve ser observado pelo juízo da execução, in casu, que a penhora (via execução direta) recaia apenas sobre os bens não afetos à representação diplomática, conforme o disposto no art. 3º da Convenção de Viena e na jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal.
Recurso ordinário parcialmente provido (TST-ROMS-161/2005-000-10-00.1, Rel. Ministro Ives Granda Martins Filho, DJ 09/03/07).
(...)
RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA ELETRÔNICA DE VALORES PERTENCENTES A ESTADO ESTRANGEIRO QUE INVOCA IMUNIDADE DE EXECUÇÃO. HIPÓTESE DE EXCEPCIONAL CABIMENTO.
Justifica-se no caso específico a utilização da medida urgente para atacar o ato judicial que, em execução definitiva, determina a penhora de numerário (via sistema BACEN JUD) existente em duas contas bancárias de titularidade do Escritório Comercial do Estado estrangeiro impetrante, que alegou ser detentor da prerrogativa da imunidade de execução conferida pela Convenção de Viena e por ele não renunciada, encontrando-se, no momento da impetração, na iminência de sofrer prejuízos dificilmente reparáveis, originados do imediato pagamento de elevada dívida trabalhista, mesmo que se admitisse haver previsão de recurso (lato sensu) próprio para impugnação do ato coator. Recurso ordinário provido, para afastar o não-cabimento da mandamus e, desde já, passar ao exame do seu mérito (art. 515, § 3º, do CPC).
PENHORA ON LINE EM CONTA CORRENTE DE ESCRITÓRIO COMERCIAL DE ENTE DE DIREITO PÚBLICO EXTERNO. IMPOSSIBILIDADE QUANDO NÃO COMPROVADA A DESAFETAÇÃO DO BEM. IMUNIDADE DE EXECUÇÃO.
No direito comparado é ilegal a determinação de penhora de conta corrente de Estado estrangeiro, salvo quando cabalmente demonstrada sua utilização para fins estritamente mercantis, porque neste caso o dinheiro ali movimentado estaria desvinculado dos fins da Missão diplomática. Nos termos da jurisprudência do E. STF e da mais abalizada doutrina, fere direito líquido e certo do Estado estrangeiro a incidência de medidas expropriatórias contra bens afetos à sua representação diplomática ou consular, mesmo diante do reconhecido caráter restritivo da imunidade de execução, na medida em que este privilégio tem lugar no que tange aos bens vinculados ao corpo diplomático (art. 22, item 3, da Convenção de Viena de 1961). No caso concreto, o próprio Juízo Coator atestou, a partir de documentos do processo original, que o Escritório Comercial da Embaixada da Malásia não pode realizar operações de comércio, destinando-se à promoção do intercâmbio comercial entre o Brasil e a Malásia. Some-se a isso o fato de o exeqüente não ter logrado provar a necessária desafetação das contas bloqueadas, como se faria mister, nos termos do direito internacional público comparado. Logo, há de se conceder em parte a segurança impetrada, para declarar a imunidade à execução das contas bancárias da impetrante que foram alvo de penhora, mantendo, assim, a antecipação de tutela quanto ao desbloqueio das contas e liberação da quantia à impetrante, porém autorizando o prosseguimento da execução quanto aos bens que forem comprovadamente desafetos à Missão diplomática (TST-ROMS-282/2003-000-10-00.1, Rel. Ministro Renato de Lacerda Paiva, DJ 26/08/05).
Afigura-se correto o entendimento exposto no acórdão recorrido no sentido de não se dar interpretação meramente literal à norma da Convenção de Viena anteriormente citada, porque a imunidade deve alcançar todo e qualquer bem cuja destinação à manutenção da missão diplomática ou consular, ainda que não estejam situados dentro do local da missão.
Qualquer ação executiva forçada em sentido contrário fere direito líquido e certo do Estado estrangeiro.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso ordinário.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário e conceder ao recorrente os benefícios da justiça gratuita.
Brasília, 15 de dezembro de 2009.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
EMMANOEL PEREIRA
Ministro Relator
NIA: 5033221
JURID - Mandado de segurança. Execução. Penhora sobre dinheiro. [09/02/10] - Jurisprudência

Nenhum comentário:
Postar um comentário