Tribunal do Júri. Pronúncia.
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro - TJRJ.
OITAVA CÂMARA CRIMINAL
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO Nº 2009.051.00546
RECORRENTE: EVERALDO BENEVENUTO LINO
RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO
ORIGEM: JUÍZO DA 4ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE SÃO GONÇALO - TRIBUNAL DO JURI
RELATOR: DES. MARCUS QUARESMA FERRAZ
Tribunal do Júri. Pronúncia. Artigo 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal. Recurso em sentido estrito defensivo argüindo tão somente as seguintes preliminares: a) nulidade da intimação editalícia, sob fundamento de que as alterações do Código de Processo Penal pela Lei nº 11.689/08 referentes aos artigos 413 e 414 não se aplicam ao presente processo, eis que a pronúncia foi prolatada antes da entrada em vigor da lei alteradora, ou, ainda, ante a ausência no edital da narrativa dos fatos e a data de sua ocorrência; b) fixação do prazo prescricional, diante da aplicação do artigo 366 do Código de Processo Penal.
O recurso não objetiva a reforma da pronúncia e as questões trazidas ao debate não estão arroladas no artigo 581 do Código de Processo Penal, e, assim, por incabível, não deve ser conhecido.
Entretanto, por envolver o mérito a temática da ampla defesa e do contraditório, o conheço como habeas corpus.
O recorrente foi denunciado por homicídio duplamente qualificado, por fato ocorrido em 28 de janeiro de 1996, sendo citado por edital, e, não tendo comparecido ao interrogatório e nem constituído advogado, teve a revelia decretada, com o prosseguimento do curso processual, diante da não aplicação do artigo 366 do Código de Processo Penal, com a nova redação dada pela Lei nº 9.271/96, pois sua vigência ocorreu posteriormente ao crime.
Em 30 de julho de 2008 foi pronunciado nos termos da denúncia, quando ainda vigorava a antiga redação dos artigos 413 e 414 do Código de Processo Penal, que, respectivamente, dispunham: "O processo não prosseguirá até que o réu seja intimado da sentença de pronúncia" e "A intimação da sentença de pronúncia, se o crime for inafiançável, será sempre feita ao réu pessoalmente".
O parágrafo único, do artigo 420, do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei nº 11.689/08, reza que "Será intimado por edital o acusado solto que não for encontrado", ao passo que este novel diploma legal, dando nova redação ao artigo 457 também daquele estatuto processual, passou a permitir o julgamento pelo Tribunal do Júri sem a presença do acusado.
Conforme se constata, o artigo 420 determina importantes consequências no âmbito do direito penal, destacando-se que eventual decisão condenatória do réu revel importará em interrupção do prazo prescricional, e, por conseguinte, não pode ser aplicado retroativamente, atingindo decisão de pronúncia proferida antes da vigência da Lei nº 11.689/08.
A discussão a respeito da contagem do prazo prescricional decorrente da aplicação do artigo 366 do Código de Processo Penal não pode ser conhecida, sob pena de ilegal supressão de instância, pois a matéria sequer foi posta em discussão perante o juízo a quo.
A alegada nulidade do edital de intimação por não constar o resumo e a data dos fatos restou prejudicada.
Recurso em Sentido Estrito não conhecido, porém, de ofício, concede-se ordem de habeas corpus para anular o processo a partir da intimação editalícia da pronúncia, devendo o trâmite processual respeitar os ditames dos artigos 413 e 414 do Código de Processo Penal, vigentes à época daquela decisão.
A C Ó R D Ã O
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso em Sentido Estrito nº 2009.051.00546, em que é recorrente Everaldo Benevenuto Lino e recorrido o Ministério Público, em sessão realizada nesta data, ACORDAM os Desembargadores que integram a Oitava Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade não conhecer do recurso, por incabível, porém, de ofício, conceder ordem de habeas corpus para anular a intimação editalícia da pronúncia, conforme voto do relator, que passa a integrar o presente.
Rio de Janeiro, de dezembro de 2009.
DES. MARCUS QUARESMA FERRAZ
RELATOR
V O T O
Everaldo Benevenuto Lino foi pronunciado pelo Juízo da 4ª Vara Criminal da Comarca de São Gonçalo, em decisão proferida pelo Juiz Daniel da Silva Fonseca, como incurso no artigo 121, § 2º, incisos I e IV, do Código Penal (fls. 265/272).
A defesa técnica recorreu, conforme petição de fl. 281, arguindo, nas razões de fls. 284/292, tão somente as seguintes preliminares:
a) nulidade da citação editalícia, sob fundamento de que a alteração do Código de Processo Penal pela Lei nº 11.689/08, no que se refere aos artigos 413 e 414 daquele diploma, não se aplicam ao presente processo, eis que a decisão de pronúncia foi prolatada antes da entrada em vigor da lei alteradora, ou, ainda, ante a ausência no edital da narrativa resumida dos fatos e da data da sua ocorrência;
b) aplicação do artigo 366 do Código de Processo Penal, com consequente suspensão do processo, e, caso assim se entenda, a suspensão do prazo prescricional.
O recurso foi contrarrazoado (fls. 295/306), tendo a Promotoria de Justiça requerido o seu acolhimento parcial, tão apenas para anular a intimação por edital da pronúncia, sustentando, porém, argumentos distintos daqueles expostos pela defesa.
A pronúncia foi mantida em sede de reexame obrigatório (fl. 308).
Oficiando perante esta Câmara, o Procurador de Justiça Dennis Aceti B. Ferreira, no parecer de fls. 313/319, opinou pelo não conhecimento do recurso, por incabível, e, de ofício, conceder há habeas corpus para declarar nulo o feito a partir da decisão de intimação da pronúncia por edital.
É o relatório.
O recurso não objetiva a reforma da pronúncia e as questões trazidas ao debate não estão arroladas no artigo 581 do Código de Processo Penal, e, assim, por incabível, não deve ser conhecido.
Entretanto, conforme está com precisão salientado no parecer da Procuradoria de Justiça, por envolver o mérito a temática da ampla defesa e do contraditório, deve ser conhecida a medida como habeas corpus, o que, realmente, o faço.
O recorrente foi denunciado por homicídio duplamente qualificado, por fato ocorrido em 28 de janeiro de 1996, sendo citado por edital, e, não comparecendo ao interrogatório e nem justificado a ausência, teve a revelia decretada, com o prosseguimento do curso processual, pois não foi aplicado artigo 366 do Código de Processo Penal, com a nova redação dada pela Lei nº 9.271/96, pois sua vigência ocorreu posteriormente ao crime.
Encerrada a instrução criminal, o recorrente foi pronunciado nos termos da denúncia, em decisão proferida em 30 de julho de 2008.
Atendendo a requerimento ministerial foi procedida a intimação do recorrente por edital, sendo que em relação a este ato surge o primeiro inconformismo defensivo, sob alegação da impossibilidade de aplicação da Lei nº 11.689/08, que alterou todo o procedimento do Tribunal do Júri, pois seus termos são prejudiciais ao acusado e a data de vigência ocorreu após a pronúncia.
O artigo 2º do Código de Processo Penal dispõe que
"A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior", consagrando o princípio do tempus regit actum, que determina que a lei processual penal nova regula os atos processuais praticados durante sua vigência. A Lei nº 11.689, publicada em 9 de junho de 2008, dispõe em seu artigo 3º que "Esta Lei entra em vigor 60 (sessenta) dias após a data de sua publicação", e, assim, deve ser imediatamente aplicada a partir deste prazo. A decisão de pronúncia, é importante repetir, foi prolatada em 30 de julho de 2008, quando ainda vigorava a antiga redação dos artigos 413 e 414 do Código de Processo Penal que, respectivamente, dispunham: "O processo não prosseguirá até que o réu seja intimado da sentença de pronúncia" e "A intimação da sentença de pronúncia, se o crime for inafiançável, será sempre feita ao réu pessoalmente".
O parágrafo único, do artigo 420, do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei nº 11.689/08, reza que "Será intimado por edital o acusado solto que não for encontrado", ao passo que este novel diploma legal, dando nova redação ao artigo 457 também daquele estatuto processual, passou a permitir o julgamento pelo Tribunal do Júri sem a presença do acusado.
Conforme se constata, o artigo 420 determina importantes consequências no âmbito do direito penal, destacando-se que eventual decisão condenatória do réu revel importará em interrupção do prazo prescricional, e, por conseguinte, não pode ser aplicado retroativamente, atingindo decisão de pronúncia proferida antes da vigência da Lei nº 11.689/08.
A discussão a respeito da contagem do prazo prescricional decorrente da aplicação do artigo 366 do Código de Processo Penal não pode ser conhecida, sob pena de ilegal supressão de instância, pois a matéria sequer foi posta em discussão perante o juízo a quo.
Por outro lado, a alegada nulidade do edital de intimação pela ausência do resumo dos fatos e da data de sua ocorrência restou prejudicada.
Pelo exposto, não conheço do recurso, porém, de ofício, concedo ordem de habeas corpus para anular o processo a partir da intimação editalícia da pronúncia, devendo o trâmite processual respeitar os ditames dos artigos 413 e 414 do Código de Processo Penal, vigentes à época daquela decisão.
Rio de Janeiro, de dezembro de 2009.
DES. MARCUS QUARESMA FERRAZ
RELATOR
JURID - Tribunal do Júri. Pronúncia. [21/01/10] - Jurisprudência
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