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terça-feira, 26 de janeiro de 2010

JURID - Negada indenização por incidente. [26/01/10] - Jurisprudência


Negada indenização por incidente com trajes gaúchos.
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AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO) Nº 2006.72.04.001782-2/SC

AUTOR: LEONARDO OLIVEIRA DOS SANTOS

: NEYMAR DANIEL CORREA ESTEVES

: JOCEMAR DA SILVA SILVEIRA

: MAICON DE SOUZA BORGES

ADVOGADO: VILMAR COSTA

: MAURI NASCIMENTO

RÉU: ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SOMBRIO - SC

RÉU: LUIZ ANTONIO TUON ROSSO

ADVOGADO: LUCIANO OLIVO DE ALMEIDA

SENTENÇA

RELATÓRIO

LEONARDO OLIVEIRA DOS SANTOS, NEYMAR DANIEL CORRÊA ESTEVES, JOCEMAR DA SILVA SILVEIRA e MAICON DE SOUZA BORGES ajuizaram a presente demanda em face de ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SOMBRIO - EAFS e LUIZ ANTÔNIO TUON ROSSO, visando à condenação dos réus ao pagamento de indenização por danos morais.

Relataram que no dia 11/06/2005 compareceram à Colação de Grau e, posteriormente, ao Baile de Formatura da Escola Agrotécnica Federal de Sombrio, ambos realizados no Clube Grêmio Fronteira em Araranguá/SC, em razão de convite recebido por uma amiga que estava se formando naquela instituição. Disseram que compareceram ao local designado para a realização das cerimônias trajados com a pilcha gaúcha e, por isso, foram impedidos, de forma humilhante e constrangedora, de ingressarem no Clube Grêmio Fronteira. Alegaram que não constava no convite recebido a obrigatoriedade de qualquer espécie de traje e requereram, assim, a condenação dos Réus ao pagamento de indenização a título de danos morais.

Valoraram a causa em R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais), juntaram procurações (fls. 12/15), declarações de insuficiência de recursos (fls. 16/19) e documentos (fls. 20/22).

O benefício da assistência judiciária gratuita foi deferido aos Autores (fls. 23)

Citado, o Réu LUIZ ANTÔNIO TUON ROSSO apresentou contestação (fls. 29/36) e juntou documentos (fls. 37/47). Argüiu, preliminarmente, a ilegitimidade passiva ad causam, por figurar como preposto da EAFS e mero intermediador entre a comissão de formatura e a empresa AM Produções Artísticas Ltda., organizadora das solenidades. No mérito, alegou que a organização do baile de formatura é de inteira responsabilidade dos formandos e que, na ocasião em que foi chamado a solucionar o impasse entre os recepcionistas do evento e os Autores, providenciou a participação dos membros da comissão de formatura a fim de que estes decidissem acerca do ingresso daqueles ao baile. Argumentou não ter ocorrido dano moral, mas mero aborrecimento, ressaltando que os Autores acabaram por participar da festa.

A Ré EAFS, igualmente, apresentou contestação (fls. 49/63) e juntou documentos (fls. 64/73). Em preliminar, aduziu a carência da ação em razão de sua ilegitimidade passiva. No mérito, alegou a ausência de nexo causal; a ocorrência de mero incidente, não suscetível de configurar dano moral; e a ausência de prova do dano moral.

Os Autores manifestaram-se acerca das contestações apresentadas (fls. 77/90).

Após as partes apresentarem de rol de testemunhas, estas foram inquiridas em audiências realizadas neste juízo (fls. 118/144) e em juízo deprecado (fls. 162/166v).

As alegações finais foram apresentadas pelos Autores (fls. 215/236), e pelos Réus (fls. 238/240 e fls. 242/245).

Vieram-me os autos conclusos.

FUNDAMENTAÇÃO

Inicialmente aprecio as alegações de ilegitimidade passiva formuladas pelos réus.

Pela documentação constante nos autos a ESCOLA participava dos atos preparativos da cerimônia de colação de grau e do evento comemorativo que se seguia, o baile.

Os contratos de prestação de serviço para com a empresa de serviços de organização de formatura foram firmados pelas comissões de formatura cujo presidente era um servidor da ESCOLA nomeado pelo seu diretor-geral.

Os autores, ao alegarem terem sofrido condutas lesivas por parte de agentes contratados em evento, cuja organização contou com representantes nomeados pela ESCOLA, demonstra e firma a legitimidade passiva da entidade pública.

Diversa, entretanto, é a situação do réu LUIZ ANTONIO TUON ROSSO, uma vez que atuava como presidente da Comissão de Formatura, a partir de nomeação do Diretor Geral da Escola Agrotécnica Federal de Sombrio, pela Ordem de Serviço 102, de 05 de novembro de 2004.

Nessa condição não poderia ser acionado diretamente pelos supostos lesados.

É certo que no Supremo Tribunal Federal existem precedentes no sentido da possibilidade de o terceiro lesado acionar, diretamente, o servidor pelos danos sofridos (RE 105.157-5, Min. Octavio Gallotti. DJU 18.10.1985), todavia, em manifestações mais recentes aquele entendimento veio a ser modificado, de modo a afastar a possibilidade de acionamento direto o servidor.

Com esse norte, acolho como razão de decidir o voto do Ministro Carlos Ayres Britto proferido no Recurso Extraordinário n.º 327.904-1, apreciado pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal:

De saída, leio o § 6º do art. 37 da Magna Carta:

§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. (sem destaques no original)

À luz do dispositivo transcrito, a conclusão a que chego é única: somente as pessoas jurídicas de direito público, ou as pessoas jurídicas de direito privado que prestem serviços públicos, é que poderão responder, objetivamente, pela reparação de danos a terceiros. Isto por ato ou omissão dos respectivos agentes, agindo estes na qualidade de agentes públicos, e não como pessoas comuns.

Quanto à questão da ação regressiva, uma coisa é assegurar ao ente público (ou quem lhe faça as vezes) o direito de se ressarcir perante o servidor praticante de ato lesivo a outrem, nos casos de dolo ou de culpa; coisa bem diferente é querer imputar à pessoa física do próprio agente estatal, de forma direta e imediata, a responsabilidade civil pelo suposto dano a terceiros.

Com efeito, se o eventual prejuízo ocorreu por força de um atuar tipicamente administrativo, como no caso do presente, não vejo como extrair do § 6º do art. 37 da Lei das Leis a responsabilidade "per saltun" da pessoa natural do agente. Tal responsabilidade, se cabível, dar-se-á apenas em caráter de ressarcimento ao erário (ação regressiva, portanto), depois de provada a culpa ou o dolo do servidor público, ou de quem lhe faça as vezes. Vale dizer: ação regressiva é ação de volta ou de retorno contra aquele agente que praticou ato juridicamente imputável ao estado, mas causador de dano a terceiro. Logo, trata-se de ação de ressarcimento, a pressupor, lógico, a recuperação de um desembolso. Donde a clara ilação de que não pode fazer uso de uma ação de regresso aquele que não fez a "viagem financeira de ida"; ou seja, em prol de quem não pagou a ninguém, mas, ao contrario, quer receber de alguém pela vez primeira.

Vê-se, então, que o § 6º do art. 37 da Constituição Federal consagra uma dupla garantia: uma, em favor do particular, possibilitando-lhe ação indenizatória contra a pessoa jurídica de direito público, ou de direito privado que preste serviço público, dado que bem maior, praticamente certa, a possibilidade de pagamento do dano objetivamente sofrido. Outra garantia, no entanto, em prol do servidor estatal, que somente responde administrativa e civilmente, perante a pessoa jurídica a cujo quadro funcional se vincular.

Nesse rumo de idéias, acolho o magistério de José Afonso da Silva, in Comentário à Constituição, Editora Malheiros - 2005, página 349, "in verbis":

"(...) A obrigação de indenizar é da pessoa jurídica a que pertencer o agente. O prejudicado há que mover a ação de indenização contra a Fazenda Pública respectiva ou contra a pessoa jurídica privada prestadora de serviço público, não contra o agente causador do dano. O principio da impessoalidade vale aqui também."

[...].

(STF. Recurso Extraordinário n.º 327.904-1. Rel. Carlos Britto, julgado em 15/08/2006).

No mesmo sentido o AI-AgR n.167.659/PR (DJU de 14.11.1996), relatado pelo Ministro Carlos Velloso da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal.

Desta forma, o feito deve ser extinto sem julgamento de mérito, ante a ilegitimidade passiva da pessoa física do servidor que atuava como presidente da Comissão de Formatura, a partir de nomeação do Diretor Geral da Escola Agrotécnica Federal de Sombrio.

Da responsabilidade civil.

Resta incontroverso nos autos que: a) os autores foram retidos na entrada do local onde se realizava o Baile de Formatura da ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SOMBRIO; b) que foram retidos em razão dos trajes usados na ocasião; c) que trajavam pilcha gaúcha; d) que apesar da inicial resistência enfrentada os autores foram autorizados a entrar no local.

Infere-se da análise dos autos que em 11/07/2005 foram realizadas as solenidades (colação de grau e baile) de formatura da ESCOLA AGROTÉCNICA FEDERAL DE SOMBRIO (fl. 21).

A colação de grau, de responsabilidade da própria Escola, foi realizada, às 18 horas, com livre acesso a todos que quisessem dela participar (depoimentos de fl. 125v. e fl. 131v.). O baile, realizado às 23 horas, por ser tradicionalmente organizado pela turma de formandos, possuiu regramento diverso.

Como sabido, as formaturas - sejam de colégio, curso técnico, ou graduação em nível superior - costumam ter, além da colação de grau, evento formal organizado pela instituição de ensino, também um evento festivo, o qual, por não possuir requisitos formais, costuma ser livremente organizado e financiado pelos próprios formandos. Para esta organização costumeiramente são contratadas empresas especializadas. Tais empresas devem, então, atender às exigências estipuladas pelos contratantes, normalmente representados por uma Comissão de Formatura.

In casu, verifica-se que a Comissão de Formatura era majoritariamente composta por funcionários da ESCOLA AGROTÉCNICA, tendo como presidente o servidor LUIZ ANTÔNIO TUON ROSSO. Referida composição, não excluiu, no entanto, a participação dos alunos (depoimentos de fl. 128v., fl. 130v., fl. 134 e fl. 163 e fl. 166).

Vê-se, assim, que os atos preparatórios do baile de formatura foram decididos de comum acordo entre funcionários da Escola, alunos e empresa organizadora - AM Produções Artísticas Ltda., os quais estavam livres a decidir sobre os detalhes do evento.

Prosseguindo no julgamento da demanda, questão essencial à pretensão de reconhecimento de direito à indenização é a demonstração da ocorrência de dano.

Segundo restou demonstrado nos autos, após inicial impasse, motivado pela dúvida dos porteiros responsáveis pela cobrança dos convites na entrada no estabelecimento, acerca da existência de proibição da admissão de convidados com trajes diversos do conjunto paletó, gravata, camisa e calça social, os autores foram autorizados a entrar no ambiente. Segundo, ainda, depoimentos colhidos os Autores, após o ocorrido, participaram do evento intensamente e aparentando divertimento.

Colhe-se do depoimento da testemunha Carlos Antônio Krause:

"... então a gente procurou o chefe da comissão de formatura, que é o seu Luiz Rosso, e em seguida isso aí foi resolvido, né, o pessoal que tava pleiteando a entrada ingressou no baile." (fl. 125)

"Juiz: O senhor tem como informar qual que foi o período, né, que essas, esses convidados ficaram esperando, para entrar no recinto?

Depoente: Vou falar o meu cálculo, eu imagino assim, pelo tempo que eu presenciei essa situação, alguma coisa entre vinte minutos, vinte e cinco minutos. Mas ali, isso foi assim, depois do ingresso do baile, né, com o baile andando, nesse período, o baile já tinha talvez uma meia hora, uma hora de funcionamento com a banda tocando, e aí." (fl. 127v.)

"Advogado: Excelência, com relação ao comportamento do réu Luiz Rosso, se o depoente sabe se poderia afirmar se houve algum comportamento agressivo, de palavra, proferidas palavras de baixo calão, nesse momento do ingresso do pessoal?

Depoente: Não, não presenciei nada não. Nada nesse sentido.

Advogado: Excelência, se não presenciou ou se não fez?

Juiz: O senhor viu o senhor Rosso proferir algum tipo de palavras?

Depoente: Não vi, não vi o Rosso proferir nenhuma expressão de baixo calão, não é do feitio dele até onde eu conheço." ( fl. 127v.)

Do depoimento da testemunha Luiz Antônio Biulchi:

Advogado: Excelência, quanto tempo os autores permaneceram pra poder entrar no baile, aproximadamente?

Depoente: É difícil de dizer né.

Advogado: Aproximado, não precisa ser um horário exato. Mais de uma hora, menos de uma hora?

Depoente: Não, não, menos de uma hora." (fl. 132)

E do depoimento da testemunha Ismael Bosa Duarte:

[...] pra acabar com aquele tumulto, a gente decidiu deixar eles entrar, daí depois que eles entraram daí foi liberado tudo, calça "jeans", até o momento ninguém entrava, só com traje social, aí depois foi liberado calça "jeans", chinelo, quem quisesse entrar, já que eles ganharam o direito de entrar os outros também tinham que ganhar. (fl. 135)

[...] eu só sei que eu vi eles ali na frente ali, e depois eu vi eles lá dentro do salão. Pilchados, com a roupa que eles tavam lá fora. (fl. 136v.)

Extrai-se do depoimento da testemunha Antônio João Pereira:

[...] daí foi pedido, daí foi chamado, chamaram alguém da escola também pra intervir né, e eles chamaram a comissão, a comissão se reuniu uma parte, que uma parte acho que não tinha chego ainda, daí tinha uma moça que eles eram convidado dela né, eles tavam acho que nuns dez, doze, todos queriam entrar, tinha quatro ou cinco que tinham indispensável, já outros não tinham, o indispensável pra entrar e, o ingresso não era comprado e tinha que ter o indispensável, né. Então daí essa moça chamou, chamou alguém da comissão, mais alguém, se reuniram aí, questão de quinze, vinte minutos, e aí acharam por bom liberar, porque eles eram de longe né, até quebrando a regra, daí tinha o pessoal que estava de tênis, de "jeans", aproveitaram o gancho e daí entraram junto, porque se libera pra um tinha que liberar pra todos, né. Mas entraram. (fls. 137v. e 138)

Advogado: Excelência, se em algum momento o depoente presenciou ou que o réu Luiz teria dito que aquelas roupas iriam ridicularizar o baile?

Depoente: Não, isso aí não foi tocado, eles disseram que aquilo ali era uma roupa, que era um traje social pro Rio Grande do Sul e daí eu ainda vi com o segurança "não, mas aqui é Santa Catarina, a semana que vem vai ter um 'debutante' aqui e é baile de gala, se vocês vier com esse traje vocês não entram, porque aqui não é permitido, pode ser lá, mas em Santa Catarina, pelo que a gente conhece" - eu vi um segurança comentando com eles - "pelo que a gente conhece e trabalha, tem que tá de 'smoking', se não tiver de 'smoking' não entra, aqui não é considerado em Santa Catarina".

Advogado: Excelência, se o depoente sabe afirmar se após a entrada dos, ao baile, dos autores, se os autores dançaram, se divertiram, aproveitaram o baile até o fim?

Depoente: Ah, se divertiram bastante, lá no palco pediram pra tocar vaneirão, música gaúcha, pediram diversas vezes e a banda [...] (fls. 139 e 139v).

E, ainda, do depoimento da testemunha Adalberto Rainke:

[...] eu não conversei diretamente com eles, mas eles participaram da festa e estiveram presentes na festa e partir do momento de que a gente tá na festa, não houve mais outros incidentes e acho que eles participaram com alegria da festa sim. (fls. 142v.)

Frente ao ocorrido, não vislumbro a ocorrência de danos morais, mas mero aborrecimento por parte dos Autores, que, ressalte-se, acabaram por ingressar no local com as roupas que trajavam. Infere-se dos depoimentos, ainda, que eles participaram efetivamente da festa, aparentando divertimento.

Não restou comprovada a agressão verbal. Não houve, outrossim, nenhuma ação por parte dos Réus que ensejassem ofensa a moral dos Autores.

É pacífico na doutrina e na jurisprudência que são indenizáveis apenas as situações que provoquem forte sentimento de humilhação, vexame, sofrimento, ou seja, grande desconforto emocional. Os meros aborrecimentos, aqueles que ficam limitados à indignação da pessoa, ao revés, não são passíveis de indenização.

Desta feita, pela ausência de um dos requisitos indispensáveis da responsabilidade civil - dano -, resta frustrada a pretensão indenizatória dos Autores formulada na presente demanda.

Prejudicada a apreciação dos demais argumentos.

DISPOSITIVO

Ante ao exposto, ACOLHO a preliminar de ilegitimidade passiva do réu LUIZ ANTONIO TUON ROSSO, extinguindo o feito em relação a ele com base no art. 267, VI, do Código de Processo Civil e, no mérito, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, nos termos do art. 269, I, do Código de Processo Civil.

CONDENO cada um dos Autores ao pagamento de honorários advocatícios no montante de R$ 1.000,00 (mil reais), nos termos do art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil. O montante deve ser dividido em partes iguais entre os réus. Anoto que os autores são beneficiários da Assistência Judiciária Gratuita.

Os Autores são isentos de custas (art. 4, II, da Lei nº. 9.289/96).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Criciúma/SC, 21 de janeiro de 2010.

GERMANO ALBERTON JUNIOR
Juiz Federal Substituto



JURID - Negada indenização por incidente. [26/01/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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