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sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

JURID - Apelação cível. Embargos à execução de título judicial. [29/01/10] - Jurisprudência


Apelação cível. Embargos à execução de título judicial.


Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte - TJRN.

Julgamento: 19/01/2010 Órgao Julgador: 2ª Câmara Cível Classe: Apelação Cível

Apelação Cível n° 2009.007046-8

Origem: Vara Única da Comarca de São José de Campestre/RN

Apelante: Município de São José do Campestre

Advogado: Otacílio Cassiano do Nascimento Neto

Apelado: José Henrique Alves

Advogado: Francisco Sandro de França

Relator: Desembargador Cláudio Santos

EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO JUDICIAL. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL, SUSCITADA PELO APELADO. REJEIÇÃO. MÉRITO. HOMOLOGAÇÃO DE ACORDO CELEBRADO POR MUNICÍPIO, EM SEDE DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA, PARA PAGAMENTO DE VERBAS SALARIAIS A SERVIDOR QUE MANTÉM COM O REFERIDO ENTE VÍNCULO DE NATUREZA ESTATUTÁRIA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM ESTADUAL PARA DIRIMIR A QUESTÃO. ALEGAÇÃO DE QUEBRA DA ORDEM CRONOLÓGICA DE PAGAMENTO DOS PRECATÓRIOS. DESCABIMENTO. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. NÃO CONFIGURAÇÃO.

I. Não há que se falar defeito de representação processual, porquanto a ausência de autenticação de documento acostado aos autos por meio de fotocópia não é circunstância que, por si só, o torne inválido, dada a presunção juris tantum de legitimidade que milita em seu favor, somente afastável por meio de elementos probatórios idôneos em contrário, inexistentes in casu. Inaplicabilidade da Súmula nº 115 do STJ.

II. Nos termos proclamados pelo STF, na ADI nº 3.395-6/DF, incumbe à Justiça Comum apreciar causas entre o Poder Público e os seus servidores, quando o vínculo existente entre ambos possui natureza estatutária ou jurídico-administrativa.

III. Verificando-se que, na hipótese, o montante objeto de execução qualifica-se como pequeno valor, nos termos do art. 87, II, do ADCT, perde relevo a alegação de violação à ordem cronológica de pagamento dos precatórios, já que a tal regime não se submete, em face da prescrição contida no § 3º do art. 100 da Constituição Federal. Observância, no caso, das disposições contidas no Regimento Interno deste Tribunal, relativamente ao pagamento dos créditos de pequeno valor (RITJRN, art. 400 e seguintes).

IV. A condenação por litigância de má-fé pressupõe a demonstração do dolo da parte em prejudicar o regular andamento processual, o que não restou demonstrado na espécie.

V. Conhecimento e improvimento do recurso.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima identificadas, acordam os Desembargadores que integram a 2ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em Turma, à unanimidade de votos, em consonância com o parecer da 16ª Procuradoria de Justiça rejeitar a preliminar de ausência de representação processual, suscitada pela Apelada. No mérito, pela mesma votação, novamente em conformidade com o opinamento ministerial, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator, que integra o julgado.

RELATÓRIO

Trata-se de Apelação Cível interposta pelo MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DE CAMPESTRE/RN em face de sentença prolatada pela MM. Juíza de Direito da Vara Única da Comarca sediada no citado município, nos autos dos Embargos à Execução de Título Judicial opostos por si contra JOSÉ HENRIQUE ALVES (proc. nº 153.08.000145-0).

Alegou a Exequente que, na condição de servidor do Município de São José de Campestre, deixou de perceber os salários dos meses de novembro e dezembro de 2004, o que ensejou a propositura de Ação Civil Pública, protocolada sob o nº 153.04.000526-9.

Relatou que, em audiência de conciliação, realizada em 16 de novembro de 2005, foi formalizado um acordo com o mencionado ente público, por meio do qual este assumiu o compromisso de efetuar, nos meses seguintes, o pagamento do débito relativo a novembro/04 e dezembro/04, o que não ocorreu.

Citado, o Município de São José de Campestre opôs Embargos à Execução, defendendo a nulidade do título executivo, sob a alegação de que cabia à Justiça do Trabalho a ratificação da avença, nos termos do art. 114, I e IV, da Constituição Federal.

Apontou precedentes jurisprudenciais reputados pertinentes e, ao final, requereu que, acolhida a argumentação expendida, fosse extinto o feito.

Intimada, a Exequente ofereceu impugnação aos Embargos, afirmando, preliminarmente, terem sido estes opostos extemporaneamente, considerando que a juntada do mandado citatório ocorreu em 06-06-2008 e a protocolização da peça, pela edilidade, em 14-07-2008, decorridos mais de trinta dias.

Rebateu a matéria ventilada pelo Município, salientando que a discussão a respeito da competência do Juízo homologante deveria ter sido suscitada na própria Ação Civil Pública.

Pugnou pelo reconhecimento da intempestividade dos Embargos ou, se assim não se entendesse, pela improcedência destes.

Na sentença que ora se impugna, a MM. Juíza de primeiro grau desacolheu os Embargos à Execução, determinando o prosseguimento desta (fls. 35/37).

Em sua peça recursal (fls. 42/46), o ente público Embargante renovou a alegação de incompetência absoluta do Juízo que homologou o acordo objeto de execução, ante a dicção do art. 114, I e IV, da Carta Magna.

Realçou que, a despeito do que afirmou a parte Embargada, a arguição de tal matéria, ainda que posteriormente à celebração da avença, era cabível, conforme o art. 113 do Código de Processo Civil.

Aduziu, ademais, que a realização do acordo em questão ia de encontro à previsão contida no art. 100 da Constituição Federal, violando a ordem de precedência cronológica no pagamento dos precatórios.

Pediu o conhecimento e provimento do Apelo, com a consequente decretação de nulidade da sentença homologatória da avença.

Em contrarrazões (fls. 52/58), o Embargado levantou, preliminarmente, ausência de representação processual do Apelante, tendo em vista que não havia sido juntado aos autos instrumento de mandato, ou substabelecimento, conferindo poderes ao advogado signatário da peça recursal, devendo ser considerado inexistente o Apelo.

No mérito, refutou os argumentos aventados pelo Recorrente, afirmando ter restado evidenciado o intuito procrastinatório deste.

Requereu o não-conhecimento do recurso e, subsidiariamente, o seu improvimento, condenando-se o Embargante em litigância de má-fé.

A 16ª Procuradoria de Justiça, em parecer opinou pela rejeição da preliminar de representação processual suscitada pela Apelada, e pelo conhecimento e improvimento do recurso (fls. 62/70).

É o relatório.

VOTO (PRELIMINAR)

PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL, SUSCITADA PELO APELADO

De acordo com o que sustentou o Recorrido, teria restado configurada, na hipótese, a ausência de representação processual da parte Apelante, em razão de não haver sido acostado aos autos instrumento de mandato, ou substabelecimento, conferindo poderes ao advogado subscritor da peça recursal, devendo, por conseguinte, ser considerado inexistente o apelo interposto, nos termos da Súmula 115 do Superior Tribunal de Justiça (Na instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos).

Não obstante o Apelado tenha invocado em favor de sua exposição o enunciado sumular supracitado, observa-se, pela própria literalidade deste, que não tem aplicação no caso em apreço. Com efeito, tratando-se de instâncias ordinárias, e dentre estas - vale realçar - se inclui a deste tribunal, a falta de procuração impõe ao juiz (de primeiro ou segundo grau, conforme o caso) a aplicação da regra prevista no art. 13 do Código de Processo Civil (Verificando a incapacidade processual ou a irregularidade da representação das partes, o juiz, suspendendo o processo, marcará prazo razoável para ser sanado o defeito). Tal é o entendimento pacífico da Corte Superior, conforme, aliás, destacou a próprio Apelado (fl. 50). Bem servem para ilustrá-lo os seguintes arestos(1):

"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO INTERPOSTA POR ADVOGADO SEM PROCURAÇÃO NOS AUTOS. VÍCIO DE REPRESENTAÇÃO SANÁVEL. INCIDÊNCIA DO ART. 13 DO CPC. PRECEDENTES. AGRAVO IMPROVIDO.

1. O Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que, ainda que nesta instância especial seja inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos, nas instâncias ordinárias a falta de procuração constitui vício sanável, cabendo ao Relator abrir prazo para que seja sanado o defeito, nos termos do artigo 13 do Código de Processo Civil.

2. Relativamente às apontadas ofensas a dispositivos da Constituição Federal, não há como conhecer do agravo, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça se restringe à uniformização de legislação infraconstitucional (art. 105, III, da CF).

3. O prequestionamento da questão afasta a incidência das súmulas 282 e 356 do STF.

4. Agravo regimental improvido."

(Quarta Turma, AgRg no REsp 901062/RS, Relator(a) Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, votação unânime, DJe 22/06/2009) (grifos e destaques acrescidos)

"DIREITO PROCESSUAL CIVIL. REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. APELAÇÃO NÃO CONHECIDA EM RAZÃO DE TER A ADVOGADA, APÓS A INTERPOSIÇÃO DO RECURSO, INFORMADO QUE NÃO MAIS REPRESENTAVA A APELANTE. NECESSIDADE DE APLICAÇÃO DA REGRA DO ART. 13 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

A procuração ad judicia é outorgada para que o advogado represente o constituinte até o desfecho do processo. Havendo superveniente irregularidade de representação da parte, o juiz deve marcar prazo razoável para ser sanado o defeito, consoante regra do art. 13 do Código de Processo Civil, aplicável às instâncias ordinárias, inclusive aos processos submetidos à jurisdição do Tribunal.

Recurso Especial provido." (Terceira Turma, REsp 1084622/SP, Relator(a) Ministro SIDNEI BENETI, votação unânime, DJe 26/05/2009) (grifos e destaques acrescidos)

Portanto, ainda que restasse verificada, in casu, eventual irregularidade ou ausência de representação processual, tal circunstância não acarretaria, de plano, o não-conhecimento do recurso, como afirmado pelo Recorrido, devendo, antes, ser oportunizado o suprimento do vício, na forma prescrita processualmente.

Analisando-se os autos, contudo, vê-se que foi anexada, à fl. 46, cópia xerográfica da portaria de nomeação do advogado subscritor da peça recursal no cargo de Procurador do Município de São José do Campestre (Portaria nº 0038/2009), documento que, até mesmo por ser considerado público, goza de presunção juris tantum de veracidade e de legitimidade, atributos que, aliás, também qualificam o ato administrativo nele materializado.

O afastamento da presunção mencionada demanda da parte que alega o vício a demonstração, por meio de elementos idôneos, da sua efetiva existência, o que não se verificou na hipótese. Ademais, a mera circunstância de não haver sido efetuada a autenticação do documento (fotocópia) não acarreta a sua invalidade, como, equivocadamente, sugeriu o Apelado (fl. 55, in fine).

Nesse diapasão, o Superior Tribunal de Justiça, por meio de remansosa jurisprudência, tem rechaçado a aplicação da Súmula nº 115 (invocada pela recorrida) em hipóteses análogas, adotando o mesmo entendimento ora esposado, conforme se vê adiante:

"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. PROCURAÇÃO. SUBSTABELECIMENTO. FOTOCÓPIA NÃO AUTENTICADA. PRESUNÇÃO JURIS TANTUM DE AUTENTICIDADE.

1. A autenticação de cópia de procuração e de substabelecimento é desnecessária, porquanto presumem-se verdadeiros os documentos juntados aos autos pelo autor, cabendo à parte contrária arguir-lhe a falsidade. Inaplicabilidade da Súmula n. 115/STJ. Precedente: (EREsp 898510/RS, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, CORTE ESPECIAL, julgado em 19/11/2008, DJ. 05/02/2009; EREsp 881170/RS, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, CORTE ESPECIAL, julgado em 03/12/2008, DJ. 30/03/2009 ).

2. A documentação juntada nos autos mediante fotocópia goza de presunção juris tantum, mesmo que não autenticada, incumbindo à parte contrária impugná-la. Precedentes: (EREsp 179.147/SP, Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 30.10.2000; EREsp 450974 / RS, Min. Cesar Asfor Rocha, DJ 15/09/200; AGA 3563.189-SP, Min. Eliana Calmon, DJU de 16/11/2004).

3. Embargos de divergência desprovidos."(EREsp 1015275/RS, Relator(a) Ministro LUIZ FUX, votação unânime, DJe 06/08/2009) (destaques em negrito e grifos inexistentes no original)

"EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. SUBSTABELECIMENTO. CÓPIA. AUTENTICAÇÃO. VALIDADE.

1. O documento juntado aos autos por cópia não autenticada é válido. Incumbe à parte contrária arguir-lhe a falsidade. Essa orientação, firmada pela Corte Especial, se aplica irrestritamente a procurações e substabelecimentos, o que afasta a aplicação da Súmula 115 ao caso concreto.

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ERRO MATERIAL. OBSCURIDADE. INEXISTÊNCIA. REJEIÇÃO.

1. Os fundamentos do acórdão, ainda que importantes para definir o alcance do julgamento, não fazem coisa julgada (Art. 469, I, CPC), nem vinculam as partes.

2. Não há obscuridade em relação a tema não tratado no julgamento embargado." (EDcl no REsp 633105/MG, Relator(a) Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, votação unânime, DJ 30/11/2007, p. 431) (destaques em negrito e grifos ora acrescidos)

Ante o expendido, rejeito a preliminar.

VOTO (MÉRITO)

Tal como se relatou, está o município Recorrente a se insurgir contra sentença que, em sede de execução de título judicial, desacolheu os Embargos por si opostos, por entender não prosperar a tese de incompetência absoluta veiculada pelo Embargante.

De fato, não são passíveis de acolhimento as alegações formuladas pelo ora Apelante, relativamente à suposta incompetência do juízo que homologou o acordo objeto de execução, ante a dicção do art. 114, I e IV, da Carta Magna(2).

Na verdade, restando evidenciado que o Exequente mantém com o Município de São José de Campestre vínculo jurídico de natureza estatutária, estando a pretender, na condição de servidor público, o adimplemento de verbas salariais relativas aos meses de novembro de dezembro de 2004, na forma pactuada em sede de Ação Civil Pública (vide termo de fl. 08), impõe-se o reconhecimento da competência da Justiça Comum Estadual para dirimir a questão.

Ressalte-se, a propósito, que o Supremo Tribunal Federal, instado a se pronunciar sobre o alcance da norma inscrita no inciso I do art. 114 da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional nº 25/2004, entendeu que se deve compreender de maneira estrita a expressão "relação de trabalho", contida naquela disposição, de maneira tal a não restarem abrangidas as causas entre o Poder Público e os seus servidores estatutários.

À luz de tal exegese, o Plenário daquela Corte referendou a liminar concedida na Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.395-6/DF(3), que havia suspendido "toda e qualquer interpretação dada ao inciso I do art. 114 da CF, na redação dada pela EC 45/2004, que inclua, na competência da Justiça do Trabalho, a '...apreciação... de causas que... sejam instauradas entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo' ".

O ilustre relator da aludida medida cautelar, Ministro Cezar Peluzo, bem salientou que, "ao atribuir à Justiça do Trabalho competência para apreciar 'as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios', o art. 114, I, da Constituição, não incluiu, em seu âmbito material de validade, as relações de natureza jurídico-administrativa dos servidores públicos. (...) Logo, é pertinente a interpretação conforme à Constituição, emprestada pela decisão liminar, diante do caráter polissêmico da norma."

Por oportuno, restou assim ementado o acórdão(4):

"EMENTA: INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Competência. Justiça do Trabalho. Incompetência reconhecida. Causas entre o Poder Público e seus servidores estatutários. Ações que não se reputam oriundas de relação de trabalho. Conceito estrito desta relação. Feitos da competência da Justiça Comum. Interpretação do art. 114, inc. I, da CF, introduzido pela EC 45/2004. Precedentes. Liminar deferida para excluir outra interpretação. O disposto no art. 114, I, da Constituição da República, não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária."

Atendendo à compreensão firmada na ADI 3395 MC/DF, assim decidiu, recentemente, a Excelsa Corte:

"EMENTA: RECLAMAÇÃO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. AUTORIDADE DE DECISÃO PROFERIDA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL: ARTIGO 102, INCISO I, ALÍNEA L, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. MEDIDA CAUTELAR NA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 3.395. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA DE PROFISSIONAIS NA ÁREA DE SAÚDE: ARTIGO 37, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO CONTRA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA COMUM. CAUSA DE PEDIR RELACIONADA A UMA RELAÇÃO JURÍDICO-ADMINISTRATIVA.

1. Incompetência da Justiça Trabalhista para o processamento e o julgamento das causas que envolvam o Poder Público e servidores que sejam vinculados a ele por relação jurídico-administrativa.

2. O eventual desvirtuamento da designação temporária para o exercício de função pública, ou seja, da relação jurídico-administrativa estabelecida entre as partes, não pode ser apreciado pela Justiça do Trabalho.

3. Reclamação julgada procedente." (Tribunal Pleno, Rcl 4464/GO, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, public 21-08-2009)

Na mesma esteira, o Superior Tribunal de Justiça:

"CONFLITO DE COMPETÊNCIA. SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL. REFORMA CONSTITUCIONAL. EMENDA 45/2004. ART. 114, INCISO I, DA CF/88. VÍNCULO ESTATUTÁRIO. CONFLITO CONHECIDO PARA DECLARAR COMPETENTE A JUSTIÇA COMUM.

1. A definição da competência ratione materiae deve ser feita de forma prévia, antes de qualquer outro juízo sobre a demanda, devendo levar em consideração a causa de pedir e o pedido apresentados na petição inicial, e não em face de eventual procedência ou improcedência, da legitimidade das partes, ou de qualquer outro juízo sobre a causa. Precedente.

2. No caso, é de ser reconhecida a competência do Juízo Comum Estadual, na medida em que a Autora postula direitos relativos ao regime estatutário estabelecidos pela Lei Municipal instituidora do vínculo jurídico-administrativo entre a Administração e seus servidores, sendo certo que a Autora foi admitida nos quadros da municipalidade em data anterior à instituição do regime jurídico único.

3. Segundo o entendimento sufragado na Súmula n.º 137/STJ, "Compete à Justiça Comum Estadual processar e julgar ação de servidor público municipal, pleiteando direitos relativos ao vínculo estatutário."

4. O Supremo Tribunal Federal suspendeu toda e qualquer interpretação dada ao inciso I do art. 114 da Constituição Federal, na redação dada pela EC n.º 45/2004, que inclua na competência da Justiça do Trabalho o exame de causas que entre o Poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo.

5. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo de Direito de Umbuzeiro - PB."

(Terceira Seção, CC 100671/PB, Rel. Min. Laurita Vaz, votação unânime, DJe 02/02/2009) (destaques em negrito e grifos ora acrescidos)

"CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA ENTRE A JUSTIÇA ESTADUAL E TRABALHISTA. AÇÃO ORDINÁRIA DE COBRANÇA AJUIZADA POR SINDICATO CONTRA CÂMARA MUNICIPAL. SERVIDORES PÚBLICOS MUNICIPAIS. VÍNCULO DE NATUREZA ESTATUTÁRIA. ADIN N.º 3.395 - DF. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL.

1. A competência da Justiça do Trabalho para processar e julgar as ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores restou fixada pela Constituição Federal, no seu art. 114, III, com redação conferida pela EC n.º 45/04.

2. Deveras, a Suprema Corte, ao julgar a ADln n.º 3.395-DF, excluiu da expressão relação de trabalho as ações decorrentes do regime estatutário. Assim, a competência para julgar as ações relativas a servidor estatutário não celetista e ente público, será da Justiça comum, estadual ou Federal, conforme o caso.

3. In casu, os autos principais versam ação ordinária de cobrança de contribuição sindical, ajuizada por sindicato contra a Câmara Municipal de Cosmorama - SP, cujos servidores ostentam vínculo estatutário com a Administração Pública, pelo que subjaz a competência da Justiça Estadual para o processamento e julgamento do writ of mandamus. (Precedentes: CC 86.876 - SP, Relator Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Primeira Seção, DJ de 10 de setembro de 2.007; CC 77.100 - SC, Relator Ministro CASTRO MEIRA, Primeira Seção, DJ de 06 de agosto de 2.007; CC 76.764 - RS, Relatora Ministra ELIANA CALMON, Primeira Seção, DJ de 16 de abril de 2.007).

4. Conflito conhecido para declarar competente o JUÍZO DE DIREITO DA 1ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE TANABI - SP." (Primeira Seção, CC 69025/SP, Rel. Min. Luiz Fux, votação unânime, DJ 05/11/2007, p. 215)

Restando, pois, afastada a tese de incompetência absoluta alvitrada pelo ente público Embargante, ora Recorrente, impende apreciar o fundamento recursal segundo o qual "o acordo realizado, no qual houve comprometimento do Recorrente de pagar R$ 40.000,00 em duas parcelas (janeiro e fevereiro de 2006), dividindo cada uma delas em parcelas iguais a todos os servidores, violou a ordem de precedência no pagamento dos precatórios." (fl. 45)

Sem embargo da argumentação veiculada pelo Apelante, é impróprio se cogitar, na hipótese, de infringência à norma inscrita no caput do art. 100 da Constituição Federal, que estabelece a sistemática dos precatórios, na execução por quantia certa contra a Fazenda Pública(5).

Com efeito, a mencionada alegação fica afastada a partir do instante em que o § 3º do mesmo artigo(6) exclui os pagamentos de obrigações definidas em lei como de pequeno valor da obrigatoriedade de expedição de precatório.

No caso dos autos, o montante objeto de execução, tal como discriminado na planilha anexada à exordial (fl. 07), equivale a R$ 1.082,70 (mil e oitenta e dois reais e setenta centavos), razão pela qual é considerado, nos termos do art. 87, II, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, pequeno valor, não se submetendo, pois, ao regime de precatórios(7).

Sem embargo da possibilidade de fixação, pelos entes federativos, de valores distintos para o fim previsto no § 3º do art. 100 da Constituição Federal, consoante autorizado pelo § 5º do mesmo artigo(8), não há evidências de que o Embargante tenha se prevalecido de tal faculdade e, ainda que existisse lei municipal definidora do aludido limite, o diminuto montante ora executado provavelmente estaria nele inserido. Caso contrário, seria o diploma, em tese, de legitimidade questionável, por possível afronta aos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade(9).

À vista do que se está a expor, constata-se, portanto, que o fundamento idôneo a rechaçar o argumento ventilado pelo Recorrente, de suposta quebra da ordem cronológica de pagamento dos precatórios, não é o de que o crédito em questão tem natureza alimentícia, estando inserido na exceção prevista no caput do art. 100 da Carta Magna, mas sim o de que a quantia postulada pelo Exequente qualifica-se como pequeno valor, subsumindo-se, por conseguinte, ao comando excludente contido no § 3º do referido artigo.

Nesse diapasão, já proclamou o Supremo Tribunal Federal:

"EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE LIMINAR. BLOQUEIO DE RECURSOS FINANCEIROS MUNICIPAIS. IMEDIATA TRANSFERÊNCIA PARA A CONTA CORRENTE DA AUTORA DA AÇÃO DE COBRANÇA DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. OCORRÊNCIA DE GRAVE LESÃO À ORDEM E À ECONOMIA PÚBLICAS. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 100 E 160 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E AO ART. 2º-B DA LEI 9.494/97. NATUREZA ALIMENTAR DA VERBA HONORÁRIA. SUBMISSÃO AO REGIME CONSTITUCIONAL DOS PRECATÓRIOS.

1. Lei 8.437/92, art. 4º, § 1º: configuração de grave lesão à ordem e à economia públicas. Pedido de suspensão de liminar deferido.

2. A tutela jurisdicional pretendida pela agravante, consubstanciada no recebimento dos honorários devidos pelos serviços advocatícios por ela prestados ao Município agravado, só pode ser efetivada após o trânsito em julgado da ação ordinária de cobrança ajuizada na origem.

3. O sequestro de recursos municipais, para prover à satisfação de futura e determinada cobrança, reveste-se de conseqüências extremamente prejudiciais à regular execução dos serviços básicos locais.

4. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, ao interpretar o disposto no caput do art. 100 da Constituição da República, firmou-se no sentido de submeter, mesmo as prestações de caráter alimentar, ao regime constitucional dos precatórios, ainda que reconhecendo a possibilidade jurídica de se estabelecerem duas ordens distintas de precatórios, com preferência absoluta dos créditos de natureza alimentícia (ordem especial) sobre aqueles de caráter meramente comum (ordem geral). Precedentes.

5. Agravo regimental improvido. (Tribunal Pleno, SL 158 AgR/CE - CEARÁ, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, votação unânime, DJ 09-11-2007)(10) (destaques em negrito ora acrescidos)

No tocante aos créditos de pequeno valor (hipótese dos autos), por sua vez, já decidiu:

"EMENTA: CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. SEQUESTRO DE VERBAS PÚBLICAS. CRÉDITO DE PEQUENO VALOR. OFENSA REFLEXA AO TEXTO CONSTITUCIONAL. ANÁLISE DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 279. AGRAVO IMPROVIDO.

I - A jurisprudência do STF orienta-se no sentido de que a previsão do art. 100, § 3º, da Constituição Federal refere-se à não necessidade de expedição de precatórios quando da ocorrência de créditos alimentícios de pequeno valor. Irrelevante a discussão acerca da ocorrência, ou não, de quebra da ordem cronológica.

II - A hipótese dos autos versa sobre crédito de pequeno valor, enquanto a ADI 1.662/SP cuida especificamente de expedição de precatórios e ofícios requisitórios decorrentes de créditos de natureza alimentícia.

III - Necessário o reexame do conjunto fático-probatório constante dos autos. Incidência da Súmula 279 do STF.

IV - O acórdão recorrido fundamentou o seqüestro de verbas públicas com base no disposto na legislação processual civil, a cujo exame não se presta o recurso extraordinário.

V - Agravo regimental improvido." (Primeira Turma, AI 560844 AgR/RS, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, votação unânime, public 23-05-2008) (destaques em negrito e grifos ora acrescidos)

De qualquer sorte, convém ser ponderado que, em nenhum momento dos autos, restou determinado eventual pagamento imediato da importância exeqüenda: do contrário, determinou-se na sentença recorrida que fosse dado "o devido prosseguimento à execução de sentença" (fl. 37). Importante se faz a ressalva porque, embora o pagamento dos créditos de pequeno valor não siga a ordem cronológica dos precatórios, porquanto figura em lista própria, a sua efetivação há de obedecer rigorosamente o rito estabelecido no art. 400 e seguintes do Regimento Interno deste Tribunal Estadual - RITJRN, que prevê como marco temporal da ordem sequencial de pagamento a data de autuação do requisitório (art. 403, parágrafo único).

Além dos fundamentos supra explicitados, por si só suficientes a afastar a alegada violação ao caput do art. 100 da Constituição Federal, entende-se que até mesmo o princípio de direito segundo o qual a ninguém é dado valer-se da própria torpeza ("nemo auditur propriam turpitudinem allegans") vem em favor do não acolhimento do argumento veiculado pelo município apelante (quebra da ordem cronológica de pagamento dos precatórios), na medida em que este celebrou formalmente, em Juízo, o acordo relativo ao débito salarial dos servidores a si vinculados (correspondente aos meses de novembro e dezembro de 2004), reconhecendo, pois, perante a autoridade judicial competente, o efetivo inadimplemento de tais valores e, agora, de modo contraditório, está a suscitar a nulidade de tal avença, comportamento que não merece ser tutelado juridicamente.

Destarte, diante de tudo o que se demonstrou, conclui-se não merecer amparo o pleito recursal formulado, dada a insubsistência dos argumentos veiculados pelo ente público Embargante.

Por fim, no que diz respeito ao pedido formulado pelo Apelado, de aplicação de multa ao Recorrente por litigância de ma-fé (CPC, art. 18), em virtude do uso de incidentes supostamente procrastinatórios, entende-se não merecer acolhida, na medida em que, embora tenha restado evidenciada a impertinência dos argumentos invocados pelo Apelante, tal circunstância, de per si, não autoriza a imposição da referida sanção processual, sendo necessária para tanto a inequívoca demonstração do dolo da parte em prejudicar o regular andamento processual(11), o que não se verificou in casu.

Diante do exposto, conheço da Apelação Cível e nego-lhe provimento.

Defiro o pedido de assistência judiciária gratuita formulado pelo Apelado.

É como voto.

Natal, 19 de janeiro de 2010.

Desembargador OSVALDO CRUZ
Presidente

Desembargador CLÁUDIO SANTOS
Relator

Doutora MYRIAN COELI GONDIM D'OLIVEIRA SOLINO
20ª Procuradora de Justiça



Notas:

1 - Os destaques em negrito e grifos não constam do original. [Voltar]

2 - Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I - as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

(...)

IV - os mandados de segurança, habeas corpus e habeas data , quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição; [Voltar]

3 - Requerentes: Associação dos Juízes Federais do Brasil - AJUFE e Associação Nacional dos Magistrados Estaduais - ANAMAGES [Voltar]

4 - DJ 10-11-2006 [Voltar]

5 - Art. 100. À exceção dos créditos de natureza alimentícia, os pagamentos devidos pela Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim. [Voltar]

6 - § 3º O disposto no caput deste artigo, relativamente à expedição de precatórios, não se aplica aos pagamentos de obrigações definidas em lei como de pequeno valor que a Fazenda Federal, Estadual, Distrital ou Municipal deva fazer em virtude de sentença judicial transitada em julgado. (Redação dada pela EC nº 30/2000). [Voltar]

7 - Art. 87. Para efeito do que dispõem o § 3º do art. 100 da Constituição Federal e o art. 78 deste Ato das Disposições Constitucionais Transitórias serão considerados de pequeno valor, até que se dê a publicação oficial das respectivas leis definidoras pelos entes da Federação, observado o disposto no § 4º do art. 100 da Constituição Federal, os débitos ou obrigações consignados em precatório judiciário, que tenham valor igual ou inferior a: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 37, de 2002)I - quarenta salários-mínimos, perante a Fazenda dos Estados e do Distrito Federal; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 37, de 2002)II - trinta salários-mínimos, perante a Fazenda dos Municípios.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 37, de 2002) [Voltar]

8 - § 5º A lei poderá fixar valores distintos para o fim previsto no § 3º deste artigo, segundo as diferentes capacidades das entidades de direito público. (Parágrafo incluído pela Emenda Constitucional nº 30, de 2000 e Renumerado pela Emenda Constitucional nº 37, de 2002) [Voltar]

9 - Vide, a propósito, as discussões levadas a efeito, dentre outras, na ADI 2868-PI, Rel. Min. Carlos Brito. [Voltar]

10 - No mesmo sentido: STA 90 AgR / PI - PIAUÍ. [Voltar]

11 - Nesse diapasão: "PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. AUTÔNOMOS, ADMINISTRADORES E AVULSOS. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. PRESCRIÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. NULIDADE. MULTA DO ART. 538 DO C.P.C. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. EXCLUSÃO.

1. (...)

3. De outro lado, em relação à multa por litigância de má-fé, cabe ressaltar que o art. 17 do Código de Processo Civil, ao definir os contornos dos atos da parte que justificam a aplicação da multa, pressupõe o dolo da parte no entravamento do trâmite processual, manifestado por conduta intencionalmente maliciosa e temerária. Desse modo, não deve ser aplicada a multa processual se ausente a comprovação nos autos do inequívoco abuso e da conduta maliciosa da parte, em prejuízo do normal trâmite do processo.

4. Recurso especial provido, para declarar a nulidade do acórdão proferido em embargos de declaração, determinando o retorno dos autos à Corte de origem, bem como para afastar as multas aplicadas." (REsp 699393/SP, Primeira Turma, Relª. Minª. Denise Arruda, votação unânime, DJ 09.05.2005, p. 312.) (destaques ora acrescidos) [Voltar]




JURID - Apelação cível. Embargos à execução de título judicial. [29/01/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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