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segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

JURID - Cliente será indenizado. [18/01/10] - Jurisprudência


BRB é condenado por cortar cheque especial de cliente sem aviso prévio.


Circunscrição: 1 - BRASÍLIA

Processo: 2004.01.1.124567-2

Vara: 114 - QUARTA VARA DA FAZENDA PUBLICA DO DISTRITO FEDERAL

SENTENÇA

Vistos etc.

Trata-se de ação de Indenização por danos morais c/c Obrigação de fazer com pedido de tutela antecipada proposta por JOSÉ HERMOGENES DE ARAUJO FILHO em desfavor do Banco de Brasília S/A, visando ser a instituição financeira condenada ao pagamento de R$ 10.400,00 (dez mil e quatrocentos reais) acrescidos de juros, correções, custas, honorários e demais despesas processuais. Juntou documentos (fls. 11 a 16).

Indeferindo a antecipação dos efeitos da tutela, o despacho das folhas 18 a 23 concedeu a gratuidade de justiça ao autor.

A contestação das folhas 32 usque 103 traz requerimento de acolhimento das preliminares de inépcia da inicial e carência da ação. No mérito requer a improcedência dos pedidos, bem assim, a condenação do exequente em razão da litigância de má fé. Juntou documentos (fls.104 a 156).

Em réplica, o autor reporta-se aos termos da inicial, citando o Código de Defesa do Consumidor em especial a inversão do ônus da prova (fls. 160 a 165), e como provas, apenas o depoimento das partes (fl. 167). O Banco não se manifestou. (fl.169).

A decisão interlocutória da folha 170 indeferiu o pedido do exequente acerca de depoimento pessoal das partes, com base no artigo 130 do CPC.

Com esse breve relatório, passo a decidir.

Trata-se de ação de indenização por danos morais proposta por JOSÉ HERMÓGENES DE ARAÚJO FILHO em face de BRB - BANCO REGIONAL DE BRASÍLIA S.A. alegando, em síntese, que tinha conta-salário no banco réu, com limite de cheque especial de R$ 2.000,00 e que, em outubro de 2004, foi surpreendido com a exclusão do tal limite, provocando uma dívida por cheques devolvidos, assim como forte abalo moral. Por conta do ocorrido, restou com uma indevida negativação junto ao SPC. Pugna, ao final, por uma indenização de R$ 10.400,00.

DA ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA INICIAL - Alega o Banco réu que a inicial é inepta vez que desvestida de articulação lógica.

Porém, data maxima venia, é perfeitamente possível inferir das razões iniciais qual a causa de pedir e o pedido, sendo ele admitindo em nosso ordenamento jurídico. O contestante pode até não concordar com os fatos narrados e o pedido inicialmente formulado, mas, de toda sorte, o compreendeu. Tanto que desenvolveu uma peça de contestação exageradamente volumosa e incompatível com a celeridade que se busca em um processo.

Só se pode falar em inépcia quando os requisitos da petição inicial, enumerados no art. 282 do CPC, não são cumulativamente preenchidos. E não é esse o caso dos autos.

Assim, tenho que, à argüição de inépcia da inicial não deve prosperar porque na exordial não está ausente pedido ou causa de pedir, há conclusão lógica entre fatos e conclusão, presente a possibilidade jurídica do pedido e não há pedidos incompatíveis.

Afasto, pois, tal argüição.

DA ALEGAÇÃO DE CARÊNCIA DE AÇÃO POR IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO - Alega o réu que a ação é carecedora porque o Autor "não juntou aos autos qualquer documento ou prova dos danos que alega ter sofrido". "Além disso, quer que seu nome seja excluído do CCF, sem antes regularizar sua conta corrente".

Não merece acolhimento a preliminar, uma vez que o pedido refere-se tão-somente a indenização por danos morais, para o qual não é necessária a produção de prova pericial. Aliás, pretensão da parte autora não só é permitida pelo ordenamento pátrio, como também encontra substrato no CDC, CC e CF.

Por isso, não se verifica a impossibilidade jurídica do pedido, pois o ordenamento jurídico pátrio não contém qualquer norma que impeça o correntista de postular danos morais, que entende fazer jus, em decorrência do cancelamento unilateral do limite de crédito do cheque especial e da inscrição do seu nome nos cadastros de inadimplentes.

Dessa forma, sendo certo que inexiste qualquer óbice para postular, em juízo, a reparação dos danos em debate, rejeito a preliminar.

DA ALEGAÇÃO DE FALTA DE INTERESSE DE AGIR - Aduz o Réu que não interesse de agir na pretensão, pois "de nada adianta o requerente recorrer ao Poder Judiciário com o propósito de buscar qualquer indenização, pois não sofreu nenhum prejuízo ou dano até a presente data".

Ao que parece, houve confusão da preliminar nominada, com o mérito da causa e com ele deve ser apreciada.

Tecnicamente, o interesse de agir decorre da necessidade de acesso ao judiciário para obtenção do bem da vida e, pela própria resistência do Réu, parece claro que a pretensão só poderia ser atendida, em tese, se o Autor se utilizasse, como fez, das vias judiciais.

Qualquer outra discussão a mais é, no fundo, mérito.

Ante o exposto, rejeito a preliminar.

MÉRITO - Inicialmente, cabe frisar que a relação de direito material estabelecida entre as partes tem caráter consumerista, respondendo o réu, independentemente de culpa, pelos prejuízos causados ao consumidor, nos termos do art. 14, do CDC.

No caso dos autos, ficou evidenciado o ato do réu, que suprimiu o limite de crédito do autor, de forma unilateral, sem comunicação prévia, sendo incontroversas as conseqüências daí advindas.

Parece incontroverso que o limite do cheque especial foi suprimido, fato confessado na contestação ao argumento de que houve uma não prorrogação do contrato de crédito. Resta, porém, analisar se tal supressão pode, ou não, ser feita unilateralmente e, em caso afirmativo, se é razoável que se faça sem notificação ao correntista.

Não se mostra pertinente analisar, nesse momento, a razão que levou o Banco a suprimir, drasticamente, o limite de crédito do demandante, apenas a forma como tal ato ocorreu: a conduta do Banco, ao encerrar o limite de crédito do cheque especial sem prévia notificação do cliente, não pode ser considerada regular, tendo havido falha na prestação do serviço.

Importa ressaltar que cabe à instituição financeira proceder à notificação prévia do correntista, quanto ao cancelamento do limite especial de crédito, pois esta permite que o mesmo possa se organizar e assim evitar maiores percalços em sua vida privada.

Assim, a ausência de comunicação do correntista, quanto ao cancelamento do limite de cheque especial, configura falha na execução do serviço, ensejando o dever de indenizar.

É de se destacar que o próprio Banco admite que concedeu um crédito ao Autor, a título de cheque especial, de R$ 1900,00 e que diminuíra para R$ 1500,00 a partir de 01/11/2004, tendo, após constatar a desregrada situação financeira do Autor, o suprido. Ora, a cláusula do contrato de crédito que confere ao Banco o direito de cancelar o crédito em conta, sem informar previamente o correntista, é abusiva, porque incompatível com a boa-fé e eqüidade, nos termos do art. 51, inc. IV, do CDC.

Ademais, se o autor contou por certo tempo com o crédito do cheque especial, teria o direito de ser notificado sobre seu cancelamento, até mesmo por razões de boa-fé nas relações contratuais (art. 422/CC).

Nesse sentido, confiram-se os seguintes arestos proferidos por este e. TJDFT:

"APELAÇÃO CÍVEL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ABRUPTA SUSPENSÃO DO CONTRATO DE CHEQUE ESPECIAL. EXIGÜIDADE DA COMUNICAÇÃO. DEVOLUÇÃO DE CHEQUE. RECUSA DE PEDIDO DE CANCELAMENTO DE CONTA CORRENTE E DE CONTRATO DE SEGURO. PROCURADOR DEVIDAMENTE CONSTITUÍDO. CONDENAÇÃO. QUANTUM. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL. JUROS LEGAIS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. COMPLEMENTAÇÃO DO JULGADO DE OFÍCIO.

I - Age em flagrante violação às normas consumeristas a instituição financeira que cancela o contrato de cheque especial antes que o correntista tenha sido efetivamente informado de tal ocorrência, ou mesmo quando não concede prazo razoável e suficiente para que o mesmo tome as providências necessárias, pois se trata de verba utilizada pela grande maioria dos clientes e que é, inclusive, muito bem remunerada aos bancos.

II - Afigura-se a recusa, pelo banco, de pedido de cancelamento de conta e de contrato de seguro ao argumento de que não houve o reconhecimento de firma do outorgante e de que o instrumento outorgado ao patrono do mesmo não indicava poderes específicos para tanto, e continuar efetuando descontos relativos a taxas e prêmios, se tal exigência não decorre de lei nem do contrato.

III - Não se reputa excessivo o valor da condenação relativa a danos morais se o quantum foi arbitrado de acordo com as circunstâncias específicas do fato, a condição financeira das partes e a gravidade da repercussão da ofensa.

IV - A incidência de juros legais e correção monetária sobre a condenação são questões de ordem pública e, por isso, podem ser examinadas pelo Tribunal, independentemente de provocação da parte.

V - Em se tratando de responsabilidade contratual, os juros moratórios devem fluir a partir da citação, conforme orientação do Superior Tribunal de Justiça.

VI - A correção monetária da condenação relativa aos danos materiais deve incidir a partir do evento danoso e, quanto aos danos morais, desde a prolação da sentença." (20050110951335APC, Relator NÍVIO GERALDO GONÇALVES, 1ª Turma Cível, julgado em 03/10/2007, DJ 06/12/2007 p. 83, grifo meu)

Sobre a inclusão do nome do Autor no SPC, conforme doc. de fls. 16, é de se registrar que se deu por 3 emissões de cheques sem fundo, mas em outubro de 2004. Ou seja, um mês antes do Réu suprimir, unilateralmente, o limite do cheque especial. Quer-se concluir, com isso, que o Autor já vivia momento difícil em sua vida financeira, mas não justifica nenhuma prestação de serviço viciada por parte do Réu - apesar de repercutir, como será visto, no quantum indenizatório.

Assim, em conclusão, agiu o réu de forma ilícita ao suprimir o limite de cheque especial, de forma unilateral, devendo, por isso, arcar com condenação moral.

É que o abalo psíquico exsurge só do fato (dano moral in re ipsa) e este se mostra indisfarçável nos autos. Ademais, a conduta do Réu em retirar o crédito colaborou com o aumento das dificuldades financeiras do Autor e isso, por óbvio, traz desconforto acima do anormal.

Por outro lado, não se pode negar que a indenização não pode ser relevante, pois o próprio Autor assumiu que seus cheques pós-datados iriam superar o montante de seu salário acrescido do crédito do cheque especial.

Nesses termos, uma condenação módica se impõe: mais para infligir ao Réu uma sanção e, assim, evitar futuras abusividades perante seu corpo de clientes (princípio da exemplaridade).

Sopesando-se tudo, hei por bem fixar uma condenação em R$ 2.000,00 (dois mil reais).

Posto isso, julgo procedente o pedido, extinguindo o processo com julgamento de mérito, nos termos do art. 269, inciso I, do CPC, para CONDENAR O RÉU A PAGAR AO AUTOR UMA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS DE R$ 2.000,00, COM JUROS DE MORA DE 1% AO MÊS, A CONTAR DA CITAÇÃO, A TEOR DO ART. 406 DO CC, C/C COM O ART. 161, §1º, do CTN, E CORREÇÃO MONETÁRIA INCIDENTE A PARTIR DESSE ARBITRAMENTO.

O prazo para pagamento começa a fluir da data do trânsito em julgado da condenação, independentemente de intimação pessoal do devedor. Caso não haja cumprimento judicial ou extrajudicialmente, incidirá a multa de 10% sobre o valor da condenação, art. 475-J do CPC.

Condeno, ainda, o sucumbente a arcar com as custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 500,00, na forma do art. 20, § 4º, do CPC, diante do reduzido valor da condenação.

P.R.I.C.

Brasília - DF, quinta-feira, 12/11/2009 às 17h06.



JURID - Cliente será indenizado. [18/01/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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