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quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

JURID - Apelação criminal. Crime contra a ordem tributária. [07/01/10] - Jurisprudência


Apelação criminal. Crime contra a ordem tributária. Sonegação fiscal.


Tribunal Regional Federal - TRF 3ª Região.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 2002.03.99.015541-4/SP

RELATOR: Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES

APELANTE: LUIZ ANTONIO TAVARES

ADVOGADO: PEDRO PAULO PINTO DE LIMA (Int.Pessoal)

APELADO: Justica Publica

No. ORIG.: 96.03.05793-2 4 Vr RIBEIRAO PRETO/SP

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. SONEGAÇÃO FISCAL. ARTIGO 1º, INCISO I, DA LEI Nº 8.137/90. DENÚNCIA OFERECIDA COM BASE EM AÇÃO FISCAL INSTAURADA PARA APURAR A SUPRESSÃO DE TRIBUTO. FALTA DE ENTREGA DE DECLARAÇÃO DE IMPOSTO DE RENDA. CONDUTA QUE SE AMOLDA AO DELITO DO ARTIGO 2º, INCISO I, DA LEI Nº 8.137/90. DESCLASSIFICAÇÃO. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA QUE SE RECONHECE DE OFÍCIO.

1. Não se cogita de ausência de justa causa para a instauração de ação penal se a denúncia foi oferecida com base em ação fiscal realizada pela Seção de Fiscalização da Delegacia da Receita Federal, na qual se constata a supressão de valor de tributo no importe de R$34.166,33 (trinta e quatro mil, cento e sessenta e seis reais e trinta e três centavos).

2. A mera falta na entrega de Declaração de Imposto de Renda Pessoa Física não configura a omissão de informação a que alude o inciso I do artigo 1º da Lei nº 8.137/90. O tipo penal exige a ocultação fraudulenta de dado patrimonial relevante no bojo da própria declaração, com a finalidade de obstar a fiscalização do Estado. Precedente da 1ª Seção desta Corte.

3. Configura, entretanto, o delito previsto no artigo 2º, inciso I, da Lei nº 8.137/90, o qual não exige a efetiva supressão ou redução de tributo e se revela mais amplo do que o tipo do artigo 1º, inciso I, do mesmo diploma legal, abarcando condutas não previstas por este último.

4. O delito do artigo 2º, inciso I, da Lei nº 8.137/90, apresenta pena máxima de 02 (dois) anos, de modo que o prazo prescricional em abstrato, nos termos do artigo 109, inciso V, do Código Penal, é de 04 (quatro) anos. Uma vez que excedido o referido lapso temporal, contado desde a publicação da sentença, impõe-se o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva do Estado.

5. Recurso de apelação parcialmente provido. Extinção da punibilidade decretada de ofício, com base na prescrição da pretensão punitiva.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso de apelação, para desclassificar os fatos imputados ao acusado para o crime do artigo 2º, inciso I, da Lei nº 8.137/90 e, de ofício, declarar extinta a sua punibilidade, em virtude da prescrição da pretensão punitiva do Estado, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 17 de novembro de 2009.

COTRIM GUIMARÃES
Desembargador Federal

RELATÓRIO

DESCRIÇÃO FÁTICA (Denúncia recebida em 24.01.2000 - fls. 163): Consta dos autos que LUIZ ANTÔNIO TAVARES suprimiu, nos anos calendários de 1993 e 1994, imposto de renda pessoa física e seus acessórios, mediante omissão de informação às autoridades fazendárias e também mediante a omissão de operações que realizava como "bicheiro", sujeitas à incidência do referido tributo. Segundo apurado, o valor total do tributo suprimido, incluindo acessórios, somou R$34.166,33 (trinta e quatro mil, cento e sessenta e seis reais e trinta e três centavos), atualizado em 15.10.1999. Assim, LUIZ ANTÔNIO TAVARES foi denunciado como incurso nas penas do artigo 1º, incisos I e II, da Lei nº 8.137/90.

SENTENÇA (Fls. 273/280 - Publicada em 28.11.2001 - fls. 281): O MM. Juízo a quo julgou parcialmente procedente a ação penal para o fim de condenar o réu, pela prática do delito previsto no artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90, à pena de 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão e pagamento de 35 (trinta e cinco) dias-multa, à razão de ½ (metade) do valor do salário mínimo.

APELAÇÃO (LUIZ ANTÔNIO TAVARES - fls. 300/320) postula pela reforma da decisão recorrida, alegando, em síntese: a) que o débito tributário foi arbitrado exclusivamente com base em extratos bancários do apelante, do que ilegítimo o lançamento tributário; b) que inexistem, nos autos, prova da culpabilidade do acusado, impondo-se a sua absolvição com base no artigo 386, inciso VI, do CPP; c) que quando iniciada a ação fiscal, o débito tributário já se encontrava extinto pela decadência, pelo que deve ser reconhecida a extinção da punibilidade do recorrente; d) que não há notícia, nos autos, de ter havido exaurimento da instância administrativa, nem tampouco de ter sido proferida decisão administrativa sobre a exigência fiscal do crédito tributário; e) subsidiariamente, pugna pela desclassificação para o delito previsto no artigo 2º, inciso I, da Lei nº 8.137/90.

CONTRA-RAZÕES (fls. 325/335): o Ministério Público Federal propugnou pelo improvimento do recurso.

PARECER DA PROCURADORIA REGIONAL DA REPÚBLICA (Dr. Mário Luiz Bonsaglia): manifestou-se pelo improvimento do recurso (fls. 338/345).

É o relatório. Ao revisor.

COTRIM GUIMARÃES
Desembargador Federal Relator

VOTO

O Exmo. Senhor Desembargador Federal COTRIM GUIMARÃES (Relator): Cuida-se de apelação criminal interposta pela defesa de LUIZ ANTÔNIO TAVARES contra a sentença que o condenou como incurso nas penas do artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90.

1. DOS FATOS

Consta dos autos que LUIZ ANTÔNIO TAVARES suprimiu imposto de renda pessoa física e seus acessórios, nos anos calendários de 1993 e 1994, mediante omissão de informação às autoridades fazendárias e também por meio da omissão de operações que realizava como "bicheiro", sujeitas à incidência do referido tributo.

Segundo apurado, o valor total do tributo suprimido, incluindo acessórios, somou R$34.166,33 (trinta e quatro mil, cento e sessenta e seis reais e trinta e três centavos), atualizado em 15.10.1999.

2. DA PRELIMINAR

Inicialmente, observo que a presente ação penal foi instaurada com base em ação fiscal realizada pela Seção de Fiscalização da Delegacia da Receita Federal em Ribeirão Preto/SP, na qual se constatou que o valor do tributo suprimido pelo apelante somou R$34.166,33 (trinta e quatro mil, cento e sessenta e seis reais e trinta e três centavos), atualizado em 15.10.1999, conforme se extrai de fls. 1616/1626 do expediente sigiloso apensado a estes autos.

Assim sendo, descabida a alegação do apelante no sentido de que a denúncia foi oferecida em detrimento da ausência de causa objetiva de procedibilidade, consistente na apuração administrativa do valor suprimido na instância administrativa.

O réu ainda alegou inexistir prova do encerramento do procedimento administrativo de lançamento do débito tributário. Todavia, a questão deve ser analisada sob outro prisma: inexistem, nos autos, notícia de que o acusado apresentou impugnação ao auto de infração lavrado, o que induz à conclusão de que o tributo foi definitivamente constituído.

3. DA CLASSIFICAÇÃO JURÍDICA DOS FATOS

Anoto que os fatos narrados na denúncia, que imputa ao acusado a conduta de suprimir tributo mediante a não apresentação de Declaração de Imposto de Renda Pessoa Física às autoridades fazendárias, não se amoldam ao tipo penal previsto no artigo 1º, inciso I, da Lei nº 8.137/90, o qual exige a supressão ou redução de tributo mediante a omissão de informações às autoridades fazendárias ou por meio de declaração falsa, nos seguintes termos:

Art. 1° Constitui crime contra a ordem tributária suprimir ou reduzir tributo, ou contribuição social e qualquer acessório, mediante as seguintes condutas:

I - omitir informação, ou prestar declaração falsa às autoridades fazendárias;

(...)

Pena - reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.

Com efeito, segundo apurou a fiscalização da Receita Federal, o acusado estava omisso na entrega de Declaração de Imposto de Renda Pessoa Física desde o ano-calendário de 1993.

Ocorre que a mera inércia do contribuinte em proceder à entrega de declaração não configura "omissão de informação" para fins da caracterização do delito previsto no inciso I do artigo 1º da Lei nº 8.137/90, que, segundo me parece, exige uma omissão fraudulenta.

De fato, observa Luiz Regis Prado (Direito Penal Econômico, 2ª ed. rev. atual. e ampl., São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 312) que

"(...) não é suficiente para a configuração do tipo a supressão ou redução do tributo, mas exige-se também que sejam conseqüência de um comportamento anterior fraudulento." (destacamos)

E não se pode dizer que a não entrega de declaração ao fisco seja comportamento de cunho fraudulento. Nesta hipótese, a Administração Fazendária não estará sendo induzida em erro, porquanto poderá constatar, sem maiores dificuldades, que o contribuinte negligenciou o seu dever instrumental de entregar declaração tributária.

Segundo muito bem observou o eminente Desembargador Federal Peixoto Júnior, em declaração de voto proferida no bojo da Apelação Criminal 10.695 (2ª Turma, Processo nº 1999.61.81.001830-2, Rel. Juíza Federal Márcia de Oliveira), a omissão de que cuida a lei penal "pressupõe uma determinação positiva, em outras palavras: a omissão em efetivo ato de declaração."

E é isso que se infere a partir de uma simples interpretação literal do tipo em questão, visto que, segundo a redação conferida ao dispositivo, o termo "omitir" se relaciona a "informação", ao passo que o termo "declaração" se liga ao adjetivo "falsa". Portanto, a não entrega de declaração fiscal não foi contemplada pelo tipo como conduta apta à configuração do ilícito penal de sonegação fiscal pelo qual responde o acusado.

Diverso seria o caso se a declaração contivesse omissão de informação relevante sobre uma situação que enseja a incidência da hipótese normativa abstrata, logrando o agente, com isso, reduzir ou suprimir tributo.

A propósito, a C. 1ª Seção deste E. Sodalício, já se pronunciou no mesmo sentido em caso análogo, conforme corrobora o seguinte aresto:

PENAL - EMBARGOS INFRINGENTES - ART. 1º, INC. I, DA LEI Nº 8.137/90 - FALTA DE ENTREGA DE FORMULÁRIO DE IMPOSTO DE RENDA - LAVRATURA DE AUTO DE INFRAÇÃO PELA RECEITA FEDERAL - AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE DOCUMENTAL - TIPO PENAL DE OCULTAÇÃO COM FRAUDE - NÃO CARACTERIZAÇÃO - ATIPICIDADE - PROVIMENTO DO RECURSO.

1.- A conduta de falta de entrega de declaração de imposto de renda à Receita Federal não configura delito, porquanto não há materialidade documental passível de ocorrer a fraude, elemento característico do crime contra a ordem tributária e necessário ao perfazimento da figura típica.

2. Embargos providos.

(TRF 3ª Região, 1ª Seção, ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 10695, Processo nº 199961810018302, Rel. JUIZ LUIZ STEFANINI, Julgado em 17/04/2008, DJF3 DATA:27/05/2008)

Observo, entretanto, que a conduta narrada na denúncia amolda-se, com perfeição, ao tipo do artigo 2º, inciso I, da Lei nº 8.137/90, que assim dispõe:

Art. 2° Constitui crime da mesma natureza:

I - fazer declaração falsa ou omitir declaração sobre rendas, bens ou fatos, ou empregar outra fraude, para eximir-se, total ou parcialmente, de pagamento de tributo;

(...)

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.

A doutrina e a jurisprudência têm identificado uma relação de tentativa e consumação entre o delito do artigo 2º e do artigo 1º, respectivamente. Assim, enquanto que para este último exige-se a efetiva verificação do resultado, qual seja de supressão ou redução do tributo, em relação àquele primeiro basta que o agente pratique qualquer uma das condutas arroladas em seus incisos, desde que com a finalidade específica de se eximir do pagamento de tributo, para que se configure o crime, não se exigindo, todavia, a efetiva consecução do resultado almejado.

Tem-se, pois, que o crime definido no artigo 2º, inciso I, da Lei nº 8.137/90 possui natureza formal, sendo certo que, em regra, a verificação do resultado naturalístico implicará na configuração do delito do artigo 1º do mesmo diploma legal.

Entretanto, especificamente no presente caso, em que se cuida da mera omissão na entrega de declaração de imposto de renda pessoa física, não enxergo, propriamente, a citada relação. Com efeito, conforme destaquei anteriormente, tal conduta não se amolda ao tipo do artigo 1º, inciso I, o qual exige omissão de informação no bojo da própria declaração. Chamo a atenção, todavia, para a sensível diferença na redação do artigo 2º, inciso I, o qual criminaliza, de forma literal, a mera omissão de declaração sobre rendas, sempre que acompanhada da intenção de afastamento do tributo. Em outras palavras, o tipo do artigo 2º, inciso I, mostra-se mais amplo do que o anterior, abarcando condutas não contempladas no artigo 1º, inciso I. E isso se revela de todo coerente, haja vista que aquele apresenta pena consideravelmente mais branda do que este último.

Assim, embora se possa cogitar da verificação do resultado naturalístico no caso em apreço, tenho que os fatos imputados ao apelante configuram o delito do artigo 2º, inciso I, da Lei nº 8.137/90, de forma continuada, haja vista que praticado por dois períodos subseqüentes.

Em vista do exposto, procedo à desclassificação do crime previsto no artigo 1º, inciso I, da Lei 8.137/90, para o do artigo 2º, inciso I, do mesmo diploma legal.

Anoto, todavia, que o referido delito é reprimido com pena máxima de 02 (dois) anos de detenção, de modo que o prazo prescricional em abstrato, nos termos do artigo 109, inciso V, do Código Penal, será de 04 (quatro) anos.

Uma vez que referido lapso temporal já foi excedido, se contado do último marco interruptivo, que foi a publicação da sentença condenatória, em 28.11.2001 (fls. 281), tem-se por consumada a prescrição da pretensão punitiva estatal.

4. CONCLUSÃO

Ante o exposto, nos termos da fundamentação supra, dou parcial provimento ao recurso de apelação, para desclassificar os fatos imputados ao acusado para o crime do artigo 2º, inciso I, da Lei nº 8.137/90 e, de ofício, declaro extinta a sua punibilidade, em virtude da prescrição da pretensão punitiva do Estado.

É o voto.

COTRIM GUIMARÃES
Desembargador Federal

D.E. Publicado em 27/11/2009




JURID - Apelação criminal. Crime contra a ordem tributária. [07/01/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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