Ação ordinária. Sentença concisa. Venda de medicamento equivocado. Dano moral. Indenização. Critério de estipulação.
Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG.
Número do processo: 1.0707.05.094136-8/001(1)
Relator: FABIO MAIA VIANI
Relator do Acórdão: FABIO MAIA VIANI
Data do Julgamento: 11/08/2009
Data da Publicação: 16/09/2009
Inteiro Teor:
EMENTA: AÇÃO ORDINÁRIA - SENTENÇA CONCISA - VENDA DE MEDICAMENTO EQUIVOCADO - DANO MORAL - INDENIZAÇÃO - CRITÉRIO DE ESTIPULAÇÃO. - A concisão é antes virtude do que defeito da sentença. -O comerciante responde pelos danos causados à saúde da consumidora que adquiriu, por equívoco do preposto daquele, medicamento diverso do prescrito por profissional médico. A indenização é antes punitiva do que compensatória
APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0707.05.094136-8/001 - COMARCA DE VARGINHA - APELANTE(S): CARVALHO MANTOVANI & CIA LTDA OU FARMÁCIA AMERICANA LTDA - APELADO(A)(S): LILIANY TEODÓZIO ROSA REPRESENTADO(A)(S) P/ MÃE DULCEMAR DO CARMO TEODÓZIO - RELATOR: EXMO. SR. DES. FABIO MAIA VIANI
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 18ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM REJEITAR A PRELIMINAR E NEGAR PROVIMENTO AO 1º AGRAVO RETIDO. NÃO CONHECER DO 2º E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
Belo Horizonte, 11 de agosto de 2009.
DES. FABIO MAIA VIANI - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. FABIO MAIA VIANI:
VOTO
Cuida-se de apelação interposta por Farmácia Americana Ltda. da sentença (fls. 220-227) que, nos autos da ação de indenização que lhe move Liliany Teodózio Rosa, julgou procedente o pedido inicial, condenando-a ao pagamento de R$ 12.000,00, por dano moral, acrescidos dos encargos legais.
A apelante, nas razões do recurso (fls. 237-258), requerer, em preliminar, a apreciação de dois agravos retidos que tratam da irregularidade de representação, ilegitimidade passiva e da contradita de testemunha. Suscita, em todo caso, nulidade da sentença, por falta de fundamentação.
No mérito, alega, em síntese, que não existe prova da ingestão de medicamento equivocado pela autora. Sequer fora esclarecida "a substância causadora do mal", no dia do atendimento hospitalar.
O estabelecimento comercial, por outro lado, realizou a venda da específica droga farmacêutica solicitada pela consumidora, como comprovam a receita apresentada e o livro de registro de medicamentos controlados mantidos pela recorrente.
Pede, com a reforma da sentença, a improcedência do pedido inicial ou a redução do valor arbitrado na indenização.
A apelada, nas contrarrazões (fls. 261-270), defende a manutenção da sentença.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da apelação.
Consoante dispõe o Código de Processo Civil, "das decisões interlocutórias caberá agravo, no prazo de 10 (dez) dias, na forma retida, salvo quando se tratar de decisão suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação".
Ora, intimada da decisão impugnada em 9 de janeiro de 2008, quarta-feira, o prazo da ré, iniciado em 14 de janeiro, segunda-feira, terminou em 23 de janeiro, quarta-feira, somados os dois dias de acréscimo previstos nas Resoluções 289/95 e 412/03 da Corte Superior deste Tribunal. O primeiro agravo retido foi interposto em 23 de janeiro de 2008, quarta-feira, dentro do prazo legal, ao contrário do que afirma a recorrida.
No mérito, não assiste razão à recorrente.
A autora, menor incapaz, representada por sua mãe, detentora do pátrio poder, outorgou regular procuração por instrumento particular a advogado habilitado, como lhe permite o Superior Tribunal de Justiça (AR 484/ SP Ação Rescisória 1995/0048630-0; Ministro Aldir Passarinho Júnior, DJ 4/2/02).
A demandante ajuizou ação de indenização contra a sociedade empresária participante da relação jurídica, declinando o correto endereço da ré. A simples confusão entre nome fantasia e nome comercial não lhe retira a legitimidade passiva. Observo, aliás, que a própria magistrada de primeiro grau determinou a correção do equívoco. Não há nulidade sem prejuízo.
NEGO PROVIMENTO ao primeiro agravo retido.
Das decisões interlocutórias proferidas na audiência de instrução e julgamento caberá agravo na forma retida, devendo ser interposto oral e imediatamente (art. 523, § 3º, CPC).
"Possível e até mesmo desejável compreender o dispositivo no sentido de que a interposição imediata só significa que a interposição deve se dar até o fim da audiência e não no prazo de 10 dias" (Scarpinella Bueno, A Nova Etapa da Reforma do Código de Processo Civil, pág. 213).
No caso dos autos, o agravante, conquanto presente à audiência de instrução (fls. 183-184), somente interpôs agravo retido 10 dias depois da decisão, fora do prazo legal.
NÂO CONHEÇO do segundo agravo retido.
A sentença, com concisão (antes defeito do que virtude), examinou todas as questões pertinentes à composição da lide. Eventual equívoco na apreciação das provas ou documentos não acarreta a nulidade suscitada pela recorrente.
REJEITO a preliminar de nulidade da sentença.
É fato incontroverso que a autora, Liliane Teodózio Rosa, submete-se a tratamento permanente de saúde, fazendo uso constante do medicamento Gadernal, nome comercial da droga farmacêutica Flenobarbital (cf. 38-41).
A própria bula do remédio esclarece que "a interrupção abrupta do tratamento anticonvulsivante pode levar ao agravamento de crises convulsivas e crises subentrantes", especialmente em pacientes com histórico de uso prolongado da droga, como no caso da recorrida (fl. 42).
Diante deste quadro, a mãe da autora, pessoa de escassa instrução formal (como esclarece em depoimento; fl. 185), verificando o término do remédio há três dias, solicitou ao estabelecimento réu, a entrega em domicílio do referido produto.
Os elementos presentes nos autos confirmam que a recorrente, por equívoco, ofereceu distinto medicamento, de nome comercial Rivotril, reconhecido "ansiolítico" e "antipressivo".
Dulcemar do Carmo Teozódio, na necessidade urgente de medicar a filha (autora incapaz), ministrou o medicamento equivocado, em doses incompatíveis, acreditando que a farmácia tinha lhe entregado a correta droga. A "superdosagem" acarretou inequívocos danos à autora. Encaminhada ao pronto-socorro, foi submetida à lavragem gástrica (fl. 25).
O apelante tenta se eximir da sua responsabilidade argumentando que não trocou os medicamentos e sequer existem provas da ingestão equivocada do Rivotril. Não lhe assiste razão.
O "Livro de Registro Específico" da farmácia apenas informa a saída de uma caixa do medicamento Gadernal no dia dos fatos (2/2/05). A venda desta droga foi realizada mediante a apresentação da receita 6200 (fl. 92).
O receituário encaminhado pela mãe da autora, para a compra de idêntico remédio, possui o número 001689 (fl. 91). Rasuras no documento são desconsideradas. Conclui-se, portanto, que a farmácia não entregou o remédio Gadernal à autora naquele específico dia.
Observo, por outro lado, que a recorrente deixa de apresentar o "Livro de Registro Específico" do medicamento Rivotril. Mas a funcionária responsável pelo estabelecimento confirma a devolução do remédio equivocado (fl. 188):
"que a depoente esteve com o medicamento errado em mãos que lhe foi entregue (...) que a pessoa que apresentou o medicamento errado não quis recebê-lo de volta; que a depoente lembra que era uma senhora, de pele morena, não recorda se estava sozinha ou acompanhada; que tal medicamento foi encaminhado para a vigilância sanitária".
Ora, se existe a devolução, não podemos desconsiderar que houve a entrega, especialmente porque se trata de medicamento controlado, não utilizado por qualquer membro da família da apelada. Os documentos médicos também comprovam que a autora foi medicada com Rivotril sendo submetida à lavagem gástrica (medida indicada pela própria fabricante do remédio; fls. 35).
Para que não restem dúvidas, o exame clínico, assinado por profissional médico habilitado, descreve a paciente com "história de ingestão de 60 gotas de Rivotril" submetida aos procedimentos específicos deste incidente (fl. 25). A simples impugnação da apelante, sem qualquer elemento, é insubsistente para desconstituir as provas produzidas no feito.
A relação jurídica estabelecida entre as partes está disciplinada no Código de Defesa do Consumidor. Este diploma legal estabelece proteção especial ao hipossuficiente, facilitando a defesa de seus direitos. Ora, invertido o ônus da prova em favor da consumidora (fl. 223), a ré não apresentou provas para desconstituir os elementos dos autos. É inevitável a procedência do pedido.
Nexo causal e os danos morais ocasionados à autora estão devidamente comprovados pelas provas e documentos juntados aos autos. A apelada foi encaminhada ao pronto-socorro em razão da negligente atitude da ré. Não há que se falar em culpa concorrente, pois a representante legal da autora tinha total confiança na conduta da apelante.
Semelhante indenização é antes punitiva do que compensatória, pois se nenhum dinheiro compensa a dor do ofendido, uma boa e exemplar indenização serve ao menos de advertência contra a prática de condutas similares. Tanto mais exemplar quanto mais poderoso o infrator e mais vulnerável a vítima, como no caso autos.
O valor arbitrado na sentença - R$ 12.000,00 - atende razoavelmente a essa finalidade. Tal arbitramento é, aliás, moderado, diante dos últimos precedentes emanados do Superior Tribunal de Justiça, que tratam da simples restrição de crédito, cuja indenização tem sido fixada em 50 salários mínimos (STJ REsp nº 295.130-SP, 3a Turma, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU de 4/4/05).
Pelo exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.
Custas pelo apelante.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): ARNALDO MACIEL e GUILHERME LUCIANO BAETA NUNES.
SÚMULA: REJEITARAM A PRELIMINAR E NEGARAM PROVIMENTO AO 1º AGRAVO RETIDO. NÃO CONHECERAM DO 2º E NEGARAM PROVIMENTO À APELAÇÃO.
JURID - Venda de medicamento equivocado. Dano moral. Indenização. [22/09/09] - Jurisprudência
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