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quarta-feira, 30 de setembro de 2009

JURID - Ação de indenização. Situação inequivocamente vexatória. [30/09/09] - Jurisprudência


Apelação cível. Ação de indenização. Professor que elabora cartazes ofensivos à honra do autor. Situação inequivocamente vexatória.
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Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC.

Apelação Cível n. 2005.043189-1, de Itajaí

Relator: Des. Sérgio Izidoro Heil

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROFESSOR QUE ELABORA CARTAZES OFENSIVOS À HONRA DO AUTOR. SITUAÇÃO INEQUIVOCAMENTE VEXATÓRIA. DANO MORAL CARACTERIZADO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DO COLÉGIO. ARTIGO 932, III, DO CÓDIGO CIVIL. DISCUSSÃO ACERCA DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. ORIENTAÇÃO PELOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. ADEQUAÇÃO NECESSÁRIA. MAJORAÇÃO. RECURSO DA RÉ DESPROVIDO E PROVIDO O RECURSO DO AUTOR.

Não se olvide que algumas brincadeiras em sala de aula sejam permitidas ou mesmo importantes para a fixação da matéria, mas no caso em tela, o professor ultrapassou os limites do razoável, na medida em que expôs o aluno a situação vexatória perante seus colegas de classe, pois os cartazes por ele elaborados deixam clara a intenção de questionar a sexualidade do autor.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2005.043189-1, da comarca de Itajaí (1ª Vara Cível), em que são apelantes/apelados André Othavio dos Santos e Sistema Radical de Ensino Ltda e apelado Benício Simão de Azevedo Neto:

ACORDAM, em Segunda Câmara de Direito Civil, por votação unânime, conhecer dos recursos, dando provimento ao do autor e negando provimento ao da ré. Custas legais.

RELATÓRIO

Trata-se de apelação cível interposta por ambas as partes contra sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Itajaí que, nos autos da ação de indenização por danos morais (n. 033.04.019079), ajuizada por Elizete Maria Jacinto, representando André Othavio dos Santos em face de Colégio Radical e Benício Simão de Azevedo Neto, julgou procedente o pedido, condenando os réus solidariamente ao pagamento de indenização no valor de R$ 6.000,00, além do pagamento das custas e honorários, fixados em 20% sobre o valor da condenação.

Os autores aduzem que: houve divergência nos argumentos utilizados pelos apelados e os depoimentos de suas testemunhas; o valor da condenação foi irrisório, devendo ser majorado (fls. 183/193).

A ré Sistema Radical de Ensino Ltda. afirma que o contrato social da empresa demonstra que seu capital social é de R$ 10.000,00, sendo o quantum indenizatório insuportável, devendo ser minorado (fls. 194/202).

Contra-razões do réu Benício S. de Azevedo Neto (fls. 209/200); pelos autores, que pleitearam a condenação a ré nas penas da litigância por má-fé (fls. 222/227); e da ré Sistema Radical de Ensino Ltda. (fls. 228).

VOTO

Ambas as partes pugnam pela modificação do quantum indenizatório, o autor, visando a sua majoração; já a ré, pela minoração.

Embora não tenha havido insurgência acerca da caracterização do ilícito cometido, pugnando as partes apenas pela modificação do valor arbitrado, faz-se necessário um breve resumo dos fatos ensejadores do pedido de dano moral.

Extrai-se da exordial que o autor era aluno do Colégio Radical que tinha como um de seus professores o réu, Benício Simão de Azevedo Neto. No dia 09.03.2004, ao adentrar na sua sala da aula, o autor deparou-se com um cartaz feito pelo referido professor, colado na parede e contendo a sua foto com os seguintes dizeres: "PROCURA-SE. RECOMPENSA DE 1,00 REAL. ASSALTO A LOJA DE LINGERIE" (fls. 16).

Não bastasse tal vexame, após uma semana, o professor foi até o autor em sua classe, e lhe entregou cópia de um novo cartaz, mais uma vez com a sua foto e os seguintes comentários (fl. 17):

FAÇO...PROGRAMAS EM GERAL

- DESPEDIDAS DE SOLTEIRO

- BOITES GAY

- DESFILES DE LINGERIE

- MASSAGEM ERÓTICA

TUDO ISSO E MUITO MAIS PARA VOCÊ MEU MACHO!

SOU EU!

ATENDO A DOMICÍLIO 024 324.2424

TELMA.

Este novo cartaz teria sido fixado também na cantina do colégio, sala de aula e sala dos professores, resultando em forte abalo emocional ao autor, que passou a ser chamado pelos colegas de "Telma". Após estes episódios, como o colégio não tomou nenhuma providência, o autor mudou de colégio e passou a necessitar de tratamento psicológico.

Incontroverso que o segundo réu foi quem elaborou os cartazes, conferindo-lhes publicidade no Colégio em que o autor estudava.

Dispõe o art. 186 do Código Civil que:

Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Desse modo, para que se caracterize o ilícito civil, necessária se faz a conjugação de três requisitos, quais sejam, o fato lesivo causado pelo agente, a ocorrência de dano moral ou patrimonial e o nexo causal entre o dano e a conduta do agente.

In casu, inquestionável o dano moral sofrido pelo autor, que foi alvo de chacotas no colégio em que estudava em razão dos cartazes elaborados pelo professor, ora réu.

De forma a estampar os fatos noticiados, colhe-se do depoimento pessoal do professor, ora réu (fl. 170):

Que foi o depoente quem fez os cartazes acostados às fls. 16 e 17; que o cartaz de fl. 16 foi fixado pelo depoente na sala de aula; que depois alguns alunos pegaram o referido cartaz e fixaram este na cantina do colégio; que o cartaz de fl. 17 foi entregue nas mãos do autor; [..] que o cartaz de fl. 17 foi mostrado pelo depoente aos colegas do autor na sala de aula, em tom de brincadeira; [...] que o o colégio permite brincadeiras com os alunos, desde que eles aceitem; [...].

A testemunha Teresa Dávila Weiss (fl. 171):

Que a depoente é professora e atualmente ocupa o cargo de direção de uma escola pública; que a depoente é colega de trabalho da mãe do autor; que na época dos fatos, a depoente viu a mãe do autor bastante preocupada e abatida; [...] que a mãe do autor relatou para a depoente os fatos ocorridos no colégio radical e mostrou os cartazes de fls. 16/17 a depoente; que a depoente, na condição de professora, pensa que a atitude do réu Benício é reprovável; [...].

Josué Cleves Croda relatou (fl. 174/175):

Que o depoente estudava na mesma sala do autor; que o professor Benício; que o professor fez uma brincadeira com o autor; [...] que brincadeira semelhante a esta estampada nos autos não aconteceu com qualquer outro aluno da sala; [...].

Acerca da relação professor-aluno, tem-se que:

As relações humanas, embora complexas, são peças fundamentais na realização comportamental e profissional de um indivíduo. Desta forma, a análise dos relacionamentos entre professor/aluno envolve interesses e intenções, sendo esta interação o expoente das conseqüências, pois a educação é uma das fontes mais importantes do desenvolvimento comportamental e agregação de valores nos membros da espécie humana.

Desta maneira, o aprender se torna mais interessante quando o aluno se sente competente pelas atitudes e métodos de motivação em sala de aula. O prazer pelo aprender não é uma atividade que surge espontaneamente nos alunos, pois, não é uma tarefa que cumprem com satisfação, sendo em alguns casos encarada como obrigação. Para que isto possa ser melhor cultivado, o professor deve despertar a curiosidade dos alunos, acompanhando suas ações no desenvolver das atividades.

[...]

O trabalho do professor em sala de aula, seu relacionamento com os alunos é expresso pela relação que ele tem com a sociedade e com cultura. ABREU & MASETTO (1990: 115), afirma que "é o modo de agir do professor em sala de aula, mais do que suas características de personalidade que colabora para uma adequada aprendizagem dos alunos; fundamenta-se numa determinada concepção do papel do professor, que por sua vez reflete valores e padrões da sociedade".

[...]

Logo, a relação entre professor e aluno depende, fundamentalmente, do clima estabelecido pelo professor, da relação empática com seus alunos, de sua capacidade de ouvir, refletir e discutir o nível de compreensão dos alunos e da criação das pontes entre o seu conhecimento e o deles. Indica também, que o professor, educador da era industrial com raras exceções, deve buscar educar para as mudanças, para a autonomia, para a liberdade possível numa abordagem global, trabalhando o lado positivo dos alunos e para a formação de um cidadão consciente de seus deveres e de suas responsabilidades sociais (SILVA, João Paulo Souza, A relação Professor/Aluno no processo de ensino e aprendizagem, artigo extraído da internet: http://www.espacoacademico.com.br/052/52pc_silva.Htm, em 22.07.2009).

Não se olvide que algumas brincadeiras em sala de aula sejam permitidas ou mesmo importantes para a fixação da matéria, mas no caso em tela, o professor ultrapassou os limites do razoável, na medida em que expôs o aluno a situação vexatória perante seus colegas de classe, pois os cartazes de fls. 16/17 deixam clara a intenção de questionar a sexualidade do autor.

Neste vértice, levando-se em conta que o autor era na época apenas um adolescente com quinze anos de idade e que estava em pleno desenvolvimento físico, psíquico e moral, tem-se que a conduta do réu resultou inegável sofrimento, que deve ser reparado. O professor, além de educador e adulto, tinha o dever de avaliar as conseqüências de sua conduta.

Em caso análogo, colhe-se da jurisprudência:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PROFESSOR. DANOS CAUSADOS AO ALUNO. PROVA CONVINCENTE. DANO MORAL. INDENIZATÓRIA. DANOS MORAIS. Aluna de curso ministrado pelo apelante sofre constrangimentos, agressões verbais, humilhações diante de colegas em sala de aula por parte do segundo réu, profesor de português. Palavras e atitudes desqualificadoras e incompatíveis com o ofício de ensinar. Prova convincente e elucidadora quanto à atitude pouco polida e descortes do professor. Inobservância do apelante quanto ao disposto no artigo 333, inciso II, do código de processo civil. Manutenção da sentença. Conhecimento e improvimento do apelo (TJRJ, AC n. 32115/2003, rel. Des. Raul Celso Lins e Silva, j. 18.02.2004).

No mesmo norte, o Colégio também fica responsabilizado pelos acontecimentos na condição de empregador do réu, forte no art. 932, III, do Código Civil.

Sendo assim, comprovada a conduta culposa do réu e, a par disso, os danos morais suportados pelo autor, passa-se à análise da verba indenizatória.

Com efeito, os danos morais não necessitam de comprovação, uma vez que eles ocorrem "na esfera da subjetividade, ou no plano valorativo da pessoa e da sociedade, alcançando os aspectos mais íntimos da personalidade humana ('o da intimidade e da consideração pessoal'), ou o da própria valoração da pessoa no meio que vive e atua ('o da reputação ou da consideração social'). Derivam, portanto, de 'práticas atentatórias à personalidade humana' (STJ, 3ª T, voto do relator Eduardo Ribeiro, no Resp 4.236, in Bussada, Súmulas do STJ, São Paulo, Jurídica Brasileira, 1995, p. 680). Traduzem-se em 'um sentimento de pesar íntimo da pessoa ofendida' (STF, RE 69.754/SP, RT 485/230), capaz de gerar 'alterações psíquicas' ou 'prejuízos à parte social ou afetiva do patrimônio moral' do ofendido (STF, RE 116.381-RJ, Bussada, ob. cit., p. 687)" (Theodoro Júnior, Humberto. Dano Moral, Oliveira Mendes, 1ª ed., 1998, p. 2 e 3).

Na realidade, sabe-se que a quantificação da indenização por abalo moral é tema bastante controvertido, tanto na doutrina como na jurisprudência. Carlos Dias Motta, discorrendo sobre o assunto, assenta:

[...] uma das maiores resistências ao acolhimento da indenização por dano moral era justamente a dificuldade da apuração de seu valor. Por não ter natureza reparatória, torna-se difícil ou até mesmo impossível a fixação da indenização em valor equivalente ao dano. [...] A questão da quantificação é, no estado de nosso direito, sem dúvida, o grande desafio de quantos cuidam do dano moral (Dano moral por abalo indevido de crédito. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 88, vol. 760, de fevereiro de 1999. p. 83).

Portanto, cabendo ao magistrado o arbitramento da indenização, respeitado o princípio do livre convencimento motivado ante a dificuldade na valoração do prejuízo, mister a utilização de determinados critérios que o auxiliem a dissipar o processo de quantificação.

Estes critérios, por sua vez, estabelecidos através da prática jurisdicional, devem atentar as particularidades tanto do ofendido como do ofensor. Assim, leva-se em conta, dentre outros, o transtorno sofrido e a posição social da vítima, além da capacidade financeira do agente. A força punitiva da indenização também deve ser considerada, de modo que, ao mesmo tempo em que o agente danoso sinta-se coibido de reiterar a prática ilícita, a vítima não seja enriquecida imprópria e demasiadamente.

Para alicerçar o raciocínio, colhe-se do julgado do Superior Tribunal de Justiça:

O valor de indenização por dano moral sujeita-se ao controle do Superior Tribunal de Justiça, sendo certo que, na fixação da indenização a esse título, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível sócio-econômico do autor e, ainda, ao porte econômico do réu, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso (REsp n. 240441/MG, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 5.6.2000, p. 00172).

Destarte, ponderando-se que a quantificação do dano não deve banalizar o instituto, bem como que a proibição de enriquecimento sem causa pela vítima do abalo moral e a máxima de se coibir a reiteração da prática danosa pelo ofensor, considerando-se que o autor sofreu abalo moral diante da publicidade dada aos cartazes feitos pelo professor, e, por outro lado, que professor e colégio não possuem grandes condições econômicas, apresenta-se como justo e razoável elevar o montante indenizatório para R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Assim sendo, atendendo aos princípios da razoabilidade, além da proporcionalidade, resta o valor mencionado suficiente para o fim de ressarcir o autor pelo abalo sofrido, bem como para coibir a reiteração, pelos réus, do ato ilícito praticado.

Por fim, cabe analisar o pedido de litigância de má-fé formulado pelo autor em contra-razões, sob a assertiva de que o pleito da ré pela minoração da verba indenizatória beira o absurdo, já que inequivocamente comprovado o abalo moral sofrido.

Todavia, não há como condenar a ré por litigância de má-fé, tendo em vista que não se vislumbra que tenha aquela atuado de forma ilegítima ao exercer seu direito de defesa, incidindo de forma atentatória à dignidade ou pretendendo atingir objetivo ilegal.

No mesmo vértice, não se verifica que tenha violado o dever que incumbe à parte de "expor os fatos em juízo conforme a verdade; proceder com lealdade e boa-fé; não formular pretensões, nem alegar defesa, cientes de que são destituídas de fundamento", conforme inscrito nos incisos I, II e III do art. 14 do CPC. Esta Corte de Justiça já decidiu acerca do tema:

A litigância de má-fé só se configura quando comprovado o dolo processual, a resistência completamente injustificada e a intenção malévola de causar efetivo prejuízo à parte contrária por conduta injurídica (AC n. 2008.060612-9, de Blumenau, rel. Des. Mazoni Ferreira, j. 12.12.2008).

Desta forma, diante da inexistência de qualquer prova de que tenha agido a ré de maneira a desrespeitar os princípios de lealdade e boa-fé, não se acolhe a pretensão de que seja condenada nas penas por litigância de má-fé.

Diante do exposto, vota-se pelo desprovimento do recurso da ré, e pelo provimento do recurso do autor, no sentido de majorar a verba indenizatória para R$ 10.000,00 (dez mil reais), com correção monetária a contar deste arbitramento, permanecendo os juros fixados na sentença, além de mantidos os ônus sucumbenciais.

DECISÃO

Nos termos do voto do relator, a Câmara, à unanimidade, conheceu dos recursos, negando provimento ao da ré, e dando provimento ao do autor, majorando o quantum indenizatório para R$ 10.000,00 (dez mil reais), com correção monetária a contar deste arbitramento, permanecendo os juros fixados na sentença, além de mantidos os ônus sucumbenciais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Mazoni Ferrreira, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Luiz Carlos Freyesleben.

Florianópolis, 13 de agosto de 2009

Sérgio Izidoro Heil
RELATOR

Publicado em 23/09/09




JURID - Ação de indenização. Situação inequivocamente vexatória. [30/09/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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