Menor. Ato Infracional. Pretensão de absolvição. Descabimento.
Tribunal de Justiça de São Paulo - TJSP.
ACÓRDÃO
MENOR - Ato Infracional - Representação acolhida pela prática de delito equiparado a roubo duplamente qualificado pelo emprego de arma e concurso de agentes, com aplicação de medida socioeducativa de internação - Pretensão de absolvição - Descabimento - Prova suficiente de que o adolescente participou do ato infracional - Pedido alternativo de substituição da medida aplicada para medida de liberdade assistida - Inadmissibilidade - Internação que encontra respaldo no artigo 122, inciso I, do ECA e que guarda relação de proporcionalidade com a gravidade do ato praticado e circunstâncias pessoais do adolescente, recomendando sua segregação até que reúna condições favoráveis para retornar ao convívio social - Sentença mantida - Recurso não provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL SEM REVISÃO nº 177.263-0/7-00, da Comarca de ITAQUAQUECETUBA, em que é apelante ALAF DE OLIVEIRA BERTINI sendo apelado PROMOTOR DE JUSTIÇA DA VARA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE DE ITAQUAQUECETUBA:
ACORDAM, em Câmara Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores MUNHOZ SOARES (Presidente), VIANA SANTOS.
São Paulo, 17 de agosto de 2009.
MARTINS PINTO
Relator
Voto nº 3066
Trata-se de recurso de apelação interposto pelo adolescente Alaf de Oliveira Bertini contra sentença que julgou procedente a representação ofertada pelo Ministério Público reconhecendo a prática de ato infracional equiparado à figura capitulada no artigo 157, parágrafo segundo, incisos I e II, do Código Penal. Foi aplicada ao adolescente a medida socioeducativa de internação por prazo indeterminado, com reavaliação a cada seis meses (artigo 121 do Estatuto da Criança e do Adolescente).
Pugnou a defesa do adolescente pela reforma da sentença recorrida para "absolver" o apelante, ou na impossibilidade, requereu a concessão da medida socioeducativa de liberdade assistida. Para tanto, sustentou que a decisão não deveria ter se pautado sobre o depoimento da vítima e também que o apelante não conhecia as intenções de seus outros comparsas, imputáveis, os quais portavam a arma de fogo, inclusive sendo um deles seu tio, não tendo ciência de que os agentes cometeriam ato delitivo e que apenas estava acompanhando seu tio.
Além disso, asseverou a defesa que o apelante possuía apenas treze anos quando da ocorrência dos fatos, não restando caracterizada sua participação ativa, sendo, portanto, "mais uma vítima da situação que o envolveu do que co-autor". Por derradeiro, pleiteou, alternativamente, o abrandamento da medida aplicada para liberdade assistida, enfatizando que o adolescente freqüenta escola, nunca foi processado por qualquer outro ato infracional e reside com sua avó e mais três irmãos (fls. 143/150).
Apresentadas as contrarrazões (fls. 153/159) e mantida a r. decisão monocrática (fl. 161), opinou a Ilustrada Procuradoria Geral de Justiça pelo não provimento do apelo (fls. 165/168).
É o relatório.
O apelo não comporta provimento.
Consta dos autos que no dia 15 de fevereiro de 2007, por volta das 15h20min, na Rua Cambará, nº 480, Rancho Grande, Comarca de Itaquaquecetuba, o adolescente Alaf de Oliveira Bertini, acompanhado dos maiores imputáveis Sérgio de Oliveira Bertini e Benedito Anselmo de Santana, subtraiu, em proveito comum, mediante grave ameaça, exercida com emprego de arma de fogo, um automóvel Ford/Fiesta, placas JLW-1552, ano 1997, cor vermelha, no valor de R$ 12.300,00 (doze mil e trezentos reais), e um aparelho celular, marca LG, avaliado em R$ 300,00 (trezentos reais), de propriedade da vítima Ivana de Jesus Silva Jascoski.
Segundo o apurado, a vítima se encontrava no interior de seu automóvel, parada em frente a garagem de uma residência, esperando para ali entrar, quando o adolescente infrator Alaf e o maior imputável Sérgio se aproximaram do veículo e anunciaram o roubo. Consta que Sérgio empunhou contra a vítima uma arma de fogo do tipo revólver, calibre 38, cano longo, por meio da qual exerceu a grave ameaça.
Na seqüência, os agentes se apoderaram do celular da vítima e ordenaram que descesse do carro. Tão logo a vítima saiu do automóvel, o adolescente e o maior imputável fugiram do local, na posse dos bens da vítima.
Policiais militares lograram abordar os agentes, na Comarca de Suzano, no momento em que desciam do carro, sendo que encontraram com o maior Sérgio a arma de fogo utilizada para consumar o delito e com o maior imputável Benedito o celular subtraído da vítima.
Acertada a decisão de procedência da ação tal como estabelecida na r. sentença, isso porque as provas produzidas nos autos não deixam dúvidas sobre a participação do adolescente Alaf de Oliveira Bertini na prática do ato infracional equiparado a roubo qualificado pelo emprego de arma e pelo concurso de agentes.
Em que pese a negativa de autoria exteriorizada pelo adolescente quando da tomada de sua oitiva informal perante a Promotoria de Justiça (fls. 27/28) e também em audiência de apresentação (fl. 47), as provas coligidas aos autos comprovam a participação ativa do menor no ato infracional.
Em depoimento prestado em Juízo, a vítima Ivana de Jesus Silva Jascoski foi enfática ao afirmar: "Na data dos fatos eu estava subindo a Rua Cambará, e parei na frente da costureira e buzinei para ela abrir o portão. Nisto estava subindo um rapaz e do outro lado estava o adolescente e um indivíduo maior. Achei que o adolescente tinha por volta de dez anos, pois parecia uma criança. Eles deram a volta e me abordaram. O indivíduo maior me mostrou a arma de fogo que estava embaixo da camiseta dele e ordenou que eu deixasse o carro em ponto morto e saísse. No veículo estavam eu, minha filha e minha neta. Minha neta foi a última a ser tirada do carro. Os dois batiam no carro para que nós saíssemos logo e o adolescente gritava "tira logo essa merda daí". O adolescente estava de acordo com tudo o que o maior fazia. Os dois mostraram-se violentos. Entraram no carro e levaram meu veículo e também meu celular. Estou com muito medo de depor na data de hoje, pois não sei se foi coincidência ou não mas já fui seguida por dois adultos. No dia em que eu vim depor na primeira vez. Estava toda a família do adolescente, eu fiquei apreensiva. Depois de duas horas do roubo me ligaram no celular dizendo que tinham encontrado o carro e que os bandidos tinham sido presos. Na delegacia reconheci o adolescente e o indivíduo maior como autores do roubo. Quando foram presos estavam em poder do meu carro e o meu celular. Reconheço o menor, visto pelo olho mágico, como um dos autores do delito." (fl. 74 - grifo nosso).
Desse modo, tem-se que a negativa de autoria exteriorizada pelo adolescente restou isolada do conjunto probatório formado nos autos, não merecendo qualquer credibilidade, posto que desamparada de outro elemento de convicção, devendo ser considerada como mera tentativa de furtar-se da conseqüência a ela inerente. Não se deve olvidar que o adolescente foi colhido em situação de flagrância.
Ademais, em casos como este, a palavra da vítima é fundamental, não devendo ser descartada, sob o risco de não haver justiça e sim impunidade.
Mister ressaltar, outrossim, o depoimento da testemunha Reinaldo Barbosa Ferreira, policial militar, ouvido em juízo sob o crivo do contraditório, que asseverou ter visto dois indivíduos descendo em um automóvel Ford Fiesta. Após avistarem a viatura, os indivíduos ficaram em atitude suspeita, quando então os policiais resolveram abordá-los. Dentro do veículo estava o adolescente e um dos indivíduos maiores, tendo sido encontrado um revólver calibre 38 e um celular. Foi verificada a placa do veículo e constatou-se que se tratava de produto de roubo. Assim relatou em juízo: "Parece que o menor disse para o delegado que tinha praticado um roubo e estavam em Suzano para praticar outro". O delegado solicitou a presença da vítima e esta reconheceu sem sombra de dúvida o adolescente e um dos maiores como autores do roubo, tendo reconhecido também o veículo como sendo seu e o celular (fl. 75).
Diante dos depoimentos colhidos, padece de credibilidade a tese ofertada pela defesa de que o menor apenas estava acompanhando seu tio, o maior imputável Sérgio de Oliveira Bertini, considerando-se "envolvido" no cometimento da ação delituosa porque não sabia das intenções de seu tio e que este o obrigou a participar e fugir do local levando o automóvel. A vítima enfatizou que o adolescente estava de acordo com tudo o que o maior fazia, sendo que ambos mostraram-se violentos. Igualmente, reconhece-se a adoção de postura ativa do apelante no ato infracional, uma vez que ordenou a vítima, gritando, que tirasse algo ou alguém do interior do veículo, já que a vítima estava acompanhada de sua filha e de sua neta.
Não obstante à prova oral colhida nos autos, apta a corroborar a autoria do ato infracional, acrescente-se que a materialidade delitiva restou igualmente demonstrada pela análise dos documentos acostados, tais como auto de prisão em flagrante delito (fls. 08/09), termos de depoimentos, declarações e interrogatório em auto de prisão em flagrante delito (fls. 10/17), boletim de ocorrência (fls. 18/20) e auto de exibição e apreensão (fls. 21/22).
Assim, todo o conjunto probatório perfez-se suficiente a embasar a procedência da representação ministerial, não havendo que se falar em fragilidade das provas carreadas, devendo ser afastado, por conseguinte, o requerimento de absolvição do recorrente.
No mais, quanto à medida socioeducativa imposta ao adolescente, ao contrário do sustentado pela defesa em suas razões recursais, a aplicação da medida de internação apresenta-se a mais adequada, afastando-se, por conseguinte o pleito de aplicação de medida de liberdade assistida.
O adolescente participou de ato infracional praticado com grave ameaça exercida com emprego de arma de fogo, não merecendo a sua participação ser reconhecida como ato de somenos importância. Embora não constem no histórico do apelante condutas desabonadoras anteriores, este envolvimento infracional, por sua gravidade, autoriza a aplicação da medida de internação consoante o artigo 122, inciso I, do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Além disso, consoante a avaliação psicológica realizada com o adolescente Alaf, foi relatado que o menor provém de estrutura familiar precária, pois reside com sua avó, tendo em vista que sua genitora se encontra presa pela prática de homicídio contra sua irmã. Também foi observado que o jovem "descreve os fatos de forma diferenciada do exposto nos autos, pouco verbaliza e denota pouca afetividade para com os familiares". Demonstra tratar-se de "pessoa com conflitos internos e que estão associados a vínculos familiares, com fixação a estágio primitivo. Apresenta capacidade de abstração espacial, consciente de suas ações, tende a ser egoísta e guiar-se pelos próprios instintos, mas com imaturidade também presente Aparentemente introvertido, com dificuldade de contato com o meio externo, deseja ser notado, apreciado e permanece ansioso até se ambientar.
Adolescente que procura esconder suas intenções, astucioso, procura ser impenetrável ao interagir com o outro, sendo presente traço de agressividade disfarçada".
Concluiu a psicóloga "que o adolescente não apresenta comprometimento, busca se esquivar da responsabilidade, não demonstra afetividade para com a família que se apresenta desestruturada" (fls. 60/61).
Destarte, as condições pessoais do adolescente aliadas à gravidade do ato infracional cometido, somando-se o evidente desvio comportamental do inimputável e a ausência do controle de seus atos por seus familiares recomendam sua segregação até que reúna condições favoráveis para retornar ao convívio social, reputando-se correta a aplicação da medida socioeducativa de internação.
ANTE O EXPOSTO, nega-se provimento ao recurso.
MARTINS PINTO
Relator
JURID - Menor. Ato Infracional. Pretensão de absolvição. [23/09/09] - Jurisprudência
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