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terça-feira, 15 de setembro de 2009

JURID - Indenização. Incêndio.Destruição completa do imóvel. [15/09/09] - Jurisprudência


Indenização. Incêndio em edificação na qual funcionava empresa familiar e residiam os autores. Destruição completa do imóvel.
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Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC

Apelação Cível n. 2009.033900-1, de Capinzal

Relator: Des. Vanderlei Romer

INDENIZAÇÃO. INCÊNDIO EM EDIFICAÇÃO NA QUAL FUNCIONAVA EMPRESA FAMILIAR E RESIDIAM OS AUTORES. DESTRUIÇÃO COMPLETA DO IMÓVEL. CURTO-CIRCUITO DECORRENTE DE OSCILAÇÃO DA ENERGIA ELÉTRICA. CAUSA DO SINISTRO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DA CELESC. REPARAÇÃO DEVIDA. SENTENÇA MANTIDA.

Se comprovado que o incêndio que assolou a moradia e a empresa familiar dos autores adveio de defeito na prestação do serviço público de energia elétrica oferecido pela empresa concessionária, certo é o dever desta de indenizar, especialmente porque não comprovada a causa excludente da sua responsabilidade civil objetiva.

RECURSO DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2009.033900-1, da comarca de Capinzal (1ª Vara), em que é apelante Centrais Elétricas de Santa Catarina S.A. - Celesc, e apelados Diocelino Zanini e Marilene Becker:

ACORDAM, em Primeira Câmara de Direito Público, por votação unânime, desprover o recurso. Custas legais.

RELATÓRIO

Diocelino Zanini e Marilene Becker ajuizaram ação de indenização contra as Centrais Elétricas de Santa Catarina S.A. - Celesc, mais tarde substituída por Celesc Distribuição S.A. Aduziram, em síntese, que são proprietários de edificação de 3 (três) pavimentos, na qual residem e trabalham na indústria que se situa no local, e, no dia 31-12-2005, em razão de curto-circuito provocado após a interrupção da energia elétrica, sobreveio um incêndio que resultou na perda de todos os bens que guarneciam o imóvel. Sustentaram, assim, a responsabilidade civil da requerida e postularam o ressarcimento pelos danos patrimoniais experimentados, no montante de R$ 89.569,00 (oitenta e nove mil quinhentos e sessenta e nove reais), bem como dos lucros cessantes relativos aos custos com locações enquanto necessárias ou até o recebimento final da indenização.

Após a contestação, a réplica e a regular instrução processual, adveio a sentença a quo, que julgou procedente em parte a pretensão para condenar a ré a pagar aos autores "a quantia de R$ 90.964,00, acrescida de correção monetária (INPC) e de juros de mora (1% ao mês), ambos a partir do evento lesivo", e, ainda, "ao pagamento integral das despesas processuais e dos honorários advocatícios, fixados estes em 10% sobre o valor atualizado da condenação" (fl. 282).

Inconformada, a Celesc interpôs recurso de apelação. Afirmou que inaplicável à hipótese é a teoria da responsabilidade civil objetiva. Disse que não ficou configurado o nexo de causalidade, porquanto o incêndio deu-se sobretudo em virtude da precariedade das instalações dos requerentes. Argumentou, ademais, que, na dúvida sobre o nexo causal, a demanda deveria ser julgada improcedente. Alegou, por outro lado, que a interrupção do fornecimento de energia elétrica ocorreu em razão das fortes chuvas e vendavais, o que caracterizou caso fortuito e de força maior. Sustentou que os autores não comprovaram que o incêndio ocorreu por ação, omissão ou falha do serviço público, de modo que não cumpriram com o ônus do art. 333, I, do CPC. Defendeu, ao menos, o reconhecimento da culpa concorrente e que os juros de mora e a correção monetária devem incidir do trânsito em julgado da condenação ou, quando muito, da citação. Pleiteou, então, a reforma integral ou parcial da sentença.

Em contrarrazões, os apelados enfatizaram que o incêndio verificou-se em razão da variação da energia elétrica no momento do seu restabelecimento, o que demonstraria a péssima qualidade do serviço. No mais, pugnaram pelo desprovimento do recurso.

VOTO

O artigo 37, § 6º, da Constituição Federal dispõe que "as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviço público responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa" (sem grifo no original).

Evidentemente que a apelante está ao alcance da norma constitucional, pois é empresa de economia mista estadual e concessionária de serviço público de energia elétrica.

É o que leciona Alexandre de Morais, em elucidativa doutrina:

[...] em relação às pessoas jurídicas de direito privado, empresas públicas, sociedades de economia mista, empresas permissionárias e concessionárias de serviço público, haverá total incidência dessa regra constitucional desde que prestem serviços públicos [...] (Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo: Jurídico Atlas, 2003. p. 899).

Para a caracterização da responsabilidade objetiva, basta apenas a comprovação do dano e do nexo causal na prestação de serviço público.

Nesse sentido:

Por força do acolhimento pela Constituição Federal da teoria objetiva no tocante à responsabilidade civil do Estado, o dever de reparar nasce, para a Administração, com a demonstração do nexo causal entre o fato e o dano (Ap. Cív. n. 98.016902-0, rel. Des. Sérgio Paladino).

Não é demais mencionar que o Código de Defesa do Consumidor determina:

Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único. Nos casos de descumprimento total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código.

No caso, o dano é evidente, pois os autores tiveram o imóvel, no qual funcionava a empresa familiar e residiam, integralmente consumido pelo fogo. As fotografias de fls. 27-30 e 42-46 bem demonstram a extensão dos prejuízos.

O nexo de causalidade, representado pela deficiência ou má-prestação do serviço público, igualmente, está comprovado.

A perícia elaborada pelo Corpo de Bombeiros da Polícia Militar esclareceu (fls. 31-41):

[...]

O foco inicial do incêndio foi identificado como sendo o soldador elétrico localizado próximo à coluna de sustentação central da edificação (Foto 07). A identificação de tal equipamento como sendo o foco inicial do incêndio se deu: Pelo elevado grau de carbonização do local em relação aos demais locais nas proximidades; Pelo maior grau de queima do caibro e demais pontos da zona de origem, inclusive com o sentido de propagação das chamas de baixo para cima e principalmente pelos traços de fusão primária localizada na fiação da parte interna do aparelho (conforme foto 10, 11, 12), o que caracteriza ponto de foco inicial de incêndio. Ainda sobre o soldador trata-se de um modelo que não dispõe de chave que liga/desliga.

[...]

Desde aproximadamente às 13h00min (informação obtida por populares e pela própria guarnição) uma queda de uma torre de sustentação de linha de transmissão elétrica provocou a falta de energia nos municípios de Capinzal, Ouro e Lacerdópolis, e desde por volta das 21h00min houve tentativas de restabelecer a normalidade, foi atendido uma ocorrência de circuito num compressor de ar conforme ocorrência n. 71262 em anexo, ocorrido por volta das 21:18 h, em uma borracharia do posto de combustível próximo ao bairro onde houve a ocorrência do incêndio objeto deste informe pericial, fenômeno que se repetiu na edificação sinistrada, não sendo possível precisar o horário do ocorrrido, mas pelas evidências próximo às 22:00 horas, sendo que o incêndio iniciou-se a partir da parte inferior do soldador parte esta que não era isolado (foto 09) permitindo que a fiação fundida e centelhas tivessem contato com a serragem que havia no chão abaixo do soldador.

[...]

Considerando o exposto até o momento, foi possível identificar a causa, sub-causa e agente ígneo. Apesar de em depoimento o proprietário afirmar que o único aparelho que permaneceu ligado à energia elétrica foi o compressor de ar o referido aparelho foi encontrado no local do incêndio sendo que a fiação bem como seu motor não tinha trações de fusão primária, e num intervalo das 1300H às 0200H a cidade permaneceu sem energia elétrica ocasionada por uma queda numa das torres de transmissão, no horário ocorrido, coincidiu quando da tentativa de restabelecimento da normalidade, momento inclusive em que provocou outro fenômeno da mesma natureza conforme documento em anexo. Quanto ao soldador, aparelho indicado como responsável pela fonte inicial de ignição (foco inicial), além dos traços de fusão primários, o aparelho não possuía chave liga/desliga e ainda não possuía isolamento na parte inferior, o que permitiu que o metal incandescente e as centelhas tivessem contato diretamente com a serragem que estava no solo em baixo do equipamento. Complementando na questão da velocidade com que as chamas tomaram conta da edificação, foi a quantidade de pneus (aproximadamente 60) depositados no primeiro pavimento, o que prejudicou o combate ao fogo pelo Corpo de Bombeiros.

[...]

De acordo com as investigações realizadas, com os depoimentos apresentados, com a correlação dos elementos obtidos e, ainda, excluindo as demais causas, os peritos concluíram que o incêndio ocorrido na residência situada à rua Acesso à Cidade Alta, 1005, bairro Jardim da Serra, Capinzal - SC, por volta das 21:17 hora do dia 31 de dezembro de 2005, teve como causa acidental de sub-causa fenômeno termoelétrico e agente ígneo centelha. (grifo no original).

E, em consonância, o laudo pericial confeccionado pela polícia técnica concluiu (fl. 26):

[...] Não se constatou indícios latentes de intencionalidade em dar início ao fogo. Constatou-se a existência de vestígios da ocorrência de curto-circuito, caracterizados pela presença de pontos de perolamento (solda) nos fios condutores de eletricidade, tratando-se do principal indício de causa da origem do sinistro. [...] (grifo no original).

Logo, a oscilação da energia elétrica no momento do seu restabelecimento foi a causa apontada para o curto-circuito que levou ao incêndio na edificação dos autores. Daí, portanto, retira-se o nexo causal.

Alexandre de Moraes esclarece novamente que a responsabilidade civil do Estado consagrada pela Constituição brasileira, apesar de objetiva, permite abrandamentos, em face da adoção da Teoria do Risco Administrativo. Assim, a responsabilidade do Estado pode ser afastada no caso de força maior, caso fortuito, ou, ainda, se comprovada a culpa exclusiva da vítima [...] (op. cit., p. 906).

Do mesmo modo, dispõe o Código de Defesa do Consumidor que a prestadora de serviço público só se eximirá da responsabilidade se comprovar a inexistência do defeito ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (art. 14, § 3º).

Significa dizer, então, que, uma vez demonstrada a causa excludente da responsabilidade, apenas nesse caso, eximir-se-á a ofensora da obrigação de indenizar.

A empresa ré alega como causas excludentes de sua responsabilidade a culpa dos requerentes e a ocorrência de caso fortuito ou força maior.

Ora, de fato, o soldador, onde teve início o incêndio, não apresentava a "chave de liga/desliga"; no entanto, como bem explicitou a perícia, isso era fruto do "modelo" do aparelho. Assim, obviamente, os autores não podem ser responsabilizados por terem-no mantido constantemente ligado, até porque, segundo consta, desconheciam esta circunstância, na medida em que pensavam que apenas o compressor de ar permanecia naquele estado.

A falta de isolamento na parte inferior do soldador e a grande quantidade de pneus, ademais, apenas contribuíram para a mais rápida propagação das chamas, mas não representaram a causa do sinistro, de responsabilidade exclusiva da empresa concessionária.

Constata-se, além disso, que o curto-circuito no imóvel dos autores não foi um fato isolado na região. Relataram os bombeiros outra ocorrência muito semelhante na mesma data e horário, situação que reforça a conclusão da inadequação do fornecimento da energia elétrica no momento.

Nesse passo, inconsistente é a tentativa de atribuir a culpa pelo infortúnio aos demandantes.

Por outro lado, as intempéries deram origem à interrupção da energia elétrica, mas não há nada que indique que tenham relação com a oscilação no restabelecimento do fornecimento do serviço, ocasião em que ocorreu o sinistro tratado nestes autos.

Infundada, pois, também é a alegação de caso fortuito ou de força maior.

Dessa forma, não comprovada nenhuma causa excludente da responsabilidade objetiva, deve a apelante suportar todos os prejuízos decorrentes do defeito no serviço público. Nesses termos, impõe-se a manutenção da sentença.

Em casos análogos, colhe-se deste Tribunal de Justiça:

INDENIZAÇÃO - INCÊNDIO - MORADIA - CURTO CIRCUITO NA REDE PÚBLICA DE ENERGIA - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO - INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS DEVIDA - PROVIMENTO PARCIAL DO RECURSO

"Produzido incêndio, resultante de curto-circuito na rede de energia elétrica, responde objetivamente a concessionária, in casu , a CELESC, pelos prejuízos causados, já que desenvolve atividade perigosa, cujos cuidados devem ser precisos e ininterruptos. Se a empresa não atende as normas técnicas e de segurança exigíveis à conservação dos fios, surge aí outro fator que reforça sua responsabilidade pelos danos causados, inobstante cuidar-se, neste caso, de responsabilidade independente de culpa" (TJSC, Ap. Cível nº 96.00043-0, Rel. Des. Carlos Prudêncio) (Ap. Cív. n. 2002.011260-2, de Palhoça, rel. Des. José Volpato de Souza, j. em 6-8-2002).

RESPONSABILIDADE CIVIL - INCÊNDIO EM RESIDÊNCIA - CURTO CIRCUITO - REDE ELÉTRICA - ACIDENTE DE CONSUMO

A responsabilidade civil das prestadoras de serviço é de natureza objetiva. Ao ocorrer incêndio em imóvel residencial, demonstrado o defeito na prestação do serviço público com a ocorrência de curto-circuito nos fios condutores, cabia à concessionária a prova de inexistência do nexo de causalidade ou de culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro (Ap. Cív. n. 2008.042008-6, de Jaraguá do Sul, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. em 29-8-2008).

Sobre os valores indenizatórios, bem ponderou o magistrado Clayton Cesar Wandscheer (fl. 281):

No que se refere ao quantum debeatur, a "Perícia de Incêndio" (Informe Pericial n. 323/2oBBM/05) de fls. 31/41, apurou o valor total de prejuízos, da ordem de R$ 89.569,00. Friso que embora tal documento mencione que o valor dos prejuízos era apenas estimado e para fins de estatística (item 7.4, fl. 38), nele foram elencados os valores da reconstrução da edificação e de cada um dos diversos bens móveis que se encontravam no seu interior, o que supre a verificação de qualquer outro tipo de prova.

Vale destacar, ainda, que ao contrário do que a ré alega na contestação, tal documento não foi elaborado de forma unilateral pelos autores: foi confeccionado pelo Estado de Santa Catarina, por seu órgão competente (Corpo de Bombeiros Militar) e assinado pelo inspetor de sinistro e 1º Tenente Marcos Alves da Silva (fl. 41).

Quanto ao pedido de pagamento de alugueres, entendo que os autores devem ser ressarcidos tão somente pelo período compreendido entre a data do sinistro (jan/2006) e o mês de abril de 2006, já que, conforme bem destacou a ré, a unidade consumidora de energia elétrica em exame passou a apresentar consumo a partir de maio de 2006.

Os valores adotados para a indenização dessa verba são de: (a) R$ 250,00 entre os dias 04/01/2006 e 19/02/2006 (Contrato de Locação de fls. 68/69); e (b) R$ 430,00 entre os dias 20/02/2006 e 30/04/2006 (Contrato de Locação de fls. 66/67). Aplicando-se a regra de três para cada um dos períodos, o total da verba alcança a cifra de R$ 1.395,00. (grifo no original).

Tais verbas foram computadas desde o evento lesivo (31-12-2005), em perfeita harmonia com a Súmula 54 do STJ.

Assim sendo, improcedente, da mesma forma, é a pretensão da apelante de cálculo a contar do trânsito em julgado da sentença ou da citação.

Por todo o exposto, o voto é pelo desprovimento do recurso.

DECISÃO

Ante o exposto, a Câmara decidiu, por votação unânime, desprover o recurso.

O julgamento, realizado no dia 4 de agosto de 2009, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Newton Trisotto, com voto, e dele participou o Exmo. Sr. Des. Sérgio Roberto Baasch Luz.

Florianópolis, 12 de agosto de 2009.

Vanderlei Romer
RELATOR

Publicado em 02/09/09




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