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terça-feira, 22 de setembro de 2009

JURID - Habeas corpus. Latrocínio. Alegado excesso de prazo. [22/09/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Latrocínio. Alegado excesso de prazo. Paciente segregado há mais de 01 ano e 08 meses.


Tribunal de Justiça do Mato Grosso - TJMT.

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

HABEAS CORPUS Nº 91618/2009 - CLASSE CNJ - 307 - COMARCA DE PARANATINGA

IMPETRANTE: DRA. SHALIMAR BENCICE - DEFENSORA PÚBLICA

PACIENTE: JOSMAR MARQUES DIAS

Número do Protocolo: 91618/2009

Data de Julgamento: 08-9-2009

EMENTA

HABEAS CORPUS - LATROCÍNIO - ALEGADO EXCESSO DE PRAZO - PACIENTE SEGREGADO HÁ MAIS DE 01 ANO E 08 MESES - ATRASO DECORRENTE DA REALIZAÇÃO DE NOVO EXAME DE INSANIDADE MENTAL REQUERIDO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO COM ANUÊNCIA DA DEFESA - INSUBSISTÊNCIA - APLICAÇÃO DA SÚMULA 64, STJ - PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE - EXCESSO QUE NÃO PODE SER DEBITADO AO PODER JUDICIÁRIO - AUSÊNCIA DE EXPERTS NO DISTRITO DA CULPA - MEDIDA DEPRECADA PARA OUTRA COMARCA - CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO DEMONSTRADO - ORDEM DENEGADA.

À luz do princípio da razoabilidade, para que se tenha configurado o constrangimento ilegal por excesso de prazo na formação da culpa não basta simplesmente a extrapolação dos prazos fixados em lei, sendo de rigor a consideração das peculiaridades do caso concreto, tudo no sentido de determinar se, de fato, ocorreu inadequado funcionamento do aparato judiciário.

Não tipifica constrangimento ilegal o excesso de prazo provocado em razão da realização de novo exame de insanidade mental requerido pelo Ministério Público com a anuência da defesa, sobretudo quando adotadas todas as providências possíveis para a realização do ato pelo Judiciário, ante a ausência de peritos no distrito da culpa.

R E L A T Ó R I O

EXMO. SR. DES. PAULO INÁCIO DIAS LESSA

Egrégia Câmara:

Trata-se de Habeas Corpus, com pedido de liminar, impetrado pela valorosa Defensoria Pública em favor de JOSMAR MARQUES DIAS, preso em flagrante delito pela suposta prática de crime de latrocínio, previsto no artigo 157, § 3º, segunda parte, do Código Penal e artigo 1º, inciso II, c/c artigo 9º, ambos da Lei nº 8.072/90.

Narra, em síntese, que o MM. Juiz de Direito da 1ª Vara de Paranatinga - MT, indeferiu o pedido de relaxamento de prisão formulado em favor do paciente sob o argumento de que o eventual excesso de prazo objurgado teria sido provocado pela defesa, quando requereu o exame de insanidade mental, que se encontra pendente de conclusão.

Sustenta, pois, restar configurado o manifesto constrangimento ilegal decorrente do excesso de prazo na formação da culpa, uma vez que o paciente se encontra segregado desde 20-12-2007, ou seja, há mais de 1 (um) ano e 8 (oito) meses.

Aduz, em síntese, estar aguardando a realização de um segundo exame de insanidade mental desde 19-3-2008, já que o primeiro efetuado foi inconclusivo.

Pugna pela concessão da liberdade provisória e conseqüente expedição de alvará de soltura, aduzindo preencher os necessários requisitos legais.

Solicitadas as informações, elas foram devidamente prestadas pela autoridade apontada como coatora, às fls. 98/99-TJ/MT.

Nesta instância, a cúpula ministerial opina pela denegação da ordem, em parecer da lavra do eminente Procurador de Justiça Dr. José de Medeiros, às fls. 105/110-TJ/MT.

É o relatório.

P A R E C E R (ORAL)

O SR. DR. JOÃO BATISTA DE ALMEIDA

Ratifico o parecer escrito.

V O T O

EXMO. SR. DES. PAULO INÁCIO DIAS LESSA (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Conforme relatado, cinge-se a matéria posta no presente remédio heróico à alegação de excesso de prazo na formação da culpa.

Cumpre ressaltar, ab initio, que, à luz do princípio da razoabilidade, para que se tenha configurado o constrangimento ilegal por excesso de prazo na formação da culpa não basta simplesmente a extrapolação dos prazos fixados em lei, sendo de rigor a consideração das peculiaridades do caso concreto, tudo no sentido de determinar se, de fato, ocorreu inadequado funcionamento do aparato judiciário.

Segundo se extrai dos autos, em especial das informações fornecidas pela douta autoridade coatora, insertas às fls. 98/99-TJ/MT, que "na data de 07/01/2008, o paciente foi denunciado pela subtração e morte de Marcelo Santiago e seu filho Salustiano, este com nove anos de idade. Segundo a denúncia o paciente desferiu um tiro na cabeça de Marcelo e outro tiro na cabeça do filho da primeira vítima. Em defesa prévia foi requerida a instauração do incidente de insanidade mental do réu. Na data de 29/01/2008, foi instaurado o incidente de insanidade mental. Na data de 12/03/2008, foi apresentado o laudo do exame respectivo. Na data de 19/03/2008, foi expedida carta precatória para a realização de novo exame para a comarca de Primavera do Leste/MT. Na data de 24/07/2008, foi encaminhada carta precatória para a comarca de Cuiabá/MT para a realização de exame de insanidade mental, tendo em vista que na comarca de Primavera do Leste/MT não havia possibilidade de sua realização. Na data de 11/11/2008, foi expedido ofício para a comarca de Cuiabá/MT, com a finalidade de colher informações a respeito da primeira carta precatória expedida. Na data de 06/08/2009, foi expedido ofício com finalidade de colher informações a respeito da primeira carta precatória expedida".

Com efeito, conforme se verifica a demora da instrução, deve-se à instauração de Incidente de Insanidade Mental requerido pelo Ministério Público em consonância com a defesa, o que por si só já afasta a ocorrência de constrangimento ilegal, a teor da Súmula 64 do Superior Tribunal de Justiça, verbis:

"Não constitui constrangimento ilegal o excesso de prazo na instrução provocado pela defesa".

Portanto, não há que se falar em constrangimento ilegal quando há causas que justifiquem a extrapolação dos prazos estabelecidos na lei processual penal ou quando a defesa ajuíza segundo pedido para apurar a condição de inimputabilidade do paciente, contribuindo, dessa forma, para o atraso na andamento do processo.

A propósito, recentemente esta Egrégia Câmara enfrentou caso semelhante, conforme consta no Habeas Corpus nº 59815/2009, de Relatoria da Dra. Graciema R. de Caravellas, julgado em 21 de julho deste ano, que por unanimidade, denegaram a ordem.

"HABEAS CORPUS - TENTATIVA DE HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO - PRISÃO PREVENTIVA - 1. PRETENDIDA REVOGAÇÃO - ADUZIDA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO - INSUBSISTÊNCIA DO ARGUMENTO - PEDIDO REFUTADO PERANTE O JUÍZO A QUO - PRESENÇA DOS REQUISITOS DA EXCEPCIONAL ACAUTELATÓRIA - GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA - PERICULOSIDADE EVIDENCIADA PELA CONCRETA GRAVIDADE DO CRIME E O SEU MODO DE EXECUÇÃO - REPERCUSÃO NEGATIVA NA SOCIEDADE LOCAL - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ENDEREÇO CERTO - 2. EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA - PACIENTE PRESO HÁ APROXIMADAMENTE 02 ANOS - PARCELA DA DEMORA ATRIBUÍDA À DEFESA - ATRASO NA CONCLUSÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL - FALTA DE PERITOS MÉDICOS HABILITADOS À REALIZAÇÃO DO EXAME - AUSÊNCIA DE DEFESA CONSTITUÍDA E SUCESSIVAS RENÚCIAS DOS ADVOGADOS NOMEADOS - INSTRUÇÃO CRIMINAL RETOMADA E ENCERRADA - EXEGESE DAS SÚMULAS 52 E 64 DO STJ - 3. ORDEM DENEGADA.

1. Não retrata constrangimento ilegal a mantença da custódia cautelar de paciente acusado de tentativa de homicídio com dupla qualificação contra a companheira, se penalmente imputável, apresenta indícios claros de periculosidade, sob o ângulo do modo de execução do crime, e sequer possui endereço certo. Nessa situação, devem prevalecer os interesses da coletividade ordeira em detrimento dos infratores da lei, sob pena de difusão da impunidade, com a inadequada inversão de valores, colocando os direitos dos que devem prestar conta dos seus atos à frente daqueles que os tiveram afrontados.

2. Inocorre excesso de prazo caracterizador de constrangimento ilegal na formação da culpa, quando parcela considerável da demora ocorreu por conta da defesa, em razão da sucessiva renúncia de causídicos nomeados para o mister; quando houve razoável atraso na conclusão do incidente de insanidade mental instaurado a pedido da defesa e, ainda, quando retomado o seu curso regular, a instrução criminal foi encerrada, estando os autos no aguardo da manifestação final da defesa. Incidência, in casu, dos enunciados das Súmulas 52 e 64 do STJ."

Acerca do tema, trago à colação de arestos do Colendo Superior Tribunal de Justiça:

"HABEAS CORPUS. CRIME DE TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. EXCESSO DE PRAZO PARA A FORMAÇÃO DA CULPA. INSTAURAÇÃO DE INCIDENTE DE INSANIDADE MENTAL. REQUERIMENTO DA DEFESA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N.º 64 DO STJ. FEITO COMPLEXO. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE.

1. Verificado que a instrução criminal está sendo conduzida sem qualquer desídia ou irregularidade, restando plenamente justificado o excesso de prazo, na medida em que não provocado pelo Juiz ou pelo Ministério Público, mas, sim, pela própria Defesa, em virtude da instauração de incidente de insanidade mental por ela requerido,incide, na espécie, o comando da Súmula n.º 64 deste Superior Tribunal de Justiça.

2. Os prazos indicados para a consecução da instrução criminal servem apenas como parâmetro geral, porquanto variam conforme as peculiaridades de cada processo, razão pela qual a jurisprudência uníssona os tem mitigado, à luz do princípio da razoabilidade, sobretudo diante da complexidade do feito, e da necessidade de expedição de carta precatória.

3. Ordem denegada." (STJ, Quinta Turma, HC 87656 / MS Relatora Ministra LAURITA VAZ, DJe 22-4-2008).

"HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR EM CONTINUIDADE DELITIVA. VIOLÊNCIA PRESUMIDA. VÍTIMAS MENORES DE 14 ANOS. PRISÃO PREVENTIVA. EXCESSO DE PRAZO (PRESO DESDE 21.02.2007). JUSTIFICADO. ORDEM DENEGADA. 1. A concessão de Habeas Corpus em razão da configuração de excesso de prazo é medida de todo excepcional, somente admitida nos casos em que a dilação (1) seja decorrência exclusiva de diligências suscitadas pela acusação; (2) resulte da inércia do próprio aparato judicial, em obediência ao princípio da razoável duração do processo, previsto no art. 5o., LXXVIII da Constituição Federal; ou (3) implique em ofensa ao princípio da razoabilidade. 2. Na hipótese, o alongamento da instrução criminal pode ser atribuído, entre outras causas, à pluralidade de vítimas (pelo menos 4 menores), à necessidade de instauração de incidente de insanidade mental e pela insistência da defesa na oitiva de testemunha que não foi localizada. Ademais, não se pode constatar qualquer desídia por parte do Juízo processante, sendo que o último despacho data do dia 03.04.2008. 3. O MPF manifesta-se pelo indeferimento do writ. 4. Ordem denegada." (STJ, Quinta Turma, HC 86734 / SP, Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 28-4-2008).

Merece destaque também parte do judicioso parecer da lavra do Procurador de Justiça Dr. José de Medeiros às fls. 105/110-TJ/MT, para quem:

"... Segundo informação trazida pela autoridade coatora, o processo encontra-se suspenso a fim de que se comprove ou não a imputabilidade do paciente mediante exame pericial.

Quanto a isso, frise-se que o laudo pericial de fls. 56-TJ aponta que o paciente não possui qualquer distúrbio e que o estado mental daquele não oferece perigo à sociedade, o que permite concluir que o paciente é imputável, sendo certo que a realização de nova perícia mostrou-se necessária apenas para responder se, ao tempo do crime, ele possuía o discernimento adequado.

Assim, ao que tudo indica, o paciente é pessoa imputável e soltá-lo nessas circunstâncias, constitui expor a sociedade aos mesmos riscos pelos quais a vítima não sobreviveram".

Portanto, sem maiores delongas, não há falar-se que o aventado excesso de prazo tenha se dado por culpa do Judiciário, porquanto se encontra comprovado que a defesa contribuiu para a demora. E, sob esse prisma não se encontra configurado constrangimento ilegal, conforme ensina Júlio Fabbrini Mirabete:

"Não há constrangimento ilegal se o excesso de prazo para o encerramento do processo é justificado, porque provocado por incidentes processuais não imputáveis ao Juiz, e resultante de diligências demoradas (complexidade do processo com vários réus, necessidade de expedição de cartas precatórias, defensores residentes em diversas cidades, obrigando a diligências de intimação, incidente de insanidade mental etc.)" (Código de Processo Penal Interpretado, 2ª ed, Atlas, p. 761).

De outro lado, impõe destacar que o crime cometido pelo paciente gerou grande repercussão negativa na sociedade local, já que ceifou a tiros a vida de pai e seu filho de 09 (nove) anos de idade, no interior da casa em que moravam numa propriedade rural, no momento em que o agente seria flagrado pela primeira vítima subtraindo armas da residência, onde trabalhava como peão. De modo que não há como se desconsiderar a seriedade do delito e as circunstâncias como os fatos ocorreram, tratando-se de réu confesso.

Ademais, a prisão do agente foi mantida a bem da ordem pública e em garantia da aplicação da lei penal.

Aliás, no ponto, também se extrai dos autos que o paciente não comprovou a existência de residência fixa na cidade, sendo certo que pela natureza de seu labor - como trabalhador em fazendas da região - se denota a inexistência de paradeiro certo, o que fragiliza a sua permanência no distrito da culpa.

Com essas considerações e em consonância com o parecer ministerial, DENEGO A ORDEM. No entanto, recomendo à indigitada autoridade coatora que confira maior celeridade à realização do exame de insanidade mental ora em exame.

É como voto.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. PAULO INÁCIO DIAS LESSA, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DES. PAULO INÁCIO DIAS LESSA (Relator), DES. RUI RAMOS RIBEIRO (1º Vogal) e DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (2º Vogal), proferiu a seguinte decisão: À UNANIMIDADE, DENEGARAM A ORDEM, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

Cuiabá, 08 de setembro de 2009.

DESEMBARGADOR PAULO INÁCIO DIAS LESSA - PRESIDENTE DA PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL E RELATOR

PROCURADOR DE JUSTIÇA

Publicado em 15/09/09




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