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quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Informativo STF 376 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Brasília, 14 a 18 de fevereiro de 2005- Nº376.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO
Plenário MP: Arquivamento de Inquérito e Irretratabilidade Responsabilidade Solidária de Assessoria Jurídica - 3 ADI: Ação Cautelar e Exceção de Suspeição Lei Orgânica da Polícia Civil e Modelo Federal Ausência de Dosimetria e Manutenção de Prisão Magistratura e Cumulação com Magistério Férias Coletivas: EC 45/2004 e Prejudicialidade 1ª Turma Notícia-Crime e Delação Anônima Sentença de Pronúncia e Eloqüência Acusatória 2ª Turma Embriaguez ao Volante e Competência Crime contra o Sistema Financeiro: Fundo de Pensão e Competência MS Coletivo: Sindicato e Legitimidade Ativa Contagem de Tempo de Serviço de Trabalhador Rural Menor de 14 Anos Clipping do DJ Transcrições Ilhas Marítimas - Domínio Insular da União - Terras Devolutas - Usucapião (RE 285615/SC) Contagem de Tempo de Serviço de Trabalhador Rural Menor de 14 Anos (AI 529694/RS) Prerrogativa de Foro e Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca (Rcl 2417/SC)
PLENÁRIO
MP: Arquivamento de Inquérito e Irretratabilidade
O Tribunal iniciou julgamento de inquérito em que se imputa a Deputado Federal e outro a suposta prática de delitos contra a liberdade e contra a organização do trabalho (CP, arts. 149; 203, § 1º, I e 207, § 1º), que teriam sido constatados por Grupo Móvel de Fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego na fazenda do parlamentar, da qual o segundo denunciado seria gerente. A defesa sustenta: a) nulidade das provas que embasam a denúncia porque produzidas pelo MP; b) inexistência de prova nova a justificar a reabertura de procedimento investigatório anteriormente arquivado pelo PGR; c) atipicidade quanto aos crimes previstos nos arts. 149 e 203, § 1º, I, do CP e d) ausência de provas em relação ao tipo do art. 207, § 1º, do CP. A Min. Ellen Gracie, relatora, não admitiu a denúncia, no que foi acompanhada pelo Min. Eros Grau. Aplicando precedente do Plenário (Inq 2028/BA, acórdão pendente de publicação), no sentido de que o pedido de arquivamento pelo órgão do Ministério Público possui caráter irretratável, não sendo passível, portanto, de reconsideração ou revisão, ressalvada a hipótese de surgimento de novas provas, entendeu que não seria possível considerar, como prova nova, no caso, a tomada dos depoimentos dos auditores fiscais, coordenadores e responsáveis pelo procedimento administrativo anteriormente arquivado pelo antecessor do atual Procurador-Geral da República. O julgamento foi suspenso com o pedido de vista do Min. Joaquim Barbosa. Inq 2054/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 16.2.2005. (Inq-2054)
Responsabilidade Solidária de Assessoria Jurídica - 3
O Pleno retomou julgamento de mandado de segurança impetrado contra ato do Tribunal de Contas da União que determinara a audiência de procuradores federais, para apresentarem, como responsáveis, as respectivas razões de justificativas sobre ocorrências apuradas na fiscalização de convênio firmado pelo INSS, em razão da emissão de pareceres técnico-jurídicos no exercício profissional - v. Informativos 328 e 343. Em voto-vista, o Min. Gilmar Mendes, ressaltando a possibilidade de os procuradores serem ouvidos em procedimento administrativo, a fim de elucidar eventuais dúvidas acerca de determinado ato administrativo, concedeu o writ por considerar, com base em precedente da Corte (MS 24073/DF, DJU de 31.10.2003), que os pareceres em questão seriam, quando muito, mero ato de administração consultiva, não havendo como se extrair dos mesmos a responsabilidade solidária pela má execução do convênio ou pela falta de prestação de contas por parte do convenente. Após o voto do Min. Eros Grau, acompanhando o Min. Gilmar Mendes, e do voto do Min. Carlos Britto, acompanhando o relator, pediu vista dos autos o Min. Cezar Peluso. MS 24584/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 16.2.2005. (MS-24584)
ADI: Ação Cautelar e Exceção de Suspeição
O Tribunal não conheceu de ação cautelar ajuizada pela Associação dos Notários e Registradores de Mato Grosso - ANOREG/MT, na qual se pretendia suspender a eficácia da Lei Estadual 8.033/2003 até o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade contra ela proposta perante o Tribunal de Justiça daquele Estado ou até o julgamento de sua liminar ou das exceções de suspeição oferecidas na ADI contra os Desembargadores do referido Tribunal. Considerado o fato de a maioria dos exceptos ter recusado a argüição de suspeição, entendeu-se que somente após o acolhimento pelo STF dos incidentes, ainda não remetidos à Corte, é que se firmaria a competência originária desta para o julgamento de qualquer matéria ligada à questão de fundo da ação. Ressaltou-se, ademais, não poder a medida cautelar, dada a sua natureza acessória à ação de cognição exauriente a que presta suporte, servir de guarida às argüições de suspeição, incabíveis no âmbito do processo objetivo de controle normativo abstrato de constitucionalidade. Vencido o Min. Marco Aurélio em relação à preliminar de conhecimento, que declinava da competência para que o Tribunal a quo decidisse a ação. AC 349/MT, rel. Min. Carlos Britto, 16.2.2005. (AC-349)
Lei Orgânica da Polícia Civil e Modelo Federal
O Tribunal iniciou julgamento de ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro contra o inciso X do parágrafo único do art. 118 da Constituição fluminense, que confere status de lei complementar à Lei Orgânica da Polícia Civil daquele Estado. O Min. Joaquim Barbosa, relator, julgou procedente o pedido ante a ausência de simetria entre a norma impugnada e a regra prevista no § 7º do art. 144 da CF, que reserva à lei ordinária a disposição sobre matéria concernente à organização e ao funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública. Considerou, ademais, que a exigência de lei complementar para disciplinar o assunto deixa de observar o modelo de separação de Poderes tal como estruturado na Constituição Federal, uma vez que cerceia indevidamente o poder de iniciativa do Executivo. O voto do relator foi acompanhado pelos Ministros Eros Grau, Gilmar Mendes, Ellen Gracie e Carlos Velloso. Em divergência, o Min. Carlos Britto votou pela improcedência do pedido, ao fundamento de que, na espécie, trata-se de matéria para qual a Constituição Federal prevê a competência legislativa concorrente dos Estados (CF: "Art. 24. ... XVI - organização, garantias, direitos e deveres das polícias civis."), salientando ser demasia recusar à Constituição estadual a faculdade para eleger determinadas matérias como exigentes de uma aprovação legislativa mais qualificada. Acompanharam o voto dissidente os Ministros Cezar Peluso, Marco Aurélio e Celso de Mello. Após, pediu vista dos autos o Min. Sepúlveda Pertence. ADI 2314/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 16.2.2005. (ADI-2314)
Ausência de Dosimetria e Manutenção de Prisão
O Pleno, por maioria, negou provimento a agravo regimental interposto contra decisão da Min. Ellen Gracie que, no exercício da Presidência do STF, negara seguimento a habeas corpus impetrado contra decisão denegatória de pretensão liberatória apresentada em favor do paciente, proferida pelo Min. Presidente do STJ, que entendera que, da ordem parcialmente concedida pela 5ª Turma desse Tribunal, em que se anulara a parte do acórdão do TRF referente à dosimetria da pena, não decorreria, como conseqüência lógica, a expedição do alvará de soltura. Entendeu-se, consoante jurisprudência reiterada do STF, que, em razão de haver condenação, não obstante a ausência da dosimetria da pena, persistiria a obrigatoriedade de recolhimento para efeito de apelação e de manutenção no cárcere até o restabelecimento da mínima parcela que houve de alteração. Vencidos os Ministros Marco Aurélio, relator, Joaquim Barbosa, Cezar Peluso e Gilmar Mendes, que davam provimento ao recurso para conceder a ordem, por considerar que, não se encontrando, ainda, aperfeiçoado o julgamento da apelação, haveria de prevalecer o direito assegurado na sentença e não impugnado pelo Ministério Público de o paciente recorrer em liberdade. HC 85340 AgR/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ acórdão Min. Ellen Gracie, 17.2.2005. (HC-85340)
Magistratura e Cumulação com Magistério
O Tribunal, por maioria, referendou liminar concedida pelo Min. Nelson Jobim, Presidente, em ação direta ajuizada pela AJUFE - Associação dos Juízes Federais do Brasil em face da Resolução 336/2003, do Conselho da Justiça Federal, para suspender a eficácia da expressão "único(a)" constante do art. 1º da norma impugnada (Resolução 336/2003: "Art. 1º Ao magistrado da Justiça Federal de primeiro e segundo graus, ainda que em disponibilidade, é defeso o exercício de outro cargo ou função, ressalvado(a) um(a) único(a) de magistério, público ou particular."). Entendeu-se que a fixação ou a imposição de que haja apenas uma "única" função de magistério não atende, a princípio, ao objetivo da Constituição Federal que, ao usar, na ressalva constante do inciso I do parágrafo único do seu art. 95, a expressão "uma de magistério", visa apenas impedir que a cumulação autorizada prejudique, em termos de horas destinadas ao magistério, o exercício da magistratura, sendo a questão, portanto, de compatibilização de horários, a ser resolvida caso a caso. Vencidos, em parte, os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto, que indeferiam a liminar. ADI 3126 MC/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 17.2.2005. (ADI-3126)
Férias Coletivas: EC 45/2004 e Prejudicialidade
Em virtude da superveniência da EC 45/2004 que, ao incluir o inciso XII ao art. 93 da CF ("a atividade jurisdicional será ininterrupta, sendo vedado férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau, funcionando, nos dias em que não houver expediente forense normal, juízes em plantão permanente;"), alterou substancialmente o citado artigo que serviria de padrão de confronto com o ato impugnado, o Tribunal julgou prejudicado pedido de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB contra o art. 253 da Lei 12.342/94, do Estado do Ceará (Código de Divisão e de Organização Judiciária), que restringe o direito dos magistrados de se ausentarem de suas comarcas durante o período de férias coletivas. ADI 3085/CE, rel. Min. Eros Grau, 17.2.2005. (ADI-3085)
PRIMEIRA TURMA
Notícia-Crime e Delação Anônima
A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se pretende o trancamento, por falta de justa causa, de notícia-crime, instaurada no STJ, por requisição do Ministério Público Federal, contra juiz estadual e dois desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado de Tocantins, pela suposta prática do delito de tráfico de influência (CP, art. 332). Sustenta o impetrante que a atuação do parquet se fez com base unicamente em denúncia anônima, o que violaria o inciso IV do art. 5º da CF ("IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;") e o disposto nos arts. 144 da Lei 8.112/90 e 14, § 1º, da Lei 8.429/92, no que versam sobre a inidoneidade da denúncia anônima para os fins quer de instauração de processo administrativo, quer de ação concernente à improbidade administrativa. O Min. Marco Aurélio, relator, concedeu a ordem por entender que a instauração de procedimento criminal originada, unicamente, de documento apócrifo seria contrária à ordem jurídica constitucional, que veda expressamente o anonimato. Salientando a necessidade de se preservar a dignidade da pessoa humana, afirmou que o acolhimento da delação anônima permitiria a prática do denuncismo inescrupuloso, voltado a prejudicar desafetos, impossibilitando eventual indenização por danos morais ou materiais, o que ofenderia os princípios consagrados nos incisos V e X do art. 5º da CF. Ressaltou, ainda, a existência da Resolução 290/2004, que criou a Ouvidoria do STF, cujo inciso II do art. 4º impede o recebimento de reclamações, críticas ou denúncias anônimas. Acompanhou o voto do relator o Min. Eros Grau. Após, pediu vista dos autos o Min. Carlos Britto. HC 84827/TO, rel. Min. Marco Aurélio, 15.2.2005. (HC-84827)
Sentença de Pronúncia e Eloqüência Acusatória
Com base na jurisprudência reiterada do STF no sentido de que a motivação da pronúncia há de se restringir, sem excesso de eloqüência acusatória, aos pressupostos da remessa do caso ao Júri (CPP, art. 408), a Turma deferiu, em parte, habeas corpus impetrado contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que confirmara sentença de pronúncia. Entendeu-se que o acórdão recorrido, no que concerne à autoria dos delitos, transformara a pronúncia em inadmissível juízo de certeza, incompatível com os limites de sobriedade e comedimento que devem ser observados nessa fase processual, sob pena de ilegítima influência sobre o ânimo dos jurados. HC deferido para anular o acórdão impugnado, a fim de que outro seja proferido, e determinar o desentranhamento da decisão questionada. Precedentes citados: HC 68606/SP (DJU de 21.2.92); HC 69133/MG (DJU de 26.6.92); HC 73126/MG (DJU de 17.5.96); e HC 77044/PE (DJU de 7.8.98). HC 85260/RJ, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 15.2.2005. (HC-85260)
SEGUNDA TURMA
Embriaguez ao Volante e Competência
Compete à Justiça Comum Estadual o julgamento do delito de embriaguez ao volante (Código de Trânsito Brasileiro, art. 306: "Conduzir veículo automotor, na via pública, sob a influência de álcool ou substância de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem"), cuja pena máxima é de três anos, haja vista não se tratar de crime de menor potencial ofensivo. Com base nesse entendimento, a Turma deferiu, em parte, habeas corpus para anular acórdão proferido pela Turma Recursal da Comarca de Barbacena - MG e determinar a remessa dos autos ao Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais para o julgamento da apelação como entender de direito. Rejeitou-se, ainda, a alegação de nulidade absoluta do processo, porquanto o impetrante não demonstrara o prejuízo na adoção do rito sumaríssimo, restringindo-se a questão à incompetência da Turma Recursal. Precedente citado: HC 81510/PR (DJU de 12.4.2002). HC 85019/MG, rel. Min. Ellen Gracie, 15.2.2005. (HC-85019)
Crime contra o Sistema Financeiro: Fundo de Pensão e Competência
A Turma negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus no qual se pretendia a nulidade do processo, sob a alegação de incompetência absoluta da Justiça Federal para julgar o recorrente por crime contra o sistema financeiro nacional praticado no exercício de atividades de entidade fechada de previdência privada. Sustentava-se, na espécie, que pelo fato de a vítima ser um fundo de pensão multipatrocinado, não haveria qualquer lesão a bens, serviços ou interesses da União, uma vez que esse seria pessoa jurídica de direito privado de fins previdenciários, assistenciais e não lucrativos, pertencente ao sistema previdenciário e não ao financeiro. Entendeu-se que não haveria razão de índole legal ou constitucional para afastar a competência da Justiça Federal para o delito financeiro praticado no âmbito de instituição previdenciária. Ademais, o fundo de pensão seria uma instituição financeira por equiparação, nos moldes do disposto na Lei 7.492/86. Asseverou-se, também, que a EC 40/2003, que dispõe sobre o Regime de Previdência Complementar, em nada repercutira na citada Lei, sendo que o envio das entidades fechadas de previdência para o capítulo constitucional reservado à seguridade social não teve por conseqüência a exclusão de tais instituições do sistema financeiro nacional. Precedentes citados: RE 198488/SP (DJU de 11.12.98); HC 83729/SC (DJU de 23.4.2004). RHC 85094/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 15.2.2005. (RHC-85094)
MS Coletivo: Sindicato e Legitimidade Ativa
Sindicato possui legitimidade para, na qualidade de substituto processual, impetrar mandado de segurança coletivo para a defesa de direitos subjetivos de parcela de seus associados, ainda que tais direitos não estejam afetos necessariamente à totalidade dos integrantes da categoria. Com base nesse entendimento, a Turma deu provimento a recurso extraordinário interposto pelo Sindicato dos Servidores Policiais do Espírito Santo - SINDIPOL contra acórdão do tribunal de justiça local que, em sede de apelação, julgara extinto, por ilegitimidade ativa, mandado de segurança impetrado pelo recorrente, no qual se impugnava ato da Diretoria da Academia de Polícia Civil do referido Estado, que oferecera curso de especialização somente a alguns policiais, com a instituição de gratificação aos escolhidos que viessem a ser aprovados. Ressaltou-se, ainda, que a anulação de concurso, em tese viciado, apesar de prejudicar os interesses de pequeno número de sindicalizados, diz respeito à defesa dos direitos da categoria como um todo, razão pela qual seria legítima a atuação do sindicato para pugnar pela sua legalidade, a fim de assegurar a todos os eventuais benefícios dele decorrentes, dentro dos princípios da moralidade, igualdade que, entre outros, devem reger os atos da Administração Pública e de seus agentes. Precedentes citados: MS 21070/DF (DJU de 22.2.91); MS 20936/DF (DJU de 11.9.92). RE 284993/ES, rel. Min. Ellen Gracie, 15.2.2005. (RE-284993)
Contagem de Tempo de Serviço de Trabalhador Rural Menor de 14 Anos
A Turma manteve decisão do STJ que reconhecera o cômputo do tempo de serviço prestado por trabalhador rural menor de quatorze anos para fins previdenciários, independentemente do recolhimento das contribuições correspondentes a esse período. Considerou-se que o acórdão recorrido está em consonância com a jurisprudência do STF, no sentido de que a regra proibitiva de trabalho ao menor (CF, art. 8º, XXXIII) não deve ser interpretada em detrimento deste. Por conseguinte, o recorrido faz jus aos benefícios previdenciários, ainda que decorrentes de relação de trabalho declarada inválida, haja vista a inaplicabilidade de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos trabalhistas. Precedentes citados: AI 105794 AgR/SP (DJU de 2.5.86); RE 104654/SP (DJU de 25.4.86). Leia a íntegra do voto condutor na seção Transcrições deste Informativo. AI 529694/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 15.2.2005. (AI-529694)
SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno16.2.200517.2.200513
1ª Turma15.2.2005--221
2ª Turma15.2.2005--237
C L I P P I N G   D O   D J
18 de fevereiro de 2005 ADI N. 3105-DF E ADI N. 3128-DF RELATOR PARA ACÓRDÃO: MIN. CEZAR PELUSO EMENTAS: 1. Inconstitucionalidade. Seguridade social. Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária. Ofensa a direito adquirido no ato de aposentadoria. Não ocorrência. Contribuição social. Exigência patrimonial de natureza tributária. Inexistência de norma de imunidade tributária absoluta. Emenda Constitucional nº 41/2003 (art. 4º, caput). Regra não retroativa. Incidência sobre fatos geradores ocorridos depois do início de sua vigência. Precedentes da Corte. Inteligência dos arts. 5º, XXXVI, 146, III, 149, 150, I e III, 194, 195, caput, II e § 6º, da CF, e art. 4º, caput, da EC nº 41/2003. No ordenamento jurídico vigente, não há norma, expressa nem sistemática, que atribua à condição jurídico-subjetiva da aposentadoria de servidor público o efeito de lhe gerar direito subjetivo como poder de subtrair ad aeternum a percepção dos respectivos proventos e pensões à incidência de lei tributária que, anterior ou ulterior, os submeta à incidência de contribuição previdencial. Noutras palavras, não há, em nosso ordenamento, nenhuma norma jurídica válida que, como efeito específico do fato jurídico da aposentadoria, lhe imunize os proventos e as pensões, de modo absoluto, à tributação de ordem constitucional, qualquer que seja a modalidade do tributo eleito, donde não haver, a respeito, direito adquirido com o aposentamento. 2. Inconstitucionalidade. Ação direta. Seguridade social. Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária, por força de Emenda Constitucional. Ofensa a outros direitos e garantias individuais. Não ocorrência. Contribuição social. Exigência patrimonial de natureza tributária. Inexistência de norma de imunidade tributária absoluta. Regra não retroativa. Instrumento de atuação do Estado na área da previdência social. Obediência aos princípios da solidariedade e do equilíbrio financeiro e atuarial, bem como aos objetivos constitucionais de universalidade, equidade na forma de participação no custeio e diversidade da base de financiamento. Ação julgada improcedente em relação ao art. 4º, caput, da EC nº 41/2003. Votos vencidos. Aplicação dos arts. 149, caput, 150, I e III, 194, 195, caput, II e § 6º, e 201, caput, da CF. Não é inconstitucional o art. 4º, caput, da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, que instituiu contribuição previdenciária sobre os proventos de aposentadoria e as pensões dos servidores públicos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações. 3. Inconstitucionalidade. Ação direta. Emenda Constitucional (EC nº 41/2003, art. 4º, § único, I e II). Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária. Bases de cálculo diferenciadas. Arbitrariedade. Tratamento discriminatório entre servidores e pensionistas da União, de um lado, e servidores e pensionistas dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, de outro. Ofensa ao princípio constitucional da isonomia tributária, que é particularização do princípio fundamental da igualdade. Ação julgada procedente para declarar inconstitucionais as expressões "cinquenta por cento do" e "sessenta por cento do", constante do art. 4º, § único, I e II, da EC nº 41/2003. Aplicação dos arts. 145, § 1º, e 150, II, cc. art. 5º, caput e § 1º, e 60, § 4º, IV, da CF, com restabelecimento do caráter geral da regra do art. 40, § 18. São inconstitucionais as expressões "cinqüenta por cento do" e "sessenta por cento do", constantes do § único, incisos I e II, do art. 4º da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, e tal pronúncia restabelece o caráter geral da regra do art. 40, § 18, da Constituição da República, com a redação dada por essa mesma Emenda. * noticiado no Informativo 357 QUEST. ORD. EM ADI N. 3.331-DF RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LIMINAR. QUESTÃO DE ORDEM. SUSPENSÃO DO ART. 2º, CAPUT, I E II; DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 4º; DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 5º E DO ART. 9º DA RESOLUÇÃO 6/2004 DA PRESIDÊNCIA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS. RITO DO ART. 12 DA LEI 9.868/1999. Conveniência de julgamento da ação segundo o rito do art. 12 da Lei 9.868/1999 e configuração do periculum in mora para deferimento de cautelar. Questão de ordem que se resolve com a suspensão de dispositivos do ato atacado que se referem a prazos para a implementação de suas disposições. Precedente: ADI 3.319-QO. * noticiado no Informativo 367 MED. CAUT. EM ADI N. 3.369-DF RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO: REMUNERAÇÃO: RESERVA DE LEI. CF, ART. 37, X; ART. 51, IV, ART. 52, XIII. ATO CONJUNTO Nº 01, DE 05.11.2004, DAS MESAS DO SENADO FEDERAL E DA CÂMARA DOS DEPUTADOS. I. - Em tema de remuneração dos servidores públicos, estabelece a Constituição o princípio da reserva de lei. É dizer, em tema de remuneração dos servidores públicos, nada será feito senão mediante lei, lei específica. CF, art. 37, X, art. 51, IV, art. 52, XIII. II. - Inconstitucionalidade formal do Ato Conjunto nº 01, de 05.11.2004, das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados. III. - Cautelar deferida. * noticiado no Informativo 374 Ext N. 897-REPÚBLICA TCHECA RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO E M E N T A: EXTRADIÇÃO PASSIVA DE CARÁTER EXECUTÓRIO - INEXISTÊNCIA DE TRATADO DE EXTRADIÇÃO ENTRE O BRASIL E A REPÚBLICA TCHECA - PROMESSA DE RECIPROCIDADE - FUNDAMENTO JURÍDICO SUFICIENTE - DUPLA TIPICIDADE - CONDENAÇÃO PELA PRÁTICA DO DELITO DE ESTELIONATO - PRETENDIDA NULIDADE DO JULGAMENTO DO EXTRADITANDO, PORQUE ALEGADAMENTE REALIZADO SOB A ÉGIDE DE REGIME AUTORITÁRIO - INOCORRÊNCIA - ALEGAÇÃO DE AUSÊNCIA DE "FAIR TRIAL" E DE JULGAMENTO POLÍTICO - AFIRMAÇÃO INCONSISTENTE - PRETENDIDA DISCUSSÃO SOBRE A PROVA PENAL PRODUZIDA PERANTE TRIBUNAL DO ESTADO REQUERENTE - INADMISSIBILIDADE - SISTEMA DE CONTENCIOSIDADE LIMITADA - EXTRADIÇÃO DEFERIDA. INEXISTÊNCIA DE TRATADO DE EXTRADIÇÃO E OFERECIMENTO DE PROMESSA DE RECIPROCIDADE POR PARTE DO ESTADO REQUERENTE. - A inexistência de tratado de extradição não impede a formulação e o eventual atendimento do pleito extradicional, desde que o Estado requerente prometa reciprocidade de tratamento ao Brasil, mediante expediente (Nota Verbal) formalmente transmitido por via diplomática. Doutrina. Precedentes. EXTRADIÇÃO E RESPEITO AOS DIREITOS HUMANOS: PARADIGMA ÉTICO-JURÍDICO CUJA OBSERVÂNCIA CONDICIONA O DEFERIMENTO DO PEDIDO EXTRADICIONAL. - A essencialidade da cooperação internacional na repressão penal aos delitos comuns não exonera o Estado brasileiro - e, em particular, o Supremo Tribunal Federal - de velar pelo respeito aos direitos fundamentais do súdito estrangeiro que venha a sofrer, em nosso País, processo extradicional instaurado por iniciativa de qualquer Estado estrangeiro. O extraditando assume, no processo extradicional, a condição indisponível de sujeito de direitos, cuja intangibilidade há de ser preservada pelo Estado a que foi dirigido o pedido de extradição (o Brasil, no caso). - O Supremo Tribunal Federal não deve autorizar a extradição, se se demonstrar que o ordenamento jurídico do Estado estrangeiro que a requer não se revela capaz de assegurar, aos réus, em juízo criminal, os direitos básicos que resultam do postulado do "due process of law" (RTJ 134/56-58 - RTJ 177/485-488), notadamente as prerrogativas inerentes à garantia da ampla defesa, à garantia do contraditório, à igualdade entre as partes perante o juiz natural e à garantia de imparcialidade do magistrado processante. Demonstração, no caso, de que o regime político que informa as instituições do Estado requerente reveste-se de caráter democrático, assegurador das liberdades públicas fundamentais. EXTRADIÇÃO E DUPLA TIPICIDADE. - A possível diversidade formal concernente ao "nomen juris" das entidades delituosas não atua como causa obstativa da extradição, desde que o fato imputado constitua crime sob a dupla perspectiva dos ordenamentos jurídicos vigentes no Brasil e no Estado estrangeiro que requer a efetivação da medida extradicional. O postulado da dupla tipicidade - por constituir requisito essencial ao atendimento do pedido de extradição - impõe que o ilícito penal atribuído ao extraditando seja juridicamente qualificado como crime tanto no Brasil quanto no Estado requerente, sendo irrelevante, para esse específico efeito, a eventual variação terminológica registrada nas leis penais em confronto. O que realmente importa, na aferição do postulado da dupla tipicidade, é a presença dos elementos estruturantes do tipo penal ("essentialia delicti"), tais como definidos nos preceitos primários de incriminação constantes da legislação brasileira e vigentes no ordenamento positivo do Estado requerente, independentemente da designação formal por eles atribuída aos fatos delituosos. PROCESSO EXTRADICIONAL E SISTEMA DE CONTENCIOSIDADE LIMITADA: INADMISSIBILIDADE DE DISCUSSÃO SOBRE A PROVA PENAL PRODUZIDA PERANTE O TRIBUNAL DO ESTADO REQUERENTE. - A ação de extradição passiva não confere, ao Supremo Tribunal Federal, qualquer poder de indagação sobre o mérito da pretensão deduzida pelo Estado requerente ou sobre o contexto probatório em que a postulação extradicional se apóia. - O sistema de contenciosidade limitada, que caracteriza o regime jurídico da extradição passiva no direito positivo brasileiro (RTJ 140/436 - RTJ 160/105 - RTJ 161/409-411 - RTJ 170/746-747 - RTJ 183/42-43), não permite qualquer indagação probatória pertinente ao ilícito criminal cuja persecução, no exterior, justificou o ajuizamento da demanda extradicional perante o Supremo Tribunal Federal. Revelar-se-á excepcionalmente possível, no entanto, a análise, pelo Supremo Tribunal Federal, de aspectos materiais concernentes à própria substância da imputação penal, sempre que tal exame se mostrar indispensável à solução de controvérsia pertinente (a) à ocorrência de prescrição penal, (b) à observância do princípio da dupla tipicidade ou (c) à configuração eventualmente política tanto do delito atribuído ao extraditando quanto das razões que levaram o Estado estrangeiro a requerer a extradição de determinada pessoa ao Governo brasileiro. * noticiado no Informativo 362 Inq N. 1.958-AC RELATOR PARA O ACÓRDÃO: MIN. CARLOS BRITTO EMENTA: INQUÉRITO. DENÚNCIA QUE FAZ IMPUTAÇÃO A PARLAMENTAR DE PRÁTICA DE CRIMES CONTRA A HONRA, COMETIDOS DURANTE DISCURSO PROFERIDO NO PLENÁRIO DE ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA E EM ENTREVISTAS CONCEDIDAS À IMPRENSA. INVIOLABILIDADE: CONCEITO E EXTENSÃO DENTRO E FORA DO PARLAMENTO. A palavra "inviolabilidade" significa intocabilidade, intangibilidade do parlamentar quanto ao cometimento de crime ou contravenção. Tal inviolabilidade é de natureza material e decorre da função parlamentar, porque em jogo a representatividade do povo. O art. 53 da Constituição Federal, com a redação da Emenda nº 35, não reeditou a ressalva quanto aos crimes contra a honra, prevista no art. 32 da Emenda Constitucional nº 1, de 1969. Assim, é de se distinguir as situações em que as supostas ofensas são proferidas dentro e fora do Parlamento. Somente nessas últimas ofensas irrogadas fora do Parlamento é de se perquirir da chamada "conexão como exercício do mandato ou com a condição parlamentar" (INQ 390 e 1.710). Para os pronunciamentos feitos no interior das Casas Legislativas não cabe indagar sobre o conteúdo das ofensas ou a conexão com o mandato, dado que acobertadas com o manto da inviolabilidade. Em tal seara, caberá à própria Casa a que pertencer o parlamentar coibir eventuais excessos no desempenho dessa prerrogativa. No caso, o discurso se deu no plenário da Assembléia Legislativa, estando, portanto, abarcado pela inviolabilidade. Por outro lado, as entrevistas concedidas à imprensa pelo acusado restringiram-se a resumir e comentar a citada manifestação da tribuna, consistindo, por isso, em mera extensão da imunidade material. Denúncia rejeitada. * noticiado no Informativo 327 RE N. 196.184-AM RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE Constitucional. Processual Civil. Mandado de segurança coletivo. Legitimidade ativa AD CAUSAM de partido político. Impugnação de exigência tributária. IPTU. 1. Uma exigência tributária configura interesse de grupo ou classe de pessoas, só podendo ser impugnada por eles próprios, de forma individual ou coletiva. Precedente: RE nº 213.631, rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 07/04/2000. 2. O partido político não está, pois, autorizado a valer-se do mandado de segurança coletivo para, substituindo todos os cidadãos na defesa de interesses individuais, impugnar majoração de tributo. 3. Recurso extraordinário conhecido e provido. * noticiado no Informativo 367 RE N. 253.906-MG RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO E FINANCEIRO. REPARTIÇÃO DO ICMS. ART. 158, IV E 161, I, DA CF/88. RESERVA DE LEI COMPLEMENTAR. USINA HIDRELÉTRICA. RESERVATÓRIO. ÁREAS ALAGADAS. 1. Hidrelétrica cujo reservatório de água se estende por diversos municípios. Ato do Secretário de Fazenda que dividiu a receita do ICMS devida aos municípios pelo "valor adicionado" apurado de modo proporcional às áreas comprometidas dos municípios alagados. 2. Inconstitucionalidade formal do ato normativo estadual que disciplina o "valor adicionado". Matéria reservada à lei complementar federal. Precedentes. 3. Estender a definição de apuração do adicional de valor, de modo a beneficiar os municípios em que se situam os reservatórios de água representa a modificação dos critérios de repartição das receitas previstos no art. 158 da Constituição. Inconstitucionalidade material. Precedentes. 4. Na forma do artigo 20, § 1º, da Constituição Federal, a reparação dos prejuízos decorrentes do alagamento de áreas para a construção de hidrelétricas deve ser feita mediante participação ou compensação financeira. Recurso extraordinário conhecido e improvido. QUEST. ORD. EM RE N. 388.846-SC RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO RECURSO EXTRAORDINÁRIO - DECISÃO DE TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS - ADMISSIBILIDADE - § 10 DO ARTIGO 14 DA LEI Nº 10.259/01. Cumpre ao presidente da turma recursal, observado o contraditório, o exercício do crivo primeiro de admissibilidade do extraordinário, presentes os pressupostos gerais de recorribilidade - adequação, oportunidade, interesse de agir, preparo e representação processual - e os específicos de que trata o inciso III do artigo 102 da Constituição Federal, não cabendo a retenção prevista no § 3º do artigo 542 do Código de Processo Civil. * noticiado no Informativo 360 HC N. 84.367-RJ RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO EMENTA: HABEAS CORPUS. PACIENTE DENUNCIADA POR OMITIR DADO TÉCNICO INDISPENSÁVEL À PROPOSITURA DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA (ART. 10 DA LEI Nº 7.347/85). ALEGADA NULIDADE DA AÇÃO PENAL, QUE TERIA ORIGEM EM PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO E INCOMPATIBILIDADE DO TIPO PENAL EM CAUSA COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Caso em que os fatos que basearam a inicial acusatória emergiram durante o Inquérito Civil, não caracterizando investigação criminal, como quer sustentar a impetração. A validade da denúncia nesses casos - proveniente de elementos colhidos em Inquérito civil - se impõe, até porque jamais se discutiu a competência investigativa do Ministério Público diante da cristalina previsão constitucional (art. 129, II, da CF). Na espécie, não está em debate a inviolabilidade da vida privada e da intimidade de qualquer pessoa. A questão apresentada é outra. Consiste na obediência aos princípios regentes da Administração Pública, especialmente a igualdade, a moralidade, a publicidade e a eficiência, que estariam sendo afrontados se de fato ocorrentes as irregularidades apontadas no inquérito civil. Daí porque essencial a apresentação das informações negadas, que não são dados pessoais da paciente, mas dados técnicos da Companhia de Limpeza de Niterói, cabendo ao Ministério Público zelar por aqueles princípios, como custos iuris, no alto da competência constitucional prevista no art. 127, caput. Habeas corpus indeferido. HC N. 85.052-MG RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE EMENTA: Júri: desaforamento: contraditório: representação do Juízo processada e julgada sem a audiência do defensor do acusado: nulidade. * noticiado no Informativo 374 Acórdãos Publicados: 256
T R A N S C R I Ç Õ E S
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica. Ilhas Marítimas - Domínio Insular da União - Terras Devolutas - Usucapião (Transcrições) RE 285615/SC*
RELATOR: MINISTRO CELSO DE MELLO
EMENTA: ILHAS MARÍTIMAS (ILHAS COSTEIRAS OU CONTINENTAIS E ILHAS OCEÂNICAS OU PELÁGICAS). SANTA CATARINA. ILHA COSTEIRA. USUCAPIÃO DE ÁREAS DE TERCEIROS NELA EXISTENTES. DOMÍNIO INSULAR DA UNIÃO FEDERAL (CF, ART. 20, IV). POSSIBILIDADE JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DE EXISTIREM, NAS ILHAS MARÍTIMAS, ÁREAS SUJEITAS À TITULARIDADE DOMINIAL DE TERCEIROS (CF, ART. 26, II, "IN FINE"). A QUESTÃO DAS TERRAS DEVOLUTAS. INEXISTÊNCIA DE PRESUNÇÃO "JURIS TANTUM" DO CARÁTER DEVOLUTO DOS IMÓVEIS PELO SÓ FATO DE NÃO SE ACHAREM INSCRITOS NO REGISTRO IMOBILIÁRIO. INSUFICIÊNCIA DA MERA ALEGAÇÃO ESTATAL DE TRATAR-SE DE IMÓVEL PERTENCENTE AO DOMÍNIO PÚBLICO. AFIRMAÇÃO QUE NÃO OBSTA A POSSE "AD USUCAPIONEM". NECESSIDADE DE EFETIVA COMPROVAÇÃO, PELO PODER PÚBLICO, DE SEU DOMÍNIO. DOUTRINA. JURISPRUDÊNCIA. DOMÍNIO DA UNIÃO FEDERAL NÃO COMPROVADO, NO CASO. POSSIBILIDADE DE USUCAPIÃO. MATÉRIA DE PROVA. PRONUNCIAMENTO SOBERANO DO TRIBUNAL RECORRIDO. SÚMULA 279/STF. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO CONHECIDO. DECISÃO: O presente recurso extraordinário foi interposto contra acórdão, que, confirmado, em sede de embargos de declaração (fls. 173/176), pelo E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região, está assim ementado (fls. 164): "USUCAPIÃO - SANTA CATARINA - ILHA COSTEIRA - CONSTITUIÇÃO FEDERAL/1967 - TERRAS DEVOLUTAS - BEM PÚBLICO. Em que pese a Constituição Federal de 1988 ter incluído nos bens da União as ilhas oceânicas e as costeiras (art. 20, IV), a Constituição Federal de 1967 estabeleceu no domínio da União somente as ilhas oceânicas. Na vigência da Constituição Federal de 1967, as terras sem registro público em nome de particular não se presumiam devolutas, cabendo à União a prova de que se tratava de bens sobre os quais exercia domínio para que fosse evitada a usucapião. Usucapião é modo originário de aquisição da propriedade que se consuma com o implemento do lapso temporal exigido em lei. A sentença, em ação de usucapião, tem eficácia meramente declaratória. Adquirida, por usucapião, sob a égide da CF/67, propriedade situada na ilha costeira de Santa Catarina, e não provado pela União que se tratava de terra devoluta, não há falar em bem de propriedade da União, insusceptível de usucapião." (grifei) A União, ao deduzir este recurso extraordinário, sustenta que o Tribunal "a quo" teria transgredido o art. 20, IV, da Constituição Federal. O Ministério Público Federal, em parecer da lavra do ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. JOÃO BATISTA DE ALMEIDA, ao opinar pelo não-conhecimento do apelo extremo, assim resumiu e expôs a controvérsia instaurada nesta sede recursal (fls. 198/201): "RECURSO EXTRAORDINÁRIO - DIREITO ADMINISTRATIVO - USUCAPIÃO - TERRAS DEVOLUTAS - ILHA COSTEIRA - NATUREZA SOB A ÉGIDE DA CONSTITUIÇÃO PRETÉRITA - DOMÍNIO DA UNIÃO NÃO COMPROVADO - ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AO ART. 20, INCISO IV, DA CF/88 - ARESTO QUE SE HARMONIZA COM O ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SOBRE O TEMA - MATÉRIA DE PROVA - PRECEDENTE - APLICAÇÃO DO ENUNCIADO DA SÚMULA 279/STF - PARECER PELO NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO. ...................................................... O recurso não merece prosperar. E isto porque, da leitura do aresto hostilizado, observa-se que, nas instâncias ordinárias, a rejeição à pretendida violação do preceito constitucional aludido como violado (art. 20, IV, da CF/88) fundou-se em matéria de fato, que, em sede de recurso extraordinário, torna-se irreversível - Súmula 279/STF, consoante se pode verificar das seguintes passagens do seu voto condutor, in verbis: 'Ora, no caso dos autos, a União não fez qualquer prova de sua dominialidade sobre as áreas objeto da ação. Em sentido contrário, os documentos acostados à inicial levam, inclusive, à presunção de que as terras são privadas, uma vez que se objetiva usucapir o 1/5 do terreno que não pode ser adquirido através do contrato de compra e venda, por tratar-se de porção de terra que coube a filho desaparecido na partilha de bens deixados em herança. A parte restante a ser usucapida, segundo os autores resulta de diferença na metragem oriunda da precariedade em que se realizavam as medições à época em que foram partilhados os bens. Ainda que tal argumento não pudesse ser considerado, poder-se-ia presumir que a área usucapida era de propriedade dos lindeiros, os quais não manifestaram qualquer oposição à ação. Uma vez não havendo prova de que o bem, sobre o qual incidiu a posse mansa e pacífica dos autores, por mais de vinte anos, era devoluto, e considerando-se, ainda, que tais fatos se deram sob a vigência da Constituição Federal de 1967, tem-se que se perfectibilizou a usucapião. Adquirida a propriedade, antes da Constituição de 1988, o direito deve ser ressalvado e declarada judicialmente a usucapião, para fins de transcrição no Registro de Imóveis.' (fls. 161/162) Por outro lado, no mérito o aresto vergastado harmoniza-se com o entendimento desse Pretório Excelso sobre o tema, como é possível atestar-se do julgamento proferido, ainda sob a égide da Constituição anterior, no RE nº 101.037/SP (Relator Exmo. Sr. Min. Francisco Rezek, DJ de 19.4.1985, p. 5.457), lavrado com ementa do seguinte teor: 'ILHAS OCEÂNICAS. C.F., ART-4.-II. HÁ DE SER ENTENDIDA ESTA EXPRESSÃO EM SEU SENTIDO TÉCNICO E ESTRITO, VISTO QUE O CONSTITUINTE DE 1967 POR CERTO NÃO PRETENDEU INSCREVER, ABRUPTAMENTE, NO DOMÍNIO DA UNIÃO, BENS SITUADOS EM CENTROS URBANOS, NAS ILHAS LITORÂNEAS, E INTEGRANTES DO PATRIMÔNIO DE ESTADOS, MUNICÍPIOS E PARTICULARES. MÉRITO DA SENTENÇA SINGULAR E DO ACÓRDÃO DO T.F.R. HIPÓTESE DE NÃO-CONHECIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO DA UNIÃO.' Ademais, ratificando o inteiro teor do parecer exarado pela Procuradoria Regional da República da 4ª Região (fls. 141/155), que, aliás, foi adotado na íntegra pelo voto condutor do aresto recorrido, impende dizer que é imprópria a argüição de ofensa à Súmula 340/STF (fl. 188), em sede de recurso extraordinário, visto não se tratar de norma constitucional, conforme reiterada jurisprudência desse Colendo Tribunal (RE nº 207.871, Relator Exmo. Sr. Min. Néri da Silveira, DJ de 28.5.1998, p. 42). Por fim, a matéria se reduz à aplicação do princípio de que tempus regit actum, salvo eventual aplicação retroativa da Constituição superveniente, a qual, não dispondo explicitamente sobre tal possibilidade, à evidência, não se presume na espécie. Ao julgar o AGRAG nº 138.986 (Relator Ministro Moreira Alves, DJ de 10.11.1995) essa Corte firmou entendimento de que 'é princípio cediço, em direito constitucional, que a aplicação imediata da Constituição alcança apenas os efeitos futuros de fatos passados, e não o que já ocorreu no passado, em face da legislação então vigente'. (...)." (grifei) Entendo assistir plena razão à douta Procuradoria-Geral da República, especialmente quando opina pelo não-conhecimento do presente recurso extraordinário, por incidir, na espécie, a Súmula 279/STF. É que o acórdão ora recorrido, ao decidir a controvérsia relativa à alegada pretensão dominial da União sobre o imóvel em litígio, dirimiu a questão à luz dos fatos e das provas existentes nos autos, circunstância esta que obsta o próprio conhecimento do apelo extremo, em face do que se contém na Súmula 279 do Supremo Tribunal Federal. A mera análise do acórdão em referência demonstra que o E. TRF/4ª Região, para confirmar a sentença proferida em primeira instância, reconheceu - com apoio em elementos de fato - que a União Federal, ora recorrente, não comprovou que o imóvel usucapiendo já se achava integrado ao seu domínio patrimonial, havendo destacado, ainda, na linha do douto parecer do Ministério Público Federal, os seguintes aspectos fático-probatórios subjacentes à decisão que proferiu (fls. 161/162): "Segundo os dados que foram trazidos aos autos, os autores têm a posse dos terrenos descritos na inicial desde 25.9.63, data em que se realizou o contrato de compra e venda entre os autores e Gercino Francisco Bittencourt e outros (escritura - fl. 64) de 4/5 dos terrenos transmitidos aos vendedores por herança. Tendo a posse se iniciado em 25.9.63, no ano de 1983, completou-se o lapso temporal de 20 anos necessários à usucapião extraordinária. A posse foi justificada na audiência de 26/2/91 (fl. 97). Presentes estavam, portanto, os requisitos necessários à aquisição da propriedade por usucapião. Restaria a discussão quanto à possibilidade de usucapir-se imóvel que não tem Registro Público, porque duvidosa a sua titularidade. Neste ponto conforme já foi mencionado neste parecer, a questão sobre o caráter devoluto de imóveis nestas circunstâncias nas ilhas costeiras foi pacificado, sob a ordem jurídica da anterior Constituição, pelo acórdão 101.037-1. Ora, no caso dos autos, a União não fez qualquer prova de sua dominialidade sobre as áreas objeto da ação. Em sentido contrário, os documentos acostados à inicial levam, inclusive, à presunção de que as terras são privadas, uma vez que objetiva-se usucapir o 1/5 do terreno que não pode ser adquirido através do contrato de compra e venda, por tratar-se de porção de terra que coube a filho desaparecido na partilha de bens deixados em herança. A parte restante a ser usucapida, segundo os autores, resulta de diferença na metragem oriunda da precariedade em que se realizavam as medições à época em que foram partilhados os bens. Ainda que tal argumento não pudesse ser considerado, poder-se-ia presumir que a área usucapida era de propriedade dos lindeiros, os quais não manifestaram qualquer oposição à ação. Uma vez não havendo prova de que o bem, sobre o qual incidiu a posse mansa e pacífica dos autores, por mais de vinte anos, era devoluto, e considerando-se ainda que tais fatos se deram sob a vigência da Constituição Federal de 1967, tem-se que perfectibilizou a usucapião. Adquirida a propriedade, antes da Constituição de 1988, o direito deve ser ressalvado e declarada judicialmente a usucapião, para fins de transcrição no Registro de Imóveis." (grifei) Vê-se, desse modo, que a pretensão recursal extraordinária deduzida pela União Federal revela-se processualmente inviável, pois - como se sabe - o recurso extraordinário não permite que se reexaminem, considerado o seu estrito âmbito temático, questões de fato ou aspectos de índole probatória (RTJ 161/992 - RTJ 186/703), quando tais circunstâncias, como sucede na espécie, se mostrarem condicionantes da própria resolução da controvérsia jurídica, tal como enfatizado no acórdão ora recorrido. Cabe referir, ainda, neste ponto, por relevante, que idêntica postulação recursal, versando a mesma controvérsia suscitada na presente causa, foi decidida pelo eminente Ministro CEZAR PELUSO, Relator do AI 421.887/SC, em julgamento - em tudo coincidente com o ora proferido - que possui o seguinte teor: "1. Trata-se de agravo de instrumento contra decisão que indeferiu processamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado: 'ADMINISTRATIVO. USUCAPIÃO. TERRAS DEVOLUTAS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. INOCORRÊNCIA. 1. Mantida a sentença que julgou procedente o pedido de usucapião, pois não ficou comprovado que se tratasse realmente de terras devolutas. Ademais, ao contrário do entendimento adotado pela decisão monocrática, as terras devolutas são bens públicos com natureza peculiar, pelo modo como foram concebidas no ordenamento jurídico; portanto, não há óbice ao usucapião desse tipo de terras. Ademais, restou comprovado o preenchimento dos requisitos necessários ao reconhecimento do domínio. 2. Apelação e remessa oficial improvidas.' (fl. 66) Sustenta a recorrente, com base no art. 102, III, a, a ocorrência de violação aos arts. 20, II, § 2º e 191, parágrafo único, da Constituição Federal. 2. Inconsistente o recurso. Diante da impossibilidade de, em recurso extraordinário, rever a Corte as premissas de fato em que, para decidir a causa, se assentou o Tribunal de origem, à luz da prova dos autos, é evidente que, para adotar outra conclusão, seria mister reexame prévio do conjunto fático-probatório, coisa de todo inviável perante o teor da súmula 279. 3. Do exposto, nego seguimento ao agravo (art. 21, § 1º, do RISTF, art. 38 da Lei nº 8.038, de 28.05.90, e art. 557 do CPC)." (grifei) Mesmo que se pudesse superar o óbice técnico representado pela Súmula 279/STF, ainda assim não se revelaria acolhível a postulação recursal que a União deduziu na presente causa. O acórdão objeto do presente recurso extraordinário bem reflete, no ponto, o entendimento que a jurisprudência desta Suprema Corte já deixara assentado a propósito da possibilidade jurídico-constitucional de existirem, nas ilhas costeiras (ou continentais), áreas sujeitas à titularidade dominial de terceiros (fls. 159/162). Com efeito, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ainda sob a égide da Carta de 1969, ao julgar o RE 101.037/SP, Rel. Min. FRANCISCO REZEK (RTJ 113/1279), pronunciou-se a respeito do tema ora em análise, fixando orientação consubstanciada em acórdão assim ementado: "Ilhas Oceânicas. CF, artigo 4º, II. Há de ser entendida esta expressão em seu sentido técnico e estrito, visto que o constituinte de 1967, por certo, não pretendeu inscrever, abruptamente, no domínio da União, bens situados em centros urbanos, nas ilhas litorâneas, e integrantes do patrimônio de Estados, municípios e particulares. Mérito da sentença singular e do acórdão do TFR. Hipótese de não conhecimento do recurso extraordinário da União." (grifei) Cumpre destacar, por relevante, que o ilustre magistrado federal de primeira instância, em sua bem lançada sentença declaratória de procedência da ação de usucapião promovida pela parte recorrida, tendo presentes os aspectos que venho de ressaltar, apreciou, de modo adequado, e com o prestigioso apoio do v. acórdão ora recorrido, o tema em análise, cabendo referir, no ponto, a seguinte e ilustrativa passagem desse ato sentencial (fls. 119/120): "Inicialmente, deve ser frisado que o simples fato de terrenos estarem localizados na ilha de Santa Catarina, por si só, não os faz pertencer ao domínio da União. A própria Constituição Federal excepciona do domínio da União as ilhas oceânicas e as costeiras quando estiverem sob o domínio dos Estados, Município ou terceiros. Assim, é necessário que se demonstre, em primeiro lugar, que o imóvel não esteja integrado ao patrimônio do Estado, Município ou terceiro. Em segundo lugar, deve restar evidenciado que o imóvel usucapiendo se encontra efetivamente sob o domínio da União. ....................................................... Por outro lado, o fato de o imóvel se localizar em ilhas costeiras e não estar registrado em nome de particular também não implica ser terra devoluta, pois, se assim fosse, a União deveria demonstrar que o imóvel não é de domínio privado, porém de seu próprio domínio, haja vista ser devoluto em ilha marítima. ....................................................... Neste contexto, é a União quem deveria demonstrar que o referido imóvel já estava integrado em seu domínio, pois é fato extintivo do direito do autor, sendo que a este incumbe somente demonstrar o tempo de sua posse e a inexistência de oposição ou interrupção. No caso destes autos, tenho que não ficou caracterizado e provado que a porção de terras, objeto do pedido desta ação, já estivesse inserida no domínio da União. O que se extrai dos autos, é que o imóvel está localizado na ilha de Santa Catarina, ausente qualquer registro de anterior proprietário." (grifei) A sentença em questão, em tudo corretamente confirmada pelo E. TRF/4ª Região, merece subsistir, eis que - cumpre não desconhecer - a mera ausência de registro imobiliário não é suficiente, só por si, para configurar a existência de domínio público, mesmo porque tal circunstância não induz à presunção, ainda que "juris tantum", de que as terras destituídas de inscrição no Registro de Imóveis sejam necessariamente devolutas, consoante tem proclamado a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que exige, do Estado, a prova inequívoca de que lhe pertence a titularidade dominial do bem imóvel: "USUCAPIÃO - DOMÍNIO PÚBLICO - TERRAS DEVOLUTAS - Cabe ao Estado o ônus da prova de que a gleba é terra devoluta." (RDA 134/208, Rel. Min. MOREIRA ALVES - grifei) Esse entendimento - que encontra apoio na autorizada lição de PONTES DE MIRANDA ("Tratado de Direito Privado", tomo XII/528, § 1.419, 2001, Bookseller) - reflete-se, por igual, na jurisprudência dos Tribunais em geral (RT 405/153 - RT 411/120 - RT 419/129 - RT 490/65 - RT 551/110 - RT 520/141): "O fato de o terreno não estar registrado não torna admissível a presunção de que é de propriedade do Estado, porque não se concebe o domínio por exclusão ou omissão. Ao Estado cumpre fazer prova de seu domínio sobre as terras que alega serem devolutas." (RT 549/204, Rel. Des. Nélson Konrad - grifei) Cabe enfatizar, por relevante, que essa mesma orientação é também prestigiada pelo magistério jurisprudencial desta Suprema Corte (RTJ 65/856 - RTJ 81/191 - RTJ 99/234): "Também a inexistência de transcrição da gleba em nome de particular não faz presumir que as terras sejam devolutas. (...). Conseqüentemente, o só fato de não se achar transcrito o imóvel não significa deva tratar-se de gleba devoluta. " (RTJ 66/797, 798, Rel. Min. RODRIGUES ALCKMIN - grifei) Em suma: não basta a mera alegação de ser devoluto o imóvel usucapiendo, pois se torna necessário que o Poder Público prove que tal bem se inclui em sua esfera de dominialidade (RT 541/131 - RT 555/223 - RT 558/95), eis que - insista-se - "Inexiste, em nosso Direito, regra que firme a presunção de serem públicas as terras que não forem objeto de transcrição" (RT 537/77-78 - grifei). O que se mostra irrecusável, considerado o que dispõem o art. 20, IV, e o art. 26, II, ambos da Constituição da República, é que nem todas as áreas existentes nas ilhas continentais (ou costeiras) acham-se incluídas no domínio patrimonial da União, pois, como anteriormente ressaltado, a própria Carta Política reconhece que, em tais ilhas, também podem existir bens pertencentes a terceiros, meros particulares. Daí a advertência de IVES GANDRA MARTINS, em obra escrita com o saudoso CELSO RIBEIRO BASTOS ("Comentários à Constituição do Brasil", vol. 3, tomo II/116, 2ª ed., 2002, Saraiva): "'Pertencem à União as áreas que não se encontram no domínio dos Estados, Municípios e de terceiros' (...). As áreas podem pertencer a terceiros, como particulares que construam casas de lazer, condomínios fechados, hotéis, à evidência, não integrando assim nenhuma das entidades federativas." (grifei) Cumpria à União Federal, portanto, provar, de modo inequívoco, que as áreas usucapiendas integravam o seu domínio patrimonial, o que - se efetivamente por ela fosse demonstrado - obstaria a consumação do usucapião. Tal, porém, não se verificou, como soberanamente afirmado pelo acórdão ora recorrido (RTJ 152/612 - RTJ 153/1019 - RTJ 158/693), circunstância esta que - ao justificar a plena incidência, no caso, da Súmula 279/STF - torna incognoscível o apelo extremo ora em exame. Vê-se, de todo esse quadro, que se mostra processualmente relevante o tópico da decisão emanada do E. TRF/4ª Região, no ponto em que adverte que a União Federal deixou de comprovar a sua titularidade dominial sobre as áreas objeto da ação de usucapião, o que implica reconhecer a ocorrência, na espécie, de insuperável obstáculo técnico, representado pela Súmula 279/STF, tal como pude assinalar, precedentemente, nesta decisão. Sendo assim, e pelas razões expostas, não conheço do presente recurso extraordinário. Publique-se. Brasília, 15 de fevereiro de 2005. Ministro CELSO DE MELLO Relator * decisão pendente de publicação Contagem de Tempo de Serviço de Trabalhador Rural Menor de 14 Anos (Transcrições) AI 529694/RS*
RELATOR: MINISTRO GILMAR MENDES
EMENTA: Agravo de instrumento. 2. Trabalhador rural ou rurícola menor de quatorze anos. Contagem de tempo de serviço. Art. 11, VII, da Lei nº 8213. Possibilidade. Precedentes. 3. Alegação de violação aos arts. 5°, XXXVI; e 97, da CF/88. Improcedente. Impossibilidade de declaração de efeitos retroativos para o caso de declaração de nulidade de contratos trabalhistas. Tratamento similar na doutrina do direito comparado: México, Alemanha, França e Itália. Norma de garantia do trabalhador que não se interpreta em seu detrimento. Acórdão do STJ em conformidade com a jurisprudência desta Corte. 4. Precedentes citados: AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 02.05.86; e RE 104.654, 2ª T., Rel. Francisco Rezek, DJ 25.04.86 5. Agravo de instrumento a que se nega provimento. RELATÓRIO: O acórdão da 5a Turma do Superior Tribunal de Justiça está assim ementado (fl. 158): "EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. PREVIDENCIÁRIO. CÔMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO POR MENOR DE 14 ANOS. QUESTÃO NOVA. I - Versando a quaestio acerca da possibilidade de averbação do período trabalhado por menor de 14 anos, para fins previdenciários, e pelo art. 55, § 2°, da Lei n° 8.213/91 determinar o cômputo do tempo de serviço do trabalhador rural, independente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes (não para contagem recíproca), a e. Terceira Seção, entendendo que a limitação etária para atividade laborativa é imposta em benefício do infante, pacificou o entendimento de que comprovado o exercício da atividade empregatícia rural, abrangida pela Previdência Social, por menor de 14 anos, é de se computar esse tempo de serviço para fins previdenciários. II - Não se presta o instituto do agravo regimental para sanar omissão apontada na decisão agravada. Ademais, verifica-se que o agravante levantou questão nova, e, portanto, incabível de ser suscitada em sede de agravo regimental. Agravo regimental desprovido." O agravante, Instituto Nacional do Seguro social - INSS, interpôs recurso extraordinário de fls. 161/169, no qual sustenta: "Pois bem, o Colendo STJ, ao dar provimento ao recurso especial, reconhecendo o cômputo do tempo de serviço prestado por menor de quatorze anos, afastou, por meio de órgão fracionário, a norma inserta no art. 11, VII, da Lei n° 8.213/91, que, a contrario sensu, exclui do menor de 14 anos a qualidade de segurado especial. Assim, a lei não reconheceu ao menor de 14 anos direitos previdenciários. Atento à negativa de vigência do mencionado dispositivo legal, a Autarquia Previdenciária interpôs agravo regimental, a fim de que o caso fosse levado a plenário. Não obstante, o recurso restou rejeitado, sob o argumento de que não se negou a constitucionalidade da referida norma, mas que a mesma foi afirmada. Não se conformando com o afastamento do art. 11, VII, da Lei n° 8.213/91 e com a violação ao art. 97 da Constituição Federal, o INSS vem interpor o presente apelo extraordinário, com base no art. 102, III, alínea "a", da Constituição Federal. 3.3. Violação ao artigo 5°, XXXVI, da CF/88 Além do disposto no art. 97 da Constituição Federal, também foi ofendido o art. 5°, inciso XXXVI, como veremos. Com efeito, o exercício de trabalho rural, no regime de economia familiar, por filhos do produtor, parceiro, meeiro, arrendatário rural, garimpeiro, pescador artesanal ou assemelhado (art. 11, VII da Lei 8.213/91), somente passou a ser reconhecido como trabalho após o advento da Lei 8.213/91. Antes da Lei 8.213/91, os filhos dos segurados especiais não eram considerados segurados, mesmo que eventualmente ajudassem no trabalho, a não ser que tivessem contribuído como autônomos. Como não contribuíram, o tempo que alegam ter trabalhado não pode ser considerado. Demonstrado, então, que o menor de 14 que trabalha com a família no campo somente passou a ser considerado segurado após o advento do art. 11, VII da Lei 8.213/91. Antes ele não era segurado. A contagem recíproca do tempo de serviço e a extensão de outros benefícios previdenciários não existia antes. Assim, se, no tempo em que trabalhou com menos de 14 anos em regime de economia familiar, o indivíduo não era considerado segurado, não pode agora ter direito a contar este tempo de serviço, pois não contribuiu como segurado e não era, à época, considerado beneficiário da previdência social. A Lei Complementar nº 11/71, que definiu o conceito de regime de economia familiar como "o trabalho dos membros da família indispensável à própria subsistência e exercido em condições de mútua dependência e colaboração" (art. 3º, § 1º, b), estabelecia em seu art. 4º que "Não será devida a aposentadoria a mais de um componente da unidade familiar, cabendo apenas beneficio ao respectivo chefe ou arrimo". Fica claro, então, que somente com a Constituição de 88, regulamentada pelo art. 11, VII, da Lei 8.213/91, é que o filho do chefe da unidade familiar passou a ter também direito a aposentadoria e mesmo assim, somente após completados 14 anos. Antes do advento da Lei 8.213/91, o filho do rurícola que trabalhava em regime de economia familiar, sem contribuir para a previdência, não era segurado, não tinha direito a contar tempo de serviço para aposentadoria. E a Lei 8.213, no seu art. 11, VII, reconheceu este direito somente aos filhos maiores de 14 anos. Assim não de pode dar aplicação retroativa da Lei 8.213/91. O autor não tem direito adquirido ao computo de tempo de serviço porque não era segurado da Previdência Social. E mesmo se aplicando a Lei 8.213/91, somento pode ser computado o trabalho de maior de 14 anos. Há que se perceber, também, que o direito ao trabalho nada tem a ver com o direito à previdência social. A regra constitucional que veda o trabalho do menor protege os direitos trabalhistas dele, não os direitos previdenciários. Os direitos oriundos da relação trabalhista dizem respeito aos direitos que o trabalhador pode exigir do empregador. Por outro lado, os direitos previdenciários não surgem simplesmente da relação trabalhista, mas da relação entre o indivíduo e a previdência social. Se o trabalhador não é segurado da previdência social, não se inscreveu no INSS, não existe relação entre aquele e esta, logo não pode o não-segurado exigir direitos da Previdência Social. Principalmente quando se trata de trabalho em regime de economia familiar, para o qual a lei não previa direitos previdenciários sem a respectiva contribuição." Contra a decisão que negou processamento ao recurso extraordinário, foi interposto agravo de instrumento. É o relatório. VOTO: Preliminarmente, não houve violação ao art. 97, da Carta Magna. Com efeito, ao apreciar a questão, o Superior Tribunal de Justiça não declarou a inconstitucionalidade do art. 11, VII, da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991. Ademais, a tese esposada pelo Tribunal está em consonância com a jurisprudência desta Corte, conforme se depreende do julgamento do AgRAI 105.794, 2ª T., Rel. Aldir Passarinho, DJ 02.05.86 e do julgamento do RE 104.654, 2ª T., Rel. Francisco Rezek, DJ 25.04.86, o que por si só afastaria a incidência do artigo 97, da Carta Magna, nos termos do artigo 481, parágrafo único, do CPC. Observe-se, trecho do voto de Rezek, no RE supra citado: "Está claro, ainda, que a regra do inciso X do mesmo dispositivo constitucional - proibindo qualquer trabalho ao menor de doze anos - foi inscrita na lista das garantias dos trabalhadores em proveito destes, e não em seu detrimento. Não me parece, assim, razoável o entendimento da origem, que invoca justamente uma norma voltada para a melhoria da condição social do trabalhador, e faz dela a premissa de uma conclusão que contraria o interesse de seu beneficiário, como que a prover nova espécie de ilustração para a secular ironia summum jus, summa injuria." Sobre o tema, destaque-se parecer que ofereci na qualidade de membro do Ministério Público Federal, no RE 104.654, de 29.01.85: "A Constituição Federal, em seu art. 165, inciso XVI, assegura ao trabalhador o direito à previdência social nos casos de doença, velhice, invalidez e morte, seguro - desemprego, seguro contra acidentes do trabalho e proteção da maternidade, mediante contribuição da União, do empregador e do empregado. Trata-se de preceito que concretiza o Estado Social em um dos seus aspectos mais relevantes, outorgando diretamente ao trabalhador o direito à previdência social, nos termos nele explicitados. 8. E como se constata, não se está diante apenas de uma norma que, de forma ampla, tem por escopo dar uma conformação justa e equânime às relações sociais, mas, efetivamente, de princípio assegurador de um direito subjetivo. É o que ensina José Afonso da Silva, in verbis: 'A Constituição vigente regula diretamente os direitos dos trabalhadores, no art. 165, onde estatui em termos inequívocos: 'A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que, nos termos da lei visem à melhoria de sua condição social'. Não parece haver dúvida, todos os direitos constantes dos incisos daquele artigo (salvos os direitos indicados nos itens V e XVIII, ainda programáticos) foram diretamente conferidos pelo constituintes aos trabalhadores reservando-se, além deles, outros que, programaticamente, nos termos da lei, visem à melhoria de sua condição social. Nem se diga que há direitos, entre os previstos, que não podem ser aferidos de imediato , como o da 'assistência sanitária, hospitalar e médica preventiva' (art. 165, nº XV). Pode ser problemático e até difícil o cumprimento' do dever contraposto a este direito. Mas aos trabalhadores corre um reconhecimento de sua exigibilidade, podendo, para tanto, recorrer as vias judiciais, para constranger as instituições de previdência ao adimplemento da prestação assistencial prevista.' (Aplicabilidade das Normas Constitucionais, 1982, pp. 178/179). 9. Em face dessas conclusões, cumpre indagar se a eventual nulidade do contrato de trabalho é apta a inviabilizar pretensão aos benefícios previdenciários. De antemão, faz-se mister assinalar que a matéria relativa aos efeitos da nulidade do contrato de trabalho constitui em diversos sistemas jurídicos autêntica vexata quaestio. Alguns autores defendem a aplicação ao contrato de trabalho das concepções civilistas, entendendo que, em caso de nulidade do aludido negócio jurídico, hão de se lhe reconhecer todos os efeitos que lhe atribui o Direito Civil, (Hueck - Nipperdey, Lehrbuch dos Arbeitsrechts, apud Mario de la Cueva, Derecho Mexicano del Trabajo, Mexico, 1969, t. 1, p. 512). Afirma-se, nessa linha de entendimento, que eventual prejuízo do empregado haverá de ser composto mediante a propositura da competente ação de indenização. 10. A doutrina dominante parece perfilhar orientação diversa, sustentando a inaplicabilidade das idéias civilistas em caso de nulidade de contrato de trabalho, porquanto impossível a restituição das partes à situação anterior. Nesse sentido, leciona Mario de La Cueva, in verbis: 'Las anteriores ideas nos parecen inadmisibles, pues, en primer término, la obligacion de pagar el salario es independiente de que se obtenga una utilidad económica y subsiste aun en el supuesto que se originenn pérdidas. En las relaciones de trabajo, el riesgo es a cargo del patrono, lo cual implica que, para el derecho del trabajo, toda prestación de servicios debe ser remunerada, cualquiera sea el resultado económico. Por otra parte, si se quiere hacer producir a la nulidad sus efectos normales, habría que retrotraer las cosas al estado que tenían antes de la formación de la relación de trabajo y de la fecha en que se inició la prestación de servicios, o sea, habría que devolver al trabajador su energía de trabajo, pues, procediendo de otra manera, se hace producir a la nulidad efectos retroactivos unilaterales, lo que no es admisible; y como la dévolución de esa energía de trabajo no es posible, es evidente que no queda otro camino que hacerle únicamente producir efectos para el futuro. Los ilustres profesores Rouast y Durand expresan que la vieja jurisprudencia francesa sostenía que la nulidade del contrato de trabajo sustraía a las partes de la aplicación del derecho del trabajo y que, consecuentemente, debían aplicarse los principios del derecho civil; según esta tesis, si el contrato de trabajo era nulo, no podían los trabajadores reclamar los beneficios de la legislación sobre accidentes de trabajo y seguros sociales; sin embargo, la jurisprudencia, al decir de nuestros tratadistas, era dudosa en el problema del pago del salario. En un párrafo posterior, critican Rouast y Durand la tesis jurisprudencial francesa: El contrato de trabajo es de tracto sucesivo y sus efectos no pueden desaparecer retroactivamente, pues algunas prestaciones quedaron cumplidas y no puede volverse sobre ellas; la nulidad no puede producir un aniquilamiento total del contrato, sino cuando se pronuncia antes de toda ejecución. Esta situación, agregan Rouast y Durand, es más fácil de alcanzar por la idea de la relacion de trabajo, pues, habiendo existido un estado de subordinación del trabajador al patrono, debe producir alguns efectos. Después de esta critica, Rouast y Durand precisan las siguientes conclusiones: a) La nulidad del contrato de trabajo no dispensa la falta de cumplimiento a las medidas de policía del trabajo (las reglas, a ejemplo, para la prevención de los infortunios del trabajo). b) La nulidad del contrato no puede hacer desaparecer el estado de subordinación en que se encontró colocado el trabajador y, según, las últimas leyes francesas, es aplicable la legislación sobre accidentes de trabajo. c) Los salarios ya pagados no deben restituir-se, porque son la contraprestación de una prestación definitiva. Si los salarios aun no se pagan, la remuneración se justifica sobre la base del enriquecimento sin causa, pero tal vez es posible sostener que 'la obligación de pagar el salario está subordinada a un simple hecho jurídico: El cumplimiento del trabajo.' El antiguo profesor de la Universidad de Marburgo ha elaborado una teoría de la nulidad en el derecho del trabajo para el problema de la capacidad de las partes, que coincide con las ideas que hemos defendido desde hace alguns años: Recuerda el profesor Krotoschin que la idea del efecto retroactivo de la nulidad no tiene, en el derecho civil, un valor absoluto y que, sobre todo, se reconoce una excepción en los contratos llamados de tracto sucesivo, 'de manera que la nulidad debe ser asimilada a la disolución que sólo produce efectos ex nunc'; consequentemente, 'las partes pueden exigir lo que les corresponde en virtud de lo contratado, hasta este momento, como derechos reputados contractuales'. Y en otro párrafo, justifica plenamente el doctor Krotoshin, la razón de esta solución: 'Se sostiene, con razón, que en el. contrato de trabajo no es posible que cada parte restituya a la otra lo que, en virtud del acto anulado, hubiese recibido. Esta solución es aceptable en el derecho del trabajo, sólo en la hipótesis de que aun no se haya iniciado el trabajo efectivamente. Pero una vez comenzada la prestación del trabajo, la situación es más compleja, ya que el empleador no podría restituir al trabajador la energia de trabajo que este hubiera empleado hasta el momento de invocarse la nulidad.' (Ob. cit., 1969, pp. 512/513) 11. 0 insigne mestre mexicano afirma que os efeitos da nulidade na relação contratual de trabalho podem ser assim resumidos: a) na hipótese do serviço não se ter iniciado, a nulidade impede a formação da relação; b) no caso da prestação de trabalho já se ter iniciado, não poderá a nulidade produzir efeitos retroativos com prejuízo para o trabalhador, fundando-se esse entendimento no próprio Direito Civil que também preserva as situações decorrentes dos chamados contratos de trato sucessivo, colocando-os a salvo da destruição retroativa. Tendo o Direito do Trabalho o duplo propósito de cuidar da vida e da saúde do trabalhador e de assegurar-lhe, mediante a proteção do salário, uma posição adequada, a nulidade da relação de emprego se assemelha, nesse aspecto, à rescisão, pondo fim à relação para o futuro. 12. Em outros sistemas jurídicos, como o alemão, problemas oriundos da nulidade do contrato de trabalho têm sido arrostados com fundamento na chamada 'Doutrina das Relações Contratuais Fáticas '(Lehre der faktischen Vertragsverhältnisse'). Tal concepção doutrinária tem o propósito, dentre outros, de oferecer solução adequada às consequências legais oriundas de um contrato nulo, mormente nas chamadas 'relações de engajamento' (Eingliederungsverhältnisse'), como nos contratos de sociedade e de trabalho, já que nesses casos a teoria clássica da nulidade dos negócios não se tem mostrado capaz de oferecer soluções adequadas. Entende-se que a execução do contrato não permite que ele seja tido por não verificado ('ungeschehen'), cuidando-se assim, de uma 'relação de trabalho fática'('faktisches Arbeitsverhältnis'), de uma 'sociedade de fato' ('faktische Gesellschaft') J. Esser e E. Schmidt , Schuldrecht, Allg. Teil, Heidelberg-Karlsruhe, 1976, pp. 110/116; Werner Flume, Das Rechtsgeschãft Berlim 1979, pp. 95/102; Hans Brox, Allgemeines Schuldrecht, München, 1982, pp. 33/36). Daí considerar essa corrente como válidas (als gültig) as aludidas relações, pelo menos no que concerne ao passado (Esser, Ob. cit., p. 114). 13. Não obstante a ampla aceitação que logrou nos meios acadêmicos e na jurisprudência, a doutrina do 'contrato fático' tem sido veementemente criticada, entendendo-se que ela constitui verdadeira ruptura com os princípios basilares da relação contratual ('Sie hat als eine 'Atombombe zur Zerstörung ge­setzestreuen juristischen Denkens erwiesen(H. Lehmann)' (Brox , Ob . cit., p. 36; Flume, Ob. cit., pp. 101/102). Sustenta Flume que os sectários dessa orientação parecem ter incidido em equívoco palmar, equiparando a nulidade do negócio jurídico (Nichtigkeit) à sua inexistência ('Nichtexistenz') no sentido das ciências naturais (Der nichtige Vertrag ist kein Nicht-Vertrag. (...) Die­se Zauberei ergibt sich nur für diejenigen, welche die Nichtigkeit des Rechtsgeschafts als Nichtexistenz im naturwissenchaft lichen Sinne ansehen") (Flume, Ob. cit., p. 102, nota nº14ª). "Entenda-se a nulidade, ao contrário, como invalidade e não se mostra difícil, para aquele que não raciocina de forma doutrinária, limitar a invalidade de maneira justa e apropriada ("Vers­tekt man dagegen die Nichtigkeit als Nicht-Geltung, so macht es für denjenigen, der nicht doktrinär denkt, keine Schwierigkeiten die Nicht-Geltung in sachgerechter Weise einzuschränken) (Ob. cit., p. 102, nota 14 a). 14. Ensina Flume que, a despeito da invalidade, há de se reconhecer significação jurídica ao negócio que venha sendo executado pelas partes nos casos em que as normas relativas ao enriquecimento sem causa (Bereicherungsrecht) se mostrem inadequadas, como ocorre nos contratos de sociedade, nos contratos de prestação de serviço e de trabalho (Flume, ob. cit., p. 555; Cfr. também Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, 1984, t. 47, pp. 469/472)). Nesse contexto, a execução de contrato de trabalho pelo menor de 18 e maior de sete anos ('beschränkter Geschäftsfähig') (BGB, § 104, I) mereceu especial atenção do emérito professor da Universidade de Bonn, como se constata na seguinte passagem, in verbis: 'Constitui entendimento amplamente majoritário que o menor que, sem autorização de seu representante legal, celebra um contrato de trabalho ou de prestação de serviço, tem pretensão ao salário ou à remuneração pela execução do trabalho, como se o contrato tivesse sido eficazmente celebrado, subsistindo seus direitos com fundamento nas normas jurídicas de proteção. Em geral, essa problemática é tratada sob a epígrafe das 'relações de trabalho fáticas' ('faktisches Arbeitsverhältnis'), como uma hipótese da chamada 'relação contratual fática' ('faktisches Vertragsverhältnis'). Como a lei determina a ineficácia de contrato celebrado pelo menor sem a anuência de representante legal tendo em vista precipuamente a proteção do incapaz, não pode corresponder ao sentido do preceito a recusa à legitimidade das pretensões oriundas do contrato, em caso de sua execução (do contrato). Daí porque se deve limitar as conseqüências de ineficácia ao efetivo sentido da lei. Fundamento das pretensões não é apenas o trabalho como fato, senão o próprio contrato.( Es ist allgemeine Meinung, dass der Minderjährige für die auf Grund eines ohne Zustimmung seines gesetzlichen Vertreters abgeschlossenen Dienst - oder Arbeitsvertrages erbrachten Dienstleistungen einen Lohn oder Gehaltsanspruch hat, wie wenn der Ver­trag wirksam abgeschlossen wäre, und dass auch seine Rechte auf Grund der Schutzvorscnriften in gleicher Weise bestehen. Im allgemeinen wird die Problematik unter dem Stichwort 'faktisches Arbeitsverhältnis' behandelt als einer der Fälle eines 'faktis­chen Vertragsverhältnisses'. Da das Gesetz die Unwirksamkeit des vom Minderjährigen ohne Zustimmung des gesetzlichen Vertreters abgeschlossenen Vertrages nur zum Schutz des Minderjährigen bestimmt, entspricht es nicht dem Sinn der gesetzlichen Regelung, dem Minderjährigen im Falle des Vollzugs des Vertrages die vertraglichen Ansprüche zu versagen. Deshalb ist die Unwirksamkeitsfolge entsprechend dem Sinn des Gesetzes zu beschränken. Grundlage der Ansprüche ist nicht nur die Leistung der Arbeit als ein Faktum, sondern der Vertrag.' (Ob. cit., p. 206). 15. Também no Direito francês, a doutrina e jurisprudência, considerando o caráter sucessivo do contrato de trabalho e a necessária proteção do salário, não tem admitido, em principio, a retroatividade dos efeitos mesmo em casos de infringência a princípio de ordem pública. A propósito, esclarecem G.H. Camerlynck e Gérard Lyon-Caen, in verbis: 'Conformément aux principes civilistes, si l'une des conditions de validité du contrat de travail fait défaut (absence de libre consentement, cause immorale ou objet illicite tel l'embauchage d'une femme de chambre dans une maison de tolérance, d'un mineur de seize ans ou d'un étranger non autorisé, la sanction est la nullité. De plus, la nullité découlant d'un vice contemporain de la formation du contrat, devrait entreiner en principe des effets rétroactifs. Se fondant sur le caractère successif du contrat de travail, et obéissant au souci évident d'assurer la protection d'un salarié, le plus souvent irresponsable, la jurisprudence, approuvée par la doctrine, a écarté la fiction civiliste de l'anéantissement rétroactif, même dans certains cas de nullité d'ordre public. Notamment le travailleur pourra réclamer le paiement de la remunération correspondant au travail exé­cuté et prévue par la convention.' (Droit du Travail, Paris, 1975, p. 142) 16. Da mesma forma, o Direito italiano exclui expressamente a nulidade retroativa nas relações de trabalho, salvo quando advenientes da ilicitude de objeto ou de causa. Tal resulta claro da seguinte observação de Santoro-Passarelli, in verbis: 'Secondo la legge' la nullità o l'annullamento non produce effetto per il periodo in cui il rapporto ha avuto esecuzione, salvo che la nullitá derivi dall'illiceità delloggetto o della causa,' e resta fermo il diritto del prestatore alla retribuzione, se nello svolgimento dell rapporto siasi commesa violazione di norme poste a sua tutela (come ad es., quele che vietano l'assunzione o stabiliscono le pause del lavoro) (art. 2.126). Ciò che la legge vuol dire, parlando inelegantemente di inefficacia dell'invalidità, è che si applica al rapporto, per il tempo in cui ha avuto esecuzione, la disciplina per lo stesso stabilita, anche quella specificamente convenuta, malgrado la nullità o l'annullamento del contratto. Ora ciò non può essere spiegato, a nostro avviso, che nel modo seguente. Se ancora, trattandosi di un rapporto di durata, può ammettersi che la retroattività dell'annullamento, come quella della condizione avverata (cfr. n° 71), trovi un limite nell'irripetibilità delle prestazione di lavoro eseguite, il che comunque non spiega pienamente la conservazione dell'intero rapporto per il corrispondente periodo, data l'invalidità del negozio, certo exclusivamente dalla legge deriva la conservazione del rapporto, quando il negozio sia radicalmente nullo. In questo senso si verifica qui l'indicata sostituzione legale dell'autonomia privata." (Nozione di Diritto del Lavoro, Napoli, 1969, pp. 147/148) 17. Também entre nós não parece existir razão para que se atribua efeito retroativo à decretação de nulidade do contrato de trabalho. Na ausência de disposição expressa, como a do Direito Italiano, e à falta de um desenvolvimento doutrinário, no tocante às 'Relações Contratuais Fáticas', há de se admitir a legitimidade das pretensões decorrentes da relação de emprego, ainda que esta venha a ser declarada inválida. Do contrário , ter-se-ía a norma protetiva aplicada contra os interesses daquele a quem visa proteger. Esta constitui sem dúvida a única solução compatível com a natureza tutelar do Direito de Trabalho. Nesse sentido, prelecionam Orlando Gomes e Elson Gottschalk, in verbis: 'A questão da ineficácia do contrato de trabalho seria resolvida em termos tão simples se fôra possível aplicar ao mesmo, com todo rigor, a teoria civilista das nulidades. Mas, a natureza especial da relação de emprego não se compadece com a retroatividade dos efeitos da decretação da nulidade. 0 princípio segundo o qual o que é nulo nenhum efeito produz não pode ser aplicado ao contrato de trabalho. É impossível aceitá-lo em face da natureza da prestação devida pelo empregado. Consistindo em força-trabalho, que implica em dispêndio de energia física e intelectual, é, por isso mesmo, insuscetível de restituição. Se a nulidade absoluta tem efeito retroativo, se repõe os contraentes no estado em que se encontravam ao estipular o contrato nulo, como se não fora celebrado, nenhuma parte tem o direito de exigir da outra o cumprimento da obrigação. Donde se segue que o empregado não tem o direito de cobrar o salário ajustado. Esta seria a consequência inelutável do princípio da retroatividade da nulidade de pleno direito. Mas, é conseqüência evidentemente absurda, ainda mesmo se admitindo que o trabalhador possa exigir a remuneração com fundamento na regra que proíbe o enriquecimento ilícito. Porque a verdade à que a retroatividade só teria cabimento se o empregador pudesse devolver ao empregado a energia que este gastou no trabalho. Mas, como isso não é possível, os efeitos da retroatividade seriam unilaterais, isto é, beneficiariam exclusivamente ao empregador, como pondera DE LA CUEVA, ao criticar a opinião de HUECK-NIPPERDEY. Deve-se admitir em toda extensão o princípio segundo o qual trabalho feito é salário ganho. Pouco importa que a prestação de serviço tenha por fundamento uma convenção nula. Em Direito do Trabalho, a regra geral há de ser a irretroatividade das nulidades. 0 contrato nulo produz efeitos até a data em que for decretada a nulidade. Subverte-se, desse modo, um dos princípios cardeais da teoria civilista das nulidades. A distinção entre os efeitos do ato nulo e do ato anulável, se permanece para alguns, não subsiste em relação a este.' (Curso Elementar de Direito do Trabalho, 1963, pp. 115/116) 18. Não parece ser outro o entendimento de Arnaldo Susse­kind (Comentários à Consolidação das Leis do trabalho, 1964, v. 3, pp. 32/35) e de Amauri Mascaro Nascimento,(Contrato de Trabalho, p. 47) 19. Assim, no caso da execução do contrato de trabalho, há de se considerar legítima toda e qualquer pretensão emanada da relação de emprego, pelo menos no tocante ao passado. 20. No caso em apreço, o v. aresto recorrido considerou que, estando vedado o exercício de atividade laboral, por força de mandamento constitucional, não poderia o INPS ser responsabilizado pelo acidente sofrido por aquele a quem a Constituição impede o exercício do trabalho remunerado (CF, art. 165, X) e, conseqüentemente, a vinculação ao regime previdenciário. 21. Não parece subsistir dúvida de que, ao assim decidir, o Egrégio Tribunal a quo extraiu conclusão contrária ao sentido e ao conteúdo do preceito constitucional. Como já amplamente demonstrado, hão de se reconhecer os efeitos jurídicos relevantes dimanados da referida relação, tendo em vista o fundamento da nulidade, não se podendo aplicar a regra protetiva em desfavor do menor. 22. Acentue-se, outrossim, que não há que se cogitar aqui da responsabilização da Previdência Social por ato ilícito de outrem, mas tão-somente de reconhecer o direito do trabalhador aos benefícios previdenciários, que não decorrem propriamente da higidez da relação de emprego, mas, e sobretudo, da prática do ato-fato-trabalho (CF, art. 165, XVI). É o que se depreende igualmente do magistério de Camerlynk e Lyon-Caen, in verbis: 'Le Droit du travail rejoint là, et par identité de motifs, les solutions formelles du droit de la Sécurité sociale. Mème en cas de nulité du contrat de travail, le salarié béneficie de la garantie, que ce soit en matière d'accidents du travail ou d'assurances, sociales. Certains auteurs verront là une application particuliare de la notion de relation de travail se substituant à celle de contrat.' (Ob. cit., p. 143)." A despeito de terem sido elaboradas sob a vigência da Constituição de 1967, parece que essas lições continuam atuais. Assim, nego provimento ao agravo. * acórdão pendente de publicação Prerrogativa de Foro e Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca (Transcrições) Rcl 2417/SC*
RELATOR: MINISTRO CARLOS BRITTO
DECISÃO: Vistos, etc. José Fritsch, Secretário Nacional de Aqüicultura e Pesca, maneja a presente reclamação constitucional. E o faz para impugnar ato praticado pelo Delegado de Polícia Federal de Florianópolis, consubstanciado na instauração de inquérito policial para apuração do delito previsto no artigo 323 do Código Eleitoral. 2. Sustenta o acionante que a autoridade reclamada é absolutamente incompetente para dirigir os autos do Inquérito Policial nº 402/2002, uma vez que, a teor da Medida Provisória nº 103/03, o titular do cargo de Secretário Nacional de Aqüicultura e Pesca tem prerrogativas, garantias, vantagens e direitos equivalentes aos de Ministro de Estado. 3. Pois bem, prossigo neste breve relato para consignar que, após declinar os fundamentos jurídicos da sua pretensão de ver julgada procedente esta reclamação, o acionante formula o seu pedido, pugnando, liminarmente, pelo imediato trancamento do referido procedimento investigatório. Já no tocante ao mérito da causa, o reclamante postula a confirmação do provimento acautelador requestado. 4. Às fls. 19, indeferi a medida liminar e determinei a remessa destes autos à douta Procuradoria-Geral da República, para manifestação. Antes, porém, consignei que esta Casa de Justiça estava prestes a julgar a Petição 3.003-QO, na qual se discutiria se detém ou não este Supremo Tribunal Federal competência para processar e julgar os titulares dos cargos arrolados no art. 38 da Lei nº 10.683/03 (antiga Medida Provisória nº 103/03). 5. A seu turno, o órgão ministerial público manifestou-se pela procedência parcial da reclamação, com a avocação do inquérito policial a esta Suprema Corte. 6. Esse o relatório. Passo a decidir. 7. Como anteriormente registrado, no julgamento da questão de ordem suscitada no seio da Petição 3.003, esta egrégia Corte começou a discutir de quem seria a competência para processar e julgar os titulares dos cargos enumerados no art. 38 da Lei nº 10.683/03. Naquela ocasião, proferi voto no sentido de que: "(...) I - Ministro de Estado é agente do Poder Executivo Federal. Agente político, mais do que simplesmente administrativo, dado que exercente do próprio Poder de que faz parte como peça essencial. É dizer: Ministro de Estado co-exerce o Poder Executivo Federal, auxiliando o Presidente da República, a teor do art. 76 da Magna Carta, in verbis: "O Poder Executivo é exercido pelo Presidente do República, auxiliado pelos Ministros de Estado." II - Ele, Ministro de Estado, justamente porque agente político, tem as competências do seu cargo estabelecidas pela própria Constituição, diretamente, como se percebe desta dicção: "Art. 87 (...) Parágrafo único. Compete ao Ministro de Estado, além de outras atribuições estabelecidas nesta Constituição e na lei: I - exercer a orientação, coordenação e supervisão dos órgãos e entidades da administração federal na área de sua competência e referendar os atos e decretos assinados pelo Presidente da República; II - expedir instruções para a execução das leis, decretos e regulamentos; III - apresentar ao Presidente da República relatório anual de sua gestão no Ministério; IV - praticar os atos pertinentes às atribuições que lhe foram outorgadas ou delegadas pelo Presidente da República." (sem os caracteres em negrito, no original). III - Além de titular de cargo diretamente nominado pela Lex Legum, o Ministro de Estado é centrado dirigente de órgão público executivo que também recebe o seu nome da mesma Constituição, por forma direta. Esse órgão, sabe-se, é chamado de "Ministério". E vai compor com o seu titular aquela mencionada parelha temática, de maneira a possibilitar a formação de um claro juízo: ministro é agente que titulariza um ministério. Ministério, circularmente, é órgão titularizado por um Ministro de Estado. Se se prefere, somente é Ministro de Estado quem dirige, superiormente, um Ministério. Só há Ministério sob a titularidade de um Ministro de Estado. "Tertius non datur". Por isso que, do conjunto normativo que a Lei das Leis devota aos Ministros de Estado, especificamente, figura dispositivo que se vaza na seguinte estrutura de linguagem: "a lei disporá sobre a criação e extinção dos Ministérios e órgãos da administração pública" (CF, art. 88). IV - Se o Poder Executivo Federal é bipolar ou necessariamente dúplice - visto que formado por um Chefe e seus auxiliares Ministros -, o Ministério é parte integrante de um aparelho estatal executivo que a Lei Maior nomina de "Administração Pública Direta"; ou seja, aquele aparato de poder que a Lei das Leis chama de "Administração Pública Direta" é formado, no âmbito do Poder Executivo, de duas porções elementares: "ministérios e órgãos". É ainda dizer: ministérios, de um lado, e, de outro, órgãos executivos sem essa explícita qualificação de ministérios. Órgãos não ministeriais, portanto. Embora de Administração igualmente Direta. É a bipolaridade que ressai desses dois dispositivos constitucionais: "Art. 48 - Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre: (...) XI - criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública; (...)". ******************************************* Art. 61 - (...) § 1o - São de iniciativa privativa do Presidente da República leis que: (...) II - disponham sobre: (...) e) criação e extinção de Ministérios e órgãos da administração pública, observado o disposto no art. 84, VI; (...)" V - Esse vínculo funcional que a Magna Carta estabelece entre ministro e ministério não pode sofrer desfazimento por conduto de lei. A lei menor não pode desenlaçar os dois termos. São coisas inapartáveis, por definição, pois o regime jurídico de uma e de outra figura, à semelhança do enlace operacional entre Presidência e Presidente, decorre é do Texto Magno mesmo. Quer dizer, se Presidente da República é somente quem chefia a Presidência da República, o mesmo é de se dizer para um Ministro de Estado. Somente ele é quem chefia um Ministério, tanto quanto um Ministério é aquela unidade de serviço executivo que é chefiada por Ministro de Estado. Só e só. VI - É nessa constitucional condição de titular de um ministério - unidade mais importante de toda a Administração Pública Federal - que o Ministro de Estado desfruta de foro especial. Foro especial por prerrogativa de função... ministerial. Tudo resultante de comando ainda uma vez emitido pela Constituição Republicana, diretamente. Insuscetível de remodelagem por outro cinzel legislativo que não seja daquela mesma estirpe constitucional. 16. Este encadeado raciocínio não recusa à lei menor a força de conferir "status" de ministro, para certos efeitos, a quem ministro não é. São os contraídos efeitos a que se refere o percuciente Ministro Celso de Mello, já mencionados linhas atrás. Modo criativo e pragmático de sobrevalorizar determinadas funções e autoridades, mas sem aquela plenitude eficacial que implicaria até mesmo ampliar o rol das competências do Supremo Tribunal Federal. 17. Esclareça-se que esta mesma lucubração não importa desconhecer que é próprio da lei menor criar ministérios e os cargos de Ministros de Estado. Evidente. O que se está a negar é a possibilidade de a lei infraconstitucional separar o que a Constituição uniu. Tal como se diz na liturgia católica dos casamentos, com a frase altissonante: "O que Deus uniu, o homem não separe". 18. Uma ponderação, todavia, é de se fazer. Por uma arraigada tradição republicana, entre nós, há um ministério que não recebe a designação de ministério. Refiro-me à Casa Civil da Presidência da República, esse ministério sem especialidade operativa. Esse ministério geral, sem especificidade temática, e que por isso mesmo é chamado de "civil". Sintomaticamente chamado de "civil", pelo fato de cuidar daquela porção de atividade corriqueiramente executiva e que remanesce das outras. Que não se encaixa, pela sua extrema generalidade, em nenhum outro setor particular de atuação estatal executiva. Mas que tudo coordena e sintetiza, na perspectiva de uma intercalação necessária de todos os outros ministérios com a Presidência da República. 19. De fora parte esse ministério-ponte, cuja especialidade é não ter especialidade alguma, é do meu pensar que nenhuma outra exceção ao enlace funcional Ministro/Ministério é de se admitir, na esfera do Poder Executivo e da Administração Pública Federal. 20. Nessa visão constitucional das coisas, penso inadmissível que a competência estabelecida pelo art. 102 da CF (que é em numerus clausus), com referência às pessoas dos Ministros de Estado, possa estender-se a cargos de feição exclusivamente administrativa. Cargos, esses, nominados e formalizados apenas por lei, como no caso em tela (art. 8º, § 1º, inciso I, da citada Lei nº 10.683/03)". 8. É verdade que essa instigante discussão restou abortada diante da superveniente perda de objeto do mencionado feito. No entanto, na Sessão plenária de 17.12.2004, tema idêntico ao presente voltou a ser debatido nesta Casa Maior da Justiça brasileira. Refiro-me à questão enfrentada por ocasião do julgamento do Inquérito 2.044-QO, Rel. Min. Sepúlveda Pertence. Na oportunidade, este Supremo Tribunal Federal declarou a sua incompetência para processar e julgar o feito, ao entendimento de que o Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca, por não ser Ministro de Estado, não possui a prerrogativa de foro estabelecida no parágrafo único do artigo 25 da Lei nº 10.683/2003, com a redação dada pela Lei nº 10.869/04. Além disso, esta egrégia Corte decidiu que a extensão de prerrogativas, garantias, vantagens e direitos equivalentes aos Ministros de Estado a que alude o § 1º do art. 38 do referido diploma legislativo repercute somente nas esferas administrativa, financeira e protocolar, mas não na estritamente constitucional (Informativo nº 374 do STF). 9. Nessa ampla moldura, frente ao art. 21, § 1º, do RI/STF, nego seguimento à reclamação. Intime-se. Publique-se. Brasília, 17 de fevereiro de 2005. * decisão pendente de publicação

Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva informativo@stf.jus.br

 
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Informativo STF - 376 - Supremo Tribunal Federal

 

 

 

 

 

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