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quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Informativo STF 449 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF


Brasília, 20 a 24 de novembro de 2006 - Nº 449.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO



Plenário
Alienação Fiduciária e Depositário Infiel - 1
Alienação Fiduciária e Depositário Infiel - 2
Alienação Fiduciária e Depositário Infiel - 3
ADI e ICMS - 1
ADI e ICMS - 2
ADI e ICMS - 3
ADI e ICMS - 4
Reclamação: Desapropriação e Coisa Julgada - 3
Art. 17 do ADCT e Coisa Julgada - 3
1ª Turma
ED: Efeitos Modificativos e Defesa Preliminar
Sursis Processual e Cabimento de HC
2ª Turma
Crime Militar e Agravamento de Pena
Ordem do Rito e Sustentação Oral - 1
Ordem do Rito e Sustentação Oral - 2
HC: Legitimidade Ativa do Ministério Público e Auditoria Militar
Efeito Suspensivo em RE e Diploma de Jornalista
Transcrições
Processo Administrativo: Ampla Defesa e Contraditório (MS 25787/DF)


PLENÁRIO


Alienação Fiduciária e Depositário Infiel - 1

O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário no qual se discute a constitucionalidade da prisão civil do depositário infiel nos casos de alienação fiduciária em garantia (DL 911/69: "Art. 4º Se o bem alienado fiduciariamente não for encontrado ou não se achar na posse do devedor, o credor poderá requerer a conversão do pedido de busca e apreensão, nos mesmos autos, em ação de depósito, na forma prevista no Capítulo II, do Título I, do Livro IV, do Código de Processo Civil."). O Min. Cezar Peluso, relator, negou provimento ao recurso, por entender que a aplicação do art. 4º do DL 911/69, em todo o seu alcance, é inconstitucional. Afirmou, inicialmente, que entre os contratos de depósito e de alienação fiduciária em garantia não há afinidade, conexão teórica entre dois modelos jurídicos, que permita sua equiparação. Asseverou, também, não ser cabível interpretação extensiva à norma do art. 153, § 17, da EC 1/69 - que exclui da vedação da prisão civil por dívida os casos de depositário infiel e do responsável por inadimplemento de obrigação alimentar - nem analogia, sob pena de se aniquilar o direito de liberdade que se ordena proteger sob o comando excepcional. Ressaltou que, à lei, só é possível equiparar pessoas ao depositário com o fim de lhes autorizar a prisão civil como meio de compeli-las ao adimplemento de obrigação, quando não se deforme nem deturpe, na situação equiparada, o arquétipo do depósito convencional, em que o sujeito contrai obrigação de custodiar e devolver.
RE 466343/SP, rel. Min. Cezar Peluso, 22.11.2006. (RE-466343)

Alienação Fiduciária e Depositário Infiel - 2

Em seguida, o Min. Gilmar Mendes acompanhou o voto do relator, acrescentando aos seus fundamentos que os tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil possuem status normativo supralegal, o que torna inaplicável a legislação infraconstitucional com eles conflitantes, seja ela anterior ou posterior ao ato de ratificação e que, desde a ratificação, pelo Brasil, sem qualquer reserva, do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 11) e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica (art. 7º, 7), não há mais base legal para a prisão civil do depositário infiel. Aduziu, ainda, que a prisão civil do devedor-fiduciante viola o princípio da proporcionalidade, porque o ordenamento jurídico prevê outros meios processuais-executórios postos à disposição do credor-fiduciário para a garantia do crédito, bem como em razão de o DL 911/69, na linha do que já considerado pelo relator, ter instituído uma ficção jurídica ao equiparar o devedor-fiduciante ao depositário, em ofensa ao princípio da reserva legal proporcional. Após os votos dos Ministros Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Carlos Britto e Marco Aurélio, que também acompanhavam o voto do relator, pediu vista dos autos o Min. Celso de Mello.
RE 466343/SP, rel. Min. Cezar Peluso, 22.11.2006. (RE-466343)

Alienação Fiduciária e Depositário Infiel - 3

O Tribunal retomou julgamento de recuso extraordinário no qual se discute a constitucionalidade da prisão civil do depositário infiel nos casos de alienação fiduciária em garantia - v. Informativo 304. O Min. Gilmar Mendes, em voto-vista, acompanhou o voto do relator para negar provimento ao recurso, adotando os fundamentos expendidos no caso acima relatado. No mesmo sentido votaram os Ministros Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio. Após, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min. Celso de Mello.
RE 349703/RS, rel. Min. Ilmar Galvão, 22.11.2006. (RE-349703)

ADI e ICMS - 1

O Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Governador do Estado do Paraná para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 3º, caput, I, II e III e § 1º; 4º, § 2º; e 7º, todos da Lei estadual 13.670/2002, que institui o Programa de Incentivos à Produção e à Industrialização do Algodão do Paraná - PROALPAR, e concede, às indústrias dele integrantes, créditos fiscais relativos ao ICMS, bem como determina o recolhimento de percentagem desse crédito fiscal para fins de apoio aos produtores e à pesquisa de algodão. Entendeu-se caracterizada a ofensa ao art. 155, § 2º, XII, g, da CF, que exige a prévia celebração de convênio entre os Estados-membros e o Distrito Federal, nos termos de lei complementar, para concessão de isenções, incentivos e benefícios fiscais relativos a créditos do ICMS, e ao art. 167, IV, da CF, que veda a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa. Precedentes citados: ADI 2376 MC/RJ (DJU de 4.5.2001), ADI 2157 MC/BA (DJU de 7.12.2000); ADI 902 MC/SP (DJU de 22.4.94).
ADI 2722/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 22.11.2006. (ADI-2722)

ADI e ICMS - 2

O Tribunal conheceu, em parte, de ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do Paraná, mas julgou improcedente o pedido nela formulado de declaração de inconstitucionalidade do Decreto 43.891/2004, do Estado de Minas Gerais, que altera o regulamento local do ICMS e concede redução da base de cálculo do imposto nas operações internas de aquisição de farinha de trigo e sua mistura pré-preparada. Entendeu-se que a concessão do referido benefício fiscal ampara-se no Convênio Confaz-ICMS 128/94, que autoriza os Estados e o Distrito Federal a instituir carga tributária reduzida para as operações internas com mercadorias da cesta básica, e que foi respeitada a fixação do limite mínimo de carga tributária de 7% (sete por cento) do ICMS previsto no aludido Convênio.
ADI 3410/MG, rel. Min. Joaquim Barbosa, 22.11.2006. (ADI-3410)

ADI e ICMS - 3

Por vislumbrar ofensa ao art. 155, § 2º, XII, g, da CF, que exige a prévia celebração de convênio entre os Estados-membros e o Distrito Federal, nos termos de lei complementar, para concessão de isenções, incentivos e benefícios fiscais relativos a créditos do ICMS, o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 1º, 5º e 7º, da Lei Complementar 231/2000, do Estado de Rondônia, e por arrastamento dos demais artigos do mesmo diploma legal, que institui o Programa de Incentivo Tributário, objetivando incentivar a implantação, ampliação e modernização de empreendimentos industriais e agroindustriais no Estado, e concede crédito presumido e redução da base de cálculo de ICMS.
ADI 3429/RO, rel. Min. Carlos Britto, 22.11.2006. (ADI-3429)

ADI e ICMS - 4

O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República para declarar a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 2º, e do art. 5º, ambos da Lei 12.223/2005, do Estado do Rio Grande do Sul, que institui o Fundo Partilhado de Combate às Desigualdades Sociais e Regionais do Estado do Rio Grande do Sul, e estabelece que as empresas que contribuírem para o referido Fundo poderão compensar, por meio de crédito fiscal presumido, o valor efetivamente depositado em benefício do Fundo com ICMS a recolher, limitado a 95% do imposto devido em cada período de apuração, e que o montante alocado ao Fundo, passível de compensação, não poderá ser superior a 30% do total do ICMS recolhido pelos setores de combustíveis, energia elétrica e serviços de comunicação, no exercício de 2004. Entendeu-se que os dispositivos impugnados, ao possibilitarem o direcionamento, pelos contribuintes, do valor devido a título de ICMS para o mencionado Fundo, compensando-se, em contrapartida, o valor despendido sob a forma de crédito fiscal presumido, criaram um mecanismo de redirecionamento da receita do ICMS para a satisfação de finalidades específicas e predeterminadas em afronta ao art. 167, IV, da CF, que veda a vinculação das receitas provenientes da arrecadação de impostos a órgão, fundo ou despesa. Vencido o Min. Marco Aurélio que, equiparando o Fundo analisado ao Fundo de Combate à Pobreza, previsto no art. 82 do ADCT, julgava improcedente o pleito, considerando estar autorizada, pelo § 1º do referido art. 82, a vinculação procedida.
ADI 3576/RS, rel. Min. Elen Gracie, 22.11.2006. (ADI-3576)

Reclamação: Desapropriação e Coisa Julgada - 3

O Tribunal retomou julgamento de reclamação proposta pela União contra decisões proferidas por desembargador do TRF da 4ª Região que, ao antecipar tutela pedida em agravos de instrumento, permitira o levantamento de valores depositados a título de indenização e consectários nos autos de ação de desapropriação - v. Informativo 425. O Min. Joaquim Barbosa, em voto-vista, divergiu do relator e julgou procedente o pedido formulado. Entendeu inexistir preclusão ou coisa julgada relativamente à questão de propriedade, porquanto - não obstante suscitada pela União em ambas as instâncias ordinárias de jurisdição -, ainda não decidida, eis que a sentença proferida na ação de desapropriação nada pronunciara a esse respeito e o acórdão da apelação determinara que tal alegação haveria de ser apreciada por ocasião do levantamento da indenização, nos termos do art. 13 do DL 554/69, então em vigor. Asseverou que, por essa razão, a União teria ajuizado ação declaratória de nulidade de título dominial, e obtido liminar para suspender o levantamento da indenização fixada na ação de desapropriação. Ressaltou, por fim, que as decisões ora reclamadas seriam as proferidas em agravo de instrumento em que concedido efeito suspensivo contra essa liminar, as quais não poderiam ser consideradas meras execuções da sentença dada na ação de desapropriação, transitada em julgado. Após, pediu vista dos autos a Min. Cármen Lúcia.
Rcl 2788/PR, rel. Min. Cezar Peluso, 23.11.2006. (Rcl-2788)

Art. 17 do ADCT e Coisa Julgada - 3

O Tribunal concluiu julgamento de embargos de divergência opostos contra acórdão da 2ª Turma que provera recurso extraordinário dos ora embargados para, restabelecendo a sentença de 1ª instância, determinar a manutenção do cálculo cumulativo dos adicionais por tempo de serviço obtido judicialmente, ao fundamento de que a cláusula temporária do art. 17 do ADCT não alcança situações jurídicas protegidas pelo manto da coisa julgada. Invocavam os embargantes, como paradigma, a decisão da 1ª Turma no RE 140894/SP (DJU de 9.8.96), que adotou orientação no sentido de que referida norma é auto-aplicável e abrange tanto a coisa julgada quanto o ato jurídico perfeito - v. Informativo 424. Por maioria, acolheram-se os embargos, para, sufragando a orientação fixada no acórdão paradigma, julgar improcedente a demanda. Entendeu-se que a decisão embargada não se harmoniza com o entendimento do Supremo de que não há direito adquirido a regime jurídico, salientando que a coisa julgada é uma das causas ou fontes geradoras do direito adquirido, razão por que, diante do que preconiza o art. 17 do ADCT, não há que se opor coisa julgada a superveniente proibição constitucional de cumulação de adicionais sob o mesmo título (CF, art. 37, XIV). Afirmou-se que o art. 5º, XXXVI, da CF, apenas veda a aplicação retroativa de normas supervenientes à situação que, julgada na sentença, foi coberta pelo manto da coisa julgada; entretanto, nas relações jurídicas de trato sucessivo, como no caso, a vedação só alcança os eventos que ocorreram até a data da alteração do estado ou da situação de fato ou de direito. Vencido o Min. Marco Aurélio que desprovia os embargos, por considerar que, em razão de a cláusula final do art. 17 do ADCT encerrar exceção, deveria ter interpretação estrita, não abrangendo a coisa julgada.
RE 146331 EDv/SP, rel. Min. Cezar Peluso, 23.11.2006. (RE-146331)


PRIMEIRA TURMA


ED: Efeitos Modificativos e Defesa Preliminar

A Turma, por maioria, preliminarmente, conheceu de manifestação do Ministério Público Federal - que pleiteava fosse cassado acórdão do STF que, em face da ausência de defesa preliminar, deferira habeas corpus para tornar sem efeito o ato que recebera o aditamento da denúncia e revogara o decreto de prisão preventiva do paciente - como embargos declaratórios e acolheu-os, com efeitos infringentes, para deferir, parcialmente, o writ, apenas para que seja cassado o decreto de prisão preventiva, mantido o recebimento da denúncia. Sustentava o embargante que não foram juntados aos autos documentos relativos ao recebimento de segundo aditamento da denúncia, este sim precedido de intimação do paciente para a apresentação de defesa preliminar (Lei 10.409/2002, art. 38), o que afastaria a existência de nulidade. Requeria, também, diante do descumprimento de dever ético por parte dos advogados que atuaram no caso, a comunicação à OAB para as providências cabíveis. Vencido o Min Marco Aurélio que não conhecia dos embargos por considerá-los precoces, já que opostos antes da confecção(1) do acórdão da Turma. No mérito, por maioria, entendeu-se, na linha do que decidido no RHC 86084/BA (j. em 7.11.2006), que a superveniente citação realizada com o objetivo de se conceder aos réus a possibilidade de apresentação de defesa preliminar supre eventuais nulidades. Asseverou-se que, na espécie, o juiz, antes de receber a ratificação da denúncia, proporcionara a defesa preliminar. Vencido, no ponto, o Min Marco Aurélio que, salientando ser a forma prevista no art. 38 da Lei 10.409/2002 essencial à validade do processo, reputara que esta fora observada somente quanto ao aditamento. No tocante à custódia preventiva, manteve-se o acórdão que considerara que o decreto carecia de fundamentação idônea. Por fim, aduziu-se que ficará a cargo do parquet, caso conclua pela existência de fraude processual, a apresentação de representação junto à OAB.
HC 87347 ED/MS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 21.11.2006. (HC-87347)

(1) Errata: O Min Marco Aurélio votou no sentido de não conhecer dos embargos de declaração por considerá-los precoces, já que opostos antes da confecção do acórdão da Turma, e não antes da juntada desse acórdão, tal como consta, por equívoco do Informativo, da matéria original divulgada.

Sursis Processual e Cabimento de HC

É cabível pedido de habeas corpus em favor de beneficiado com a suspensão condicional do processo (Lei 9.099/95, art. 89), porquanto tal medida pode ameaçar sua liberdade de locomoção. Com base nesse entendimento, a Turma deferiu writ impetrado contra decisão monocrática de Ministro do STJ que julgara prejudicado recurso ordinário em idêntica medida ante a aceitação, pelo paciente, de proposta de sursis formulada pelo Ministério Público. Tendo em conta a envergadura constitucional do habeas corpus e o direito fundamental que visa resguardar, reconheceu-se que o acusado pode, a qualquer tempo, questionar os atos processuais que importem coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder. HC deferido para determinar que o STJ, afastada a prejudicialidade, julgue a impetração como entender de direito, bem como que seja suspenso o cumprimento das obrigações estabelecidas no art. 89 da Lei 9.099/95, até decisão final do STJ, uma vez que a suspensão condicional do processo já estará no seu final quando do julgamento pretendido. Precedente citado: HC 85747/SP (DJU de 4.4.2006).
HC 89179/RS, rel. Min. Carlos Britto, 21.11.2006. (HC-89179)



SEGUNDA TURMA


Crime Militar e Agravamento de Pena

A Turma indeferiu habeas corpus em que militar da ativa condenado por estelionato alegava bis in idem na aplicação da causa de aumento de pena prevista no § 3º do art. 251 do CPM ("A pena é agravada, se o crime é cometido em detrimento da administração militar."). Entendeu-se que a mencionada agravante incidiria regularmente, porquanto, em relação ao militar da ativa, a condição da vítima não seria elementar do tipo. Ressaltou-se que ocorreria bis in idem apenas se se tratasse de civil ou militar da reserva/reformado, que só praticam o referido crime se contra as instituições castrenses.
HC 85167/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 21.11.2006. (HC-85167)

Ordem do Rito e Sustentação Oral - 1

A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se discute se, em julgamento de recurso exclusivo da acusação, pode o membro do Ministério Público manifestar-se somente depois da sustentação oral da defesa. No caso, o juízo de 1º grau rejeitara a denúncia apresentada contra o paciente, acusado pela suposta prática de delito previsto no art. 10 da Lei 7.492/86. Contra esta decisão, o Ministério Público interpusera recurso em sentido estrito que, provido pelo TRF da 3ª Região, dera ensejo à instauração da ação penal. Ocorre que, durante a sessão de julgamento do citado recurso, a defesa proferira sustentação oral antes do Procurador-Geral, sendo tal fato alegado em questão de ordem, rejeitada ao fundamento de que o parquet, em segunda instância, atua apenas como fiscal da lei. Sustenta a impetração a nulidade desse julgamento por ofensa ao contraditório, uma vez que seria direito da defesa manifestar-se por último, especialmente em recurso exclusivo da acusação. Ademais, alega que, sendo o Ministério Público órgão uno e indivisível, incabível a invocação da figura de custos legis para justificar tal inversão.
HC 87926/SP, rel. Min. Cezar Peluso, 21.11.2006. (HC-87926)

Ordem do Rito e Sustentação Oral - 2

O Min. Cezar Peluso, relator, deferiu o writ para anular o julgamento do recurso em sentido estrito e determinar que outro se realize, observado o direito de a defesa do paciente, se pretender realizar sustentação oral, somente fazê-lo depois do representante do Ministério Público. Entendeu que, mesmo que invocada a qualidade de custos legis, o membro do Ministério Público deve manifestar-se, na sessão de julgamento, antes da sustentação oral da defesa, haja vista que as partes têm direito à observância do procedimento tipificado na lei, como concretização do princípio do devido processo legal, a cujo âmbito pertencem as garantias específicas do contraditório e da ampla defesa (CF, art. 5º, LIV e LV). Ressaltando a unidade e indivisibilidade do parquet, asseverou ser difícil cindir sua atuação na área recursal, no processo penal, de modo a comprometer o pleno exercício do contraditório. Aduziu, também, que o direito de a defesa falar por último é imperativo e decorre do próprio sistema, e que a inversão na ordem acarretaria prejuízo à plenitude de defesa. Ademais, afirmou não ser admissível interpretação literal do art. 610, parágrafo único, do CPP ("...o presidente concederá... a palavra aos advogados ou às partes que a solicitarem e ao procurador-geral, quando o requerer...") e que o art. 143, § 2º, do Regimento Interno do TRF da 3ª Região, que dispõe que o parquet fará uso da palavra após o recorrente e o recorrido, merece releitura constitucional. Após, pediu vista o Min. Joaquim Barbosa.
HC 87926/SP, rel. Min. Cezar Peluso, 21.11.2006. (HC-87926)

HC: Legitimidade Ativa do Ministério Público e Auditoria Militar

A Turma indeferiu habeas corpus impetrado pelo Ministério Público do Estado de Rondônia contra acórdão do STJ que assentara a competência do Juízo da Auditoria Militar daquele Estado-membro para processar e julgar ação penal instaurada contra civil pela suposta prática do crime de furto qualificado (CP, art. 155, §§ 1º e 4º, I e IV, c/c o art. 69). Preliminarmente, reconheceu-se a legitimação ativa do membro do parquet de primeira instância para impetrar, em sede originária, habeas perante o STF. No mérito, entendeu-se que o acórdão impugnado estaria em consonância com a jurisprudência da Corte que, no julgamento do HC 85720/RO (j. em 14.6.2006), concluíra que a Lei de Organização Judiciária desse ente da federação (Lei Complementar 94/93) não ofende a Constituição ao atribuir a juiz de direito, excepcionalmente no exercício da função de juiz auditor, a competência para processar e julgar feitos criminais genéricos.
HC 85725/RO, rel. Min. Celso de Mello, 21.11.2006. (HC-85725)

Efeito Suspensivo em RE e Diploma de Jornalista

A Turma, resolvendo questão de ordem, referendou decisão do Min. Gilmar Mendes, relator, que deferira medida cautelar em ação cautelar proposta pelo Procurador-Geral da República para obtenção de efeito suspensivo a recurso extraordinário, já admitido na origem, em que se alega ofensa aos artigos 5º, IX e XIII, e 220, ambos da CF, e não-recepção, por esta, do DL 972/69, que estabelece requisitos para o exercício da profissão de jornalista. Trata-se, na espécie, de recurso extraordinário interposto pelo Ministério Público Federal contra acórdão do TRF da 3ª Região que reformara decisão que, em ação civil pública, concedera parcialmente antecipação de tutela para determinar que a União não mais exija diploma de curso superior em jornalismo para o exercício da profissão. Entendeu-se que o recurso discute matéria de relevância constitucional - afetada ao Plenário (RMS 24213/DF) -, em especial a interpretação dos referidos dispositivos constitucionais. Ademais, aduziu-se que o tema concernente ao âmbito de proteção e limitações legais do direito fundamental à liberdade de profissão, bem como a recepção ou não do mencionado decreto-lei foram debatidos nas instâncias inferiores. No tocante à urgência da pretensão cautelar, consideraram-se suficientes as ponderações do requerente no sentido da elevada quantidade de pessoas, que desempenhavam a profissão independentemente de diploma, estarem impossibilitadas de exercer suas atividades.
AC 1406 QO-MC/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 21.11.2006. (AC-1406)

SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno22.11.200623.11.200610
1ª Turma21.11.2006--127
2ª Turma21.11.2006--185



T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Processo Administrativo: Ampla Defesa e Contraditório (Transcrições)

MS 25787/DF*

RELATOR: MIN. GILMAR MENDES

Voto: O presente mandado de segurança, apesar de sua importância e ampla repercussão no setor nacional de aviação civil, não contempla maiores controvérsias de índole jurídica, encontrando solução por meio da análise pormenorizada do vasto conteúdo documental juntado aos autos.

A questão debatida cinge-se em saber se a impetrante teve violados seus direitos à ampla defesa e ao contraditório no processo administrativo instaurado com o objetivo de apurar a ocorrência das causas legais para a declaração de caducidade do contrato de concessão para prestação do serviço de transporte aéreo. A resposta está nos documentos juntados pela própria impetrante.

Tenha-se em conta, portanto, que o exame sumário dos autos realizado pelo Ministro Nelson Jobim, quando da apreciação, inaudita altera pars, do pedido de medida cautelar, não possibilitou o pleno conhecimento dos fatos envolvidos no processo administrativo, e por isso culminou em julgamento liminar amparado apenas no relato presente na peça inicial, o qual não condiz com a verdade processual revelada pelo conteúdo documental constante nos autos deste writ.

Se o direito líquido e certo amparado por mandado de segurança nada mais é do que aquele cuja existência e delimitação são claras e passíveis de demonstração documental, como consagrado na doutrina e na jurisprudência, é fácil aferir, no presente caso, a sua cabal inexistência.

Isso porque os documentos que acompanham o pedido inicial formulado pela impetrante demonstram, de forma indubitável, justamente a ausência de violação aos princípios da ampla defesa e do contraditório.

Em outras ocasiões, tenho afirmado neste Tribunal que a garantia fundamental do contraditório e da ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, contempla, no seu âmbito de proteção, não apenas os processos judiciais, mas também os administrativos.
Há muito vem a doutrina constitucional enfatizando que o direito de defesa não se resume a um simples direito de manifestação no processo. Efetivamente, o que o constituinte pretende assegurar - como bem anota Pontes de Miranda - é uma pretensão à tutela jurídica (Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda no 1, 1969. T. V, p. 234).

Observe-se que não se cuida aqui, sequer, de uma inovação doutrinária ou jurisprudencial. Já o clássico João Barbalho, nos seus Comentários à Constituição de 1891, asseverava, com precisão, que:

"Com a plena defesa são incompatíveis, e, portanto, inteiramente, inadmissíveis, os processos secretos, inquisitoriais, as devassas, a queixa ou o depoimento de inimigo capital, o julgamento de crimes inafiançáveis na ausência do acusado ou tendo-se dado a produção das testemunhas de acusação sem ao acusado se permitir reinquiri-las, a incomunicabilidade depois da denúncia, o juramento do réu, o interrogatório dele sob coação de qualquer natureza, por perguntas sugestivas ou capciosas." (Constituição Federal Brasileira - Comentários, Rio de Janeiro, 1902, p. 323).

Não é outra a avaliação do tema no direito constitucional comparado. Apreciando o chamado Anspruch auf rechtliches Gehör (pretensão à tutela jurídica) no direito alemão, assinala o Bundesverfassungsgericht que essa pretensão envolve não só o direito de manifestação e o direito de informação sobre o objeto do processo, mas também o direito do indivíduo de ver os seus argumentos contemplados pelo órgão incumbido de julgar (Cf. Decisão da Corte Constitucional alemã - BVerfGE 70, 288-293; sobre o assunto, ver, também, PIEROTH, Bodo; SCHLINK, Bernhard. Grundrechte - Staatsrecht II. Heidelberg, 1988, p. 281; BATTIS, Ulrich; GUSY, Christoph. Einführung in das Staatsrecht. 3. ed. Heidelberg, 1991, p. 363-364).

Daí afirmar-se, correntemente, que a pretensão à tutela jurídica, que corresponde exatamente à garantia consagrada no art. 5o, LV, da Constituição, contém os seguintes direitos:

1) direito de informação (Recht auf Information), que obriga o órgão julgador a informar à parte contrária dos atos praticados no processo e sobre os elementos dele constantes;

2) direito de manifestação (Recht auf Äusserung), que assegura ao defendente a possibilidade de manifestar-se oralmente ou por escrito sobre os elementos fáticos e jurídicos constantes do processo;

3) direito de ver seus argumentos considerados (Recht auf Berücksichtigung), que exige do julgador capacidade, apreensão e isenção de ânimo (Aufnahmefähigkeit und Aufnahmebereitschaft) para contemplar as razões apresentadas (Cf. PIEROTH; SCHLINK. Grundrechte -Staatsrecht II. Heidelberg, 1988, p. 281; BATTIS; GUSY. Einführung in das Staatsrecht. Heidelberg, 1991, p. 363-364; Ver, também, DÜRIG/ASSMANN. In: MAUNZ-DÜRIG. Grundgesetz-Kommentar. Art. 103, vol. IV, no 85-99).

Sobre o direito de ver os seus argumentos contemplados pelo órgão julgador (Recht auf Berücksichtigung), que corresponde, obviamente, ao dever do juiz ou da Administração de a eles conferir atenção (Beachtenspflicht), pode-se afirmar que ele envolve não só o dever de tomar conhecimento (Kenntnisnahmepflicht), como também o de considerar, séria e detidamente, as razões apresentadas (Erwägungspflicht) (Cf. DÜRIG/ASSMANN. In: MAUNZ-DÜRIGi. Grundgesetz-Kommentar. Art. 103, vol. IV, no 97).

É da obrigação de considerar as razões apresentadas que deriva o dever de fundamentar as decisões (Decisão da Corte Constitucional - BVerfGE 11, 218 (218); Cf. DÜRIG/ASSMANN. In: MAUNZ-DÜRIG. Grundgesetz-Kommentar. Art. 103, vol. IV, no 97).

Dessa perspectiva não se afastou a Lei no 9.784, de 29.1.1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. O art. 2o desse diploma legal determina, expressamente, que a Administração Pública obedecerá aos princípios da ampla defesa e do contraditório. O parágrafo único desse dispositivo estabelece que nos processos administrativos serão observados, dentre outros, os critérios de "observância das formalidades essenciais à garantia dos direitos dos administrados" (inciso VIII) e de "garantia dos direitos à comunicação" (inciso X).

A verificação, no caso concreto, da não-observância das garantias da ampla defesa e do contraditório, em toda sua amplitude, depende da análise de todas as circunstâncias envolvidas na produção das formalidades processuais e a decisão final delas resultante.

Como bem esclarece García de Enterría, "este mismo concepto de indefensión es un concepto relativo, cuya valoración exige colocarse en una perspectiva dinámica o funcional, es decir, en una perspectiva que permita contemplar el procedimiento en su conjunto y el acto final como resultado de la integración de trámites y actuaciones de distinta clase y procedencia, en los que el particular va teniendo oportunidades sucesivas de defenderse y de poner de relieve ante la Administración sus puntos de vista" (GARCÍA DE ENTERRÍA, Eduardo; FERNÁNDEZ, Tomás-Ramón. Curso de Derecho Administrativo I. 12. ed. Madrid: Civitas, 2004, p. 650).

No presente caso, o exame nesses termos não foi capaz de revelar qualquer afronta ao contraditório e à ampla defesa, assim como às garantias deles decorrentes.

Quanto à alegação da impetrante de falta de publicação ou de qualquer outra forma de comunicação do ato de instauração do processo administrativo, basta verificar o seguinte.

Como se pode aferir à fl. 304 dos autos, a Chefe da Assessoria Jurídica do Departamento de Aviação Civil, por meio de ofício encaminhado à Coordenadora de Editoração e Divulgação da Imprensa Nacional - demonstrando preocupação em relação ao cumprimento dos princípios da ampla defesa e do contraditório, assim como da Lei n° 9.784/99 -, solicitou a publicação da Portaria no 1.445/DGAC no Diário Oficial da União. Eis o teor do referido ofício, presente à fl. 304 dos autos:

"Senhora Coordenadora,
Encaminho a V. Sa. cópia da Portaria n° 1445/DGAC, de 17 de outubro de 2002, solicitando a sua publicação no Diário Oficial da União, para que produza os seus regulares efeitos ou, se não for possível, que sejam esclarecidos e fundamentados os motivos da eventual impossibilidade da citada publicação.
Lembro que, além dos princípios norteadores da administração pública expressos no art. 37, 'caput', da Constituição Federal, a presente publicação faz-se necessária considerando o disposto no inciso V, do art. 2o da Lei n° 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.
Assim, solicito com a urgência possível, a manifestação desse Órgão oficial para fins de orientar as ações da Comissão do respectivo Processo Administrativo." (ênfases acrescidas) Em resposta a esse ofício, a Coordenadora de Editoração e Divulgação da Imprensa Nacional assim se pronunciou (fl. 301):

"Senhora Chefe,
Em referência à mensagem S/N 303/ASS JUR/2002, datada de 11/11/2002, informamos a Vossa Senhoria que a Portaria DAC n° 1.445/DGAC, de 17 de outubro de 2002, não é publicável no DOU, de acordo com a letra h do inciso II do art. 14 do Anexo I da Portaria IN n° 190, de 16/10/2001 (publicada no DOU de 17/10/2001, Seção I)." (ênfases acrescidas)

De fato, como consta nas informações prestadas pelo Presidente da República, "não havia, e não há, em norma vigente, a obrigatoriedade de ser o diário oficial o único meio hábil de veicular o início de um procedimento dessa natureza" (fl. 3064).

De qualquer forma, a Portaria n° 1445/DGAC foi publicada nos Boletins Interno e Externo Ostensivo do DAC, de 24 de outubro de 2002, de acompanhamento obrigatório pelas empresas concessionárias do serviço de transporte aéreo, como afirma o Ministério da Defesa (fl. 3080).

Não bastasse isso, ressalte-se também que a impetrante, logo após a instauração dos trabalhos da comissão, ingressou nos autos do processo administrativo, por meio de advogado, solicitando cópias do referido processo, como comprovam a petição e o substabelecimento que constam às fls. 319-320. O simples fato do imediato ingresso da impetrante nos autos do processo administrativo, por meio de seus advogados devidamente constituídos, afasta qualquer hipótese de nulidade quanto ao procedimento de intimação. A Lei n° 9.784/99, em seu art. 26, § 5o, diz que "as intimações serão nulas quando feitas sem observância das prescrições legais, mas o comparecimento do administrado supre sua falta ou irregularidade".

Essa é, portanto, mais uma prova de que não poderia a impetrante, por meio deste writ, alegar desconhecimento da instauração do processo administrativo e das diligências nele realizadas.

Da mesma forma, não procedem os argumentos de ofensa aos direitos de informação e de manifestação.

Os documentos presentes nos autos atestam que a impetrante teve conhecimento de todos os atos praticados no processo administrativo e sobre eles produziu manifestação. Para comprovar essa afirmação, basta mencionar os ofícios encaminhados pela Transbrasil à comissão de processo administrativo indicando pessoas para prestar esclarecimentos (fl. 816-817), solicitando reagendamento de reuniões para apresentação de planos de negócios da empresa (fl. 873/877), informando a realização de assembléia geral extraordinária visando à reestruturação societária da companhia (fl. 894), esclarecendo o cumprimento de providências solicitadas pela comissão (fl. 898), apresentando documentação sobre as condições econômico-financeiras da companhia (fl. 900), solicitando vista dos autos para cópia (fl. 1125). Frise-se que alguns desses ofícios são subscritos pelos mesmos patronos da impetrante que subscrevem a peça inicial deste writ.

Aliás, é importante destacar, também, que, antes da instauração do processo administrativo em causa, os mesmos advogados já estavam constituídos pelo Espólio de Omar Fontana, acionista majoritário da Transbrasil, para representá-lo perante o Departamento de Aviação Civil no processo de regularização societária da empresa (recomposição dos cargos de sua Diretoria, Conselho Superior de Administração e Conselho Fiscal) (fl. 1406, 1435).

Em ofício datado de 22 de agosto de 2002, o Diretor-Geral do DAC já havia alertado à impetrante que o descumprimento da Cláusula XIII do Contrato de Concessão poderia ensejar a instauração de processo administrativo, tendo por objeto a declaração de caducidade dessa concessão (fl. 1370).

Em outro ofício, de 1o de outubro de 2002, o DAC informa à impetrante que estaria tomando as medidas administrativas para tanto (fls. 1463/1464).

Ressalte-se, ainda, que, como consta do Relatório produzido pela Comissão de Processo Administrativo (fls. 765-772), no dia 18 de dezembro de 2002, ou seja, no início do processo administrativo, foram inquiridos a Sra. Denilda Pereira Fontana, na qualidade de representante legal do Espólio de Omar Fontana, e o Sr. Antonio Celso Cipriani, na qualidade de Presidente do Conselho Superior de Administração da impetrante (fl. 771).

Diante de todos esses fatos, fartamente comprovados pelos documentos juntados aos autos pela própria impetrante, não há como dar credibilidade às alegações de desconhecimento da instauração do processo administrativo e dos atos nele praticados.

Está plenamente demonstrado que à impetrante foram assegurados os direitos de informação sobre os atos produzidos no processo, de manifestação sobre seu conteúdo e de ter seus argumentos devidamente considerados pela autoridade administrativa.

Sobre a improcedência dos argumentos da impetrante, o parecer do Procurador-Geral da República, Dr. Antonio Fernando Barros e Silva de Souza, assim dispõe:

"Não assiste razão à impetrante.
Verifica-se, pelas argumentações empreendidas por ambas as partes, que, embora inexistente publicação no Diário Oficial da União, repise-se, por manifesta rejeição da imprensa oficial, a impetrante foi citada por meio apto a atingir o seu conhecimento, isto é, pelos boletins do Departamento de Aviação Civil - DAC, que, como afirmou a autoridade impetrada, são de observância obrigatória a todas as companhias aéreas.
Posto que assim não fosse, a nulidade teria, claramente, sido saneada pelo comparecimento espontâneo da impetrante, por meio da habilitação de procuradores nos autos do procedimento administrativo. Aplica-se no caso o princípio da instrumentalidade de formas, em razão do qual 'não há nulidade sem prejuízo' (pas de nullité sans grief).
Não convence a tese de que a impetrante se reportara a outro processo administrativo, quando da habilitação dos causídicos (fls. 3483-3484), mormente por que sequer foi apontado qual procedimento seria este ou o porquê da realização de tal ato.
Outrossim, a impetrante não pode se utilizar, como escusa do cumprimento de suas obrigações contratuais, do suposto inadimplemento de deveres análogos por outras companhias aéreas. Resta evidente que as situações fáticas que caracterizam as diversas empresas desse segmento são distintas, reclamando formas distintas de resolução das pendências. Revelam-se improcedentes, portanto, as alegações referentes a lesões aos princípios da igualdade, da razoabilidade e da proporcionalidade.
Ante o exposto, o parecer é pela denegação da segurança."

A Transbrasil S.A. Linhas Aéreas interrompeu de forma unilateral suas operações em 3 de dezembro de 2001. O fato é notório e foi amplamente divulgado pela imprensa. Segundo consta dos documentos juntados ao processo, após esse fato, o Departamento de Aviação Civil, em vez de declarar a caducidade da concessão do serviço, permitiu que a Transbrasil realizasse todas as tentativas possíveis para sua reestruturação societária, econômico-financeira e técnico-administrativa, com vistas ao devido retorno de suas atividades.

Apenas quando decorridos mais de dez meses da interrupção dos serviços é que o DAC resolveu instaurar processo para apurar o descumprimento do contrato de concessão pela Transbrasil.

Frise-se que, de acordo com a Portaria n° 536/CG5, de 18 de agosto de 1999, que aprova as instruções que regulamentam os pedidos de concessão para exploração dos serviços aéreos públicos, o DAC já poderia ter declarado a caducidade do contrato no momento em que completados 6 (seis) meses de interrupção dos serviços. Diz o art. 12 da referida portaria:

"Art. 12 . A concessão caducará de pleno direito, independentemente de interpelação:
I - se os serviços não forem iniciados no prazo de 6 (seis) meses a contar da data da assinatura do contrato de concessão;
II - se os serviços ficarem interrompidos por mais de 6 (seis) meses, salvo por motivo de força maior, plenamente comprovado;
III - se expirar o prazo de concessão;
IV - a pedido da concessionária."

O Código Brasileiro de Aeronáutica, por sua vez, estabelece que:

"Art. 289 . Na infração aos preceitos deste Código ou da legislação complementar, a autoridade aeronáutica poderá tomar as seguintes providências administrativas:
I - multa;
II - suspensão de certificados, licenças, concessões ou autorizações;
III - cassação de certificados, licenças, concessões ou autorizações;
IV - detenção, interdição ou apreensão de aeronave, ou do material transportado;
V - intervenção nas empresas concessionárias ou autorizadas."

A Lei n° 8.987/95, que dispõe sobre o regime de concessão de serviços públicos, prevê a declaração de caducidade por interrupção do serviço, da seguinte forma:

"Art. 38. A inexecução total ou parcial do contrato acarretará, a critério do poder concedente, a declaração de caducidade da concessão ou a aplicação das sanções contratuais, respeitadas as disposições deste artigo, do art. 27, e as normas convencionadas entre as partes.
        § 1o A caducidade da concessão poderá ser declarada pelo poder concedente quando:
        I - o serviço estiver sendo prestado de forma inadequada ou deficiente, tendo por base as normas, critérios, indicadores e parâmetros definidores da qualidade do serviço;
        II - a concessionária descumprir cláusulas contratuais ou disposições legais ou regulamentares concernentes à concessão;
        III - a concessionária paralisar o serviço ou concorrer para tanto, ressalvadas as hipóteses decorrentes de caso fortuito ou força maior;
        IV - a concessionária perder as condições econômicas, técnicas ou operacionais para manter a adequada prestação do serviço concedido;
        V - a concessionária não cumprir as penalidades impostas por infrações, nos devidos prazos;
        VI - a concessionária não atender a intimação do poder concedente no sentido de regularizar a prestação do serviço; e
        VII - a concessionária for condenada em sentença transitada em julgado por sonegação de tributos, inclusive contribuições sociais.
        § 2o A declaração da caducidade da concessão deverá ser precedida da verificação da inadimplência da concessionária em processo administrativo, assegurado o direito de ampla defesa.
        § 3o Não será instaurado processo administrativo de inadimplência antes de comunicados à concessionária, detalhadamente, os descumprimentos contratuais referidos no § 1º deste artigo, dando-lhe um prazo para corrigir as falhas e transgressões apontadas e para o enquadramento, nos termos contratuais.
        § 4o Instaurado o processo administrativo e comprovada a inadimplência, a caducidade será declarada por decreto do poder concedente, independentemente de indenização prévia, calculada no decurso do processo.
        § 5o A indenização de que trata o parágrafo anterior, será devida na forma do art. 36 desta Lei e do contrato, descontado o valor das multas contratuais e dos danos causados pela concessionária.
        § 6o Declarada a caducidade, não resultará para o poder concedente qualquer espécie de responsabilidade em relação aos encargos, ônus, obrigações ou compromissos com terceiros ou com empregados da concessionária."

A continuidade do serviço é princípio que rege o regime de concessão de serviços públicos, como estabelece o art. 6o da Lei n° 8.987/95:

"Art. 6o Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.
§ 1o Serviço adequado é o que satisfaz as condições de regularidade, continuidade, eficiência, segurança, atualidade, generalidade, cortesia na sua prestação e modicidade das tarifas.
        § 2o A atualidade compreende a modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço.
        § 3o Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando:
        I - motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações; e,
        II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade."

Segundo informa o Ministério da Defesa, a declaração de caducidade ocorreu somente em 11 de outubro de 2003, ou seja, quase dois anos após a interrupção unilateral do serviço por parte da Transbrasil.

A impetrante sempre esteve ciente de que a paralisação dos serviços acarretaria a declaração de caducidade da concessão, por força das normas legais acima mencionadas.

Decorridos mais de dez meses desde a concessão da liminar pelo Ministro Nelson Jobim, restabelecendo a impetrante na condição de concessionária do serviço de transporte aéreo, não se tem notícia sequer da possibilidade do retorno de suas atividades.

Portanto, é preciso ponderar se a eventual restauração do processo administrativo, com a conseqüente repetição de todos os atos supostamente eivados de nulidade, como alega a impetrante, teria o condão de produzir uma decisão de conteúdo material diverso do que foi adotado.

As circunstâncias envolvidas neste processo atestam que a eventual concessão da ordem, nos termos em que requerida, produziria apenas uma inútil repetição de atos que culminariam, em qualquer hipótese, na mesma decisão, qual seja, a destituição da impetrante do status de concessionária do serviço de transporte aéreo.

Nesses termos, voto pela denegação da ordem, ficando cassada a medida liminar anteriormente deferida.


* acórdão pendente de publicação



Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos
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Informativo STF - 449 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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