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quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Informativo STF 453 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF


Brasília, 18 e 19 de dezembro de 2006 - Nº 453.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO



Plenário
Subsídios de Parlamentares: Decreto Legislativo e Perda de Eficácia - 1
Subsídios de Parlamentares: Decreto Legislativo e Perda de Eficácia - 2
Cola Eletrônica e Tipificação Penal - 4
ADI e Abertura de Elementos de Despesa
Juiz de TRE e Recondução para Segundo Biênio
1ª Turma
Inquérito Policial e Direito de Vista
Criação de Foro e "Perpetuatio Jurisdictionis" - 1
Criação de Foro e "Perpetuatio Jurisdictionis" - 2
Exercício de Função Militar e Crime Culposo
2ª Turma
Direito de Presença do Réu Preso
Cabimento de HC e Restituição de Documentos
Clipping do DJ
Transcrições
Tribunal de Justiça Militar Estadual - "Habeas Corpus" - Competência Originária do STJ (CC 7346/SP)


PLENÁRIO


Subsídios de Parlamentares: Decreto Legislativo e Perda de Eficácia - 1

O Tribunal, por maioria, não conheceu de ação direta ajuizada pelo Partido Popular Socialista - PPS, em que se pretendia a declaração de inconstitucionalidade do Decreto Legislativo 444/2002, averbando, todavia, o exaurimento da norma contida no referido decreto legislativo, ou seja, é entendimento da Corte que a fixação dos subsídios para os Congressistas, Senadores e Deputados, deverá se fazer mediante decreto legislativo específico a ser aprovado por ambas as Casas do Congresso. O Decreto Legislativo 444/2002 dispôs sobre a remuneração dos membros do Congresso Nacional durante a 52ª Legislatura, estabelecendo que, "até que seja aprovada a lei de iniciativa conjunta de que trata o art. 48, XV, da CF, a remuneração dos Membros do Congresso Nacional corresponderá à maior remuneração percebida, a qualquer título, por Ministro do STF... e se constituirá de subsídio fixo, variável e adicional", bem como que as "Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados regularão, em ato conjunto, a aplicação deste Decreto Legislativo.". Entendeu-se que o ato normativo impugnado teria perdido a eficácia desde a promulgação da EC 41/2003, que alterou o art. 48, XV, da CF, na redação que lhe foi dada pela EC 19/98, mencionado no art. 1º do decreto legislativo, que previa lei de iniciativa conjunta, a qual não sobreveio (EC 41/2003: "Art. 48. Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor... sobre:... XV - fixação do subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, observado o que dispõem os arts. 39, § 4º; 150, II; 153, III; e 153, § 2º, I."). Asseverou-se também que, nos termos do art. 49, VII, da CF, a fixação dos subsídios há de ser objeto de decreto legislativo específico a exigir deliberação do plenário das Casas do Congresso Nacional (CF: "Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional:... VII - fixar idêntico subsídio para os Deputados Federais e os Senadores, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;"). Vencidos os Ministros Carlos Britto, relator, Cármen Lúcia, Eros Grau e Ricardo Lewandowski, que conheciam da ação e deferiam a cautelar para suspender os efeitos do decreto legislativo questionado.
ADI 3833 MC/DF, rel. orig. Min. Carlos Britto, rel. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 19.12.2006. (ADI-3833)

Subsídios de Parlamentares: Decreto Legislativo e Perda de Eficácia - 2

Tendo em conta o entendimento firmado no julgamento da ADI 3833 MC/DF, acima relatado, o Tribunal deferiu pedido de liminar formulado em mandado de segurança preventivo impetrado por Deputados Federais contra os Presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, e os Secretários e Mesas dessas Casas Legislativas, para que as Mesas da Câmara e do Senado se abstenham de editar qualquer ato que fixe subsídios de Deputados e Senadores com base no Decreto Legislativo 444/2002. Inicialmente, o Tribunal, por maioria, admitiu questão de ordem, no sentido de ser possível ao relator submeter ao Plenário o exame da liminar. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio, que considerava caber isoladamente ao relator essa apreciação. Em seguida, o Tribunal reconheceu a legitimidade dos impetrantes, haja vista estarem os parlamentares atuando na defesa da prerrogativa de participar de votação de matéria que, conforme o art. 49, VII, da CF, cabe ao plenário das Casas do Congresso Nacional. No mérito, entendeu-se estarem presentes os requisitos do fumus boni iuris, consubstanciado na aparente violação ao art. 49, VII, da CF/88, e do periculum in mora, representado pela iminência da efetivação do reajuste impugnado.
MS 26307 MC/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 19.12.2006. (MS-26307)

Cola Eletrônica e Tipificação Penal - 4

Em conclusão de julgamento, o Tribunal, por maioria, rejeitou denúncia apresentada contra Deputado Federal, em razão de ter despendido quantia em dinheiro na tentativa de obter, por intermédio de cola eletrônica, a aprovação de sua filha e amigos dela no vestibular de universidade federal, conduta essa tipificada pelo Ministério Público Federal como crime de estelionato (CP, art. 171), e posteriormente alterada para falsidade ideológica (CP, art. 299) - v. Informativos 306, 395 e 448. Entendeu-se que o fato narrado não constituiria crime ante a ausência das elementares objetivas do tipo, porquanto, na espécie, a fraude não estaria na veracidade do conteúdo do documento, mas sim na utilização de terceiros na formulação das respostas aos quesitos. Salientou-se, ainda, que, apesar de seu grau de reprovação social, tal conduta não se enquadraria nos tipos penais em vigor, em face do princípio da reserva legal e da proibição de aplicação da analogia in malam partem. Vencidos os Ministros Carlos Britto, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio, que recebiam a denúncia.
Inq 1145/PB, rel. orig. Min. Maurício Corrêa, rel. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes, 19.12.2006. (Inq-1145)

ADI e Abertura de Elementos de Despesa

O Tribunal conheceu em parte de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Governador do Estado de Roraima contra a Lei estadual 503/2005 (lei orçamentária estadual para o exercício de 2006) e julgou parcialmente procedente o pedido nela formulado para dar interpretação conforme à expressão "abertura de novos elementos de despesa", contida no artigo 56, parágrafo único, da lei questionada, de modo a que a abertura não exceda os créditos orçamentários ou adicionais. O parágrafo único do art. 56 impugnado estabelece que os Poderes Legislativo e Judiciário e o Ministério Público Estadual poderão, no decorrer da execução orçamentária do exercício de 2006, caso haja necessidade, promover alterações em seus orçamentos, por meio da transposição, do remanejamento, da transferência de recursos de uma categoria de programação para outra, bem como proceder a abertura de novos elementos de despesa. Entendeu-se serem permitidos, de acordo com o disposto no inciso VI do art. 167 da CF, a transposição, o remanejamento e a transferência de recursos de uma categoria da programação para outra, desde que mediante prévia autorização legislativa, no caso, substantivada precisamente no dispositivo questionado. Quanto à expressão "abertura de novos elementos de despesa", asseverou-se ser necessário observar o inciso II do art.167 da CF, que veda a realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas que excedam os créditos orçamentários ou adicionais.
ADI 3652/RR, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 19.12.2006. (ADI-3652)

Juiz de TRE e Recondução para Segundo Biênio

O Tribunal, por maioria, julgou procedente, em parte, reclamação proposta contra decisão do Tribunal Superior Eleitoral - TSE que, com base no art. 102 da LOMAN (LC 35/79), concedera liminar para suspender os efeitos de eleição realizada pelo Tribunal Regional Eleitoral da Bahia - TRE-BA (LOMAN: "Art. 102 - Os Tribunais... elegerão dentre seus Juízes mais antigos, em número correspondente ao dos cargos de direção, os titulares destes, com mandato por dois anos, proibida a reeleição. Quem tiver exercido quaisquer cargos de direção por quatro anos, ou o de Presidente, não figurará mais entre os elegíveis, até que se esgotem todos os nomes, na ordem de antigüidade..."). Na espécie, o TRE-BA, à vista da recusa à eleição para presidente da desembargadora vice-presidente, reelegera o seu presidente, que fora reconduzido pelo TJ do Estado para cumprir o segundo biênio naquele órgão da justiça eleitoral. Inicialmente, considerou-se o pedido improcedente relativamente à parte da decisão reclamada que afirmara a irreelegibilidade do presidente do TRE, em razão de nenhum dos acórdãos do STF invocados como paradigmas ter enfrentado a questão. De outro lado, entendeu-se que a aplicação ao caso do preceito da LOMAN em que se fundara o TSE violaria o § 2º do art. 121 da CF, segundo a leitura que lhe dera o STF numa das decisões paradigmas (ADI 2993/MG, DJU de 12.3.2004), quando nela se assentara ser inadmissível vedar-se a juiz de TRE a possibilidade da recondução para um segundo biênio (CF: "Art. 121... § 2º - Os juízes dos tribunais eleitorais, salvo motivo justificado, servirão por dois anos, no mínimo, e nunca por mais de dois biênios consecutivos, sendo os substitutos escolhidos na mesma ocasião e pelo mesmo processo, em número igual para cada categoria."). Vencido o Min. Marco Aurélio, que julgava improcedente a reclamação.
Rcl 4587/BA, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 19.12.2006. (Rcl-4587)



PRIMEIRA TURMA


Inquérito Policial e Direito de Vista

A Turma não conheceu de habeas corpus impetrado contra decisão de ministro do STJ que negara seguimento a idêntica medida dirigida contra decisão denegatória de liminar - em que se sustentava a inoponibilidade de sigilo das investigações em inquérito policial aos advogados constituídos pelo paciente - ao fundamento de que o pedido possuiria natureza satisfativa e o deferimento da liminar resultaria na perda de objeto das impetrações antecedentes. Concedeu-se, porém, a ordem, de ofício, para assegurar aos causídicos do paciente a faculdade de consultar os elementos de informação já introduzidos nos autos, bem como de obter as cópias pertinentes. Entendeu-se que, ao advogado do indiciado em inquérito policial, titular do direito de acesso aos autos respectivos, não é oponível o sigilo que se imponha ao procedimento. Salientando a inexistência de conflito de interesses contrapostos, asseverou-se que a Lei 8.906/94 prestigia a prerrogativa do defensor contra a oponibilidade ao advogado do sigilo decretado no inquérito. No ponto, ressaltou-se que o inciso XIV do seu art. 7º não faz nenhuma distinção entre inquéritos sigilosos e não sigilosos. Além disso, afirmou-se que tal oponibilidade esvaziaria a garantia prevista no inciso LXIII do art. 5º da CF ("o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;"), que se estende ao indiciado solto. Precedentes citados: HC 82354/PR (DJU de 24.9.2004); HC 87827/RJ (DJU de 23.6.2006); HC 86059 MC/PR (DJU de 30.6.2005).
HC 90232/AM, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 18.12.2006. (HC-90232)

Criação de Foro e "Perpetuatio Jurisdictionis" - 1

A Turma indeferiu habeas corpus em que acusado como suposto mandante de homicídios alegava a ausência de fundamentação da prisão preventiva e a incompetência do juízo que a decretara. No caso, no curso da ação penal, adviera a Lei 10.772/2003, dispondo sobre a criação de novas varas federais, dentre as quais a sediada em Patos de Minas/MG, com jurisdição sobre o Município de Unaí/MG, local onde praticado o fato delituoso. Posteriormente, a Corregedoria-Geral do TRF da 1ª Região editara o Provimento COGER 19/05, regulamentando a redistribuição de processos às recentes varas criadas, tão logo fossem implementadas, o que acontecera com a subseção referida. Os autos, entretanto, não foram para lá remetidos por se encontrarem no TRF em face de recurso em sentido estrito interposto pelo paciente e pelos co-réus. Ocorre que, depois, a custódia preventiva do paciente fora determinada pelo juízo federal de Belo Horizonte/MG. No dia seguinte à decretação desta prisão, o Provimento 25/05 alterou a redação do art. 1º do mencionado Provimento COGER 19/05 para impedir novas redistribuições de ações penais e determinar a devolução, às varas federais de origem, das ações já distribuídas.
HC 89849/MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 18.12.2006. (HC-89849)

Criação de Foro e "Perpetuatio Jurisdictionis" - 2

Inicialmente, analisando a questão da competência, prejudicial das demais, considerou-se que a solução da controvérsia deveria partir da incidência ou não do princípio da perpetuatio jurisdictionis no processo penal. No ponto, asseverou-se que a orientação fixada no julgamento do RHC 83181/RJ (DJU de 22.10.2004) - no sentido de que esse princípio, instituído no art. 87 do CPC, aplica-se, por analogia, ao processo penal (CPP, art. 3º) -, deve ser entendida como regra geral e que a incidência do princípio da perpetuatio jurisdictionis somente se justificaria, nos crimes dolosos contra a vida, pelas suas peculiaridades, na fase anterior ao julgamento pelo júri. Assim, tendo em conta o objetivo de se preservar o julgamento do réu pelos seus pares, aduziu-se que apenas a competência territorial do júri deveria ser prorrogada. Por conseguinte, o que poderia se sujeitar à sanção de nulidade relativa seria a eventual realização de julgamento pelo júri na subseção originária e, apesar disso, ressalvada a hipótese de para esta não ser desaforado o judicium causae. Conclui-se, desse modo, que, na espécie, não haveria nenhuma irregularidade a ser sanada, dada a aplicação, por analogia, do art. 87 do CPC e que a disciplina dos Provimentos COGER 19 e 25 do TRF da 1ª Região perderia relevo, porquanto os autos não foram sequer enviados para a vara federal de Patos de Minas/MG. No tocante à fundamentação da segregação preventiva, entendeu-se que o decreto embasara-se em elementos concretos, cujo reexame não seria viável em habeas corpus. Nesse sentido, salientou-se que o fato de o paciente haver patrocinado a defesa de um dos co-réus executores do delito, com o intuito deste evadir-se, constituiria, em tese, ato que poderia prejudicar a instrução e, em conseqüência, legitimar a prisão preventiva.
HC 89849/MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 18.12.2006. ((HC-89849)

Exercício de Função Militar e Crime Culposo

A Turma deferiu habeas corpus para determinar o trancamento de processo criminal instaurado contra civil acusado pela suposta prática do crime de lesão corporal leve em decorrência de seu envolvimento, de modo culposo, em acidente de trânsito com militar que retornava ao quartel após cumprimento de missão de escolta. No caso, em face da existência de coisa julgada no juízo comum, em que decretada a extinção da punibilidade do paciente, o processo penal em trâmite na auditoria militar, promovido para a apuração do mesmo fato, fora extinto. Ocorre que, em sede de recurso ex officio, essa decisão fora revista, resultando na retomada do curso do processo. Considerou-se que o retorno da missão descaracterizaria, no momento do acidente, exercício de função militar, de modo a afastar o seu enquadramento como "crime contra militar em função de natureza militar", para fins de incidência do art. 9º, III, d, do CPM, e que a justiça comum já extinguira, com trânsito em julgado, a punibilidade do paciente.
HC 89592/DF, rel. Min. Carlos Britto, 18.12.2006. (HC-89592)



SEGUNDA TURMA


Direito de Presença do Réu Preso

A Turma deferiu, de ofício, habeas corpus para assegurar a paciente, que se encontra preso, o direito de presença em todos os atos de instrução a serem realizados no âmbito do processo-crime contra ele instaurado, sob pena de nulidade absoluta daqueles aos quais se negar o comparecimento pessoal. Tratava-se de habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que indeferira liminarmente o pedido de idêntica medida, cujo julgamento de mérito fora declarado prejudicado por aquela Corte ante a denegação do writ originário, quando o mérito da presente impetração ainda encontrava-se pendente de apreciação pelo STF. Preliminarmente, afastou-se a incidência do Enunciado da Súmula 691 do STF, em face da relevância constitucional da discussão a envolver o reconhecimento ou não do direito de o réu preso comparecer, mediante requisição do Poder Judiciário, às audiências de instrução processual em que serão inquiridas testemunhas arroladas pelo Ministério Público. Tendo em conta a natureza dialógica do processo penal acusatório, considerou-se que o acusado, embora preso, tem o direito de comparecer, de assistir e de presenciar, sob pena de nulidade absoluta, os atos processuais, notadamente aqueles que se produzem na fase de instrução processual e que as alegações do Poder Público concernentes à dificuldade ou inconveniência da remoção de acusados presos a locais diversos daqueles em que custodiados não têm precedência sobre as determinações constitucionais. No ponto, asseverou-se que o direito de audiência, de um lado, e o direito de presença do acusado, do outro, esteja ele preso ou não, traduzem prerrogativas jurídicas que derivam da garantia constitucional do devido processo legal, consubstanciando o estatuto constitucional do direito de autodefesa, que encontra suporte legitimador também em convenções internacionais. Por fim, invalidou-se, por absolutamente nula, qualquer audiência de instrução que tenha sido realizada sem a presença pessoal do paciente, o qual deverá ser requisitado para tal fim.
HC 86634/RJ, rel. Min. Celso de Mello, 18.12.2006. (HC-86634)

Cabimento de HC e Restituição de Documentos

A Turma deferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que não conhecera de idêntica medida ao fundamento de que o habeas corpus não seria via idônea para a restituição de bens apreendidos em cumprimento de decisão judicial. No caso, os documentos foram apreendidos em diligência de busca e apreensão realizada nas dependências da empresa dos pacientes, investigados pela suposta prática de crimes de formação de quadrilha e de fraude à licitação. Sustenta a impetração ofensa ao princípio do juiz natural, sob a alegação de que os documentos não poderiam ser retidos por juízo diverso daquele que determinara a diligência, inclusive porque parte de tal documentação excederia aos limites do objeto da medida cautelar de busca e apreensão realizada. Entendeu-se que, embora se tratasse de pedido de restituição de documentos apreendidos, a impetração estaria embasada na suposta ilegalidade dessa apreensão, que poderia contaminar, eventualmente, o inquérito policial. Considerou-se, assim, presente pressuposto para o conhecimento do writ, porquanto, no bojo da investigação, seria possível a decretação de prisão cautelar dos pacientes com base em provas ilicitamente obtidas. Concluiu-se, dessa forma, ser necessário um pronunciamento da autoridade apontada como coatora acerca da legalidade ou não da apreensão de documentos empreendida nos autos do inquérito policial de origem, bem como da legalidade da manutenção dessa apreensão. HC deferido para determinar que o STJ, afastada a preliminar, aprecie o fundo da controvérsia.
HC 86600/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 18.12.2006. (HC-86600)


SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno--19.12.200610
1ª Turma--18.12.200687
2ª Turma --18.12.2006221



C L I P P I N G   D O   D J

19 de dezembro de 2006

ADI N. 3.146-DF
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL. PROCESSO LEGISLATIVO. MEDIDA PROVISÓRIA. TRANCAMENTO DE PAUTA. ART. 62, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
Preliminar de prejudicialidade: dispositivo de norma cuja eficácia foi limitada até 31.12.2005. Inclusão em pauta do processo antes do exaurimento da eficácia da norma temporária impugnada. Julgamento posterior ao exaurimento. Circunstâncias do caso afastam a aplicação da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre a prejudicialidade da ação, visto que o requerente impugnou a norma em tempo adequado.
Conhecimento da ação. A Constituição federal, ao dispor regras sobre processo legislativo, permite o controle judicial da regularidade do processo. Exceção à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre a impossibilidade de revisão jurisdicional em matéria interna corporis. Precedente.
Alegação de inconstitucionalidade formal: nulidade do processo legislativo em que foi aprovado projeto de lei enquanto pendente a leitura de medida provisória numa das Casas do Congresso Nacional, para os efeitos do sobrestamento a que se refere o art. 62, § 6º, da Constituição federal. Medida provisória que trancaria a pauta lida após a aprovação do projeto que resultou na lei atacada. Ausência de demonstração de abuso ante as circunstâncias do caso.
Ação direta conhecida, mas julgada improcedente.
* noticiado no Informativo 426

QUEST. ORD. EM Pet N. 3.674-DF
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Competência originária do Supremo Tribunal para as ações contra o Conselho Nacional de Justiça e contra o Conselho Nacional do Ministério Público (CF, art. 102, I, r, com a redação da EC 45/04): inteligência: não inclusão da ação popular, ainda quando nela se vise à declaração de nulidade do ato de qualquer um dos conselhos nela referidos.
1. Tratando-se de ação popular, o Supremo Tribunal Federal - com as únicas ressalvas da incidência da alínea n do art. 102, I, da Constituição ou de a lide substantivar conflito entre a União e Estado-membro -, jamais admitiu a própria competência originária: ao contrário, a incompetência do Tribunal para processar e julgar a ação popular tem sido invariavelmente reafirmada, ainda quando se irrogue a responsabilidade pelo ato questionado a dignitário individual - a exemplo do Presidente da República - ou a membro ou membros de órgão colegiado de qualquer dos poderes do Estado cujos atos, na esfera cível - como sucede no mandado de segurança - ou na esfera penal - como ocorre na ação penal originária ou no habeas corpus - estejam sujeitos diretamente à sua jurisdição.
2. Essa não é a hipótese dos integrantes do Conselho Nacional de Justiça ou do Conselho Nacional do Ministério Público: o que a Constituição, com a EC 45/04, inseriu na competência originária do Supremo Tribunal foram as ações contra os respectivos colegiados, e não, aquelas em que se questione a responsabilidade pessoal de um ou mais dos conselheiros, como seria de dar-se na ação popular.
* noticiado no Informativo 443

RE N. 418.416-SC
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Decisão judicial: fundamentação: alegação de omissão de análise de teses relevantes da Defesa: recurso extraordinário: descabimento.
Além da falta do indispensável prequestionamento (Súmulas 282 e 356), não há violação dos art. 5º, LIV e LV, nem do art. 93, IX, da Constituição, que não exige o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas apresentadas pelas partes, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão; exige, apenas, que a decisão esteja motivada, e a sentença e o acórdão recorrido não descumpriram esse requisito (v.g., RE 140.370, 1ª T., 20.4.93, Pertence, DJ 21.5.93; AI 242.237 - AgR, 1ª T., 27.6.00, Pertence, DJ 22.9.00).
II. Quebra de sigilo bancário: prejudicadas as alegações referentes ao decreto que a determinou, dado que a sentença e o acórdão não se referiram a qualquer prova resultante da quebra do sigilo bancário, tanto mais que, dado o deferimento parcial de mandado de segurança, houve a devolução da documentação respectiva.
III. Decreto de busca e apreensão: validade.
1. Decreto específico, que somente permitiu que as autoridades encarregadas da diligência selecionassem objetos, dentre aqueles especificados na decisão e na sede das duas empresas nela indicadas, e que fossem "interessantes à investigação" que, no caso, tinha pertinência com a prática do crime pelo qual foi efetivamente condenado o recorrente.
2. Ademais não se demonstrou que as instâncias de mérito tenham invocado prova não contida no objeto da medida judicial, nem tenham valorado qualquer dado resultante da extensão dos efeitos da decisão determinante da busca e apreensão, para que a Receita Federal e a "Fiscalização do INSS" também tivessem acesso aos documentos apreendidos, para fins de investigação e cooperação na persecução criminal, "observado o sigilo imposto ao feito".
IV - Proteção constitucional ao sigilo das comunicações de dados - art. 5º, XVII, da CF: ausência de violação, no caso.
1. Impertinência à hipótese da invocação da AP 307 (Pleno, 13.12.94, Galvão, DJU 13.10.95), em que a tese da inviolabilidade absoluta de dados de computador não pode ser tomada como consagrada pelo Colegiado, dada a interferência, naquele caso, de outra razão suficiente para a exclusão da prova questionada - o ter sido o microcomputador apreendido sem ordem judicial e a conseqüente ofensa da garantia da inviolabilidade do domicílio da empresa - este segundo fundamento bastante, sim, aceito por votação unânime, à luz do art. 5º, XI, da Lei Fundamental.
2. Na espécie, ao contrário, não se questiona que a apreensão dos computadores da empresa do recorrente se fez regularmente, na conformidade e em cumprimento de mandado judicial.
3. Não há violação do art. 5º. XII, da Constituição que, conforme se acentuou na sentença, não se aplica ao caso, pois não houve "quebra de sigilo das comunicações de dados (interceptação das comunicações), mas sim apreensão de base física na qual se encontravam os dados, mediante prévia e fundamentada decisão judicial".
4. A proteção a que se refere o art.5º, XII, da Constituição, é da comunicação 'de dados' e não dos 'dados em si mesmos', ainda quando armazenados em computador. (cf. voto no MS 21.729, Pleno, 5.10.95, red. Néri da Silveira - RTJ 179/225, 270).
V - Prescrição pela pena concretizada: declaração, de ofício, da prescrição da pretensão punitiva do fato quanto ao delito de frustração de direito assegurado por lei trabalhista (C. Penal, arts. 203; 107, IV; 109, VI; 110, § 2º e 114, II; e Súmula 497 do Supremo Tribunal).
* noticiado no Informativo 416

ADI N. 2.792-DF E ADI N. 2.860-DF
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. ADIn: legitimidade ativa: "entidade de classe de âmbito nacional" (art. 103, IX, CF): Associação Nacional dos Membros do Ministério Público - CONAMP
1. Ao julgar, a ADIn 3153-AgR, 12.08.04, Pertence, Inf STF 356, o plenário do Supremo Tribunal abandonou o entendimento que excluía as entidades de classe de segundo grau - as chamadas "associações de associações" - do rol dos legitimados à ação direta.
2. De qualquer sorte, no novo estatuto da CONAMP - agora Associação Nacional dos Membros do Ministério Público - a qualidade de "associados efetivos" ficou adstrita às pessoas físicas integrantes da categoria, - o que basta a satisfazer a jurisprudência restritiva-, ainda que o estatuto reserve às associações afiliadas papel relevante na gestão da entidade nacional.
II. ADIn: pertinência temática.
Presença da relação de pertinência temática entre a finalidade institucional das duas entidades requerentes e os dispositivos legais impugnados: as normas legais questionadas se refletem na distribuição vertical de competência funcional entre os órgãos do Poder Judiciário - e, em conseqüência, entre os do Ministério Público .
III. Foro especial por prerrogativa de função: extensão, no tempo, ao momento posterior à cessação da investidura na função dele determinante. Súmula 394/STF (cancelamento pelo Supremo Tribunal Federal). Lei 10.628/2002, que acrescentou os §§ 1º e 2º ao artigo 84 do C. Processo Penal: pretensão inadmissível de interpretação autêntica da Constituição por lei ordinária e usurpação da competência do Supremo Tribunal para interpretar a Constituição: inconstitucionalidade declarada.
1. O novo § 1º do art. 84 CPrPen constitui evidente reação legislativa ao cancelamento da Súmula 394 por decisão tomada pelo Supremo Tribunal no Inq 687-QO, 25.8.97, rel. o em. Ministro Sydney Sanches (RTJ 179/912), cujos fundamentos a lei nova contraria inequivocamente.
2. Tanto a Súmula 394, como a decisão do Supremo Tribunal, que a cancelou, derivaram de interpretação direta e exclusiva da Constituição Federal.
3. Não pode a lei ordinária pretender impor, como seu objeto imediato, uma interpretação da Constituição: a questão é de inconstitucionalidade formal, ínsita a toda norma de gradação inferior que se proponha a ditar interpretação da norma de hierarquia superior.
4. Quando, ao vício de inconstitucionalidade formal, a lei interpretativa da Constituição acresça o de opor-se ao entendimento da jurisprudência constitucional do Supremo Tribunal - guarda da Constituição -, às razões dogmáticas acentuadas se impõem ao Tribunal razões de alta política institucional para repelir a usurpação pelo legislador de sua missão de intérprete final da Lei Fundamental: admitir pudesse a lei ordinária inverter a leitura pelo Supremo Tribunal da Constituição seria dizer que a interpretação constitucional da Corte estaria sujeita ao referendo do legislador, ou seja, que a Constituição - como entendida pelo órgão que ela própria erigiu em guarda da sua supremacia -, só constituiria o correto entendimento da Lei Suprema na medida da inteligência que lhe desse outro órgão constituído, o legislador ordinário, ao contrário, submetido aos seus ditames.
5. Inconstitucionalidade do § 1º do art. 84 C.Pr.Penal, acrescido pela lei questionada e, por arrastamento, da regra final do § 2º do mesmo artigo, que manda estender a regra à ação de improbidade administrativa.
IV. Ação de improbidade administrativa: extensão da competência especial por prerrogativa de função estabelecida para o processo penal condenatório contra o mesmo dignitário (§ 2º do art. 84 do C Pr Penal introduzido pela L. 10.628/2002): declaração, por lei, de competência originária não prevista na Constituição: inconstitucionalidade.
1. No plano federal, as hipóteses de competência cível ou criminal dos tribunais da União são as previstas na Constituição da República ou dela implicitamente decorrentes, salvo quando esta mesma remeta à lei a sua fixação.
2. Essa exclusividade constitucional da fonte das competências dos tribunais federais resulta, de logo, de ser a Justiça da União especial em relação às dos Estados, detentores de toda a jurisdição residual.
3. Acresce que a competência originária dos Tribunais é, por definição, derrogação da competência ordinária dos juízos de primeiro grau, do que decorre que, demarcada a última pela Constituição, só a própria Constituição a pode excetuar.
4. Como mera explicitação de competências originárias implícitas na Lei Fundamental, à disposição legal em causa seriam oponíveis as razões já aventadas contra a pretensão de imposição por lei ordinária de uma dada interpretação constitucional.
5. De outro lado, pretende a lei questionada equiparar a ação de improbidade administrativa, de natureza civil (CF, art. 37, § 4º), à ação penal contra os mais altos dignitários da República, para o fim de estabelecer competência originária do Supremo Tribunal, em relação à qual a jurisprudência do Tribunal sempre estabeleceu nítida distinção entre as duas espécies.
6. Quanto aos Tribunais locais, a Constituição Federal - salvo as hipóteses dos seus arts. 29, X e 96, III -, reservou explicitamente às Constituições dos Estados-membros a definição da competência dos seus tribunais, o que afasta a possibilidade de ser ela alterada por lei federal ordinária.
V. Ação de improbidade administrativa e competência constitucional para o julgamento dos crimes de responsabilidade.
1. O eventual acolhimento da tese de que a competência constitucional para julgar os crimes de responsabilidade haveria de estender-se ao processo e julgamento da ação de improbidade, agitada na Rcl 2138, ora pendente de julgamento no Supremo Tribunal, não prejudica nem é prejudicada pela inconstitucionalidade do novo § 2º do art. 84 do C.Pr.Penal.
2. A competência originária dos tribunais para julgar crimes de responsabilidade é bem mais restrita que a de julgar autoridades por crimes comuns: afora o caso dos chefes do Poder Executivo - cujo impeachment é da competência dos órgãos políticos - a cogitada competência dos tribunais não alcançaria, sequer por integração analógica, os membros do Congresso Nacional e das outras casas legislativas, aos quais, segundo a Constituição, não se pode atribuir a prática de crimes de responsabilidade.
3. Por outro lado, ao contrário do que sucede com os crimes comuns, a regra é que cessa a imputabilidade por crimes de responsabilidade com o termo da investidura do dignitário acusado.
* noticiado no Informativo 401

Acórdãos Publicados: 165



T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.


Tribunal de Justiça Militar Estadual - "Habeas Corpus" - Competência Originária do STJ (Transcrições)

CC 7346/SP*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA ENTRE O SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR (STM) E O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). "HABEAS CORPUS" IMPETRADO, EM FAVOR DE OFICIAL DA POLÍCIA MILITAR, CONTRA DECISÃO EMANADA DE TRIBUNAL DE JUSTIÇA MILITAR ESTADUAL. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA, EM REFERIDO CONTEXTO, PROCESSAR E JULGAR A AÇÃO DE "HABEAS CORPUS". AS DECISÕES DA JUSTIÇA MILITAR ESTADUAL ESTÃO SUJEITAS, UNICAMENTE, AO CONTROLE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, ENQUANTO INSTÂNCIAS DE SUPERPOSIÇÃO. O SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR NÃO DISPÕE DE COMPETÊNCIA DE DERROGAÇÃO DOS ACÓRDÃOS EMANADOS DA JUSTIÇA MILITAR DOS ESTADOS-MEMBROS. A QUESTÃO DA COMPETÊNCIA PENAL DA JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO E DOS ESTADOS-MEMBROS. O CARÁTER ANÔMALO DA JURISDIÇÃO PENAL CASTRENSE, OUTORGADA À JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO, EM TEMPO DE PAZ, SOBRE CIVIS. O CASO "EX PARTE MILLIGAN" (1866): UMA "LANDMARK DECISION" DA SUPREMA CORTE DOS EUA (RTJ 193/357-358). RECONHECIMENTO, NO CASO, DA COMPETÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA PARA PROCESSAR E JULGAR, EM SEDE ORIGINÁRIA, "HABEAS CORPUS" IMPETRADO CONTRA DECISÃO EMANADA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO.

DECISÃO: Trata-se de conflito negativo de competência instaurado entre o E. Superior Tribunal Militar e o E. Superior Tribunal de Justiça, motivado pelo dissenso quanto ao órgão judiciário investido de atribuições jurisdicionais para processar e julgar ação de "habeas corpus" ajuizada em face de acórdão proferido pelo E. Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo, que recebeu denúncia contra determinado Tenente-Coronel da Polícia Militar dessa mesma unidade da Federação.
O Ministério Público Federal, em pronunciamento da lavra da ilustre Subprocuradora-Geral da República, Dra. CLÁUDIA SAMPAIO MARQUES, aprovado pelo eminente Procurador-Geral da República (fls. 97/99), entendeu competente o E. Superior Tribunal de Justiça, órgão ora suscitado, para apreciar o pedido de "habeas corpus" em questão, formulando parecer assim ementado (fls. 97):

"CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA ENTRE O SUPERIOR TRIBUNAL MILITAR E O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 'HABEAS CORPUS' IMPETRADO CONTRA DECISÃO COLEGIADA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA MILITAR DO ESTADO DE SÃO PAULO. CORTE SUJEITA À JURISDIÇÃO DO ÓRGÃO SUSCITADO. PARECER PELO CONHECIMENTO DO CONFLITO PARA DECLARAR A COMPETÊNCIA DO STJ PARA PROCESSAR E JULGAR O 'WRIT'." (grifei)

Cabe reconhecer, preliminarmente, considerada a situação de antagonismo entre o E. Superior Tribunal Militar e o E. Superior Tribunal de Justiça, que assiste, ao Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 102, I, "o", da Constituição da República, a atribuição jurisdicional originária de dirimir o presente conflito de competência instaurado entre Tribunais Superiores da União.
Entendo assistir plena razão à douta Procuradoria-Geral da República, pois o E. Superior Tribunal Militar, não obstante qualificado, constitucionalmente, como Tribunal Superior, atua como órgão de segunda instância da Justiça Militar da União (CF, art. 122, I).
Isso significa, portanto, que o Superior Tribunal Militar - enquanto órgão de cúpula da Justiça Militar da União - não dispõe, considerada essa particular condição institucional, de competência, para, em tema de crimes militares praticados por integrantes da Polícia Militar e dos Corpos de Bombeiros Militares, reexaminar, quer em sede recursal, quer em sede de "habeas corpus", as decisões que, nessa mesma matéria, hajam sido proferidas por Tribunais de Justiça locais ou, onde houver, por Tribunais de Justiça Militar, como ocorre nos Estados de São Paulo, do Rio Grande do Sul e de Minas Gerais (CF, art. 125, § 3º).
Cumpre acentuar, neste ponto, por necessário, que a competência penal da Justiça Militar dos Estados-membros restringe-se, unicamente, tratando-se de crimes militares definidos em lei, aos membros integrantes da respectiva Polícia Militar, "ressalvada a competência do júri quando a vítima for civil" (CF, art. 125, § 4º, na redação dada pela EC nº 45/2004).
As decisões proferidas, em primeiro grau, "pelos juízes de direito e pelos Conselhos de Justiça" são passíveis de controle recursal, em segunda instância, nos delitos militares praticados por "militares dos Estados" (CF, art. 125, § 4º), "pelo próprio Tribunal de Justiça, ou por Tribunal de Justiça Militar nos Estados em que o efetivo militar seja superior a vinte mil integrantes" (CF, art. 125, § 3º, na redação dada pela EC nº 45/2004).
Na realidade, e como tem advertido a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a competência penal da Justiça Militar dos Estados-membros - porque abrangente de um complexo de atribuições de exegese necessariamente estrita - não se estende aos civis, limitando-se, tão-somente, mesmo nas hipóteses legais de conexão ou de continência, aos membros integrantes das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares:

"Incompetência da Justiça Militar Estadual para o processo e julgamento de civil (C.F., art. 125, § 4º), mesmo quando enquadrável como crime militar o fato que lhe é atribuído.
'Habeas corpus' deferido."
(HC 80.163/MG, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI - grifei)

"'HABEAS CORPUS' - CRIME COMETIDO POR CIVIL CONTRA O PATRIMÔNIO DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO - INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA MILITAR ESTADUAL (CF, ART 125, § 4º) - PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL - NULIDADE DOS ATOS DECISÓRIOS PROFERIDOS PELA JUSTIÇA MILITAR DO ESTADO - PEDIDO DEFERIDO.
- A Justiça Militar estadual não dispõe de competência penal para processar e julgar civil que tenha sido denunciado pela prática de crime contra a Polícia Militar do Estado.
Qualquer tentativa de submeter os réus civis a procedimentos penais-persecutórios instaurados perante órgãos da Justiça Militar estadual representa, no contexto de nosso sistema jurídico, clara violação ao princípio constitucional do juiz natural (CF, art. 5º, LIII).
- A Constituição Federal, ao definir a competência penal da Justiça Militar dos Estados-membros, delimitou o âmbito de incidência do seu exercício, impondo, para efeito de sua configuração, o concurso necessário de dois requisitos: um, de ordem objetiva (a prática de crime militar definido em lei) e outro, de índole subjetiva (a qualificação do agente como policial militar ou como bombeiro militar).
A competência constitucional da Justiça Militar estadual, portanto, sendo de direito estrito, estende-se, tão-somente, aos integrantes da Policia Militar ou dos Corpos de Bombeiros Militares que hajam cometido delito de natureza militar."
(RTJ 158/513-514, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

De outro lado, e tratando-se da Justiça Militar da União, cumpre registrar, quanto a ela, que dispõe, excepcionalmente, nos crimes militares tipificados em lei - ao contrário do que sucede com a Justiça Militar do Estado-membro -, de competência penal sobre réus civis, ainda que em tempo de paz.
Como anteriormente enfatizado, reveste-se de caráter excepcional a jurisdição castrense outorgada à Justiça Militar da União, notadamente quando se tratar de civil, tal como acentua, com particular ênfase, a jurisprudência constitucional desta Suprema Corte:

"(...) EXCEPCIONALIDADE DA COMPETÊNCIA PENAL DA JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO, EM TEMPO DE PAZ, TRATANDO-SE DE RÉU CIVIL.
- Não se tem por configurada a competência penal da Justiça Militar da União, em tempo de paz, tratando-se de réus civis, se a ação delituosa, a eles atribuída, não afetar, ainda que potencialmente, a integridade, a dignidade, o funcionamento e a respeitabilidade das instituições militares, que constituem, em essência, nos delitos castrenses, os bens jurídicos penalmente tutelados.
- O caráter anômalo da jurisdição penal castrense sobre civis, notadamente em tempo de paz. O caso 'Ex Parte Milligan' (1866): um precedente histórico valioso.
O POSTULADO DO JUIZ NATURAL REPRESENTA GARANTIA CONSTITUCIONAL INDISPONÍVEL, ASSEGURADA A QUALQUER RÉU, EM SEDE DE PERSECUÇÃO PENAL, MESMO QUANDO INSTAURADA PERANTE A JUSTIÇA MILITAR DA UNIÃO.
- O princípio da naturalidade do juízo representa uma das mais importantes matrizes político-ideológicas que conformam a própria atividade legislativa do Estado e condicionam o desempenho, pelo Poder Público, das funções de caráter penal-persecutório, notadamente quando exercidas em sede judicial.
O postulado do juiz natural, em sua projeção político-jurídica, reveste-se de dupla função instrumental, pois, enquanto garantia indisponível, tem, por titular, qualquer pessoa exposta, em juízo criminal, à ação persecutória do Estado, e, enquanto limitação insuperável, representa fator de restrição que incide sobre os órgãos do poder estatal incumbidos de promover, judicialmente, a repressão criminal.
- É irrecusável, em nosso sistema de direito constitucional positivo - considerado o princípio do juiz natural - que ninguém poderá ser privado de sua liberdade senão mediante julgamento pela autoridade judiciária competente. Nenhuma pessoa, em conseqüência, poderá ser subtraída ao seu juiz natural. A nova Constituição do Brasil, ao proclamar as liberdades públicas - que representam limitações expressivas aos poderes do Estado - consagrou, de modo explícito, o postulado fundamental do juiz natural. O art. 5º, LIII, da Carta Política prescreve que 'ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente' (...)."
(RTJ 193/357-358, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

De qualquer maneira, no entanto, não assiste, ao E. Superior Tribunal Militar, competência para reexaminar, em sede de "habeas corpus" (como sucede na espécie), acórdão, que, emanado do E. Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo, ordenou "o recebimento da denúncia" (fls. 19), por crime militar, contra determinado Oficial da Polícia Militar daquela unidade da Federação.
Cabe, na verdade, não ao Superior Tribunal Militar, mas, isso sim, ao Superior Tribunal de Justiça, por efeito de expressa determinação constitucional, processar e julgar, originariamente, a ação de "habeas corpus", "quando o coator for tribunal sujeito à sua jurisdição" (CF, art. 105, I, "c", na redação dada pela EC 22/99), como ocorre com os Tribunais judiciários estaduais (Tribunais de Justiça e, onde houver, Tribunais de Justiça Militar).
Daí a correta observação constante do parecer da douta Procuradoria-Geral da República (fls. 98/99):

"6. (...). A Justiça Militar local, que dispõe de competência constitucional apenas para processar e julgar os integrantes da Polícia Militar ou do Corpo de Bombeiros Militares que tenham cometido delito de natureza militar, pertence à estrutura do Poder Judiciário do Estado Federado, sujeitando-se, portanto, à jurisdição do Superior Tribunal de Justiça.
7. Já o Superior Tribunal Militar, impõe-se advertir, não é órgão de cúpula da Justiça Militar, mas, tão-somente, órgão de segunda instância da Justiça Militar federal.
8. Como exposto na decisão emanada da Corte suscitante, 'o art. 1º da LOJM enumera os órgãos da Justiça Militar da União como sendo apenas o Superior Tribunal Militar, a Auditoria de Correição, os Conselhos de Justiça, os Juízes Auditores e os Juízes Auditores substitutos. Não são órgãos da Justiça Militar da União, e nem se sujeitam à sua jurisdição, os Juízes de Direito da Justiça Militar estadual e os Tribunais de Justiça Militar estaduais, referidos no art. 125 da Constituição Federal. Também não há que se confundir o militar das Forças Armadas, de que tratam o § 3º, do art. 142, da Constituição e o art. 22 do CPM, e que é julgado pela Justiça Militar da União, com o policial militar referido no § 5º, do art. 144, do mesmo diploma, cuja competência para o julgamento é da Justiça Militar estadual, nos termos do § 4º, do referido art. 125 da Constituição' (fl. 82).
Deste modo, tendo em vista o disposto no art. 105, I, 'c', da CF, manifesta-se o Ministério Público Federal pelo conhecimento do conflito para declarar a competência do Superior Tribunal de Justiça para processar e julgar o pedido de 'habeas corpus' formulado pela defesa de Carlos Roberto de Barros Consani contra acórdão do Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo." (grifei)

Sendo assim, pelas razões expostas, acolhendo o parecer da douta Procuradoria-Geral da República (fls. 97/99), e nos termos do art. 120, parágrafo único, do CPC, conheço deste conflito negativo de competência e declaro competente o Superior Tribunal de Justiça para processar e julgar o pedido de "habeas corpus" impetrado a fls. 03/10.
Encaminhem-se, pois, os presentes autos ao E. Superior Tribunal de Justiça.
Transmita-se, ao E. Superior Tribunal Militar, mediante cópia, o teor da presente decisão.
Publique-se.
Brasília, 07 de dezembro de 2006.

Ministro CELSO DE MELLO
Relator


* decisão publicada no DJU de 14.12.2006



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