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quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Informativo STF 468 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Brasília, 21 a 25 de maio de 2007 - Nº 468.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO


Plenário
Aumento de Remuneração: Iniciativa das Casas Legislativas e Dotação Orçamentária - 1
Aumento de Remuneração: Iniciativa das Casas Legislativas e Dotação Orçamentária - 2
Conselho Superior do Ministério Público: Poder Normativo e Critérios para a Promoção - 1
Conselho Superior do Ministério Público: Poder Normativo e Critérios para a Promoção - 2
Sistema Bicameral e Vício Formal - 1
Sistema Bicameral e Vício Formal - 2
Verbete 394 da Súmula e Art. 84 do CPP - 3
Mandado de Injunção e Direito de Greve - 1
Mandado de Injunção e Direito de Greve - 2
Mandado de Injunção e Direito de Greve - 3
Nova Composição da Corte: Renovação de Julgamento e Óbice Regimental
1ª Turma
Princípio da Proporcionalidade e Mérito Administrativo
Resolução e Criação de Vara Especializada - 3
Perda dos Dias Remidos e Art. 58 da LEP
Demora no Julgamento de HC e Injusto Constrangimento
Crime Doloso contra a Vida e Justiça Militar
Exceção de Coisa Julgada e Crime Militar
2ª Turma
ED e Juízo de Admissibilidade Implícito - 1
ED e Juízo de Admissibilidade Implícito - 2
Clipping do DJ
Transcrições
Tribunal de Contas - Provimento Cautelar - Poder Implícito - Devido Processo Legal (MS 26547/DF)
Rcl e Sala de Estado-Maior (Rcl 4535/ES)
Medida Sócio-Educativa e Advento da Maioridade (HC 90129/RJ)


PLENÁRIO


Aumento de Remuneração: Iniciativa das Casas Legislativas e Dotação Orçamentária - 1

O Tribunal conheceu em parte de ação direta ajuizada pelo Presidente da República e, na parte conhecida, julgou improcedente o pedido nela formulado de declaração de inconstitucionalidade das Leis 11.169/2005 e 11.170/2005, de iniciativa, respectivamente, da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, que alteraram a remuneração dos servidores dessas Casas Legislativas, majorando-a em 15%. Afastou-se a alegação de ofensa ao art. 61, § 1º, II, a, da CF, haja vista não se tratar de normas que pretenderam revisão geral anual de remuneração dos servidores públicos, mas de normas específicas (CF, art. 37, X), daquelas Casas Legislativas, que concederam majoração de remuneração a seus servidores, com base no art. 51, IV e no art. 52, XIII, ambos da CF, não havendo, assim, que se falar, também, em violação ao princípio da separação de poderes. Da mesma forma, não se acolheu o argumento de afronta ao art. 5º, caput, da CF, asseverando-se que, do confronto estabelecido entre a possibilidade de concessão de aumentos diferenciados e o princípio da isonomia, há de se privilegiar o entendimento que, harmonizando o conceito de majorações remuneratórias específicas para determinados segmentos e carreiras - respeitados os limites das respectivas autonomias administrativo-financeiras -, com a revisão geral anual do funcionalismo público, é constitucional a norma que concede aumentos para determinados grupos, desde que tais reajustes sejam devidamente compensados, em caso de eventual revisão geral anual.
ADI 3599/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 21.5.2007. (ADI-3599)

Aumento de Remuneração: Iniciativa das Casas Legislativas e Dotação Orçamentária - 2

No que se refere à apontada violação ao art. 169, § 1º, da CF, não se conheceu do pedido, com base na orientação fixada no julgamento da ADI 1292/MT (DJU de 15.9.95), no sentido de que não se viabiliza controle abstrato de constitucionalidade quando se pretende confrontar norma que impõe despesa alusiva a vantagem funcional e o art. 169, da CF, visto que a ausência de dotação orçamentária prévia em legislação específica não autoriza a declaração de inconstitucionalidade da lei, mas apenas impede a sua aplicação naquele exercício financeiro. Ademais, reconheceu-se que, no caso, teria havido dotação orçamentária. O Min. Cezar Peluso fez ressalva quanto à interpretação ao art. 37, X, da CF, no que foi acompanhado pelo Min. Carlos Britto, no sentido de que essa norma introduz um requisito particular, que é a necessidade de uma lei específica para toda e qualquer alteração de remuneração, independentemente de se tratar de aumento ou de simples revisão geral, e, ainda, que a parte final desse dispositivo confere a garantia, aos servidores públicos dos três Poderes, dessa revisão geral anualmente.
ADI 3599/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 21.5.2007. (ADI-3599)

Conselho Superior do Ministério Público: Poder Normativo e Critérios para a Promoção - 1

O Tribunal, por maioria, concedeu mandado de segurança impetrado por Subprocuradores-Gerais da República e integrantes do Conselho Superior do Ministério Público Federal para tornar insubsistente a decisão do Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP, no Procedimento de Controle Administrativo 435/2006, que, alterando a Resolução 86/2006 daquele Conselho que fixara critérios para a promoção por merecimento, impusera avaliação negativa dos currículos dos candidatos à promoção por merecimento, quanto à eficiência, produtividade, presteza e dedicação no desempenho das funções, bem como o voto de desempate do Procurador-Geral da República, em substituição ao fator antigüidade. Preliminarmente, reconheceu-se a legitimidade ativa dos impetrantes, já que membros titulares do Conselho Superior que visavam preservar a atuação sem interferência externa. Reportou-se ao que decidido no MS 21239/DF (DJU de 23.4.93) e AO 232/PE (DJU de 20.4.2001), nos quais o Tribunal proclamou estarem incluídos entre os direitos públicos subjetivos os direitos-função, que têm por objeto a posse e o exercício, em toda a extensão, das competências e prerrogativas da função pública pelo titular que a detenha. No mérito, entendeu-se que o CNMP não deparou com ato concreto de promoção, mas com norma editada, com base no disposto nos artigos 57, I, e, VII, e 200, §§ 1º a 3º da Lei Complementar 75/93, pelo Conselho Superior, e que, ao alterá-la, adentrou campo normativo, ultrapassando os limites previstos na Constituição Federal ("Art. 130-A....§ 2º Compete ao Conselho Nacional do Ministério Público o controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros, cabendo-lhe: I - zelar pela autonomia funcional e administrativa do Ministério Público, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências; II - zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência dos Tribunais de Contas;..."), em afronta à autonomia funcional e administrativa do Ministério Público, que a ele caberia zelar.
MS 26264/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 21.5.2007. (MS-26264)

Conselho Superior do Ministério Público: Poder Normativo e Critérios para Promoção - 2

Asseverou-se, ademais, que, sob o ângulo do desempate, não se deveria concluir ter-se formalizado correção de rumo, considerado o art. 56, § 1º, LC 75/93, que dispõe que, em matéria administrativa, verificado o empate na esfera do Conselho Superior, prevalece a corrente a qual integra o Procurador-Geral da República, que o preside. Esclareceu-se, no ponto, que, além de se estar diante de ato normativo abstrato do Conselho Superior, haver-se-ia de conferir, ao referido preceito, interpretação teleológica, no sentido de que ele se refere a processos administrativos em geral, não sendo possível emprestar-lhe alcance de molde a abranger a confecção de lista por merecimento, sob pena de o Procurador-Geral da República, afastando a natureza complexa do ato, vir a atuar de forma tríplice, estabelecendo, por si mesmo, o teor da própria lista. Afirmou-se, também, que o critério de desempate previsto na Resolução do Conselho Superior - a antigüidade - ante impasse, tendo em conta o número par dos integrantes do Conselho Superior, é dotado de razoabilidade e homenageia o sistema de promoção. Por fim, aduziu-se que, quanto ao critério introduzido para a avaliação, ter-se-ia a potencialização do excepcional, porquanto, ao invés de se apreciarem as qualidades do candidato, conferindo-se a devida gradação, ter-se-ia, à margem do objeto do instituto da promoção por merecimento - a escolha do melhor - o exame sob o ângulo negativo. Os Ministros Carlos Britto e Gilmar Mendes, acompanharam o relator, com a ressalva de que o CNMP possui poder normativo. Vencidos os Ministros Joaquim Barbosa, Cezar Peluso, Celso de Mello e Ellen Gracie, que denegavam a ordem, ao fundamento de que o CNMP, dentro do âmbito da competência que lhe foi conferida pela Constituição para editar atos regulamentares e examinar a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Ministério Público da União e dos Estados, afastou norma que estaria em confronto com a LC 75/93 (art. 56, § 1º) e com a jurisprudência da Corte (ADI 189/DF, DJU de 22.5.92; AO 70/DF, DJU 18.6.93), que assentou que a introdução do critério de antiguidade entre os critérios das promoções por merecimento ofende a dualidade constitucional da promoção.
MS 26264/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 21.5.2007. (MS-26264)

Sistema Bicameral e Vício Formal - 1

O Tribunal iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Partido Trabalhista Nacional - PTN contra a Lei 8.429/92, que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional e dá outras providências. O Min. Marco Aurélio, relator, julgou procedente o pedido formulado para declarar a inconstitucionalidade formal da lei impugnada por entender que o diploma legal foi aprovado sem a devida observância do sistema bicameral. Afirmou que o projeto que dera origem à Lei 8.429/92, aprovado pela Câmara dos Deputados e enviado ao Senado Federal para revisão, fora objeto de substitutivo nesta Casa Legislativa, que adotara, portanto, postura própria à Casa iniciadora. Assim, a Câmara dos Deputados, ao receber o substitutivo e rejeitá-lo quase que integralmente, emendando-o, deveria tê-lo remetido ao Senado Federal, por força do disposto no art. 65, parágrafo único, da CF, e não à sanção presidencial ("Art. 65. O projeto de lei aprovado por uma Casa será revisto pela outra, em um só turno de discussão e votação, e enviado à sanção ou promulgação, se a Casa revisora o aprovar, ou arquivado, se o rejeitar. Parágrafo único. Sendo o projeto emendado, voltará à Casa iniciadora.").
ADI 2182/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 23.5.2007. (ADI-2182)

Sistema Bicameral e Vício Formal - 2

Em divergência, a Min. Cármen Lúcia, considerando que, na espécie, a modificação do projeto iniciado na Câmara dos Deputados se dera, no Senado Federal, basicamente pela pormenorização, adoção de uma técnica legislativa, em que o conteúdo se alterara muito mais no sentido formal do que material, e, ainda, ressaltando a prevalência da Casa iniciadora do projeto, julgou improcedente o pleito, no que foi acompanhada pelo Min. Ricardo Lewandowski. Após, pediu vista dos autos o Min. Eros Grau. Em seguida, o Min. Marco Aurélio, relator, suscitando questão de ordem, rejeitou a possibilidade de o Tribunal, superada a questão pertinente à inconstitucionalidade formal da lei, apreciar os aspectos conducentes ou não da inconstitucionalidade material, tendo em conta a petição inicial abordar somente o vício formal, não atendendo à exigência, feita pela Corte, de análise mínima quanto a vício material. Acompanharam o relator os Ministros Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Carlos Britto. Após os votos dos Ministros Eros Grau, Cezar Peluso e Celso de Mello, que divergiam do relator, ao fundamento de que a função da Corte é examinar a inconstitucionalidade da norma impugnada em face de toda a Constituição, pediu vista dos autos, quanto a esse ponto, o Min. Gilmar Mendes.
ADI 2182/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 23.5.2007. (ADI-2182)

Verbete 394 da Súmula e Art. 84 do CPP - 3

Em conclusão de julgamento, o Tribunal resolveu questão de ordem suscitada em inquérito, no qual se questionava, ante a alteração dada ao art. 84 do Código de Processo Penal pela Lei 10.628/2002, se persistiria a competência desta Corte para o julgamento de ação penal instaurada contra ex-Deputado Federal, por crimes supostamente praticados no exercício do mandato ou em razão dele - v. Informativos 322 e 423. Aplicou-se a orientação firmada pelo STF no julgamento da ADI 2797/DF (acórdão pendente de publicação), em que reconhecida a inconstitucionalidade do § 1º do art. 84 do CPP, e determinou-se a baixa dos autos à primeira instância (CPP, art. 84, § 1º: "A competência especial por prerrogativa de função, relativa a atos administrativos do agente, prevalece ainda que o inquérito ou a ação judicial sejam iniciados após a cessação do exercício da função pública.").
Inq 2010 QO/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 23.5.2007. (Inq-2010)

Mandado de Injunção e Direito de Greve - 1

O Tribunal iniciou julgamento de mandado de injunção impetrado pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Município de João Pessoa - SINTEM em face do Congresso Nacional, com o objetivo de dar efetividade à norma inscrita no art. 37, VII, da CF ("Art. 37. ... VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica;"). O Min. Gilmar Mendes, relator, conheceu do mandado de injunção e acolheu a pretensão nele deduzida para que, enquanto não suprida a lacuna legislativa, seja aplicada a Lei 7.783/89, e, ainda, em razão dos imperativos da continuidade dos serviços públicos, de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, e mediante solicitação de órgão competente, seja facultado ao juízo competente impor a observância a regime de greve mais severo, haja vista se tratar de serviços ou atividades essenciais, nos termos dos artigos 9 a 11 da Lei 7.783/89. Inicialmente, teceu considerações a respeito da questão da conformação constitucional do mandado de injunção no Direito Brasileiro e da evolução da interpretação que o Supremo lhe tem conferido. Ressaltou que a Corte, afastando-se da orientação inicialmente perfilhada no sentido de estar limitada à declaração da existência da mora legislativa para a edição de norma regulamentadora específica, passou, sem assumir compromisso com o exercício de uma típica função legislativa, a aceitar a possibilidade de uma regulação provisória pelo próprio Judiciário. Registrou, ademais, o quadro de omissão que se desenhou, não obstante as sucessivas decisões proferidas nos mandados de injunção.
MI 708/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 24.5.2007. (MI-708)

Mandado de Injunção e Direito de Greve - 2

O Min. Gilmar Mendes entendeu que, diante disso, talvez se devesse refletir sobre a adoção, como alternativa provisória, para esse impasse, de uma moderada sentença de perfil aditivo. Aduziu, no ponto, no que concerne à aceitação das sentenças aditivas ou modificativas, que elas são em geral aceitas quando integram ou completam um regime previamente adotado pelo legislador ou, ainda, quando a solução adotada pelo Tribunal incorpora "solução constitucionalmente obrigatória". Salientou que a disciplina do direito de greve para os trabalhadores em geral, no que tange às denominadas atividades essenciais, é especificamente delineada nos artigos 9 a 11 da Lei 7.783/89 e que, no caso de aplicação dessa legislação à hipótese do direito de greve dos servidores públicos, afigurar-se-ia inegável o conflito existente entre as necessidades mínimas de legislação para o exercício do direito de greve dos servidores públicos, de um lado, com o direito a serviços públicos adequados e prestados de forma contínua, de outro. Assim, tendo em conta que ao legislador não seria dado escolher se concede ou não o direito de greve, podendo tão-somente dispor sobre a adequada configuração da sua disciplina, reconheceu a necessidade de uma solução obrigatória da perspectiva constitucional.
MI 708/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 24.5.2007. (MI-708)

Mandado de Injunção e Direito de Greve - 3

Por fim, depois de esclarecer a necessidade da complementação na parte dispositiva de seu voto, porquanto não se poderia deixar de cogitar dos riscos decorrentes das possibilidades de que a regulação dos serviços públicos que tenham características afins aos serviços ou atividades essenciais seja menos severa que a disciplina dispensada aos serviços privados ditos essenciais, concluiu que, sob pena de injustificada e inadmissível negativa de prestação jurisdicional nos âmbitos federal, estadual e municipal, seria mister que, na decisão do writ, fossem fixados, também, os parâmetros institucionais e constitucionais de definição de competência, provisória e ampliativa, para apreciação de dissídios de greve instaurados entre o Poder Público e os servidores com vínculo estatutário. Dessa forma, no plano procedimental, vislumbrou a possibilidade de aplicação da Lei 7.701/88, que cuida da especialização das turmas dos Tribunais do Trabalho em processos coletivos. Após, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Ricardo Lewandowski.
MI 708/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 24.5.2007. (MI-708)

Nova Composição da Corte: Renovação de Julgamento e Óbice Regimental

O Tribunal, por maioria, julgou improcedente pedido formulado em ação cível originária proposta pelo Estado do Paraná contra a União, em que objetivava o ressarcimento das despesas decorrentes de construção de estrada de ferro, em razão de convênios celebrados entre as partes - v. Informativos 116, 254 e 323. Preliminarmente, o Tribunal, por maioria, rejeitou o requerimento formalizado pelo Estado do Paraná, e apresentado pelo Min. Marco Aurélio, no sentido da renovação do julgamento, haja vista a nova composição da Corte e o grande valor da causa. Considerou-se que o pedido encontraria óbice no art. 134, § 1º, do RISTF ("Art. 134. Se algum dos Ministros pedir vista dos autos, deverá apresentá-los, para prosseguimento da votação, até a segunda sessão ordinária subseqüente. § 1° Ao reencetar-se o julgamento, serão computados os votos já proferidos pelos Ministros, ainda que não compareçam ou hajam deixado o exercício do cargo."). Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio, que acolhia o requerimento, para que houvesse o reinício do julgamento com a participação dos Ministros que hoje integram o Tribunal. O Min. Marco Aurélio afirmou que o julgamento no plenário seria um grande todo e que, antes da proclamação final deste, diante das questões trazidas por quem pediu vista, poderia haver retratação por qualquer dos integrantes do Tribunal, e, aí, compondo essa mesma retratação o julgamento, se impossível, tendo em conta os Ministros que já se afastaram, não se teria a observância, portanto, desse julgamento como um grande todo. No mérito, entendeu-se que o acordo firmado entre as partes fora integralmente adimplido. Vencidos, em parte, o Min. Nelson Jobim, que julgava o pedido parcialmente procedente, e o Min. Marco Aurélio, que o julgava integralmente procedente.
ACO 453/PR, rel. orig. Min. Ilmar Galvão, rel. p/ o acórdão Min. Ellen Gracie, 24.5.2007. (ACO-453)


PRIMEIRA TURMA


Princípio da Proporcionalidade e Mérito Administrativo

A Turma manteve decisão monocrática do Min. Carlos Velloso que negara provimento a recurso extraordinário, do qual relator, por vislumbrar ofensa aos princípios da moralidade administrativa e da necessidade de concurso público (CF, art. 37, II). Tratava-se, na espécie, de recurso em que o Município de Blumenau e sua Câmara Municipal alegavam a inexistência de violação aos princípios da proporcionalidade e da moralidade no ato administrativo que instituíra cargos de assessoramento parlamentar. Ademais, sustentavam que o Poder Judiciário não poderia examinar o mérito desse ato que criara cargos em comissão, sob pena de afronta ao princípio da separação dos poderes. Entendeu-se que a decisão agravada não merecia reforma. Asseverou-se que, embora não caiba ao Poder Judiciário apreciar o mérito dos atos administrativos, a análise de sua discricionariedade seria possível para a verificação de sua regularidade em relação às causas, aos motivos e à finalidade que ensejam. Salientando a jurisprudência da Corte no sentido da exigibilidade de realização de concurso público, constituindo-se exceção a criação de cargos em comissão e confiança, reputou-se desatendido o princípio da proporcionalidade, haja vista que, dos 67 funcionários da Câmara dos Vereadores, 42 exerceriam cargos de livre nomeação e apenas 25, cargos de provimento efetivo. Ressaltou-se, ainda, que a proporcionalidade e a razoabilidade podem ser identificadas como critérios que, essencialmente, devem ser considerados pela Administração Pública no exercício de suas funções típicas. Por fim, aduziu-se que, concebida a proporcionalidade como correlação entre meios e fins, dever-se-ia observar relação de compatibilidade entre os cargos criados para atender às demandas do citado Município e os cargos efetivos já existentes, o que não ocorrera no caso.
RE 365368 AgR/SC, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 22.5.2007. (RE-365368)

Resolução e Criação de Vara Especializada - 3

A Turma retomou julgamento de habeas corpus em que acusado pela suposta prática de crimes contra o sistema financeiro nacional, contra a ordem tributária, de lavagem de ativos ilícitos e de apropriação indébita alega ofensa aos princípios constitucionais da reserva de lei e da separação de poderes. Sustenta-se, na espécie, a incompetência da 11ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Ceará - criada pela Resolução 314/2003 do Conselho da Justiça Federal - CJF e regulamentada pela Resolução 10-A/2003, do TRF da 5ª Região -, porquanto o inquérito policial iniciara-se no Juízo Federal da 12ª Vara daquela Seção Judiciária e, com a criação dessa vara especializada em cuidar de delitos financeiros, o procedimento fora para lá distribuído, em data anterior ao oferecimento da denúncia, em ofensa ao princípio do juiz natural e ao art. 75, parágrafo único, do CPP - v. Informativo 457. Após o voto-vista do Min. Ricardo Lewandowski que acompanhava o voto da Min. Cármen Lúcia, relatora, que deferia o writ para determinar que o paciente seja julgado pela 12ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Ceará, a Turma, resolvendo questão de ordem suscitada pelo Min. Marco Aurélio, decidiu afetar o julgamento ao Plenário.
HC 88660/CE, rel. Min. Cármen Lúcia, 22.5.2007. (HC-88660)

Perda dos Dias Remidos e Art. 58 da LEP

A Turma iniciou julgamento de habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo em favor de condenado que, ante a prática de falta grave, perdera a integralidade dos dias remidos. Pretende-se, na espécie, o estabelecimento de limitação à perda dos dias remidos em, no máximo, 30 dias, conforme o parâmetro do art. 58 da Lei de Execução Penal - LEP ("o isolamento, a suspensão e a restrição de direitos não poderão exceder a 30 (trinta) dias."), sob a alegação de que a decretação automática da perda de todo o tempo remido viola os princípios da isonomia, da individualização da pena e da dignidade da pessoa humana. A Min. Cármen Lúcia, relatora, indeferiu o writ, no que foi acompanhada pelo Min. Ricardo Lewandowski. Inicialmente, asseverou que a jurisprudência da Corte é no sentido de que a falta grave cometida durante o cumprimento da pena implica a perda dos dias remidos (LEP, art. 127), sem que isso signifique ofensa ao direito adquirido. No tocante à remição, cujos efeitos estão ligados ao comportamento carcerário do condenado, entendeu incabível a incidência do aludido art. 58 da LEP para restringir a perda a 30 dias, porquanto esse dispositivo refere-se exclusivamente ao isolamento, à suspensão e à restrição de direitos, incumbindo à autoridade disciplinar do estabelecimento prisional aplicá-lo, o que não ocorre com aquele instituto, de competência do juízo da execução. Assim, concluiu não haver pertinência entre o referido artigo e o objeto deste habeas corpus. Por fim, reputou dispensável o pedido de limitação temporal referente aos dias remidos até a prática da falta grave, uma vez que o sentenciado tornará a adquirir eventual benefício a partir da data da infração disciplinar. Após, pediu vista dos autos o Min. Carlos Britto.
HC 91085/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 22.5.2007. (HC-91085)

Demora no Julgamento de HC e Injusto Constrangimento

A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se pretende a concessão da ordem para determinar que o STJ coloque em pauta idêntica medida lá impetrada, ao argumento de excesso de prazo no julgamento do writ que, impetrado em 1º.8.2006, tivera liminar indeferida em 21.8.2006, data em que os autos foram remetidos ao Ministério Público Federal. A Min. Cármen Lúcia, relatora, indeferiu o writ, no que foi acompanhada pelo Min. Ricardo Lewandowski. Embora reconhecendo não ser curto o período de pendência daquela ação no Tribunal a quo, considerou que a concessão da ordem, neste caso, seria medida excepcional e tornar-se-ia viável se essa demora configurasse efetivo e óbvio constrangimento ilegal pelo descumprimento da norma da razoável duração do processo (CF, art. 5º, LXXVIII), o que não comprovado na espécie. Aduziu, nesse sentido, que o feito, já concluso com parecer, estaria tendo regular processamento, que, em princípio, não se teriam os fundamentos pelos quais o habeas corpus teria sido denegado na origem e que não haveria risco iminente ao direito de ir e vir do paciente, porquanto não se encontra preso. Após, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Carlos Britto.
HC 91041/PE, rel. Min. Cármen Lúcia, 22.5.2007. (HC-91041)

Crime Doloso contra a Vida e Justiça Militar

A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se alegava a incompetência da justiça militar para processar e julgar civil denunciado por homicídio qualificado praticado contra militar, que se encontrava de sentinela em posto de vila militar, com o propósito de roubar-lhe a arma. Pleiteava-se, na espécie, a nulidade de todos os atos realizados pela justiça castrense, ao argumento de ser inconstitucional o art. 9º, III, do CPM, por ofensa ao art. 5º, XXXVIII, da CF (tribunal do júri). Entendeu-se que, no caso, a excepcionalidade do foro castrense para processar e julgar civis que atentam dolosamente contra a vida de militar apresenta-se incontroversa. Tendo em conta o que disposto no art. 9º, III, d, do CPM ("Art. 9º Consideram-se crimes militares, em tempo de paz: ... III - os crimes praticados por ... civil ...: d) ... contra militar em função de natureza militar ou no desempenho de serviço de vigilância..."), asseverou-se que para se configurar o delito militar de homicídio é necessário que a vítima esteja efetivamente exercendo função ou desempenhando serviço de natureza militar, não bastando a sua condição de militar. Assim, considerou-se que, no caso, estariam presentes 4 elementos de conexão militar do fato: a) a condição funcional da vítima, militar da aeronáutica; b) o exercício de atividade fundamentalmente militar pela vítima, serviço de vigilância; c) o local do crime, vila militar sujeita à administração militar e d) o móvel do crime, roubo de arma da Força Aérea Brasileira - FAB. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o writ por não vislumbrar, na hipótese, exceção à regra linear da competência do tribunal do júri para julgar crime doloso contra a vida praticado por civil. Precedentes citados: RHC 83625/RJ (DJU de 28.5.99); RE 122706/RE (DJU de 3.4.92).
HC 91003/BA, rel. Min. Cármen Lúcia, 22.5.2007. (HC-91003)

Exceção de Coisa Julgada e Crime Militar

A Turma deferiu habeas corpus para cassar acórdão proferido pelo STM e julgar extinto processo penal militar, em curso na 9ª Circunscrição Judiciária Militar de Mato Grosso do Sul, instaurado contra militar pela suposta prática do crime de lesão corporal leve. No caso, após o trânsito em julgado da decisão que declarara a extinção da punibilidade do paciente pelo cumprimento integral das condições estabelecidas em transação penal oferecida pelo Ministério Público estadual, o parquet militar o denunciara pelo cometimento do mesmo delito. Ocorre que, em face da existência de coisa julgada, o Conselho Permanente de Justiça da auditoria militar determinara o arquivamento dos autos, sendo esta decisão cassada pelo Tribunal a quo que, por vislumbrar a competência exclusiva da justiça castrense para julgar o feito, determinara o seu prosseguimento. Inicialmente, aduziu-se que a decisão que declarara extinta a punibilidade em favor do paciente, ainda que proferida com suposto vício de incompetência de juízo, é suscetível de trânsito em julgado e produz efeitos. Ademais, asseverou-se que a adoção do princípio do ne bis in idem pelo ordenamento jurídico penal complementa os direitos e garantias individuais previstos na Constituição, cuja interpretação sistemática leva à conclusão de que o direito à liberdade, com base em coisa julgada material, prevalece sobre o dever estatal de acusar. Assim, concluiu-se que a extinção da punibilidade, com trânsito em julgado, impede o prosseguimento do processo, mesmo quando se trate, em hipótese, de nulidade absoluta. Precedente citado: HC 87869/CE (DJU de 2.2.2007).
HC 86606/MS, rel. Min. Cármen Lúcia, 22.5.2007. (HC-86606)


SEGUNDA TURMA


ED e Juízo de Admissibilidade Implícito - 1

A Turma iniciou julgamento de embargos de declaração em que a União sustenta omissões, obscuridades e contradições decorrentes das seguintes ausências: a) de pronunciamento sobre a alegação de falta de prequestionamento da matéria constitucional; b) de esclarecimento se a responsabilidade do Estado adviria de ato lícito ou ilícito e c) de explicitação sobre qual seria o dano indenizável. Trata-se, na espécie, de embargos declaratórios opostos em recurso extraordinário que, reformando acórdão do STJ, vislumbrara ofensa ao art. 37, § 6º, da CF e condenara a embargante a indenizar os prejuízos advindos da intervenção do Poder Público no domínio econômico, que resultara na fixação de preços, no setor sucro-alcooleiro, abaixo dos valores apurados e propostos pelo Instituto Nacional do Açúcar e do Álcool - v. Informativos 390 e 412.
RE 422941 ED/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 22.5.2007. (RE-422941)

ED e Juízo de Admissibilidade Implícito - 2

O Min. Cezar Peluso, relator, rejeitou os embargos de declaração, no que foi acompanhado pelo Min. Eros Grau. Embora reconhecendo que o acórdão embargado não afirmara, expressamente, ter sido prequestionada a matéria constitucional, considerou que a Turma julgara atendidas todas as exigências recursais, haja vista haver analisado o mérito do extraordinário. Aduziu, no ponto, que o juízo positivo de admissibilidade dos recursos pode ser implícito. Ressaltou que, desde as instâncias ordinárias, a questão sobre a afronta ao art. 37, § 6º, da CF, vem sendo explicitamente suscitada e debatida pelos órgãos judiciais. Asseverou, ademais, que o interesse recursal da destilaria, então recorrente, surgira com o provimento do recurso especial da União, quando se tornou possível reabrir o debate em torno da aplicabilidade ou não do art. 37, § 6º, da CF. Assim, não haveria como se negar que o tema constitucional fora prequestionado, sob pena de se inviabilizar o acesso da parte ao recurso extraordinário, não obstante a pretensão ter sido solucionada à luz de norma constitucional nas instâncias ordinárias. Ainda, registrou que a embargada opusera declaratórios ao acórdão do Tribunal a quo, reabrindo a discussão. Entendeu, também, que as demais alegações objetivavam a rediscussão sobre os fundamentos do acórdão impugnado. No que se refere ao dever de indenizar, concluiu que o aresto fora claro tanto ao assentar que a responsabilidade objetiva decorreria de dano atribuível à atuação do Estado na economia, independentemente de ter ou não ocorrido desobediência à lei específica, quanto ao reputar demonstrado o dano da ora embargada. Após, pediu vista o Min. Joaquim Barbosa.
RE 422941 ED/DF, rel. Min. Cezar Peluso, 22.5.2007. (RE-422941)

SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno23.5.200721 e 24.5.200711
1ª Turma22.5.200722.5.2007417
2ª Turma22.5.2007--271



C L I P P I N G   D O   D J

25 de maio de 2007

ADI N. 1.074-DF
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 19, CAPUT, DA LEI FEDERAL N. 8.870/94. DISCUSSÃO JUDICIAL DE DÉBITO PARA COM O INSS. DEPÓSITO PRÉVIO DO VALOR MONETARIAMENTE CORRIGIDO E ACRESCIDO DE MULTA E JUROS. VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 5º, INCISOS XXXV E LV, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. O artigo 19 da Lei n. 8.870/94 impõe condição à propositura das ações cujo objeto seja a discussão de créditos tributários. Consubstancia barreira ao acesso ao Poder Judiciário. 2. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente.
* noticiado no Informativo 461

ADI N. 2.464-AP
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 553/2000, DO ESTADO DO AMAPÁ. DESCONTO NO PAGAMENTO ANTECIPADO DO IPVA E PARCELAMENTO DO VALOR DEVIDO. BENEFÍCIOS TRIBUTÁRIOS. LEI DE INICIATIVA PARLAMENTAR. AUSÊNCIA DE VÍCIO FORMAL.
1. Não ofende o art. 61, § 1º, II, b da Constituição Federal lei oriunda de projeto elaborado na Assembléia Legislativa estadual que trate sobre matéria tributária, uma vez que a aplicação deste dispositivo está circunscrita às iniciativas privativas do Chefe do Poder Executivo Federal na órbita exclusiva dos territórios federais. Precedentes: ADI nº 2.724, rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 02.04.04, ADI nº 2.304, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 15.12.2000 e ADI nº 2.599-MC, rel. Min. Moreira Alves, DJ 13.12.02
2. A reserva de iniciativa prevista no art. 165, II da Carta Magna, por referir-se a normas concernentes às diretrizes orçamentárias, não se aplica a normas que tratam de direito tributário, como são aquelas que concedem benefícios fiscais. Precedentes: ADI nº 724-MC, rel. Min. Celso de Mello, DJ 27.04.01 e ADI nº 2.659, rel. Min. Nelson Jobim, DJ de 06.02.04.
3. Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedido se julga improcedente.
* noticiado no Informativo 462

ADI N. 3.277-PB
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade: L. est. 7.416, de 10 de outubro de 2003, do Estado da Paraíba, que dispõe sobre serviço de loterias e jogos de bingo: inconstitucionalidade formal declarada, por violação do art. 22, XX, da Constituição Federal, que estabelece a competência privativa da União para dispor sobre sistemas de sorteios.
* noticiado no Informativo 462

Ext N. 1.012-REPÚBLICA FEDERAL DA ALEMANHA
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
EXTRADIÇÃO - PRESCRIÇÃO - EXAME. O exame da prescrição faz-se considerado o critério unitário, ou seja, levando-se em conta, de forma separada, a legislação do país requerente e a do país requerido. Descabe a mesclagem dos sistemas, quando, então, surgiria uma terceira disciplina.
EXTRADIÇÃO - PRESCRIÇÃO - LEGISLAÇÃO BRASILEIRA. Incidindo a prescrição segundo a legislação brasileira, presente a circunstância de o extraditando haver completado setenta anos, cumpre indeferir o pedido de extradição.

Ext N. 1.056-REPÚBLICA FRANCESA
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Extradição executória: França : pena de 3 anos de prisão e multa de 150.000 euros por "tentativa de fraude, falso por alteração da verdade em um escrito, utilização de falso em escrita e execução de um trabalho dissimulado": deficiência da instrução documental: ausência de informação do quantum individualizado das penas impostas ao extraditando, com relação a cada crime, o que impossibilita a aferição da prescrição da pretensão executória conforme a legislação brasileira: indeferimento do pedido.
II. Extradição: prescrição conforme o direito brasileiro: base de cálculo.
1. Cuidando-se de extradição executória, o cálculo da prescrição conforme o direito brasileiro toma por base a pena efetivamente aplicada no estrangeiro e não aquela abstratamente cominada no Brasil à infração penal correspondente ao fato.
2. Aplica-se à verificação da prescrição segundo a lei brasileira, no processo de extradição passiva, a regra, aqui incontroversa, de que cuidando-se de concurso material de infrações, não se considera, no cálculo do prazo prescricional, a soma das penas aplicadas, mas se consideram isoladamente uma a uma das correspondentes aos diversos crimes.
III. Extradição: diligência: indeferimento à vista das circunstâncias do caso concreto.
1. Cabe ao requerente instruir corretamente o pedido: é para esse fim que o Tratado incidente (art. 15, 5) lhe confere o prazo de 60 dias contados da data em que efetivada a prisão preventiva.
2. Essa instrução, que há de ser feita no ato de formalização do pedido de extradição, pode, excepcionalmente, ser complementada em momento posterior.
3. Dessa excepcional possibilidade eventualmente conferida ao Estado requerente, contudo, não pode resultar uma dilação excessiva da prisão, que se mantém até a decisão final do processo (RISTF, art. 213).
IV. Extradição: no sistema brasileiro de extradição passiva, a concordância do extraditando não dispensa a verificação da legalidade do pedido.

EMB. DECL. NO HC N. 88.807-RJ
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: Embargos de declaração: inexistência da alegada omissão quanto à incidência, no caso, do Dec. 23.258/33 e de regulamentação própria do Banco Central: rejeição. 1. Pretendeu "a denúncia capitular a imputação dirigida contra o paciente no tipo do art. 22, caput, da L. 7.492/84 - a chamada Lei do Colarinho Branco", sob o fundamento de que incidiria, no caso, o art. 1º do Dec. 23.258/33. 2. Enfatizou-se expressamente, contudo, no acórdão embargado, que a situação do Paciente era de todo peculiar, eis que, "malgrado a quantia por ele recebida tenha sido subtraída do valor recebido pela venda do passe, refere-se ela a outra relação jurídica, qual seja, a prestação de seus serviços ao atleta". 3. Essa relação jurídica não se deu, portanto, entre pessoas naturais "com quaisquer entidades do exterior", o que basta para afastar, quanto ao Paciente, a pretendida incidência do art. 1º do Dec. 23.258/33 e, em consequência, de qualquer atos regulamentares desse dispositivo.

HC N. 88.503-SP
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO. SURSIS PROCESSUAL. EXTINÇÃO DO PROCESSO SOB A CONDIÇÃO RESOLUTIVA. PREJUDICIALIDADE DA IMPETRAÇÃO.
I - Decisão atacada que, de ofício, desclassificou a imputação de homicídio doloso qualificado para conduta meramente culposa.
II - Da suspensão condicional do processo aceita pela parte decorre a extinção da ação, ainda que sob condição resolutória.
III - Habeas corpus denegado.
* noticiado no Informativo 458
HC N. 90.156-PE
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
DENÚNCIA - GESTÃO TEMERÁRIA - LEI Nº 7.492/86 - ELEMENTO SUBJETIVO DO TIPO - ARTIGO 24 - VETO - ALCANCE. Atendendo a denúncia ao disposto no artigo 41 do Código de Processo Penal, ficando viabilizada a defesa, descabe glosá-la como inepta, sendo que o veto ao artigo 24 da Lei nº 7.492/86 não implicou o afastamento da forma culposa, apenas fulminou a mitigação da pena nele prevista.

HC N. 90.292-RJ
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PROVA NOVA. DESARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO. ART. 18 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. ALEGAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE ANTE A INALTERABILIDADE DO PANORAMA PROBATÓRIO. OFERECIMENTO DE DENÚNCIA. POSSIBILIDADE. FALTA DE JUSTA CAUSA. PEDIDO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO. HC. VIA DE COGNIÇÃO SUMÁRIA E RITO CÉLERE. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME ACURADO DO CONTEXTO PROBATÓRIO. NECESSIDADE DE EXAME DOS DEMAIS DOCUMENTOS QUE INTEGRAM OS AUTOS. ORDEM DENEGADA. I - O pedido de desarquivamento de inquérito policial só é possível na hipótese de nova prova vir a lume, conforme já assentado na Súmula 524 do STF. II - O exame do mérito da prova nova, que motivou o desarquivamento, a fim de verificar ausência de justa causa para a denúncia de pronúncia, não se coaduna com a cognição sumária do remédio constitucional, salvo quando evidente que o quadro probatório permaneceu inalterado. III - Necessidade, no caso, do exame de documentos cujas cópias não instruem o feito. IV - Ordem denegada.

HC N. 90.305-RN
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: HABEAS CORPUS. LEGITIMIDADE AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO QUE PRETENDE O RECONHECIMENTO DA INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JUÍZO PROCESSANTE. O pedido de reconhecimento de incompetência absoluta do Juízo processante afeta diretamente a defesa de um direito individual indisponível do paciente: o de ser julgado por um juiz competente, nos exatos termos do que dispõe o inciso LIII do artigo 5º da Constituição Federal. O Ministério Público, órgão de defesa de toda a Ordem Jurídica, é parte legítima para impetrar habeas corpus que vise ao reconhecimento da incompetência absoluta do juiz processante de ação penal. Ordem parcialmente concedida para que, afastada a preliminar da ilegitimidade, o Tribunal Estadual aprecie o mérito como entender de Direito.
* noticiado no Informativo 460

HC N. 90.654-SP
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. STJ e STF - HC - Competência originária.
1. Não pode o Superior Tribunal de Justiça conhecer de questão suscitada pelo impetrante - excesso de prazo - que não foi enfrentada pelo Tribunal de origem, ao qual, em conseqüência, não se pode atribuir a alegada coação. 2. Pelo mesmo fundamento - impossibilidade de supressão de instância -, também não cabe ao Supremo Tribunal conhecer originariamente da questão.
II. Denúncia: aptidão: descrição suficiente do delito de associação para o tráfico imputado aos pacientes. 1. É da jurisprudência do Tribunal, na linha do que se tem decidido quanto ao crime de quadrilha ou bando (C.Penal, art. 288), que a configuração do delito de associação para o tráfico independe "da realização ulterior de qualquer delito compreendido no âmbito de suas projetadas atividades criminosas" (v.g., Ext 966, Pl., 29.6.06, Pertence, DJ 10.8.06).
2. Daí que, para a aptidão da denúncia, o que se "exige, sobretudo, é que a imputação descreva concretamente os elementos essenciais à realização do tipo cogitado" (v.g., HC 70.290, Pl., 30.06.93, Pertence, RTJ 162/559), o que, no caso, não foi descumprido.

HC N. 90.813-SP
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. MANUTENÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. DOSIMETRIA DA PENA. REGIME PRISIONAL. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO VERIFICADO DE PLANO. AUSÊNCIA DE PLAUSIBILIDADE JURÍDICA. ORDEM CONHECIDA PARCIALMENTE E, NESSA PARTE, DENEGADA.
1. O Paciente não tem direito à concessão da ordem de ofício apenas por ter perdurado na custódia cautelar por tempo suficiente para a conquista dos benefícios da progressão de regime ou do livramento condicional.
2. Embora a jurisprudência do Supremo Tribunal não reclame o trânsito em julgado da condenação para a concessão dos mencionados benefícios, somente ao juízo de origem ou da execução criminal competente cabe avaliar se estão presentes os requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessão nos processos criminais aos quais responde o Paciente, sob pena de supressão de instância. Necessidade de ser o juízo competente provocado pelo Paciente.
3. O habeas corpus não pode ser conhecido na parte relativa à fixação da pena e ao regime prisional por não terem sido objeto de apreicação nas instâncias a quo. , O seu exame pelo Supremo Tribunal, nesta ação, configuraria indevida supressão de instância.
4. Habeas corpus conhecido parcialmente e, nessa parte, denegado.

HC N. 90.871-MG
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. SUBSTITUIÇÃO DE PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVA DE DIREITO (ART. 44 DO CÓDIGO PENAL). TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTE: POSSIBILIDADE: INCONSTITUCIONALIDADE DO § 1º DO ART. 2º DA LEI N. 8.072/90. PRECEDENTES. ORDEM CONCEDIDA.
1. O fundamento que vedava a aplicação de pena alternativa aos condenados por crime hediondo era o art. 2º, § 1º, da Lei n. 8.072/90, a impedir a progressão do regime de cumprimento de pena. O Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucional esse dispositivo, o que faz não possibilitar a adoção daquele entendimento proibitivo da progressão. Precedentes.
2. Habeas corpus concedido.

RHC N. 90.252-RJ
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Habeas corpus: descabimento para ponderar, in concreto, a suficiência das circunstâncias judiciais invocadas na sentença, para refazer a aplicação da pena.
Acórdão do Superior Tribunal de Justiça, que, malgrado tenha examinado indevidamente matéria não compreendida no âmbito do habeas corpus, diminuiu a pena imposta ao Paciente e o beneficiou: o acolhimento do pedido de cassação do acórdão restabeleceria a pena imposta na sentença.
II. Recurso ordinário em habeas corpus desprovido.
* noticiado no Informativo 466

AG. REG. NO AI N. 597.729-BA
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: 1. Competência: é da jurisprudência do Supremo Tribunal que não havendo interesse jurídico da União Federal na demanda entre empresa concessionária de serviço público e particular usuário, a competência é da Justiça estadual. Precedentes.
2. Recurso extraordinário: inadmissibilidade: controvérsia decidida à luz da legislação infraconstitucional pertinente ao caso: não se abre a via do recurso extraordinário para ofensa reflexa à Constituição: incidência, mutatis mutandis, da Súmula 636.
3. Agravo regimental manifestamente infundado: condenação da agravante ao pagamento de multa, nos termos do art. 557, § 2º, C.Pr.Civil.

HC N. 89.079-MG
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Habeas Corpus. 1. No caso concreto, o impetrante/paciente foi denunciado, mediante prévia representação, pela suposta prática dos delitos tipificados nos arts. 138 (calúnia contra funcionário público), 141, II e 145, todos do Código Penal. 2. Impetração em face de decisão monocrática proferida por Ministro-Relator do Superior Tribunal de Justiça que não conheceu do pedido formulado. 3. No mérito, verifica-se que a decisão impugnada negou seguimento ao pedido formulado perante o STJ por configuração de hipótese de patente incompetência nos termos do art. 105, I, "a" e "c", da CF e, ademais, nomeou a Defensoria Pública da União para o patrocínio dos interesses do impetrante/paciente. 4. Não tendo sido a questão objeto de exame definitivo pelo STJ, a apreciação da matéria pelo Supremo Tribunal Federal implicaria, ao menos em tese, supressão de instância, o que não seria admitido consoante a reiterada jurisprudência desta Corte. Precedentes citados: HC nº 90.312/PR, Rel. Min. Eros Grau, 2ª Turma, unânime, DJ 27.4.2007; HC nº 89.305/RJ, Rel. Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma, unânime, DJ 16.2.2007; HC nº 89.141/SP, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma, unânime, DJ 6.11.2006; HC nº 85.744/RJ, de minha relatoria, 2ª Turma, unânime, DJ 2.9.2005; HC nº 84.349-ES, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 24.9.2004, 1ª Turma, unânime; HC nº 83.922-RJ, Rel. Min. Nelson Jobim, DJ 2.4.2004, 2ª Turma, unânime; HC nº 83.489-SP, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 19.12.2003, 2ª Turma, unânime; e HC nº 81.617-MT, Rel. Min. Carlos Velloso, DJ 28.6.2002, 2ª Turma, unânime. 5. Ainda que superada a questão do conhecimento do writ, dos documentos acostados aos autos, não se vislumbra flagrante ilegalidade nos fundamentos da decisão impugnada. 6. Ordem indeferida.

HC N. 90.216-PR
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTOS: ORDEM PÚBLICA E APLICAÇÃO DA LEI PENAL. ASSISTÊNCIA MÉDICA ADEQUADA AO PRESO. IMPOSSIBILIDADE DE PRESTÁ-LA RECONHECIDA PELO ESTADO. RECONHECIMENTO DO DIREITO DE ASSISTÊNCIA MÉDICA EM HOSPITAL PARTICULAR. CONCESSÃO DA ORDEM, EM PARTE, DE OFÍCIO.
1. Pacientes acusados de série delitiva que se estendeu mesmo após o recebimento de várias denúncias. Necessidade da prisão preventiva arrimada na garantia da ordem pública visando à interrupção do ciclo delituoso.
2. Os fundamentos da custódia cautelar para assegurar a aplicação da lei penal revelam-se idôneos ante a evidência de que os pacientes possuem vultosas quantias em nomes de pessoas interpostas, além da circunstância de que pretendiam dispor de patrimônio imobiliário significativo, situado no Brasil.
3. Assistência médica adequada aos pacientes. Reconhecimento, pelo Estado, da impossibilidade de prestá-la. Concessão da ordem, de ofício, para assegurar-lhes o direito de contratar hospital particular.
4. Ressalva do entendimento do Relator, que deferia a ordem em maior extensão para determinar o tratamento em prisão domiciliar.
Ordem concedida, em parte, de ofício.
* noticiado no Informativo 455



Acórdãos Publicados: 714



T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.


Tribunal de Contas - Provimento Cautelar - Poder Implícito - Devido Processo Legal (Transcrições)

MS 26547/DF*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. PODER GERAL DE CAUTELA. LEGITIMIDADE. DOUTRINA DOS PODERES IMPLÍCITOS. PRECEDENTE (STF). CONSEQÜENTE POSSIBILIDADE DE O TRIBUNAL DE CONTAS EXPEDIR PROVIMENTOS CAUTELARES, MESMO SEM AUDIÊNCIA DA PARTE CONTRÁRIA, DESDE QUE MEDIANTE DECISÃO FUNDAMENTADA. DELIBERAÇÃO DO TCU, QUE, AO DEFERIR A MEDIDA CAUTELAR, JUSTIFICOU, EXTENSAMENTE, A OUTORGA DESSE PROVIMENTO DE URGÊNCIA. PREOCUPAÇÃO DA CORTE DE CONTAS EM ATENDER, COM TAL CONDUTA, A EXIGÊNCIA CONSTITUCIONAL PERTINENTE À NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO DAS DECISÕES ESTATAIS. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO EM CUJO ÂMBITO TERIAM SIDO OBSERVADAS AS GARANTIAS INERENTES À CLÁUSULA CONSTITUCIONAL DO "DUE PROCESS OF LAW". DELIBERAÇÃO FINAL DO TCU QUE SE LIMITOU A DETERMINAR, AO DIRETOR-PRESIDENTE DA CODEBA (SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA), A INVALIDAÇÃO DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO E DO CONTRATO CELEBRADO COM A EMPRESA A QUEM SE ADJUDICOU O OBJETO DA LICITAÇÃO. INTELIGÊNCIA DA NORMA INSCRITA NO ART. 71, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO. APARENTE OBSERVÂNCIA, PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO, NO CASO EM EXAME, DO PRECEDENTE QUE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL FIRMOU A RESPEITO DO SENTIDO E DO ALCANCE DESSE PRECEITO CONSTITUCIONAL (MS 23.550/DF, REL. P/ ACÓRDÃO O MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE). INVIABILIDADE DA CONCESSÃO, NO CASO, DA MEDIDA LIMINAR PRETENDIDA, EIS QUE NÃO ATENDIDOS, CUMULATIVAMENTE, OS PRESSUPOSTOS LEGITIMADORES DE SEU DEFERIMENTO. MEDIDA CAUTELAR INDEFERIDA.

DECISÃO: Trata-se de mandado de segurança, com pedido de medida cautelar, impetrado contra deliberação, que, emanada do E. Tribunal de Contas da União (Processo TC-008.538/2006-0), acha-se consubstanciada em acórdão assim ementado (fls. 35/36):

"SOLICITAÇÃO DO CONGRESSO NACIONAL. REALIZAÇÃO DE FISCALIZAÇÃO EM CERTAME LICITATÓRIO. AUSÊNCIA DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL PRÉVIO À ABERTURA DO CERTAME. EDITAL DE CONCORRÊNCIA COM CLÁUSULAS RESTRITIVAS AO CARÁTER COMPETITIVO DA LICITAÇÃO. INFRINGÊNCIA A PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS RELATIVOS A LICITAÇÕES E CONTRATOS. INOBSERVÂNCIA DAS NORMAS LEGAIS RELATIVAS A PROCESSO DE OUTORGA DE CONCESSÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS. INADEQUABILIDADE DOS ESTUDOS DE VIABILIDADE. FIXAÇÃO DE PRAZO PARA ANULAÇÃO DO CERTAME E DO CONTRATO. MULTA.
1. A modalidade operacional a ser aplicada a cada desestatização deve ser previamente aprovada pelo Conselho Nacional de Desestatização - CND, nos termos da Lei 9.491/97.
2. O programa de arrendamento das áreas e instalações portuárias deve ser elaborado atendendo às suas destinações específicas, de acordo com o Plano de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto que contém as áreas objeto de arrendamento, nos termos do Decreto 4.391/02.
3. Os processos de arrendamento de áreas e instalações portuárias cujos valores gerem receita mensal superior a R$  50.000,00 sujeitam-se à fiscalização, prévia ou concomitante, do Tribunal de Contas da União, nos moldes previstos na IN TCU 27/98, alterada pela IN TCU 40/02, ante o disposto no Decreto 4.391/02.
4. O processo licitatório e a celebração do contrato de arrendamento de áreas e instalações portuárias depende de prévio licenciamento do órgão ambiental competente, nos termos da Lei 8.630/93, da Resolução Antaq 55/02 e da Resolução Conama 237/1997.
5. A identificação de graves irregularidades na fiscalização de procedimento licitatório enseja a fixação de prazo à entidade para que adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, objetivando a anulação de contrato celebrado em decorrência de certame impugnado, bem como a aplicação de multa aos responsáveis."
(Acórdão nº 2338/2006, Rel. Min. AUGUSTO NARDES - grifei)

A parte ora impetrante, que é sociedade de economia mista, sustenta que essa deliberação, além de transgredir certos diplomas normativos - Lei nº 8.630/93 (art. 4º, § 1º), Lei nº 8.666/93 (art. 31, § 2º), Lei nº 9.784/99 (arts. 3º e 38) e Decreto nº 4.391/2002 (art. 2º, § 3º, I, e art. 7º, § 1º) -, também ofendeu o texto da Constituição da República, notadamente os seus arts. 5º, incisos LIV e LV, e 71, § 1º, assinalando que o E. Tribunal de Contas da União teria atuado além dos limites de sua competência institucional, apoiando-se, a autora do presente "writ", nas seguintes alegações (fls. 04 e 08):

"Exsurge nítido vício de competência da Autoridade Impetrada com mácula no art. 71, § 1º, da Constituição Federal, como se procurará demonstrar.
......................................................
A Peticionária entende que não pode juridicamente transformar-se em simples preposto do Tribunal de Contas da União, para, em seu nome, tornar sem efeito contrato validamente celebrado.
É certo que, se a Postulante vier a invalidar o mencionado contrato, na esteira do entendimento do Supremo Tribunal Federal, poderá tê-lo feito por conta e responsabilidade própria, já que a manifestação envolveria simples recomendação.
Ao atuar em nome próprio sujeita-se, inclusive à responsabilidade civil e a perdas e danos que poderão ser demandados pelo contratado, pela via judicial, sem que possa escudar-se na afirmativa de que teria praticado um ato por recomendação de Autoridade Incompetente, já que 'ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei' ('art. 5°, inciso II, CF').
A Impetrante, a seu sentir, não encontra máculas que lhe levem a fulminar o contrato e não pode acatar ordem de quem evidentemente não é competente para tanto, porque usurparia atribuição do Congresso Nacional.
De todo modo, para que a Codeba, Autora desta lide viesse a anular o referido ajuste deveria instaurar procedimento próprio com as garantias inerentes à ampla defesa e ao contraditório, para afinal proferir veredicto." (grifei)

O E. Tribunal de Contas da União, por sua vez, ao prestar as informações que lhe foram solicitadas, produziu esclarecimentos que por ele foram assim resumidos (fls. 328):

"Mandado de segurança, com pedido de liminar, impetrado contra os termos dos Acórdãos n. 1.379/2006 e 2.338/2006, proferidos pelo Plenário do TCU, por meio dos quais foram tecidas determinações ao Diretor-Presidente da Codeba para que adotasse as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, com vistas à suspensão/anulação da Concorrência n. 3/2004 e do Contrato n. 16/2006, firmado com a Empresa Bunge Alimentos S.A.
1. O recurso administrativo interposto contra o Acórdão n. 2.338/2006-TCU-Plenário foi recebido apenas no efeito devolutivo em relação às determinações que confirmaram a medida cautelar, consoante dispõe o art. 520, IV, do CPC, aplicado subsidiariamente nos processos do TCU.
2. Da observância pelo TCU ao precedente firmado pelo STF no MS 23.550/DF. O TCU não anulou qualquer ato ou contrato administrativo, apenas determinou à autoridade administrativa a sua anulação, ressaltando, outrossim, que o não-atendimento da referida determinação resultaria na imediata comunicação ao Congresso Nacional, a quem compete adotar o ato de sustação.
3. O TCU tem legitimidade para expedição de medidas cautelares, a fim de prevenir a ocorrência de lesão ao erário ou a direito alheio, bem como garantir a efetividade de suas decisões, consoante entendimento firmado pelo STF.
4. Em sendo o provimento cautelar medida de urgência, admite-se sua concessão 'inaudita altera parte' sem que tal procedimento configure ofensa às garantias do contraditório e ampla defesa, ainda mais quando se verifica que, em verdade, o exercício dos referidos direitos, observado o devido processo legal, será exercido em fase processual seguinte.
5. Qualquer vício alegado em relação ao Acórdão n. 1.379/2006-TCU-Plenário não merece ser conhecido, haja vista que já decaiu o direito de a Impetrante impugná-lo pela via mandamental. O referido 'decisum' foi proferido em 09/08/2006, publicado do DOU em 11/08/2006 e comunicado ao Diretor-Presidente da Codeba em 31/08/2006.
6. Da observância aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Antes de o TCU proferir o Acórdão n. 2.338/2006-Plenário, foi conferido aos interessados oportunidade de defesa, os quais não lograram elidir as diversas irregularidades constatadas pelo TCU.
7. Não-cabimento da liminar, ante a ausência do 'fumus boni juris'. No mérito, denegação da segurança, em face da legitimidade das decisões proferidas pelo TCU e pela inexistência do alegado direito líquido e certo." (grifei)

Cabe analisar, preliminarmente, se se revela cabível, ou não, o presente mandado de segurança, considerada a afirmação - constante da própria petição inicial - de que a invalidação do contrato e do procedimento licitatório caracterizaria "simples recomendação" (fls. 08).

Reconheço que a deliberação do E. Tribunal de Contas da União, no caso, analisada em seu conteúdo material, não veicula mera recomendação (como sugere a ora impetrante), mas consubstancia, no ponto versado na presente impetração mandamental, clara determinação (v. itens ns. 9.4 e 9.5 do Acórdão 2338/2006 - fls. 58/59) dirigida à própria Companhia das Docas do Estado da Bahia - CODEBA.

A presente observação é feita em decorrência de pronunciamento da ora impetrante, que, ao se referir à eventual invalidação do contrato celebrado com a empresa vencedora da licitação, expressamente afirmou, em sua petição inicial, que, "(...) se a Postulante vier a invalidar o mencionado contrato (...), poderá tê-lo feito por conta e responsabilidade própria, já que a manifestação envolveria simples recomendação" (fls. 08 - grifei).

Se se verificasse, na espécie, "simples recomendação" (fls. 08), como sugere a ora impetrante, tornar-se-ia inadmissível a presente ação de mandado de segurança, pois, como se sabe, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal entende insuscetível de conhecimento o mandado de segurança, quando impetrado contra deliberação do Tribunal de Contas da União que consubstancie simples recomendação (MS 26.503/DF, Rel. Min. MARCO AURÉLIO), porque configuradora, em tal hipótese, de "mera sugestão sem caráter impositivo (...)" (MS 21.519/PR, Rel. p/ o acórdão Min. MOREIRA ALVES).

Ocorre, no entanto, tal como por mim precedentemente assinalado, que a deliberação do E. Tribunal de Contas da União, ora questionada nesta sede mandamental, traduz, na espécie em exame, determinação, que, por efeito de sua natureza mesma, revela-se impregnada de caráter impositivo.

Por tal razão, e por entender admissível esta impetração, tenho por cabível a presente ação de mandado de segurança.

Sendo esse o contexto, passo a apreciar o pedido de medida cautelar.

E, ao fazê-lo, indefiro-o, pois entendo não satisfeita a exigência pertinente à cumulativa ocorrência dos requisitos relativos ao "periculum in mora" e ao "fumus boni juris".

Com efeito, impende reconhecer, desde logo, que assiste, ao Tribunal de Contas, poder geral de cautela. Trata-se de prerrogativa institucional que decorre, por implicitude, das atribuições que a Constituição expressamente outorgou à Corte de Contas.

Entendo, por isso mesmo, que o poder cautelar também compõe a esfera de atribuições institucionais do Tribunal de Contas, pois se acha instrumentalmente vocacionado a tornar efetivo o exercício, por essa Alta Corte, das múltiplas e relevantes competências que lhe foram diretamente outorgadas pelo próprio texto da Constituição da República.

Isso significa que a atribuição de poderes explícitos, ao Tribunal de Contas, tais como enunciados no art. 71 da Lei Fundamental da República, supõe que se reconheça, a essa Corte, ainda que por implicitude, a possibilidade de conceder provimentos cautelares vocacionados a conferir real efetividade às suas deliberações finais, permitindo, assim, que se neutralizem situações de lesividade, atual ou iminente, ao erário.

Impende considerar, no ponto, em ordem a legitimar esse entendimento, a formulação que se fez em torno dos poderes implícitos, cuja doutrina - construída pela Suprema Corte dos Estados Unidos da América no célebre caso McCULLOCH v. MARYLAND (1819) - enfatiza que a outorga de competência expressa a determinado órgão estatal importa em deferimento implícito, a esse mesmo órgão, dos meios necessários à integral realização dos fins que lhe foram atribuídos.

Na realidade, o exercício do poder de cautela, pelo Tribunal de Contas, destina-se a garantir a própria utilidade da deliberação final a ser por ele tomada, em ordem a impedir que o eventual retardamento na apreciação do mérito da questão suscitada culmine por afetar, comprometer e frustrar o resultado definitivo do exame da controvérsia.

Torna-se essencial reconhecer - especialmente em função do próprio modelo brasileiro de fiscalização financeira e orçamentária, e considerada, ainda, a doutrina dos poderes implícitos (MARCELO CAETANO, "Direito Constitucional", vol. II/12-13, item n. 9, 1978, Forense; CASTRO NUNES, "Teoria e Prática do Poder Judiciário", p. 641/650, 1943, Forense; RUI BARBOSA, "Comentários à Constituição Federal Brasileira", vol. I/203-225, coligidos e ordenados por Homero Pires, 1932, Saraiva, v.g.) - que a tutela cautelar apresenta-se como instrumento processual necessário e compatível com o sistema de controle externo, em cuja concretização o Tribunal de Contas desempenha, como protagonista autônomo, um dos mais relevantes papéis constitucionais deferidos aos órgãos e às instituições estatais.

Cumpre assinalar, neste ponto, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o MS 24.510/DF, Rel. Min. ELLEN GRACIE, reconheceu assistir, ao Tribunal de Contas, esse poder geral de cautela:

"PROCEDIMENTO LICITATÓRIO. IMPUGNAÇÃO. COMPETÊNCIA DO TCU. CAUTELARES. CONTRADITÓRIO. AUSÊNCIA DE INSTRUÇÃO.
1 - Os participantes de licitação têm direito à fiel observância do procedimento estabelecido na lei e podem impugná-lo administrativa ou judicialmente. Preliminar de ilegitimidade ativa rejeitada.
2 - Inexistência de direito líquido e certo. O Tribunal de Contas da União tem competência para fiscalizar procedimentos de licitação, determinar suspensão cautelar (artigos 4º e 113, § 1º e 2º da Lei nº 8.666/93), examinar editais de licitação publicados e, nos termos do art. 276 do seu Regimento Interno, possui legitimidade para a expedição de medidas cautelares para prevenir lesão ao erário e garantir a efetividade de suas decisões).
3 - A decisão encontra-se fundamentada nos documentos acostados aos autos da Representação e na legislação aplicável.
4 - Violação ao contraditório e falta de instrução não caracterizadas.
Denegada a ordem." (grifei)

Vale referir, ainda, que se revela processualmente lícito, ao Tribunal de Contas, conceder provimentos cautelares "inaudita altera parte", sem que incida, com essa conduta, em desrespeito à garantia constitucional do contraditório.

É que esse procedimento mostra-se consentâneo com a própria natureza da tutela cautelar, cujo deferimento, pelo Tribunal de Contas, sem a audiência da parte contrária, muitas vezes se justifica em situação de urgência ou de possível frustração da deliberação final dessa mesma Corte de Contas, com risco de grave comprometimento para o interesse público.

Não se pode ignorar que os provimentos de natureza cautelar - em especial aqueles qualificados pela nota de urgência - acham-se instrumentalmente vocacionados a conferir efetividade ao julgamento final resultante do processo principal, assegurando-se, desse modo, não obstante em caráter provisório, plena eficácia e utilidade à tutela estatal a ser prestada pelo próprio Tribunal de Contas da União.

Essa visão do tema tem o beneplácito de autorizado magistério doutrinário, que, embora exposto a propósito do processo judicial, traduz lição que se mostra inteiramente aplicável aos procedimentos administrativos, notadamente àqueles instaurados perante o Tribunal de Contas, considerando-se, para esse efeito, os princípios e diretrizes que regem a teoria geral do processo (SYDNEY SANCHES, "Poder Cautelar Geral do Juiz no Processo Civil Brasileiro", p. 30, 1978, RT; JOSÉ FREDERICO MARQUES, "Manual de Direito Processual Civil", vol. 4/335, item n. 1.021, 7ª ed., 1987, Saraiva; CÂNDIDO RANGEL DINAMARCO, "A Instrumentalidade do Processo", p. 336/371, 1987, RT; VITTORIO DENTI, "Sul Concetto di funzione cautelare", "in" "Studi P. Ciapessoni", p. 23/24, 1948; PIERO CALAMANDREI, "Introduzione allo Studio Sistematico dei Provvedimenti cautelari", p. 20, item n. 8, Pádua, 1936, Cedam; HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, "Tutela Cautelar", vol. 4/ 17, 1992, Aide, v.g.).

Daí a possibilidade, ainda que excepcional, de concessão, sem audiência da parte contrária, de medidas cautelares, por deliberação do Tribunal de Contas, sempre que necessárias à neutralização imediata de situações de lesividade, atual ou iminente, ao interesse público.

Eis porque entendo, em sede de mera delibação, que não se teria configurado, na espécie, ofensa à garantia do contraditório, ainda mais se se tiver presente a circunstância - juridicamente relevante - de que se ensejou, à ora impetrante, em momento procedimentalmente oportuno, a possibilidade de exercer o direito de defesa, com os meios e recursos a ele inerentes, como se verifica dos elementos documentais concernentes ao processo TC-008.538/2006-0 produzidos nestes autos, notadamente daqueles veiculados nas informações oficiais prestadas pelo E. Tribunal de Contas da União.

Não se pode desconsiderar, neste ponto, que declarações emanadas de servidores públicos, quando prestadas, como no caso, em razão do ofício que exercem, qualificam-se pela nota da veracidade, prevalecendo eficazes até que sobrevenha prova idônea e inequívoca em sentido contrário.

E a razão é uma só: precisamente porque constantes de documento subscrito por agente estatal, tais informações devem prevalecer, pois, como se sabe, as declarações emanadas de servidores públicos, como aquela de fls. 327/351, gozam, quanto ao seu conteúdo, da presunção de veracidade, consoante assinala o magistério da doutrina (CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, "Curso de Direito Administrativo", p. 373, item n. 59, 13ª ed., 2001, Malheiros; MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, "Direito Administrativo", p. 182/184, item n. 7.6.1, 20ª ed., 2007, Atlas; DIOGENES GASPARINI, "Direito Administrativo", p. 63, item n. 7.1, 1989, Saraiva; JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, "Direito Administrativo Brasileiro", p. 54, item n. 43, 1999, Forense; JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, "Manual de Direito Administrativo", p. 116, item n. 2, 12ª ed., 2005, Lumen Juris).

Esse entendimento - que põe em evidência o atributo de veracidade inerente aos atos emanados do Poder Público e de seus agentes - é perfilhado, igualmente, pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RTJ 86/212 - RTJ 133/1235-1236 - RTJ 161/572-573, v.g.), notadamente quando tais declarações compuserem e instruírem, como na espécie, as informações prestadas pela própria autoridade apontada como coatora:

"- As informações prestadas em mandado de segurança pela autoridade apontada como coatora gozam da presunção 'juris tantum' de veracidade."
(MS 20.882/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Impende assinalar, ainda, que o E. Tribunal de Contas da União, ao conceder a medida cautelar em questão, cumpriu a obrigação constitucional - que se impõe a todos os órgãos do Estado - de fundamentar a sua deliberação, em ordem a não incidir em prática arbitrária, assim evitando, com a exposição dos fundamentos de fato e de direito subjacentes ao ato decisório, a censura que faz a doutrina, como resulta claro do magistério do eminente Professor HUMBERTO THEODORO JUNIOR ("Curso de Direito Processual Civil", vol. II/515, item n. 1.022, 39ª ed., 2006, Forense):

"A sumariedade do conhecimento inicial nessas medidas não se confunde, porém, com puro arbítrio do julgador. (...) De sorte que a faculdade conferida ao juiz no art. 804 só deve ser exercitada quando a inegável urgência da medida e as circunstâncias de fato evidenciarem que a citação do réu poderá tornar ineficaz a providência preventiva. E, pelas mesmas razões, a decisão, ainda que sucinta, deve ser fundamentada." (grifei)

A longa fundamentação do Acórdão nº 1.379/2006 (fls. 61/93), com a indicação dos motivos de fato e de direito que deram suporte à concessão do provimento cautelar, apenas traduz a fidelidade com que se houve o E. Tribunal de Contas da União no cumprimento de seus deveres constitucionais.

De outro lado, mostra-se importante acentuar que o E. Tribunal de Contas da União, na deliberação ora questionada, não determinou a anulação da Concorrência nº 3/2004 e não suspendeu, ele próprio, a execução do Contrato nº 16/2006, mas, como resulta claro das informações de fls. 327/351, limitou-se a ordenar, à autoridade competente (Diretor-Presidente da Codeba, fls. 58, item n. 9.4), que assim procedesse, sob pena de "imediata comunicação ao Congresso Nacional a quem compete adotar o ato de sustação" (fls. 328).

Cabe registrar, ainda, por relevante, que esse procedimento do E. Tribunal de Contas da União parece estar em consonância com a jurisprudência desta Suprema Corte, que já decidiu, por mais de uma vez, a propósito das atribuições daquela Alta Corte de Contas, que "(...) O Tribunal de Contas da União - embora não tenha poder para anular ou sustar contratos administrativos - tem competência, conforme o art. 71, IX, para determinar à autoridade administrativa que promova a anulação do contrato e, se for o caso, da licitação de que se originou" (MS 23.550/DF, Rel. p/ o acórdão Min. SEPÚLVEDA PERTENCE).

Todas essas razões levam-me a entender inviável a pretendida suspensão cautelar de eficácia da deliberação emanada do E. Tribunal de Contas da União.

É importante rememorar, neste ponto, que o deferimento da medida liminar, resultante do concreto exercício do poder cautelar geral outorgado aos juízes e Tribunais, somente se justifica em face de situações que se ajustem aos pressupostos referidos no art. 7º, II, da Lei nº 1.533/51: a existência de plausibilidade jurídica ("fumus boni juris"), de um lado, e a possibilidade de lesão irreparável ou de difícil reparação ("periculum in mora"), de outro.

Sem que concorram esses dois requisitos - que são necessários, essenciais e cumulativos -, não se legitima a concessão da medida liminar, consoante enfatiza a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

"Mandado de segurança. Liminar. Embora esta medida tenha caráter cautelar, os motivos para a sua concessão estão especificados no art. 7º, II da Lei nº 1.533/51, a saber: a) relevância do fundamento da impetração; b) que do ato impugnado possa resultar a ineficácia da medida, caso seja deferida a segurança.
Não concorrendo estes dois requisitos, deve ser denegada a liminar."
(RTJ 112/140, Rel. Min. ALFREDO BUZAID - grifei)

Sendo assim, e por entender ausente o requisito pertinente à plausibilidade jurídica da pretensão mandamental ora em exame, indefiro o pedido de medida liminar, ante a inocorrência de seus pressupostos legitimadores.

Publique-se.

Brasília, 23 de maio de 2007.

Ministro CELSO DE MELLO
Relator

* decisão publicada no DJU de 29.5.2007

Rcl e Sala de Estado-Maior (Transcrições)

(v. Informativo 466)

Rcl 4535/ES*

RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE

EMENTA: I. Reclamação: alegação de afronta à autoridade da decisão plenária da ADIn 1127, 17.05.06, red. p/acórdão Ministro Ricardo Lewandowski: procedência.

1.Reputa-se declaratória de inconstitucionalidade a decisão que - embora sem o explicitar - afasta a incidência da norma ordinária pertinente à lide para decidi-la sob critérios diversos alegadamente extraídos da Constituição.

2. A decisão reclamada, fundada na inconstitucionalidade do art. 7, V, do Estatuto dos Advogados, indeferiu a transferência do reclamante - Advogado, preso preventivamente em cela da Polícia Federal, para sala de Estado Maior e, na falta desta, a concessão de prisão domiciliar.

3. No ponto, dissentiu do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal na ADIn 1127 (17.05.06, red.p/acórdão Ricardo Lewandowski), quando se julgou constitucional o art. 7, V, do Estatuto dos Advogados, na parte em que determina o recolhimento dos advogados em sala de Estado Maior e, na sua falta, em prisão domiciliar.

4. Reclamação julgada procedente para que o reclamante seja recolhido em prisão domiciliar - cujo local deverá ser especificado pelo Juízo reclamado -, salvo eventual transferência para sala de Estado Maior.

II. "Sala de Estado-Maior" (L. 8.906, art. 7º, V): caracterização. Precedente: HC 81.632 (2ª T., 20.08.02, Velloso, RTJ 184/640).

1. Por Estado-Maior se entende o grupo de oficiais que assessoram o Comandante de uma organização militar (Exército, Marinha, Aeronáutica, Corpo de Bombeiros e Polícia Militar); assim sendo, "sala de Estado-Maior" é o compartimento de qualquer unidade militar que, ainda que potencialmente, possa por eles ser utilizado para exercer suas funções.

2. A distinção que se deve fazer é que, enquanto uma "cela" tem como finalidade típica o aprisionamento de alguém -e, por isso, de regra contém grades -, uma "sala" apenas ocasionalmente é destinada para esse fim.

3. De outro lado, deve o local oferecer "instalações e comodidades condignas", ou seja, condições adequadas de higiene e segurança.

Relatório: O Reclamante - advogado - foi preso preventivamente em processo no qual é acusado de praticar os delitos de estelionato, falsidade ideológica e uso de documento falso.

Recolhido em cela da Polícia Federal, requereu ao Juízo da 2ª Vara Federal Criminal de Vitória/ES, com fundamento no art. 7º, V, do Estatuto dos Advogados, a sua transferência para sala de Estado Maior e, na falta desta, a concessão de prisão domiciliar (f. 17/21).

O pedido foi indeferido nestes termos, verbis (f. 33/34):

"Em que pese a r. decisão monocrática trazida à baila pela defesa do réu BELINE, resta sedimentado na jurisprudência amplamente majoritária que a prerrogativa de cela especial, e mesmo de 'sala de estado-maior', é atendida quando, não havendo uma custódia com tal qualificação expressa, recolhe-se o preso em cela diferenciada dos demais presos, que não possuem tal prerrogativa, sempre com as mínimas condições de higiene e segurança (como se 'prisão comum' não tivesse que ostentar tais condições).
(...)
À fl. 263 é informado que não há 'salas de Estado-Maior' nesta região metropolitana de Vitória/ES.
Ante a realidade brasileira, é consabido que o texto da Lei nº. 8.906/94, quando se refere a 'salas de Estado-Maior', não passa de, data venia, engodo demagógico materialmente inexeqüível.
Aliás, o que vem a ser 'sala de Estado-Maior"?
Seria qualquer cela mantida pelas Forças Armadas ou pela polícia militar para custodiar presos de alto posto em sua hierarquia?
Tanto se trata de conceito indeterminado que a própria Lei nº. 8.906/94 resolvia o assunto delegando essa conceituação à Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, o que, conforme bem lembrado pelo Requerente, foi julgado inconstitucional pelo Eg. STF nos autos da ação direta de inconstitucionalidade.
Ora, assim sendo, quem terá agora a competência para qualificar uma cela como "sala de Estado-Maior"?
A exigência de que advogados sejam recolhidos às tais "salas de Estado Maior", e a não submissão dos mesmos aos ditames do art. 295 do CPP tem por conseqüência a impossibilidade de aplicação de prisão provisória aos mesmos, constituindo-se em diferenciação odiosa, não permitida pela Carta Magna.
Isto posto, INDEFIRO os requerimentos (...)"

Alega-se afronta à autoridade da decisão plenária da Adin 1127 - 17.05.06, red. p/ acórdão o em. Ministro Ricardo Lewandowski - no qual o Supremo Tribunal Federal, preliminarmente, por maioria, entendeu não estar prejudicada a ação relativamente ao inciso V, do artigo 7º e, no mérito, também por decisão majoritária, declarou a inconstitucionalidade apenas da expressão "assim reconhecidas pela OAB", contida naquele dispositivo.

Aduz-se que, quando da análise da questão preliminar, o Plenário do Supremo Tribunal decidiu expressamente "pela inaplicabilidade ao advogado" do art. 295 do C.Pr.Penal, "pelo quê laborou em erro a decisão de primeiro grau".

O Tribunal, ademais - continua o Reclamante -, "não aderiu ao pensamento de que tal prerrogativa seria 'engodo demagógico', 'materialmente inexeqüível'".

Ressalta, por fim, que o Reclamante "sequer encontra-se em sala especial - prerrogativa aplicável aos outros presos especiais -, consoante ofício do Superintendente da Polícia Federal" (f. 25).

Deferida a liminar (f. 74/76) e recebidas as informações, sobreveio o parecer do Ministério Público Federal, da lavra da Il. Subprocurador Geral Cláudia Marques - com a aprovação do em. Procurador-Geral Souza -, que opinou pelo indeferimento do pedido, verbis (f. 121/124):

"(...)
Acertada a decisão proferida pela autoridade reclamada. Desde que se garanta ao advogado, regularmente inscrito nos quadros da OAB, o recolhimento em local condizente com a dignidade inerente ao exercício profissional, alcançado está, sem dúvidas, o escopo pretendido pela norma prevista no art. 7º, V, da Lei nº. 8.906/94.
De acordo com a Superintendência Regional da Polícia Federal no Espírito Santo, o reclamante encontrava-se recolhido em cela distinta dos detentos comuns, construída recentemente, dotada dos atributos exigidos pelo art. 295 do Código de Processo Penal, que dispõe sobre a prisão especial, apresentando condições regulares de higiene, instalações sani­tárias satisfatórias, correspondentes à sala de Estado Maior.
Assim, ainda que se reconheça a inexistência de sala de Estado Maior no Estado do Espírito Santo, não se vislumbra, de plano, qualquer prejuízo ao reclamante, em decorrência do quadro apresentado nestes autos, já que a carceragem da Superintendência Regional da Polícia Federal em Vitória/ES, preenchendo os requisitos do art. 295 do Código de Processo Penal, corresponde, concretamente, à garantia conferida à classe profissional no art. 7º, V, da Lei 8.906/94.
Se, por um lado, esse Supremo Tribunal Federal, no julga­mento da ADI nº. 1.127/DF, afastou a aplicabilidade da art. 295 do CPP em prol da norma prevista no art. 7. V, da Lei nº. 8.906/94, por outro, tal orientação não prejudicou a incidência subsidiária da lei processual penal, na hipótese de impossibilidade material da execução da regra contida no Estatu­to da OAB, verificada quando, de fato, inexistir sala de Estado Maior disponível ao recolhimento do custodiado.
Ressalte-se que, havendo local revestido das garantias ne­cessárias à preservação da prerrogativa legal consubstanciada no art. 7º, V, da Lei nº. 8.906/94, inadequada seria a transferência de BELINE JOSÉ SALLES RAMOS para a prisão domiciliar, que é medida de caráter excepcional, cabível em situações de extrema gravidade, notadamente, em razão da dificuldade enfrentada pelas autoridades na fiscalização acerca do seu efetivo cumprimento.
Segundo informações oriundas da Superintendência Regional da Polícia Federal em Vitória/ES, às fls. 109/112, a carência apresentada na estrutura funcional daquele órgão é circunstância que inviabiliza a vi­gilância ininterrupta do custodiado no regime de prisão domiciliar.
Portanto, a decisão adotada pelo Juízo da 2ª Vara Federal Criminal de Vitória/ES, ao mesmo tempo em que resguarda, no plano fático, a prerrogativa legal contida no art. 7º, V, da Lei nº. 8.906/94, assegura a eficácia da prisão provisória imposta ao reclamante, não se caracterizando, desse modo, em ofensa ao acórdão proferido na ADI nº. 1.127/DF.
Do contrário, estar-se-ia estabelecendo em favor da nobre classe dos advogados um privilégio inexistente para qualquer outra categoria profissional no Estado do Espírito Santo, qual seja, a de nunca ser preso preventivamente, em estabelecimento adequado, dada a inexistência naquela unidade federativa, de sala do Estado Maior. Assim, enquanto um médico, um engenheiro, um arquiteto, ou qualquer outro profissional de nível superior que vier a ser preso preventivamente, ficará recolhido em prisão especial, o advogado sempre será beneficiado com a prisão domiciliar.
Tal situação, data venia, afronta ao que determina o art. 5º, caput, da Constituição Federal: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza...".
Sem desmerecer a classe dos advogados, não há razão para um tratamento diferenciado, nesse aspecto, aos demais profissionais de nível superior."

É o relatório.

Voto:

I

Esse Tribunal reputa declaratório de inconstitucionalidade a decisão que - embora sem o explicitar - afasta a incidência da norma ordinária pertinente à lide para decidi-la sob critérios diversos alegadamente extraídos da Constituição (v.g. RE 240.096, Pertence, RTJ 169/756), sendo esta a hipótese dos autos, conforme se infere do seguinte trecho da decisão reclamada, verbis (f. 34):

"(...)
A exigência de que advogados sejam recolhidos às tais "salas de Estado Maior", e a não submissão dos mesmos aos ditames do art. 295 do CPP tem por conseqüência a impossibilidade de aplicação de prisão provisória aos mesmos, constituindo-se em diferenciação odiosa, não permitida pela Carta Magna."

E, no ponto, estou convencido de que a decisão reclamada dissente do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal na ADIn 1127 (17.05.06, red. p/ acórdão Ricardo Lewandowski, p.p.), quando se julgou constitucional o art. 7, V, do Estatuto dos Advogados, na parte em que determina o recolhimento dos advogados em sala de Estado Maior e, na sua falta, em prisão domiciliar.

Ressalte-se que, diversamente do que inicialmente afirmado pelo Reclamante, o descumprimento não se refere ao tópico da decisão plenária do Supremo Tribunal que, preliminarmente, decidiu "pela inaplicabilidade ao advogado" do art. 295 do C.Pr.Penal: o que tem eficácia erga omnes e efeito vinculante é a declaração de constitucionalidade proferida, não a preliminar quanto ao conhecimento da ação direta.

II

Outra ressalva necessária é quanto ao que seja "sala de Estado Maior", local onde podem ser recolhidos provisoriamente não apenas os advogados (L. 8.906/94, art. 7º, V), mas também os magistrados (LC 35/79 - LOMAM -, art. 33, III) e os agentes do Ministério Público (L. 8.625/83, art. 40; e LC 75/93, art. 18, II, e).

Certo, há diversidade de regime: quanto aos advogados, a prisão domiciliar é uma opção subsidiária; relativamente aos agentes dos Ministérios Públicos estaduais a prisão domiciliar é uma alternativa possível ainda que existente "sala de Estado-Maior"; assim também quanto aos magistrados e aos agentes do Ministério Público da União, mas quanto a eles a opção é outra, qual seja, o recolhimento em "prisão especial".

Em comum, isto sim, a ausência de definição do que seja sala de Estado-Maior, o que se explica, ao menos quanto aos advogados, porque a referida definição ficou a critério da Ordem dos Advogados do Brasil (L. 8.906/94, art. 7º, V), na parte do dispositivo declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal.

No Supremo Tribunal Federal, não encontrei nenhuma solução explícita da questão, senão em voto do em. Ministro Nelson Jobim no HC 81.632 (2ª T., 20.08.02, Velloso, RTJ 184/640).

Concluíra então S. Exa. que, por sala de Estado-Maior, se entende qualquer sala dentre as existentes em todas as dependências de comando das Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) ou Auxiliares (Policia Militar ou Corpo de Bombeiros), com a ressalva de que, eventualmente, pode não existir "uma sala específica para o cumprimento de prisão" e, se for o caso, "o Comandante escolhe uma, nas dependências do pavilhão de comando, e a destina para tal fim".

De fato, se por Estado-Maior se entende o grupo de oficiais que assessoram o Comandante de uma unidade militar (Exército, Marinha, Aeronáutica, Corpo de Bombeiros e Polícia Militar), "sala de Estado-Maior" é o compartimento de qualquer unidade militar que, ainda que potencialmente, possa por eles ser utilizado para exercer suas funções.

A distinção que se deve fazer é que, enquanto uma "cela" tem como finalidade típica o aprisionamento de alguém - e, por isso, de regra contém grades -, uma "sala" apenas ocasionalmente é destinada para esse fim.

De outro lado, deve o local oferecer "instalações e comodidades condignas", ou seja, condições adequadas de higiene, segurança.

Este o quadro, julgo procedente a reclamação para que o Reclamante seja recolhido em prisão domiciliar - cujo local deverá ser especificado pelo Juízo reclamado -, salvo eventual transferência para sala de Estado-Maior, como antes caracterizada

É o meu voto.

* acórdão pendente de publicação

Medida Sócio-Educativa e Advento da Maioridade (Transcrições)

(v. Informativo 462)

HC 90129/RJ*

RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI

EMENTA: HABEAS CORPUS. ADOLESCENTE. INFRAÇÃO AOS ARTS. 12 E 14, DA LEI 6.368/76, E 16, DA LEI 10.826/03. INTERNAÇÃO. PROGRESSÃO PARA O REGIME DE SEMILIBERDADE. ATINGIMENTO DA MAIORIDADE. MANUTENÇÃO DA MEDIDA. POSSIBILIDADE. OFENSA AO ART. 121, § 5o, DO ECA NÃO CARACTERIZADA. ALEGAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA OU ANALÓGICA IN PEJUS. INOCORRÊNCIA.
I - A aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente rege-se pela idade do infrator à época dos fatos.
II - O atingimento da maioridade não impede a permanência do infrator em regime de semiliberdade, visto que se trata de medida mais branda do que a internação.
III - Alegação de interpretação extensiva e analógica in pejus que não pode ser acolhida.
IV - Ordem denegada.

Relatório: Trata-se de habeas corpus impetrado por Adalgisa Maria Steele Macabu em favor de CARLOS JOSÉ DE PAULA CORREIA, contra decisão monocrática do Ministro Relator nos autos do HC 64.893, da 6a Turma do Superior Tribunal de Justiça, que negou seguimento ao pedido.

A impetrante narra, em suma, que o paciente foi condenado ao cumprimento de medida sócio-educativa de internação por infração aos arts. 12 e 14, da Lei 6.368/76, e 16, da Lei 10.826/03, tendo sido ele, na seqüência, transferido para o regime de semiliberdade.

Sustenta, em suma, configurar "notório constrangimento ilegal" (fl. 14) a imposição de medida sócio-educativa ao paciente depois de ter ele atingido a maioridade penal, visto não se encontrar mais "sob o império das normas do Estatuto da Criança e do Adolescente, mas sim sujeito à legislação penal" (fl 3).

Afirma, mais, com base no § 5o do art. 121 do ECA, que tal medida não pode ser imposta aos maiores de 18 anos, salvo em caráter excepcional, ou seja, no "caso de prosseguimento da internação" (fl. 7). Aduz, ainda, que tal hipótese não comporta interpretação extensiva ou analógica, sob pena de violação do parágrafo único do art. 2o do referido Estatuto.

Requer, ao final, a concessão da ordem para que seja declarada extinta a medida sócio-educativa de semiliberdade a que se encontra submetido o paciente.

O Ministério Público Federal, por meio do parecer de lavra do Subprocurador-Geral da República Wagner Gonçalves, manifestou-se pelo indeferimento do writ (fls. 38-42).

É o relatório.

Voto: Bem examinados os autos, e sem embargo dos argumentos expendidos na inicial, verifico que o presente habeas corpus não merece prosperar.

Com efeito, o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê seis espécies de medidas sócio-educativas (art. 112): advertência, obrigação de reparar o dano, prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, inserção em regime de semiliberdade e internação em estabelecimento educacional. As duas primeiras não perduram no tempo, razão pela qual não demandam análises mais pormenorizadas.

Não sendo, tecnicamente, penas, as medidas sócio-educativas refogem ao princípio da legalidade estrita, o que permitem tenham duração indeterminada. Para a prestação de serviços à comunidade, o ECA previu a duração máxima de seis meses (art. 117), prazo tido como mínimo para a liberdade assistida (art. 118, § 2º).

Mas, a questão que ora se enfrenta diz respeito ao efeito da superveniência da maioridade penal do sócio-educando no curso da medida sócio-educativa que lhe foi imposta. É evidente que a aplicação do ECA estará sempre dependente da idade do agente no momento do fato (art. 104, parágrafo único).

Contudo, afirmar, que, atingindo a maioridade, a medida deve ser extinta é fazer "tabula rasa" do Estatuto. Isso porque esta seria inócua para aqueles que cometeram atos infracionais com mais de dezessete anos. Com efeito, no limite, adotada a tese de defesa, poder-se-ia admitir medida sócio-educativas com duração de apenas um dia, hipótese, data venia, incompatível com os seus objetivos.

A impetrante narra que foi imposta ao paciente a medida sócio-educativa correspondente à internação, progredindo para a semiliberdade, no curso de cujo cumprimento sobreveio a maioridade. Segundo o ECA, tal medida não comporta prazo determinado, aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à internação (art. 120, § 2º).

Assim, conclui-se, não poderá ela poderá ter duração superior a três anos (art. 121, § 3º) e importará liberação compulsória quando o sócio-educando tiver atingido a idade de vinte e um anos (art. 121, § 5º).

Como se vê, a superveniência da maioridade foi situação pensada pelo legislador que a previu expressamente para a medida de internação e, subsidiariamente, para a de semiliberdade.

Não vislumbro, na espécie, portanto, o constrangimento ilegal a que alude a impetrante. O Estatuto da Criança e do Adolescente possui objetivos, estrutura e sistemática distintos do Código Penal, visando exatamente a preservar a dignidade do menor infrator e promover a sua reinserção no convívio social.

A manutenção do infrator, maior de dezoito e menor de vinte e um anos, sob o regime do ECA, em situações excepcionais, taxativamente enumeradas, longe de afigurar-se ilegal, tem como escopo, exatamente, protegê-lo dos rigores das sanções de natureza penal, tendo em conta a sua inimputabilidade, e reintroduzi-lo paulatinamente na vida da comunidade.

O Juízo da Infância e Juventude, no caso sob exame, agiu corretamente ao determinar a progressão de regime do paciente, mantendo-o, todavia, nessa situação de semiliberdade, ainda que completado os dezoito anos, em atenção ao que dispõe o art. 121 do ECA, bem assim aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento, que regem o instituto da internação.

Em face do exposto, denego a ordem.

Voto:

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI (RELATOR) - Na verdade, eu estava combinando o art. 121, § 5º, com o art. 120 do ECA.

É um longo voto. O art. 120, § 2º, diz:


"§ 2º A medida não comporta prazo determinado, aplicando-se, no que couber, as disposições relativas à internação."


O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO - Seria a continuidade de uma medida sócio-educativa a pessoa que já atingiu a maioridade penal e civil.

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI (RELATOR) - Entendo que o ECA tem objetivos, estrutura e sistemática próprios que têm em vista preservar a dignidade do menor infrator e promover sua reinserção no convívio social. Digo até que causaria espécie uma pessoa que comete um crime com dezessete anos, onze meses e vinte e nove dias ter uma medida sócio-educativa por um dia, levando ao extremo absurdo, data venia, esse raciocínio.

O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO - Poderia até planejar: só cometer o crime nesse apagar das luzes, nessa passagem da idade menor para a idade maior.

O SENHOR MINISTRO RICARDO LEWANDOWSKI (RELATOR) - Pois é, faço uma interpretação sistemática. Peço vênia e peço desculpas por não ter lido o voto todo, tendo em vista o número de habeas corpus que temos, mas o correto seria ter esgotado a matéria.

* acórdão publicado no DJU de 18.5.2007




Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos
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Informativo STF - 468 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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