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segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Informativo STF 509 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Informativo STF


Brasília, 2 a 6 de junho de 2008 - Nº 509.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO

Plenário
Materiais de Amianto: Proibição e Competência Legislativa - 2
Materiais de Amianto: Proibição e Competência Legislativa - 3
Materiais de Amianto: Proibição e Competência Legislativa - 4
Materiais de Amianto: Proibição e Competência Legislativa - 5
ADI e Prerrogativa de Delegado
ADI e Aumento de Remuneração
Emenda Parlamentar e Aumento de Despesa
ADI e Regime Jurídico
ADI e Sistema de Sorteios
ADI e Responsabilidade Civil de Profissional
Horário de Expediente Forense e Princípio da Colegialidade
Desmembramento de Feito e Conexão - 1
Instauração de Processo contra Governador e Licença da Assembléia Legislativa - 2
1ª Turma
Quadrilha e Crimes contra a Ordem Tributária: Autonomia - 4
Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos e Gratuidade - 3
Estelionato contra a Previdência e Crime Instantâneo
ECA e Convívio Familiar - 1
ECA e Convívio Familiar - 2
Pensão por Morte e Rateio entre Esposa e Companheira - 2
2ª Turma
Prisão Preventiva e Falta de Fundamentação
Imediata Execução de Julgado e Abuso do Direito de Recorrer - 1
Imediata Execução de Julgado e Abuso do Direito de Recorrer - 2
Clipping do DJ
Repercussão Geral
Transcrições
Crime Continuado e Reunião de Feitos (HC 91895/SP)


PLENÁRIO

Materiais de Amianto: Proibição e Competência Legislativa - 2

Por votação majoritária, o Tribunal, em questão de ordem, negou referendo à decisão concessiva de liminar, proferida pelo Min. Marco Aurélio, e, julgando prejudicado agravo regimental, indeferiu a liminar pleiteada em ação direta de inconstitucionalidade, ajuizada pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria - CNTI, em face da Lei 12.684/2007, do Estado de São Paulo, que "proíbe o uso, no Estado de São Paulo, de produtos, materiais ou artefatos que contenham quaisquer tipos de amianto ou asbesto ou outros minerais que, acidentalmente, tenham fibras de amianto na sua composição" - v. Informativo 477. Prevaleceram os votos dos Ministros Joaquim Barbosa e Eros Grau.
ADI 3937 QO-MC/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 4.6.2008. (ADI-3937)

Materiais de Amianto: Proibição e Competência Legislativa - 3

O Min. Joaquim Barbosa salientou, inicialmente, os graves danos à saúde provocados pelo amianto, citando doenças relacionadas ao seu uso, e o que disposto na Resolução CONAMA 348/2004, no sentido de reconhecer, de acordo com critérios adotados pela Organização Mundial da Saúde, a inexistência de limites seguros para a exposição humana ao referido mineral. Considerou que, à primeira vista, a lei impugnada não seria inconstitucional por duas razões. Afirmou, no ponto, que haveria uma norma a respaldar a postura legislativa adotada pelo Estado-membro, qual seja, a Convenção 162 da OIT, promulgada por meio do Decreto 126/91. Essa Convenção seria um compromisso assumido pelo Brasil de desenvolver e implementar medidas para proteger o trabalhador exposto ao amianto, uma norma protetiva de direitos fundamentais, em especial o direito à saúde e o direito ao meio-ambiente equilibrado. Tendo em conta a coincidência principiológica entre o texto constitucional e a Convenção, afirmou que esta deveria ser um critério para se avaliar as normas estaduais, e conferiu às normas da Convenção, no mínimo, o status supralegal e infraconstitucional. Ressaltou que, se a União, no plano internacional, assumiu o compromisso de adotar medidas no sentido de substituir a utilização do amianto crisotila, conforme os artigos 3º e 10 da Convenção 162, esse compromisso deveria ser utilizado também no plano interno em face das unidades federativas. A
ADI 3937 QO-MC/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 4.6.2008. (ADI-3937)

Materiais de Amianto: Proibição e Competência Legislativa - 4

Além disso, o Min. Joaquim Barbosa se convenceu da legitimidade da lei estadual impugnada por reputar inadequado concluir que a lei federal excluiria a aplicação de qualquer outra norma ao caso. Esclareceu que a preexistência da Convenção impediria que se tentasse levar a lei ordinária federal ao status de norma geral. A Convenção é que possuiria tintas de generalidade nessa matéria, sendo a lei federal uma lei específica destinada, talvez, a permitir o crisotila no âmbito das relações federais. Acrescentou que essa distinção entre lei federal e lei específica seria inaplicável ao caso das leis sobre amianto, porque, em matéria de defesa da saúde, sobre a qual o Estado-membro tem competência, não seria razoável que a União exercesse uma opção permissiva no lugar do Estado, retirando-lhe a liberdade de atender, dentro dos limites razoáveis, aos interesses da sua comunidade, sob pena de, assim fazendo, esvaziar por completo o compromisso internacional, assumido pelo Brasil, na Convenção.
ADI 3937 QO-MC/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 4.6.2008. (ADI-3937)

Materiais de Amianto: Proibição e Competência Legislativa - 5

Por sua vez, o Min. Eros Grau, salientando que o Tribunal não estaria vinculado às razões que fundamentam o pedido do requerente, e reputando imprescindível a análise da conformidade da lei federal com a Constituição, indeferiu a liminar por entender que a Lei 9.055/95 pareceria inconstitucional, na medida em que desrespeitaria o preceito disposto no art. 196 da CF ("A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação."), situação que viabilizaria o estado-membro a legislar sobre a matéria de forma ampla (CF, art. 24, § 3º). Vencidos os Ministros Marco Aurélio, relator, Menezes Direito e Ellen Gracie, que referendavam a decisão concessiva da liminar, por considerar que, em princípio, na linha de precedentes da Corte, a lei impugnada teria usurpado a competência da União para tratar da matéria (CF, art. 22, VIII), e extrapolado a competência concorrente prevista no inciso V do art. 24 da CF, por existir norma federal regulando o tema. Os Ministros Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski reajustaram seus votos.
ADI 3937 QO-MC/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 4.6.2008. (ADI-3937)

ADI e Prerrogativa de Delegado

Por entender caracterizada a usurpação da competência privativa da União para legislar sobre direito processual (CF, art. 22, I), o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB para declarar a inconstitucionalidade do art. 32, IV, da Lei sergipana 4.122/99, que confere, ao delegado de polícia de carreira, a prerrogativa de ser ouvido, como testemunha ou ofendido, em qualquer processo ou inquérito, em dia, hora e local previamente ajustados com o juiz ou autoridade competente.
ADI 3896/SE, rel. Min. Cármen Lúcia, 4.6.2008. (ADI-3896)

ADI e Aumento de Remuneração

Por entender usurpada a iniciativa reservada ao Chefe do Poder Executivo para instauração do processo legislativo em tema concernente ao aumento de remuneração e regime jurídico dos servidores públicos (CF, art. 61, § 1º, II, a e c), de observância obrigatória pelos Estados-membros, o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República, para declarar a inconstitucionalidade do art. 4º, e sua referida Tabela X, da Lei capixaba 6.065/99, resultante de emenda parlamentar, que fixa os valores dos vencimentos do quadro permanente do pessoal da polícia civil estadual. Alguns precedentes citados: ADI 3051/MG (DJU de 28.10.2005); ADI 2705/DF (DJU de 31.10.2003); ADI 2742/ES (DJU de 25.3.2003).
ADI 2192/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 4.6.2008. (ADI-2192)

Emenda Parlamentar e Aumento de Despesa

O Tribunal deferiu pedido de medida liminar formulado em duas ações diretas ajuizadas pelo Procurador-Geral da República para suspender a eficácia das expressões "e Tubarão" e "Tubarão", contidas, respectivamente, no inciso I e no caput do art. 1º, da Lei Complementar 398/2007, e "e Tubarão", contida no inciso I do art. 1º da Lei Complementar 399/2007, ambas do Estado de Santa Catarina, resultantes de emenda parlamentar. A primeira norma impugnada transforma, cria e extingue cargos do Quadro da Magistratura e dos Serviços Auxiliares do Poder Judiciário Estadual, e eleva para entrância especial a Comarca de Tubarão. A segunda trata sobre a elevação de Promotorias de Justiça e a reclassificação, criação e extinção de cargos na carreira do Ministério Público do Estado de Santa Catarina, e também eleva a Comarca de Tubarão para entrância especial. Considerou-se que os preceitos impugnados, em princípio, afrontam a jurisprudência pacífica da Corte no sentido de serem cabíveis emendas parlamentares aos projetos de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, dos Tribunais, do Ministério Público, dentre outros, apenas quando não importarem aumento de despesa e quando tratarem de matéria que encontra pertinência com o objeto do projeto de lei.
ADI 4062 MC/SC, rel. Min. Joaquim Barbosa, 4.6.2008. (ADI-4062)
ADI 4075 MC/SC, rel. Min. Joaquim Barbosa, 4.6.2008. (ADI-4075)

ADI e Regime Jurídico

Por entender usurpada a iniciativa reservada ao Chefe do Poder Executivo para instauração do processo legislativo em tema concernente ao regime jurídico dos servidores públicos (CF, art. 61, § 1º, II, c), de observância obrigatória pelos Estados-membros, o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do Rio Grande do Norte para declarar a inconstitucionalidade da Lei estadual 7.000/97, de iniciativa parlamentar, que concede anistia a faltas administrativas cometidas por servidores públicos estaduais e estabelece condições para a readmissão e a contagem de tempo de serviço relativo ao período de afastamento. Precedentes citados: ADI 2420/ES (DJU de 8.4.2005); ADI 1440 MC/SC (DJU de 1º.6.2001); ADI 2856 MC/ES (DJU de 30.4.2004).
ADI 1594/RN, rel. Min. Eros Grau, 4.6.2008. (ADI-1594)

ADI e Sistema de Sorteios

Aplicando o entendimento fixado pela Corte em diversos precedentes no sentido de que compete privativamente à União legislar sobre sistema de sorteios (CF, art. 22, XX), o Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido de ação direta ajuizada pelo Governador do Estado de São Paulo para declarar a inconstitucionalidade da Lei estadual 12.519/2007, que "proíbe a instalação, utilização, manutenção, locação, guarda ou depósito de máquinas caça-níqueis, de vídeo-bingo, vídeo-pôquer e assemelhadas, em bares, restaurantes e similares". Vencido o Min. Marco Aurélio que julgava o pedido improcedente, reportando-se aos fundamentos do voto que proferira no julgamento da ADI 2847/DF (DJU de 26.11.2004).
ADI 3895/SP, rel. Min. Menezes Direito, 4.6.2008. (ADI-3895)

ADI e Responsabilidade Civil de Profissional

Por considerar usurpada a competência privativa da União para legislar sobre direito civil (CF, art. 22, I), o Tribunal julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação direta proposta pelo Governador do Distrito Federal para declarar a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei distrital 3.139/2003, que, ao dispor sobre a obrigatoriedade de notificação dos casos de câncer de pele, prevê que a omissão médica no cumprimento da lei acarretará responsabilidade civil do profissional e da respectiva entidade de saúde.
ADI 2875/DF, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 4.6.2008. (ADI-2875)

Horário de Expediente Forense e Princípio da Colegialidade

O Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB para declarar a inconstitucionalidade da Portaria 954/2001, do Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, que dispõe sobre o horário de expediente forense nas comarcas da capital e do interior do Estado do Amazonas, assim como dos órgãos de apoio do tribunal de justiça local. Entendeu-se que o diploma legal estaria em confronto com o art. 96, I, a, da CF ("Art. 96. Compete privativamente: I - aos tribunais: a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos; b) organizar suas secretarias e serviços auxiliares e os dos juízos que lhes forem vinculados, velando pelo exercício da atividade correicional respectiva;"). Salientou-se que, embora a norma impugnada alterasse o horário de trabalho dos servidores do judiciário local, não teria mudado sua jornada de trabalho, não interferindo, assim, com o respectivo regime jurídico. Considerou-se, entretanto, que o tema não poderia ter sido tratado por meio de portaria, de forma monocrática, mas por resolução, isto é, por decisão colegiada. Vencidos os Ministros Marco Aurélio, Menezes Direito, Cármen Lúcia e Eros Grau, julgavam improcedente o pleito. O Tribunal, ainda, deliberou emprestar eficácia ex nunc à declaração de inconstitucionalidade. Vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio, que atribuía efeitos ex tunc à decisão.
ADI 2907/AM, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 4.6.2008. (ADI-2907)

Desmembramento de Feito e Conexão - 1

O Tribunal, por maioria, deu provimento a agravo regimental interposto contra decisão que determinara o desmembramento dos autos de inquérito em que o Ministério Público Federal imputa a Senador, Governador e outros, a suposta prática dos crimes previstos nos artigos 299 do Código Eleitoral e 288, 328, 342, 343 e 344, do Código Penal, e mantivera apenas o Senador, para julgamento no Supremo, por ser o único detentor da prerrogativa de foro perante esta Corte. Considerou-se a existência de conexão a impor o julgamento conjunto dos denunciados. Vencidos os Ministros Marco Aurélio, relator, e Ricardo Lewandowski, que negavam provimento a ambos os recursos.
Pet 3838 AgR/RO, rel. Min. Marco Aurélio, 5.6.2008. (Pet-3838)

Instauração de Processo contra Governador e Licença da Assembléia Legislativa - 2

Em seguida, o Tribunal passou a deliberar sobre o requerimento do Procurador-Geral da República no sentido de desdobrar os autos do inquérito ante a negativa de licença da Assembléia Legislativa para o curso do processo contra o Governador, a fim de evitar a prescrição dos delitos imputados aos demais co-réus. O Min. Marco Aurélio, relator, indeferiu o pedido, concluindo pela inconstitucionalidade do inciso XIII do art. 29 e da expressão "admitida a acusação pelo voto de dois terços dos Deputados", contida na cabeça do art. 67, ambos da Constituição do Estado de Rondônia, que condicionam a instauração de processo contra o Governador e o Vice-Governador à prévia licença da Assembléia Legislativa. Considerou não haver, no ponto, a indispensável simetria em relação à Carta Federal. Ressaltou que, no caso, nem o § 4º do art. 86 da CF, que estabelece que o Presidente da República, na vigência do mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício das respectivas funções, serviria de base para o constituinte estadual impor a licença referida, porque esse dispositivo constitucional encerraria exceção maior, somente podendo ser considerado quanto ao Presidente da República. Após, pediu vista dos autos o Min. Eros Grau.
Pet 3838 AgR/RO, rel. Min. Marco Aurélio, 5.6.2008. (Pet-3838)


PRIMEIRA TURMA


Quadrilha e Crimes contra a Ordem Tributária: Autonomia - 4

Em conclusão de julgamento, a Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus impetrado contra ato do STJ que denegara igual medida, em que se pretendia o trancamento de ação penal instaurada contra denunciados pela suposta prática de crimes contra a ordem tributária (Lei 8.137/90, art. 1º, c/c o art. 12), em concurso formal impróprio e de forma continuada, bem como por infringência do art. 288, do CP ("Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes:...") - v. Informativos 355, 358 e 476. Asseverou-se que, nessa fase de simples recebimento da denúncia, poder-se-ia extrair dessa inicial fartura de detalhes caracterizadores do fumus comissi delicti, autorizador da persecução penal em relação ao delito de quadrilha. Salientou-se que a jurisprudência do STF admite excepcionalmente o trancamento da ação penal por habeas corpus quando ausente qualquer situação de iliquidez ou de dúvida objetiva quanto aos fatos subjacentes à acusação penal, inocorrentes na espécie. Considerou-se improcedente a assertiva de que inexistiria o elemento subjetivo do tipo do art. 288, do CP, tendo em conta que o fato de os pacientes estarem na gerência da empresa não impediria que, nessa condição, viessem a se associar para o fim de cometer crimes. Por fim, com base no entendimento da Corte no sentido de que o crime de quadrilha ou bando, por ser delito autônomo e formal, se consuma no momento em que se concretiza a convergência de vontades e independe da realização ulterior do fim visado, concluiu-se que a suspensão da ação penal pelo crime de sonegação fiscal, decorrente da adesão a programa de recuperação fiscal, não implicaria falta de justa causa para acusação pelo crime de quadrilha. Vencido o Min. Cezar Peluso que deferia parcialmente a ordem para determinar o trancamento da ação penal quanto à acusação de formação de quadrilha ou bando. O Min. Eros Grau retomou os fundamentos do seu voto originário.
HC 84223/RS, rel. Min. Eros Grau, 3.6.2008. (HC-84223)

Certificado de Entidade de Fins Filantrópicos e Gratuidade - 3

Em continuação de julgamento, a Turma, por proposta do Min. Marco Aurélio, decidiu afetar ao Plenário exame de recurso ordinário em mandado de segurança no qual instituição beneficente de assistência social pretende, para gozar da imunidade prevista no art. 195, § 7º, da CF ("§ 7º - São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei."), a renovação do seu certificado de entidade de fins filantrópicos, pedido este indeferido pelo Conselho Nacional de Assistência Social - CNAS, porquanto não comprovada a aplicação anual de, pelo menos, 20% da receita bruta em gratuidade - v. Informativo 418. Alega-se, na espécie, que o Decreto 752/93, ao determinar a aplicação do aludido percentual, possui natureza autônoma, haja vista a inexistência de lei que estabeleça tal obrigatoriedade. Nesse sentido, aduz-se que a imunidade constitui limitação ao poder de tributar e que a expressão "em lei", contida na parte final do citado § 7º, deve ser entendida como lei complementar, em razão do que estabelece o art. 146, II, da CF ("Art. 146. Cabe à lei complementar: ... II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;"). Assim, na falta de lei complementar específica disciplinando as condições a serem preenchidas pelas entidades beneficentes, devem incidir apenas os requisitos dispostos nos artigos 9º e 14 do CTN. Sustenta-se, também, ofensa à orientação adotada pelo STF no julgamento da ADI 2028 MC/DF (DJU de 16.6.2000), em que suspensa a eficácia do art. 55, III, da Lei 8.212/91.
RMS 24065/DF, rel. Min. Eros Grau, 3.6.2008. (RMS-24065)

Estelionato contra a Previdência e Crime Instantâneo

Aplicando o precedente firmado no julgamento do HC 86467/RS (DJU de 22.6.2007) no sentido de que o crime consubstanciado na concessão de aposentadoria a partir de dados falsos é instantâneo, não o transmudando em permanente o fato de terceiro haver sido beneficiado com a fraude de forma projetada no tempo, a Turma deferiu habeas corpus para declarar extinta a punibilidade do paciente. No caso, o paciente fora condenado por infringência do art. 171, § 3º, do CP, em virtude de haver adulterado anotações da carteira de trabalho de co-réu, de modo a permitir que esse recebesse aposentadoria. Tendo em conta que a pena aplicada seria inferior a 4 anos e que já transcorrido o prazo prescricional superior a 8 anos (CP, art. 109, IV), concluiu-se que o reconhecimento da prescrição retroativa se imporia.
HC 94148/SC, rel. Min. Carlos Britto, 3.6.2008. (HC-94148)

ECA e Convívio Familiar - 1

Por considerar que a melhor providência para o caso seria proporcionar o convívio do menor com os próprios pais, a Turma deferiu habeas corpus impetrado contra decisão de Ministro do STJ que denegara pedido de liminar formulado em igual medida, em que requerida a anulação de sentença que impusera ao paciente medida sócio-educativa de internação, por prazo indeterminado, pela prática de ato infracional equiparado ao delito previsto no art. 12 da Lei 6.368/76. Na espécie, o pedido fora liminarmente indeferido pela autoridade apontada como coatora ao fundamento de incompetência daquela Corte para conhecer do writ porquanto impetrado contra negativa de medida acauteladora do tribunal de origem. O Min. Marco Aurélio, relator, após superar o óbice do Enunciado na Súmula 691 do STF, deferiu liminar para que o paciente fosse colocado de imediato em liberdade, devendo ser entregue, mediante termo de responsabilidade, aos pais, permanecendo na vigilância destes até o julgamento, pelo tribunal estadual, do habeas corpus em curso. Ocorre que, posteriormente, a Corte local concedera a ordem a fim de aplicar ao paciente medida sócio-educativa de semiliberdade, com escolarização e profissionalização obrigatórias, sem prazo determinado (ECA, art. 120).
HC 88473/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 3.6.2008. (HC-88473)

ECA e Convívio Familiar - 2

Inicialmente, afastou-se o prejuízo do writ, tendo em conta a persistência do interesse dos impetrantes no seu julgamento, haja vista que o tribunal de origem não implementara o afastamento linear da internação, substituindo-a pelo regime da semiliberdade. Considerou-se que de nada adiantaria o menor desenvolver atividades externas e ter de recolher-se a casa que se diz de reeducação. No ponto, ressaltou-se o que contido no art. 227 da CF ("É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão."). Ademais, afirmou-se que, na situação concreta, o paciente seria primário, conviveria com a família e o ato infracional não teria sido cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa, não se fazendo presente reiteração no cometimento de infrações graves, nem o descumprimento injustificável de medida anteriormente imposta. Precedente citado: HC 85598/SP (DJU de 25.10.2005).
HC 88473/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 3.6.2008. (HC-88473)

Pensão por Morte e Rateio entre Esposa e Companheira - 2

A Turma concluiu julgamento de recurso extraordinário interposto pelo Estado da Bahia contra acórdão do seu respectivo Tribunal de Justiça que, dando interpretação ao § 3º do art. 226 da CF, acolhera pedido formulado em apelação, reconhecendo o direito à recorrida do rateio, com a esposa legítima, da pensão por morte de seu ex-companheiro, tendo em conta a estabilidade, publicidade e continuidade da união entre aquela e o falecido, da qual nasceram nove filhos - v. Informativo 404. Em votação majoritária, proveu-se o recurso extraordinário. Entendeu-se que, embora não haja imposição da monogamia para ter-se configurada a união estável, no caso dos autos, esta não gozaria da proteção da ordem jurídica constitucional, porquanto em desarmonia com essa, cujo art. 226 possui como objetivo maior a proteção do casamento. Ressaltou-se que, apesar de o Código Civil versar a união estável como núcleo familiar, excepciona a proteção do Estado quando existente impedimento para o casamento relativamente aos integrantes da união, sendo que, se um deles é casado, esse estado civil apenas deixa de ser óbice quando verificada a separação de fato. Concluiu-se, dessa forma, estar-se diante de concubinato (CC, art. 1.727) e não de união estável. Vencido o Min. Carlos Britto que, conferindo trato conceitual mais dilatado para a figura jurídica da família e ressaltando a existência de prole, bem como de dependência econômica da recorrida, negava provimento ao extraordinário. Reputava que a união estável constituiria tertium genus do companheirismo, abarcante dos casais desimpedidos para o casamento civil, ou, reversamente, ainda sem condições jurídicas para tanto. Assim, considerava não existir concubinos (palavra preconceituosa) para a Constituição, porém casais em situação de companheirismo.
RE 397762/BA, rel. Min. Marco Aurélio, 3.6.2008. (RE-397762)


SEGUNDA TURMA


Prisão Preventiva e Falta de Fundamentação

É da jurisprudência desta Corte que a fuga, por si só, não constitui motivação idônea para a decretação da prisão preventiva, sendo necessária a análise, caso a caso, para chegar-se à conclusão de que o paciente pretende subtrair-se ao cumprimento de eventual condenação ou se foge para não se submeter a uma custódia que considera injusta. Com base nesse entendimento, a Turma, por maioria, deferiu habeas corpus para revogar decreto de prisão preventiva expedido em desfavor de denunciado pela suposta prática de homicídio duplamente qualificado (CP, art. 121, § 2º, II e IV). Na espécie, quando do recebimento da inicial acusatória, o juízo de origem decretara a custódia cautelar do paciente com fundamento nos pressupostos da garantia da ordem pública, da conveniência da instrução criminal e da garantia da aplicação da lei penal. Ocorre que o paciente evadira-se do distrito da culpa depois de lhe ter sido negado o direito de comparecer para ser interrogado sem o risco de prisão. Ressaltou-se que se trataria de um pretenso autor ocasional de delito e que houvera manifestação espontânea do paciente no sentido de se apresentar às autoridades policial e judiciária. Por fim, aduziu-se que o ato que decretara a custódia cautelar, não poderia se valer das circunstâncias do crime ou de alegada periculosidade do autor para justificar medida tão excepcional de constrição do estado de liberdade das pessoas. Vencidos os Ministros Ellen Gracie, relatora, e Joaquim Barbosa que indeferiam o writ por reputarem legítimo o decreto de prisão preventiva.
HC 91741/PE, rel. orig. Min. Ellen Gracie, rel. p/ o acórdão Min. Eros Grau, 3.6.2008. (HC-91741)


Imediata Execução de Julgado e Abuso do Direito de Recorrer - 1

A Turma acolheu, integralmente, questão de ordem suscitada pelo Min. Joaquim Barbosa no sentido de, independentemente de ulterior impugnação recursal, dar-se imediato cumprimento à decisão da Corte que confirmara a cassação e a inelegibilidade de deputado estadual em Roraima. No caso, a aludida decisão fora proferida pelo Tribunal Regional Eleitoral - TRE e ratificada pelo Tribunal Superior Eleitoral - TSE. Interposto recurso extraordinário, o Min. Joaquim Barbosa, monocraticamente, negara-lhe seguimento, sendo a decisão mantida pela Turma no julgamento de agravo regimental. Irresignado, o ora embargante opusera embargos de declaração, rejeitados em face de seu inequívoco caráter infringente. Naquela assentada, determinara-se a imediata execução do julgado. Contra esse acórdão, a defesa impetrara mandado de segurança, cujo processamento restara obstado liminarmente pelo Min. Ricardo Lewandowski, no qual se sustentava a existência de direito líquido e certo à nova apreciação dos declaratórios, sob a alegação de ofensa aos direitos à defesa técnica e ao contraditório. Ocorre que posteriormente à oposição dos primeiros embargos, o advogado que os subscreveram renunciara ao mandato que lhe havia sido outorgado e cientificara o ora embargante, que assinara o termo de renúncia. Diante da inércia da parte em regularizar sua representação processual, o relator ordenara que o transcurso de eventuais prazos correria em Secretaria, independentemente de intimação por via de advogado.
AI 676479 QO-ED-AgR/RR, rel. Min. Joaquim Barbosa, 3.6.2008. (AI-676479)

Imediata Execução de Julgado e Abuso do Direito de Recorrer - 2

Inicialmente, asseverou-se que o recurso de embargos declaratórios fora subscrito por patrono devidamente habilitado e regularmente constituído pelo embargante. Aduziu-se que, no exame desse recurso, não cabe sustentação oral (RISTF, art. 131, § 2º) e o seu julgamento independe de pauta (RISTF, art. 83, § 1º, III). Desse modo, não haveria ato processual de natureza recursal ou ligado ao contraditório a ser praticado, de modo a implicar prejuízo ao contraditório ou ao direito de a parte ser assistida por advogado. Aduziu-se, contudo, que, com a publicação do acórdão que analisara os embargos de declaração, surgiria a necessidade de dar-se ciência ao embargante do quanto decidido pelo colegiado, sob pena de lhe sobrevir eventual prejuízo. No ponto, enfatizou-se que a razão de ser da presente questão de ordem seria dar cumprimento à decisão do STF e evitar futura alegação de nulidade do julgado. Ressaltou-se que o caso seria marcado por 3 premissas relevantes, a saber: a) a renúncia do mandato após a apresentação do recurso, o que não prejudicaria o seu conhecimento, haja vista a regular representação, à época, da parte; b) o exercício da jurisdição pelo Supremo, dada a interposição adequada do recurso e c) o dever de regularização processual da parte, que não dependia de qualquer iniciativa da Corte. No tocante a essa última assertiva, afirmou-se que o advogado observara o art. 45 do CPC, cientificando sua renúncia à parte. Nesse sentido, nos termos do mencionado dispositivo legal, seria dever da parte, independentemente de provocação do Judiciário, constituir novo causídico em até 10 dias da data em que for cientificada, por qualquer meio, da renúncia. Determinou-se, também, a comunicação ao TRE de Roraima e à presidência da Assembléia Legislativa do respectivo Estado-membro.
AI 676479 QO-ED-AgR/RR, rel. Min. Joaquim Barbosa, 3.6.2008. (AI-676479)

SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno4.6.20085.6.200824
1ª Turma3.6.2008--42
2ª Turma3.6.2008--199




R E P E R C U S S Ã O  G E R A L

DJE de 6 de junho de 2008

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 564.354-SE
RELATOR: MIN. MENEZES DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. TETO. ALTERAÇÃO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 20/98. APLICAÇÃO AOS BENEFÍCIOS ANTERIORMENTE CONCEDIDOS. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 565.202-RN
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: INTERPRETAÇÃO DO ART. 543-A, § 3º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL C/C ART. 323, § 1º, DO REGIMENTO INTERNO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
1. Não se presume a ausência de repercussão geral quando o recurso extraordinário impugnar decisão que esteja de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, vencida a Relatora.
2. Julgamento conjunto dos Recursos Extraordinários n. 563.965, 565.202, 565.294, 565.305, 565.347, 565.352, 565.360, 565.366, 565.392, 565.401, 565.411, 565.549, 565.822, 566.519, 570.772 e 576.220.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 569.056-PA
RELATOR: MIN. MENEZES DIREITO
EMENTA
Processo Trabalhista. Competência para executar as contribuições previdenciárias decorrentes de todo o período laboral. Artigo 114, § 3º, da Constituição Federal.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 573.232-SC
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ASSOCIAÇÃO. NECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO EXPRESSA DOS ASSOCIADOS. ART. 5º, XXI, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. Questão relevante do ponto de vista jurídico.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 576.336-RO
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. AUDITOR FISCAL. ESTORNO NA REMUNERAÇÃO. SUBSÍDIO DO GOVERNADOR. EMENDA CONSTITUCIONAL 41/2003. SUPERVENIÊNCIA DA EMENDA CONSTITUCIONAL 47/2005. SUBSÍDIO DO DESEMBARGADOR. INEXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. Questão restrita ao interesse regional e das partes.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 578.657-RS
RELATOR: MIN. MENEZES DIREITO
EMENTA
ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. DESVIO DE FUNÇÃO. DISCUSSÃO ACERCA DO DIREITO À DIFERENÇA DE REMUNERAÇÃO. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 579.648-MG
RELATOR: MIN. MENEZES DIREITO
EMENTA
AÇÃO DE INTERDITO PROIBITÓRIO. ACESSO DE FUNCIONÁRIOS E CLIENTES À AGÊNCIA BANCÁRIA FECHADA EM DECORRÊNCIA DE MOVIMENTO GREVISTA. COMPETÊNCIA PARA JULGAMENTO. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

Decisões Publicadas: 22

C L I P P I N G D O DJ

6 de junho de 2008

QUEST. ORD. EM Inq N. 2.010-SP
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
PRERROGATIVA DE FORO - OBJETO. A prerrogativa de foro não visa beneficiar o cidadão mas proteger o cargo ocupado.
COMPETÊNCIA - PRERROGATIVA DE FORO - AFASTAMENTO DO CARGO. Não mais ocupando o envolvido no inquérito o cargo que deu margem à prerrogativa de foro, cessa a competência do Supremo.
* noticiado no Informativo 468

HC N. 93.356-RO
RELATOR: MIN. MENEZES DIREITO
EMENTA
Habeas corpus. Sentença que condiciona a execução da pena ao trânsito em julgado da condenação. Recurso de apelação exclusivo da defesa. Reformatio in pejus. Precedentes da Suprema Corte.
1. Configura-se reformatio in pejus a decisão de Tribunal de Justiça que, ao negar provimento à apelação exclusiva da defesa, determina a expedição de mandado de prisão contra o recorrente quando a sentença condenatória condiciona a execução da pena ao trânsito em julgado da condenação.
2. Ordem de habeas corpus concedida.

HC N. 93.652-RJ
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRIBUNAL DO JÚRI. COMPETÊNCIA. ALTERAÇÃO DE LEI ESTADUAL POR RESOLUÇÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. NÃO-CONHECIMENTO PELA AUTORIDADE IMPETRADA. INADMISSIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
I - A ação de habeas corpus é adequada para questionar afronta a quaisquer direitos que tenham a liberdade de locomoção como condição ou suporte de seu exercício.
II - A alteração da competência entre Tribunais Populares por Resolução de Tribunal de Justiça, em possível afronta ao princípio do juízo natural da causa, deve ser apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça.
III - Ordem concedida de ofício.

HC N. 93.940-SE
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. CRIME HEDIONDO. LIBERDADE PROVISÓRIA. INADMISSIBILIDADE. VEDAÇÃO CONSTITUCIONAL. DELITOS INAFIANÇÁVEIS. ART. 5º, XLIII E LXVI, DA CF. SENTENÇA DE PRONÚNCIA ADEQUADAMENTE FUNDAMENTADA. EVENTUAL NULIDADE DA PRISÃO EM FLAGRANTE SUPERADA. PRECEDENTES DO STF.
I - A vedação à liberdade provisória para crimes hediondos e assemelhados que provém da própria Constituição, a qual prevê a sua inafiançabilidade (art. 5º, XLIII e XLIV).
II - Inconstitucional seria a legislação ordinária que viesse a conceder liberdade provisória a delitos com relação aos quais a Carta Magna veda a concessão de fiança.
III - Decisão monocrática que não apenas menciona a fuga do réu após a prática do homicídio, como também denega a liberdade provisória por tratar-se de crime hediondo.
IV - Pronúncia que constitui novo título para a segregação processual, superando eventual nulidade da prisão em flagrante.
V - Ordem denegada.

RE N. 497.170-SP
RELATOR: MIN. RICARDO LEWANDOWSKI
EMENTA: PROCESSO PENAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CAPITULAÇÃO DO FATO. AUTORIDADE POLICIAL. TIPIFICAÇÃO PROVISÓRIA. MINISTÉRIO PÚBLICO. ATRIBUIÇÕES CONSTITUCIONAIS. OFENSA AO ART. 129, I, DA CF/88. INEXISTÊNCIA.
I - A definição da competência para julgamento do crime, com base na tipificação provisória conferida ao fato pela autoridade policial, não enseja supressão das atribuições funcionais do Parquet.
II - Fica resguardada a competência do Ministério Público de dar ao fato a capitulação que achar de direito quando ofertar a denúncia.
III - Se a denúncia contemplar crimes diversos do relatado pela autoridade policial, capazes de modificar a competência para o julgamento do processo, poderá o Ministério Público requerer sejam os autos remetidos ao juízo competente.
IV - A competência fixada com base na tipificação realizada pela autoridade policial não ofende o art. 129, I, da Constituição Federal.
V - Recurso não provido.
* noticiado no Informativo 506


Acórdãos Publicados: 425


TRANSCRIÇÕES


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Crime Continuado e Reunião de Feitos (Transcrições)

(v. Informativo 500)

HC 91895/SP*

RELATOR: MIN. MENEZES DIREITO

Relatório: Habeas corpus, sem pedido de liminar, impetrado pelo advogado Luiz Fernando Comegno, em favor de Elzio Rahal Melillo, buscando o reconhecimento de continuidade delitiva em relação aos crimes imputados ao paciente, bem como a reunião dos processos correspondentes.

Aponta como autoridade coatora a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça que desproveu o RHC nº 20.428/SP, interposto com objetivo idêntico ao perseguido nesta oportunidade.

Alega que:

"O Recorrente, por razões de ofício - Advogado que é (OAB/SP 67.327), responde junto à Justiça Federal de Bauru à mais de 500 (quinhentos) processos crimes, todos por infração aos artigos 304, 299 e 171, § 3º, do Código Penal, figurando como vítima o INSS. Destes, 98% encontram-se sendo processados na 2ª Vara Federal Criminal, restando apenas 09 (nove) em trâmite junto à 1ª Vara e 02 (dois) junto à 3ª Vara Criminal, todas da 8ª Subseção Judiciária (Bauru).

Consta em todas as denúncias em anexo, que dia 07 de Julho de 2000, Policiais Federais de Bauru, em diligência na comarca de Botucatu, em busca realizada no escritório de advocacia do co-réu Francisco Moura, acabaram por apreender 1.000 (mil) Carteiras de Trabalho já preenchidas com o histórico de trabalho rurais daquela região. Elaborado o competente Auto de Apreensão, foram as CTPS removidas para a sede da PF de Bauru e lá, o Delegado de Polícia Dr. Amaro Silva, acabou por determinar a abertura de um (um) inquérito para cada CTPS apreendida. A inusitada diligência policial tinha como objetivo a averiguação das CTPS já que pesava a suspeita que as anotações nelas inseridas eram 'falsas'. Tendo em vista que o Paciente Dr. Ézio Rahal Melillo era o Advogado que elaborava e firmava as petições iniciais das ações previdenciárias em desfavor do INSS, ajuizadas no Fórum da comarca de São Manuel - SP, foi o mesmo indiciado em 1.000 (mil) inquéritos policiais pela prática dos delitos de falsificação de documento público; uso de documento falso e estelionato. Começava aí o 'inferno' jurídico vivido não só pelo Paciente, mas também pelo próprio Poder Judiciário da 8ª Subseção Federal de Bauru. Para cada inquérito o MPF aceitou laborar uma denúncia e hoje já se somam mais de 500 (quinhentos) processos crimes e mais 500 (quinhentos) inquéritos em andamento que, quase que semanalmente, transmudam-se em processos criminais.
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O Paciente buscou a tutela jurisdicional do STJ porque, o MM. Juiz monocrático deixou de proceder a conexão dos processos, não porque não seria comportado juridicamente, mas sim, porque a justiça não estava aparelhada para um ato dessa magnitude também porque 'seria impossível o manuseio do processo'. Ora, existindo a continuidade delitiva, pouco importa a forma do manuseio do processo, se com 180.000 páginas ou apenas 180, já que o Código de Processo Penal não trata da quantidade de páginas a ser carreada aos autos. O que não se pode admitir é que o Paciente, ora Paciente, responda a mais de 500 (quinhentos) processos crimes e ainda outros virão pela existência de quase 500 inquéritos em andamento, sob argumento da falta de 'logística' para manuseio dos autos.
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Frise-se que todas as denúncias, sem exceção, tratam de crime da mesma espécie (arts. 299, 304 e 171, § 3º do CP).
Como já se disse, o nexo adverbial da continuidade delitiva: tempo, lugar, modo de execução e outras semelhantes, encontram-se em todos os processos a que responde o Paciente.
As acusações que pesam contra o Paciente - ora Paciente, traduzem-se no fato de ter o mesmo, no pleno exercício da advocacia, firmado as petições e ajuizado as ações declaratórias em desfavor do INSS.
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Pergunta-se: Admitindo-se - EM TESE - que o Paciente, após todo trâmite processual, vier a ser condenado em todos os processos, sendo as condutas delituosas praticadas de forma continuada (e isso não há como negar), as penas deverão ser unificadas pelo juízo da execução, porque então não unificá-los agora???
Num raciocínio jurídico lógico, coerente, inteligente, não há nada que justifique o uso da máquina do Poder Judiciário para o processamento de mais de 500 (quinhentos) processos crimes (isso hoje, amanhã serão 1.000), comprometendo quase 80% de toda a estrutura da 2ª Vara Federal Criminal de Bauru; assoberbando também as Varas Criminais da Comarca de São Manuel-SP e Botucatu (onde são deprecadas toda prova acusatória); o próprio TRF3 que julga os incidentes e recursos processuais (hcs, apelações, correições parciais, etc...); a dedicação total do Ministério Público Federal e outras tantas comarcas onde são deprecadas a oitiva de testemunhas, além de equipes da Polícia Federal para transportar o Paciente às audiências, quando se sabe que a responsabilização penal neste caso poderia ser buscada em um só processo crime, ou quiçá em dois ou três. Por derradeiro,não há como negar que até mesmo esse Egrégio Supremo Tribunal Federal, num futuro muito próximo, certamente estará assoberbado com uma milhar de recursos, enfim, porque não UNIFICAR HOJE o que certamente será UNIFICADO AMANHÃ..!!??
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É certo que a sociedade, merece uma resposta jurídica sobre os fatos que foram imputados ao Paciente, mas este, merece também, cidadão brasileiro que é, a imediata intervenção do Poder Judiciário para prestar-lhe a proteção jurisdicional e constitucional a que faz jus, para que possa defender-se das frágeis acusações que lhes foram assacadas, exercendo seu direito de defesa, fato esse que se tornou impossível, já que não há como defender-se em 500 (quinhentos) processos crimes que tramitam de uma só vez, sendo obrigado a renunciar ao direito de provas, já que não existe a possibilidade de estar presente, nem o réu, nem seu advogado, em todas as audiências designadas (na maioria deprecadas) eis que encontra-se preso, sendo obrigado a requerer sua dispensa pessoal, para minimizar seu sofrimento físico e moral.
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Houve e há, em tese, ABUSO no poder de Denunciar.
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Some-se ainda em favor do Paciente para ver reconhecido a unicidade dos processos, a presença do instituto da CONEXÃO INTERSUBJETIVA no âmbito probatório (art. 76, III) eis que a prova da infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares apurada num processo, influirá na prova de outro.
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A segunda Vara Federal Criminal de Bauru deve ser a prevalente para os atos dos processos frutos da conexão aqui pretendida, eis que foi aquele r. Juízo quem antecedeu-se a todos atos processuais, inclusive, na decretação da medida de busca e apreensão (Proc. nº 2000.61.08.004738-6 - IPL 7-0249/2000) e naquelas medidas assecuratórias que desencadearam o indiciamento, denuncia e conseqüente processo penal em desfavor dos réus.

Destarte, torna-se de rigor o reconhecimento do simultaneus processus e, por conseqüência a conexão intersubjetiva dos mesmos, atribuindo-se a competência para processar e julgar ao juízo, eis que os demais devem ser reconhecidos com extensão do primeiro, formando um só bloco. No caso, a primeira denuncia recebida foi aquela referente ao processo nº 2000.61.08.008777-3, cujo delito foi praticado em 22/07/1993 recebida em 03/12/2002 pelo Juízo da 2ª Vara Federal de Bauru.
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Enfim, a planilha retro mencionada, evidencia a existência de uma continuidade delitiva, clara e transparente. Se não estamos diante de um lapso temporal de 30 dias entre o primeiro e o último delito, não há como negar que o marco temporal entre um delito e outro refletem a mais cabal continuidade delitiva, eis que foram praticados dia-após-dia" (fls. 3 a 45).

Requer, finalmente, "o reconhecimento da continuidade delitiva e conseqüente junção de todas as ações numa só, ou quiçá em 3 ou 4 blocos, aplicando-se o instituto da conexão intersubjetiva, atribuindo-se jurisdição à Segunda Vara Federal Criminal da 8ª Secção Judiciária de Bauru-SP" (fls. 45/46).

O Ministro Sepúlveda Pertence não solicitou informações à autoridade apontada como coatora (fl. 81).

O ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. Edson Oliveira de Almeida, opinou pela denegação da ordem (fls. 83 a 87).

É o relatório.

EMENTA

Habeas corpus. Crime continuado. Dilação probatória. Conexão. Reunião facultativa de processos. Prejuízo ao direito de ampla defesa em vista da multiplicidade de ações penais instauradas.

1. Não é possível, em sede de habeas corpus, examinar se estão presentes os requisitos fáticos caracterizadores da continuidade delitiva. Tal exame exigiria dilação probatória, não admitida nesta via processual. Ademais, no caso, o Superior Tribunal de Justiça não cuidou do tema no seu mérito, o que configura inviabilidade de seu exame nesta Suprema Corte, porquanto haveria supressão de instância.
2. "Desde que submetidos ao mesmo juízo, pode o magistrado utilizar-se da faculdade de não reunir processos conexos, por força do que dispõe o art. 80 do CPP." (HC nº 80.717/SP, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 5/3/04).
3. Embora a conexão não implique, necessariamente, a reunião dos feitos em curso num único processo, devem eles ser submetidos à competência do mesmo Juízo prevento.
4. A multiplicidade de ações penais não constitui, por si só, obstáculo ao exercício do direito de ampla defesa do paciente. Somente é possível aferir eventual desrespeito a essa garantia constitucional diante de situação concreta.
5. Habeas corpus conhecido em parte e, nessa parte, deferido.

Voto: O paciente alega ter contra si mais de 500 processos em relação a cujos delitos pretende ver reconhecida a existência de crime continuado. Pretende, também, como conseqüência, a reunião dos feitos em um único processo.

Consta dos autos que, em julho de 2000, foram apreendidas no escritório do paciente aproximadamente 1000 (mil) Carteiras de Trabalho e Previdência Social - CTPS adulteradas, que estariam sendo utilizadas por ele e por outros réus para a obtenção fraudulenta de benefícios junto ao Instituto Nacional do Seguro Social.

Nesse compasso, para cada documento falso apreendido foi instaurado um inquérito policial, o que havia resultado, ao tempo da impetração, em mais de 500 denúncias e em igual número de ações penais. Nesses feitos ele se vê processado, de modo geral, pela prática dos crimes previstos nos artigos 171, § 3º, (estelionato), 299 (falsificação de documento público) e 304 (uso de documento falso) do Código Penal.

O Juiz de 1º grau indeferiu o pedido de reunião dos processos, sob o argumento:

"(...)
(...)se reunidos os processos que já estão em andamento, o manuseio e sentenciamento de um feito com mais de 180.000 páginas certamente comprometeria um mínimo de objetividade na fase de sentença e, se reunidos os 150 processos que aguardam interrogatório, os interrogatórios teriam que abordar 150 fatos distintos, ter-se-ia que aguardar pela oitiva de, no mínimo, 150 testemunhas de acusação, com todos os percalços na colheita da prova oral e, ainda, a possibilidade da defesa arrolar mais de duas mil testemunhas" (fl. 5.326 dos autos originais, apenso 26).

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região denegou a ordem no habeas corpus impetrado contra essa decisão, afirmando que a reunião dos feitos não seria viável naquele momento, pois eles se encontravam em fases processuais distintas, o que poderia causar tumulto processual. Além disso, não seria possível examinar, em sede de habeas corpus, se estariam presentes os requisitos fáticos necessários à configuração da continuidade delitiva. Finalmente, asseverou que, embora os fatos fossem correlatos, investigava-se, em cada processo, uma conduta criminosa autônoma, isso porque cada episódio era relacionado à utilização de uma CTPS em particular, de propriedade de segurados distintos, sendo que as provas colhidas em cada processo, especialmente as testemunhais, seriam diversas (fls. 5.324 a 5.329 dos autos originais, apenso 26).

O Superior Tribunal de Justiça, a seu turno, negou provimento ao recurso então interposto, em acórdão assim ementado:

"CRIMINAL. RHC. ESTELIONATO. REUNIÃO DE AÇÕES PENAIS. CONTINUIDADE DELITIVA. VERIFICAÇÃO DE REQUISITOS. IMPROPRIEDADE DA VIA ELEITA. ELEVADO NÚMERO DE PROCESSOS. JUNÇÃO DOS FEITOS QUE NÃO ATENDE AO JUÍZO DE CONVENIÊNCIA. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. RECURSO DESPROVIDO.
I. A verificação dos requisitos do art. 71 do Código Penal, a fim de se verificar a eventual caracterização da continuidade delitiva e autorizar a reunião dos diversos processos criminais instaurados contra o réu não pode ser procedida na via eleita.
II. O habeas corpus é meio impróprio para essa discussão, na forma como se apresenta o caso dos autos, pois implicaria no revolvimento do contexto fático-probatório.
III. A teor do art. 80 do Código de Processo Penal, a junção de ações penais deve atender a um juízo de conveniência no tocante à otimização do trâmite processual, da produção de provas, etc.
IV. O elevado número de feitos a que responde o recorrente - quinhentos processos criminais -, afasta a conveniência necessária à reunião das ações, diante da dificuldade da tramitação em conjunto, ainda mais quando evidenciado que os procedimentos estão em fases processuais distintas, tendo sido, inclusive, proferidas duas condenações.
V. Não obstante haja correlação entre os fatos objeto dos processo-crime, as provas a serem produzidas em cada processo, especialmente as testemunhais, são diversas, o que poderá inviabilizar o regular andamento do feito.
VI.Recurso desprovido" (fl. 49).

O impetrante alega, em síntese, que essas várias ações devem ser reunidas, porque: 1) estariam presentes os requisitos legais para que se reconheça, no caso presente, a continuidade delitiva; 2) existiria conexão intersubjetiva entre os feitos, já que em todos eles figura o mesmo réu e o mesmo autor; 3) também existiria conexão probatória, vez que a prova obtida em uma ação serviria, também, às demais; e 4) o elevado número de processos inviabilizaria o exercício do seu direito de ampla defesa.

Em primeiro lugar, é preciso alertar que as instâncias ordinárias não negaram nem afirmaram a existência de crime continuado, apenas indeferiram a reunião dos feitos com fundamento na inconveniência que isso traria para a respectiva instrução. Da mesma forma, o Superior Tribunal de Justiça não tratou do tema de forma direta, afirmando apenas que a pretensão formulada, nesse particular, demandaria o reexame de matéria fático-probatória, inviável na via estreita do habeas corpus.

Nesse compasso, o Supremo Tribunal Federal está impedido de examinar se, no caso concreto, as circunstâncias indicadas pelo impetrante são suficientes, mesmo em tese, para caracterizar a continuidade delitiva. O enfrentamento da questão consubstanciaria supressão de instância não autorizada, na linha dos seguintes precedentes:

"I. STJ e STF - HC - Competência originária. 1. Não pode o Superior Tribunal de Justiça conhecer de questão suscitada pelo impetrante - excesso de prazo - que não foi enfrentada pelo Tribunal de origem, ao qual, em conseqüência, não se pode atribuir a alegada coação. 2. Pelo mesmo fundamento - impossibilidade de supressão de instância -, também não cabe ao Supremo Tribunal conhecer originariamente da questão. II. Denúncia: aptidão: descrição suficiente do delito de associação para o tráfico imputado aos pacientes. 1. É da jurisprudência do Tribunal, na linha do que se tem decidido quanto ao crime de quadrilha ou bando (C.Penal, art. 288), que a configuração do delito de associação para o tráfico independe 'da realização ulterior de qualquer delito compreendido no âmbito de suas projetadas atividades criminosas' (v.g., Ext 966, Pl., 29.6.06, Pertence, DJ 10.8.06). 2. Daí que, para a aptidão da denúncia, o que se 'exige, sobretudo, é que a imputação descreva concretamente os elementos essenciais à realização do tipo cogitado' (v.g., HC 70.290, Pl., 30.06.93, Pertence, RTJ 162/559), o que, no caso, não foi descumprido" (HC nº 90.654/SP, Primeira Turma, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 25/5/07).

"HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. CARÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. EXCESSO DE PRAZO PARA A PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. JULGAMENTO DE RECURSO DEFENSIVO EM SENTIDO ESTRITO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. DECRETO DE PRISÃO FUNDAMENTADO NA APLICAÇÂO DA LEI PENAL. FUGA DO PACIENTE APÓS A PRÁTICA DO DELITO QUE LHE É IMPUTADO. ORDEM DENEGADA. A tese do excesso de prazo para a prestação jurisdicional não foi suscitada nas instâncias inferiores, o que impede o julgamento do feito diretamente pelo Supremo Tribunal Federal, sob pena de indevida supressão de instância. Precedentes: HC 86.990, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski; HC 84.799, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence; HC 82.213, Relatora a Ministra Ellen Gracie; e o HC 83.842, Relator o Ministro Celso de Mello. Recurso defensivo em sentido estrito já denegado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Co-réu já julgado e condenado pelo Tribunal do Júri. A gravidade (em abstrato) do delito não se presta, ao ver desta Suprema Corte, como fundamento idôneo para a prisão preventiva. Precedentes. A evasão após a prática delitiva é fundamento idôneo para a segregação cautelar para resguardar a aplicação da lei penal. Ordem denegada" (HC nº 90.162/RJ, Primeira Turma, Relator o Ministro Carlos Britto, DJ 29/6/07).

"HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. PACIENTE AFASTADO DO CARGO DE AUDITOR FISCAL APÓS AS IMPETRAÇÕES DE HHCC NO TJ/PR E NO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. ALEGAÇÃO DE QUE COM O AFASTAMENTO NÃO MAIS REMANESCERIA A NECESSIDADE DA PRISÃO CAUTELAR. FATO SUPERVENIENTE NÃO EXAMINADO NAS INSTÂNCIAS PRECEDENTES. SUPRESSÕES DE INSTÂNCIAS. A prisão preventiva do paciente foi decretada em 13/07/2006, sob o fundamento de que ele, em liberdade, poderia, considerada sua condição funcional, influir na instrução do processo. Em 14/9/2006, foi impetrado habeas corpus no STJ, sustentando o exaurimento da necessidade da constrição cautelar, em virtude de o paciente ter sido afastado do cargo de Auditor Fiscal em 23/11/2006. Essa ordem cronológica evidencia que a tese da cessação dos fundamentos da custódia cautelar não foi submetida ao Juízo de primeiro grau, nem ao TJ/PR, muito menos ao STJ. O conhecimento da impetração, sem que a questão superveniente tenha sido posta a exame do Juízo de primeiro grau, do TJ/PR e do STJ implica supressões de instâncias, em três níveis. Habeas corpus não conhecido" (HC nº 90.312/PR, Segunda Turma, Relator o Ministro Eros Grau, DJ 27/4/07).

"PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. QUESTÃO NOVA. I. - Por conter questão nova, não apreciada pelo Superior Tribunal de Justiça, o habeas corpus não pode ser conhecido, sob pena de supressão de instância. II. - HC não conhecido" (HC nº 86.997/DF, Segunda Turma, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ 3/2/06).

Advirto que, além de não ser possível conhecer do writ quanto a esse particular, não se configura presente hipótese de concessão de habeas corpus de ofício. É que não se pode afirmar a existência dos pressupostos legais da continuidade delitiva sem profunda incursão em matéria fático-probatória, o que, todavia, como afirmou o acórdão impugnado, não é admitido no rito especial da ação autônoma de impugnação em causa.

A propósito, confira-se:

"Habeas Corpus. (...) 3. Inviável a via do habeas corpus para a análise da alegação de existência de continuidade delitiva entre as condutas imputadas ao paciente, em razão da necessidade de dilação de fatos e provas. Precedentes: HC nº 71.436/SP, Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, unânime, DJ 27.10.1994; HC nº 75.069/SP, Rel. Min. Moreira Alves, 1ª Turma, unânime, DJ 27.6.1997; HC nº 76.381/SP, Rel. Min. Carlos Velloso, 2ª Turma, unânime, DJ 14.8.1998; HC nº 79.503/RJ, Rel. Min. Maurício Corrêa, 2ª Turma, maioria, DJ 18.5.2001; HC nº 81.472/RJ, Rel. Min. Nelson Jobim, 2ª Turma, unânime, DJ 14.6.2002; e HC nº 81.914/SP, Rel. Min. Nelson Jobim, 2ª Turma, unânime, DJ 22.11.2002; e HC nº 82.011/PR, Rel. Min. Celso de Mello, 2ª Turma, unânime, DJ de 11.3.2005. 4. Precedentes. 5. Habeas Corpus não conhecido" (HC nº 85.532/RJ, Segunda Turma, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJ de 18/5/07).

"HABEAS CORPUS. CRIME CONTINUADO. CARACTERIZAÇÃO. 1. A continuidade delitiva (CP, art. 71) não pode prescindir dos requisitos objetivos (mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução) e subjetivo (unidade de desígnios). 2. Impossibilidade de reexame, na via do habeas corpus, dos elementos de prova que o acórdão impugnado levou em consideração para não admitir a continuidade. Precedentes. 3. RHC improvido" (RHC nº 85.577/RJ, Segunda Turma, Relatora a Ministra Ellen Gracie, DJ de 2/9/05).

De fato, no caso dos autos, os fatos criminosos ainda estão sendo apurados. As ações penais, segundo se pode inferir, ainda estão em fase de instrução. Não seria, portanto, nem mesmo o caso de apreciar a continuidade delitiva a partir de uma moldura fática já delineada por decisões judiciais. O enfrentamento da decisão demandaria, ao contrário, verdadeira dilação probatória a fim de comprovar a presença dos requisitos indicados no artigo 71 do Código Penal, em especial daquele relativo ao modus operandi.

De outra parte, no que diz respeito à reunião dos feitos com fundamento nas alegadas conexões subjetiva e probatória, verifico merecer aplicação o artigo 80 do Código de Processo Penal, última parte, com a seguinte redação:

"Art. 80. Será facultativa a separação dos processos quando as infrações tiverem sido praticas em circunstâncias de tempo ou de lugar diferentes, ou, quando pelo excessivo número de acusados e para não lhes prolongar a prisão provisória, ou por outro motivo relevante, o juiz reputar conveniente a separação".

Assim, se o Juiz natural da causa afirma não ser conveniente a reunião dos processos em uma única ação, pelos motivos antes reproduzidos nesse mesmo voto, não cabe ao Supremo Tribunal Federal, especialmente em sede de habeas corpus, substituir-se ao órgão julgador, mais próximo à instrução, para afirmar o contrário.

É nessa linha a jurisprudência da Suprema Corte:

"AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. CORRUPÇÃO ATIVA E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. CRIMES PRATICADOS EM DIVERSAS COMARCAS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. REUNIÃO DE PROCESSOS. REITERAÇÃO DE MATÉRIA DECIDIDA EM OUTRA IMPETRAÇÃO. NÃO-CONHECIMENTO. JUÍZO DE CONVENIÊNCIA. Paciente que, na qualidade de sócio de escritório de advocacia, foi processado em várias Comarcas do Estado do Rio Grande do Sul pela suposta prática dos crimes e corrupção ativa e formação de quadrilha. Denegação de pedido de habeas corpus via do qual pretendia a reunião de processos, em virtude da conexão pela continuidade delitiva. (...) De mais a mais, não cabe ao Supremo Tribunal Federal substituir ao magistrado no juízo de conveniência que lhe é assegurado pela norma veiculada no artigo 80 do Código de Processo Penal. Agravo regimental não provido" (HC nº 88.867/RS-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Eros Grau, DJ de 15/6/07).

"HABEAS CORPUS. 'OPERAÇÃO ANACONDA'. (...) VIOLAÇÃO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. DESMEMBRAMENTO DOS AUTOS. A regra do art. 79 do Código de Processo Penal - competência por conexão ou continência - é abrandada pelo teor do art. 80 do Código de Processo Penal, que faculta a separação dos autos quando se tratar de fatos distintos, como ocorre nos caso concreto.
............................................................................................" (HC nº 84.301/SP, Segunda Turma, Relator o Ministro Joaquim Barbosa, DJ de 24/3/06).

"RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS-CORPUS. DENÚNCIA: ADITAMENTO. FALTA DE INTIMAÇÃO. DECISÃO DO STF NO SENTIDO DE SANAR-SE O VÍCIO. DESCUMPRIMENTO. IMPROCEDÊNCIA. DILIGÊNCIAS. POSTERGAÇÃO. CONVENIÊNCIA DO RELATOR. APROVEITAMENTO DA INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHA TOMADA EM OUTRO PROCESSO. CONEXÃO PROBATÓRIA. COMPETÊNCIA DO RELATOR PARA RECEBER DENÚNCIA CONTRA PREFEITO. LEI 8.658/93. (...) 3. Conexão probatória. Aproveitamento da inquirição de testemunha tomada em processo diverso. Possibilidade, ficando a critério do julgador o exame e valoração da prova, assim como a faculdade de deferir ou não o pedido de reunião de processos, consoante dispõe o artigo 80 do Código de Processo Penal.
............................................................................................" (RHC nº 81.922/RS, Segunda Turma, Relator o Ministro Maurício Corrêa, DJ de 29/8/03).

Cumpre observar, no entanto, que a regra do artigo 80 do Código de Processo Penal só pode ser aplicada em relação aos processos submetidos à jurisdição de um mesmo Juízo. Em outras palavras, a separação dos processos ou a sua não-reunião, com fundamento no dispositivo legal suscitado, pressupõe que todos eles estejam afetos ao mesmo Juízo competente. Com efeito, se apenas o Juiz competente para julgar os vários delitos conexos pode determinar o seu processamento em autos apartados, interpretação em sentido inverso que se faz do artigo 80 do Código de Processo Penal pressupõe que os crimes em apreciação, nos autos correspondentes, estejam, igualmente, sob a competência do mesmo Juízo.

Nesse sentido, o seguinte julgado do Plenário desta Corte:

"HABEAS CORPUS. JULGAMENTO. PEDIDO DE ADIAMENTO. SUSTENTAÇÃO ORAL. AUSÊNCIA DO ADVOGADO NA SESSÃO. PRINCÍPIO DA AMPLA DEFESA. PREVENÇÃO. PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. SÚMULA/STF 394. CANCELAMENTO. CONEXÃO ENTRE TRÊS AÇÕES PENAIS. ALEGAÇÃO DE OBRIGATORIEDADE DE REUNIÃO DE PROCESSOS AFASTADA. CPP, ART. 80. PRISÃO PREVENTIVA. REVOGAÇÃO. REQUISITOS DO ART. 312 DO CPP PREENCHIDOS. APLICAÇÃO DO ART. 30 DA LEI Nº 7.492/86. (...) 3. Desde que submetidos ao mesmo juízo, pode o magistrado utilizar-se da faculdade de não reunir processos conexos, por força do que dispõe o art. 80 do CPP.
............................................................................................" (HC nº 80.717/SP, Tribunal Pleno, Relator o Ministro Sepúlveda Pertence, DJ de 5/3/04).

As regras dos artigos 76, III, e 79 do Código de Processo Penal, que prescrevem a competência por conexão "quando a prova de uma infração ou de qualquer de suas circunstâncias elementares influir na prova de outra infração" e, ainda, a unidade de processo e de julgamento em caso de conexão e continência, não desqualificam a abrangência do art. 80 que torna facultativa a separação dos processos. Como indica Guilherme de Souza Nucci, "tendo em vista que a conexão e a continência, como já afirmado, têm por finalidade garantir a união dos processos para uma melhor apreciação da prova pelo juiz, evitando-se decisões conflituosas, pode ocorrer a inconveniência dessa junção, seja porque torne mais difícil a fase probatória, seja pelo fato de envolver muitos réus - uns presos e outros soltos - e até por razões outras que somente o caso concreto pode determinar" (Código de Processo Penal Comentado, RT, São Paulo, 5ª ed., 2006, pág. 247).

Por outro lado, a aplicação do art. 80 do Código de Processo Penal não significa a inexistência de conexão ou continência. Facultativa é, apenas, a reunião dos processos. Daí que tudo conduz à unidade da autoridade judicante.

Da mesma forma, não há indicativo de que os feitos devam ser submetidos a jurisdições ou Juízos diversos (Justiça Federal, Militar, Tribunal do Júri, etc).

A interpretação harmônica das regras e dos princípios incidentes no caso revela, portanto, que, malgrado possam ser os delitos apurados em ações distintas, devem ser processados no mesmo Juízo, ou seja, devem as ações penais ser processadas e julgadas em unidade de Juízo.

Merecem, assim, ser colocados os feitos sob a competência do Juízo prevento.

De outro lado, no que diz respeito à alegada inviabilização do direito de ampla defesa do paciente, assinalo que a multiplicidade das ações penais não implica, por si só, a impossibilidade de se realizar uma defesa ampla e irrestrita. Com efeito, a alegada ofensa não pode ser invocada em vista de uma situação abstrata, mas apenas diante de situações concretas será possível aferir se essa garantia constitucional estará sendo desrespeitada. Essas situações, se sobrevierem no curso das muitas ações penais a que responderá o paciente, poderão ser oportuna e pontualmente contornadas por medidas processuais específicas.

Ressalto que, de qualquer sorte, a simples submissão dos processos a um único Juízo já constitui, diante da multiplicidade de ações, facilitador considerável à defesa do paciente.

De todos os modos, nada impedirá que a reunião dos feitos no Juízo prevento seja examinada em outra oportunidade.

Ante o exposto, conheço do habeas corpus apenas em parte e, nesta parte, concedo parcialmente a ordem para determinar que os processos sejam todos submetidos ao mesmo Juízo prevento.


* acórdão pendente de publicação



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