Anúncios


terça-feira, 25 de novembro de 2008

Informativo STF 526 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Informativo STF


Brasília, 27 a 31 de outubro de 2008 - Nº 526.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

Download deste Informativo

SUMÁRIO

Plenário
Fracionamento de Precatório: Custas Processuais e Requisição de Pequeno Valor - 2
Princípio da Simetria e Processo Legislativo - 2
Lei Orgânica da Polícia Civil e Modelo Federal - 2
Recolhimento de Custas e Depósito Recursal: Interposição de Recurso em Juizado Especial
Recebimento de Benefício e Filiação a Colônia de Pescadores
Aposentadoria Especial e Funções de Magistério -2
Conflito de Competência e Servidor Regido por Regime Especial - 3
Extradição: Desqualificação do Crime de Seqüestro e Morte Presumida - 4
Extradição: Desqualificação do Crime de Seqüestro e Morte Presumida - 5
Extradição: Desqualificação do Crime de Seqüestro e Morte Presumida - 6
Extradição: Desqualificação do Crime de Seqüestro e Morte Presumida - 7
Art. 290 do CPM e Princípio da Insignificância - 2
Interrogatório por Videoconferência - 2
1ª Turma
Regime de Cumprimento de Pena e Estabelecimento Adequado
Decreto de Expulsão e Direito à Progressão de Regime - 1
Decreto de Expulsão e Direito à Progressão de Regime - 2
Porte de Arma e Perícia sobre a Potencialidade Lesiva
2ª Turma
Conexão: Competência Relativa e Prevenção - 1
Conexão: Competência Relativa e Prevenção - 2
Ministério Público e Investigação Criminal - 1
Ministério Público e Investigação Criminal - 2
Repercussão Geral
Clipping do DJ
Transcrições
Co-réus - Interrogatório - Direito de Repergunta (HC 94601 MC/CE)
Inovações Legislativas


PLENÁRIO

Fracionamento de Precatório: Custas Processuais e Requisição de Pequeno Valor - 2

Em conclusão de julgamento, o Tribunal, por maioria, desproveu recurso extraordinário em que se discutia a possibilidade de se fracionar, ou não, o valor de precatório, em execução de sentença, com o objetivo de lograr-se o pagamento de custas processuais por meio de Requisição de Pequeno Valor - RPV. O acórdão recorrido adotara o fundamento de que é possível a expedição de RPV para pagamento das custas processuais devidas ao titular da serventia privatizada, desde que o seu crédito individual não supere o limite estabelecido pelo art. 87 do ADCT. O Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul - IPERGS, ora recorrente, alegava violação aos artigos 87, I, do ADCT e 100, § 4º, da CF — v. Informativo 520. Considerou-se que, no caso concreto, a pensionista, ora recorrida, seria parte ilegítima para executar as custas processuais, haja vista que, por ser beneficiária da justiça gratuita, não as teria antecipado. Destacou-se que, por essa razão, estaria descaracterizada a possibilidade de enfrentamento da questão sob a perspectiva da repercussão geral. O Min. Ricardo Lewandowski, relator, diante disso, reformulou seu voto anterior. Vencido o Min. Joaquim Barbosa, que dava provimento ao recurso.
RE 578695/RS, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 29.10.2008. (RE-578695)

Princípio da Simetria e Processo Legislativo - 2

O Tribunal retomou julgamento de ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do Piauí contra os incisos III, VII, VIII, IX e X do parágrafo único do art. 77 da Constituição estadual, que impõe a edição de lei complementar para disciplinar o Estatuto dos Servidores Públicos Civis e dos Servidores Militares, a Lei Orgânica do Magistério Público do Estado, a Lei Orgânica da Administração Pública, o Estatuto da Polícia Civil e o Estatuto Administrativo do Fisco Estadual — v. Informativo 378. Salientando que o princípio da simetria deve comportar modulação, o Min. Menezes Direito, em voto-vista, julgou improcedente o pedido formulado, no que foi acompanhado pela Min. Cármen Lúcia. Considerou que a legislação ordinária do âmbito federal, que dispensa o quorum mais rigoroso da lei complementar, não impede, pelo referido postulado, que, na competência dos Estados-membros, seja possível exigir lei complementar. Frisou que a força da federação brasileira deve estar exatamente na compreensão de que os Estados-membros podem fazer opções constitucionais locais com os padrões normativos disponíveis na Constituição Federal sem que isso malfira, em nenhum aspecto, qualquer princípio sensível ou qualquer limitação expressa ou implícita, e concluiu não vislumbrar razão alguma para a aplicação alargada do aludido postulado. Após, o Min. Eros Grau, relator, indicou adiamento.
ADI 2872/PI, rel. Min. Eros Grau, 29.10.2008. (ADI-2872)

Lei Orgânica da Polícia Civil e Modelo Federal - 2

O Tribunal retomou julgamento de ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro contra o inciso X do parágrafo único do art. 118 da Constituição fluminense, que confere status de lei complementar à Lei Orgânica da Polícia Civil daquele Estado — v. Informativo 376. Na linha do voto-vista acima relatado, o Min. Menezes Direito julgou improcedente o pleito. Após, o Min. Eros Grau pediu vista.
ADI 2314/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 29.10.2008. (ADI-2314)

Recolhimento de Custas e Depósito Recursal: Interposição de Recurso em Juizado Especial

O Tribunal concedeu medida liminar em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil - OAB para suspender a eficácia, ex nunc, do art. 7º da Lei 6.816/2007, do Estado de Alagoas, que condiciona a interposição de recurso inominado cível nos Juizados Especiais do referido Estado-membro ao recolhimento das custas judiciais e do depósito recursal. Entendeu-se que a norma impugnada, em princípio, usurpa a competência privativa da União para legislar sobre direito processual (CF, art. 22, I), bem como ofende as garantias do amplo acesso à jurisdição, do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório (CF, art. 5º, LIV e LV).
ADI 4161 MC/AL, rel. Min. Menezes Direito, 29.10.2008. (ADI-4161)

Recebimento de Benefício e Filiação a Colônia de Pescadores

Por entender caracterizada a ofensa aos princípios constitucionais da liberdade de associação e da liberdade sindical (CF, artigos 5º, XX e 8º, V, respectivamente), o Tribunal julgou procedente pedido formulado em ação direta proposta pelo Procurador-Geral da República para declarar a inconstitucionalidade do art. 2º, IV, e alíneas, da Lei 10.779/2003, que exige que os pescadores profissionais que exerçam a atividade de forma artesanal apresentem atestado da colônia de pescadores a que estejam filiados para que possam se habilitar ao benefício do seguro-desemprego durante o período de defeso. Considerou-se que o dispositivo impugnado acaba por compelir os pescadores a se filiarem a uma colônia de pescadores. Precedente citado: ADI 1655/AP (DJU de 2.4.2004).
ADI 3464/DF, rel. Min. Menezes Direito, 29.10.2008. (ADI-3464)

Aposentadoria Especial e Funções de Magistério -2

O Tribunal concluiu julgamento de ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República em que se objetivava a declaração de inconstitucionalidade da Lei 11.301/2006, que acrescentou ao art. 67 da Lei 9.393/95 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) o § 2º (“Para os efeitos do disposto no § 5º do art. 40 e no § 8º do art. 201 da Constituição Federal, são consideradas funções de magistério as exercidas por professores e especialistas em educação no desempenho de atividades educativas, quando exercidas em estabelecimento de educação básica em seus diversos níveis e modalidades, incluídas, além do exercício da docência, as de direção de unidade escolar e as de coordenação e assessoramento pedagógico.”) — v. Informativo 502. Salientando que a atividade docente não se limita à sala de aula, e que a carreira de magistério compreende a ascensão aos cargos de direção da escola, o Tribunal, por maioria, julgou parcialmente procedente o pedido formulado para conferir interpretação conforme, no sentido de assentar que as atividades mencionadas de exercício de direção de unidade escolar e as de coordenação e assessoramento pedagógico também gozam do benefício, desde que exercidas por professores. Vencidos os Ministros Carlos Britto, relator, Cármen Lúcia e Joaquim Barbosa, que julgavam procedente o pleito, ao fundamento de que a lei impugnada ofenderia o § 5º do art. 40 e o § 8º do art. 201, da CF, a qual teria conferido aposentadoria especial não a todos os profissionais da educação, mas apenas ao professor que desempenha a atividade de docência, entendida como tal a que se passa em sala de aula, no desempenho do específico mister de ensino regular ou habitual (CF: “Art. 40. ... § 5º Os requisitos de idade e de tempo de contribuição serão reduzidos em cinco anos, em relação ao disposto no  § 1º, III, ‘a’, para o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio. ... Art. 201. ... § 7º É assegurada aposentadoria no regime geral de previdência social, nos termos da lei, obedecidas as seguintes condições: I - trinta e cinco anos de contribuição, se homem, e trinta anos de contribuição, se mulher; ... § 8º Os requisitos a que se refere o inciso I do parágrafo anterior serão reduzidos em cinco anos, para o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.”). Vencida, também, a Min. Ellen Gracie, que dava pela total improcedência da ação.
ADI 3772/DF, rel. orig. Min. Carlos Britto, rel. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, 29.10.2008. (ADI-3772)

Conflito de Competência e Servidor Regido por Regime Especial - 3

Em conclusão de julgamento, o Tribunal, por maioria, conheceu de conflito de negativo de competência, e declarou a competência da Justiça Estadual para julgar reclamação trabalhista proposta por servidor regido por regime especial (Lei estadual 1.674/84) contra o Estado do Amazonas - SEDUC - Secretaria de Estado da Educação e Qualidade do Ensino. Na espécie, o TST, ao analisar recurso de revista interposto contra acórdão que dera parcial provimento a recurso ordinário, declinara de sua competência para a Justiça Estadual, com base em sua Orientação Jurisprudencial 263 da SBDI [“A relação jurídica que se estabelece entre o Estado ou Município e o servidor contratado para exercer funções temporárias ou de natureza técnica, decorrente de lei especial, é de natureza administrativa, razão pela qual a competência é da justiça comum, até mesmo para apreciar a ocorrência de eventual desvirtuamento do regime especial (CF/1967, art. 106; CF/1988, art. 37, IX).”] — v. Informativo 429. Invocou-se o entendimento fixado pelo Supremo em vários precedentes no sentido de que a competência para julgar a controvérsia, que envolve servidor estadual regido por regime especial disciplinado por lei local editada com fundamento no art. 106 da Emenda Constitucional 1/69, é da Justiça Estadual. A Min. Ellen Gracie, em voto-vista, reportou-se a recentes pronunciamentos desta Corte (RE 573202/AM, j. em 20.8.2008; Rcl 5381/AM, DJE de 8.8.2008; CC 7514/AM, DJE de 11.10.2007), e, ainda, ao RE 367638/AM (DJU de 28.3.2003), reconhecendo que as admissões fundadas em lei disciplinadora do regime jurídico próprio dos servidores admitidos em caráter temporário, dado o caráter indisponível da contratação, atraem a competência da Justiça Comum para o seu julgamento. Vencidos os Ministros Marco Aurélio, relator, Sepúlveda Pertence e Cezar Peluso, que admitiam o conflito e assentavam a competência da Justiça Trabalhista para julgamento do feito. Os primeiros, ao fundamento de que a competência, no caso, haveria de ser definida a partir da pretensão deduzida pelo reclamante, qual seja, a existência de vínculo empregatício e as verbas trabalhistas dele decorrentes. O último, por defender que a competência da Justiça Trabalhista seria firmada quando da propositura da ação, aplicando-se, ao caso, a regra do art. 87 do CPC. Reformulou o voto proferido anteriormente o Min. Carlos Britto.
CC 7201/AM, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o acórdão Min. Ricardo Lewandowski, 29.10.2008. (CC-7201)

Extradição: Desqualificação do Crime de Seqüestro e Morte Presumida - 4

O Tribunal retomou julgamento de extradição formulada, com base em tratado bilateral, pelo Governo da Argentina contra nacional uruguaio, a fim de submetê-lo a processo judicial no qual lhe é imputada a prática dos crimes de privação de liberdade e de associação ilícita, previstos, respectivamente, nos artigos 144, alínea 1ª, e 210, ambos do Código Penal argentino. Alega o Estado requerente que, durante a denominada “Operação Condor”, “identificada como uma organização terrorista, secreta e multinacional para caçar adversários políticos” dos regimes militares do Brasil, Argentina, Chile, Uruguai, Paraguai e Bolívia nas décadas de 1970 e 1980, o extraditando, à época, Major do Exército uruguaio, teria participado de ações militares que resultaram no seqüestro de pessoas, dentre as quais um cidadão argentino, levadas a uma fábrica abandonada e lá submetidas a interrogatórios e torturas — v. Informativo 519. Inicialmente, o Min. Marco Aurélio, relator, esclareceu ter havido aditamento ao pedido de extradição, por ele acolhido, em que imputado ao extraditando também o crime de subtração de menor de 10 anos, previsto no art. 146 do Código Penal argentino. Esse aditamento sustenta que o extraditando teria subtraído menor de 20 dias de idade, em 13.7.76, e que o crime, permanente — cujos efeitos teriam cessado em 18.3.2002, quando o subtraído, então com 26 anos de idade, conhecera sua verdadeira identidade —, não teria prescrito. O relator — embora reconhecendo, considerada a simetria, que, se o crime tivesse sido cometido no Brasil, estaria coberto pela anistia —, asseverou que, em razão de haver uma ordem de prisão expedida contra o extraditando, mas não ter sido ele indiciado por esse crime, isso seria suficiente para se consignar a impropriedade do pleito. Além disso, realçou que o referido menor fora encontrado, em 14.7.76, próximo a um hospital, sendo, posteriormente, adotado. Tendo isso em conta, e após salientar que o delito corresponderia ao tipo previsto no art. 249 do nosso Código Penal, e que a legislação brasileira não contempla a figura da suspensão do prazo prescricional pelo fato versado na decisão de origem — ignorar o menor a verdadeira identidade —, concluiu, colocando em plano secundário a anistia, que, por se estar diante de crime instantâneo, muito embora com conseqüências que se projetam no tempo, teria incidido, segundo a lei brasileira, a prescrição da pretensão punitiva em 14.7.80. Assim, também sob esse ângulo, portanto, seria improcedente o pedido.
Ext 974/República Argentina, rel. Min. Marco Aurélio, 30.10.2008. (Ext-974)

Extradição: Desqualificação do Crime de Seqüestro e Morte Presumida - 5

Prosseguindo, o Min. Cezar Peluso, em voto-vista, acompanhou a divergência, para deferir parcialmente o pedido de extradição, a fim de que o extraditando seja processado e julgado pelos delitos previstos nos artigos 144, bis, alínea 1ª, e 146, do Código Penal argentino. Entendeu não ser possível, sem encontrar correspondência no ordenamento jurídico argentino, dar pela existência de presunção de morte das inúmeras vítimas, para, desclassificando os crimes de seqüestro para os de homicídio, tirar-lhes a todos, sem discriminação alguma, a conseqüência de prescrição da pretensão punitiva. Reputou, ademais, inadmissível que a Corte subordine o deferimento da extradição a eventual concordância do Estado requerente em, afastada a prescrição, julgar o extraditando por concurso material de delito de homicídio. Ressaltou que a Lei 6.815/80 proíbe apenas que se autorize a extradição por fato que não constitua crime ou no Brasil ou no Estado requerente (art. 80), e que não é este o caso presente, haja vista que os fatos corporificam, em ambos os Estados, crimes de seqüestro. Aduziu que a reclassificação jurídica dos fatos para a categoria normativa de homicídios inovaria a própria base empírica do pedido de extradição, porque implicaria transpor, por simples exercício de conjectura, os limites da operação mental de subsunção para mudar, em conseqüência pressuposta, a situação concreta que, como objeto dos processos, motivou o pleito. Observou que diversa seria a hipótese, se a dificuldade se originasse da falta de coincidência absoluta quanto aos elementos que compõem o delito, em ambas as legislações, porquanto, nesse caso, a solução de eventuais dúvidas resultaria do confronto entre os elementos históricos e as figuras típicas. Asseverou, no entanto, que, a supor e considerar situação concreta distinta da que subjaz no pedido, a Corte estaria a violar o poder de controle limitado previsto no ordenamento e reconhecido pela jurisprudência (Ext 669/EUA, DJU de 29.3.96).
Ext 974/República Argentina, rel. Min. Marco Aurélio, 30.10.2008. (Ext-974)

Extradição: Desqualificação do Crime de Seqüestro e Morte Presumida - 6

Afirmou que, de todo modo, mesmo para nós, não se estaria diante de múltiplos homicídios, cuja materialidade resultaria de presunção jurídica das mortes das vítimas. Depois de salientar a indispensabilidade do exame de corpo de delito, direto ou indireto, nas hipóteses em que a infração deixa vestígios (CPP, art. 158 c/c a alínea b do inciso III do art. 564), reputou que tal prova, que no caso não existe, não poderia ser suprida por presunção legal de morte, em face das disposições do Código Civil vigente. No ponto, registrou que, nos termos do art. 7º do atual Código Civil, não basta, para que exsurja considerável presunção legal de morte, o mero juízo de extrema probabilidade da morte de quem estava em perigo de vida (inciso I), sendo necessária a existência de sentença que, após esgotadas as buscas e averiguações, produzidas em procedimento de justificação judicial, fixe a data provável do falecimento (parágrafo único). Considerou que, na espécie, não incidiria o disposto no referido artigo, haja vista a inexistência de sentença, seja de declaração de ausência, seja de declaração de morte presumida, e que, à falta da sentença, a qual deve fixar a data provável do falecimento, bem como na carência absoluta de qualquer outro dado ou prova a respeito, não se saberia quando começaram a correr os prazos de prescrição da pretensão punitiva de cada uma das mortes imaginadas ou de todas, que poderiam dar-se em datas diversas, salvo hipótese de execução coletiva. Além disso, haver-se-ia de levar em conta o óbice intransponível de, como o impõe a lei, não estar descrito o comportamento circunstanciado do extraditando em cada ação de matar. Concluiu, assim, não haver suporte para a idéia de configuração de homicídios.
Ext 974/República Argentina, rel. Min. Marco Aurélio, 30.10.2008. (Ext-974)

Extradição: Desqualificação do Crime de Seqüestro e Morte Presumida - 7

No que concerne ao aditamento formalizado no sentido de requerer que a extradição seja concedida com base na imputação do crime de seqüestro de menor de 10 anos de idade, que corresponderia ao tipo do art. 148, § 1º, IV, do Código Penal brasileiro, o Min. Cezar Peluso afastou a prescrição dessa pretensão punitiva. Citou a decisão do juiz federal argentino no sentido de que o prazo prescricional teria começado a correr a partir da data em que se comunicara oficialmente ao menor sua verdadeira identidade biológica, isto é, março de 2002, e entendeu correta a conclusão do Procurador-Geral da República quanto a não haver se falar em prescrição relativamente ao crime de seqüestro enquanto a vítima estiver privada de sua liberdade, e de não se poder afirmar, no caso, que, a despeito do tempo decorrido, todas as vítimas estivessem mortas, porque seus corpos nunca foram encontrados, de modo a ainda subsistir a ação perpetrada pelo extraditando. Por fim, quanto à alegação de que o extraditando teria sido beneficiado por indulto concedido pelo Governo Argentino mediante o Decreto 1.003/89, demonstrou que esse ato normativo teria sido declarado inconstitucional, em 25.7.2006, pela Corte Suprema de Justicia de La Nación, em relação ao benefício a ele proporcionado. Após o voto da Min. Cármen Lúcia, que reajustou o anteriormente proferido, e dos votos dos Ministros Joaquim Barbosa e Carlos Britto, todos acompanhando a divergência, pediu vista dos autos o Min. Eros Grau.
Ext 974/República Argentina, rel. Min. Marco Aurélio, 30.10.2008. (Ext-974)

Art. 290 do CPM e Princípio da Insignificância -2

O Tribunal iniciou julgamento de habeas corpus, afetado ao Pleno pela 2ª Turma, impetrado contra acórdão do Superior Tribunal Militar - STM em favor de militar condenado pelo crime de posse de substância entorpecente em lugar sujeito à administração castrense (CPM, art. 290) — v. Informativo 519. O acórdão impugnado afastou a aplicação do princípio da insignificância ao delito de uso de substância entorpecente por se tratar de crime de perigo abstrato, pouco importando a quantidade encontrada em poder do usuário e afirmou que o art. 290 do CPM não sofreu alteração com o advento da Lei 11.343/2006, tendo em conta o critério da especialidade da norma castrense em relação à lei penal comum. Pretende a impetrante, em síntese, a aplicação: a) do princípio da insignificância, dado o grau mínimo de ofensa ao bem jurídico protegido; b) do art. 28 da Lei 11.343/2006. A Min. Ellen Gracie, relatora, denegou a ordem, no que foi acompanhada pelos Ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Joaquim Barbosa. Entendeu que, diante dos valores e bens jurídicos tutelados pelo aludido art. 290 do CPM, revela-se inadmissível a consideração de alteração normativa pelo advento da Lei 11.343/2006. Assentou que a prática da conduta prevista no referido dispositivo legal ofende as instituições militares, a operacionalidade das Forças Armadas, além de violar os princípios da hierarquia e da disciplina na própria interpretação do tipo penal. Asseverou que a circunstância de a Lei 11.343/2006 ter atenuado o rigor na disciplina relacionada ao usuário de substância entorpecente não repercute no âmbito de consideração do art. 290, do CPM, não havendo que se cogitar de violação ao princípio fundamental da dignidade da pessoa humana. Salientou, ademais, que lei posterior apenas revoga anterior quando expressamente o declare, seja com ela incompatível, ou regule inteiramente a matéria por ela tratada. Concluiu não incidir qualquer uma das hipóteses à situação em tela, já que o art. 290, do CPM, é norma especial. Em seguida, reputou inaplicável, no âmbito do tipo previsto no art. 290, do CPM, o princípio da insignificância. No ponto, após discorrer que o princípio da insignificância tem como vetores a mínima ofensividade da conduta do agente, a nenhuma periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica provocada, concluiu que o entorpecente no interior das organizações militares assume enorme gravidade, em face do perigo que acarreta, uma vez que é utilizado, no serviço, armamento de alto poder ofensivo, o que afeta, diretamente, a operacionalidade da tropa e a segurança dos quartéis, independentemente da quantidade da droga encontrada, e agride, dessa forma, os valores básicos das instituições militares. Em divergência, o Min. Eros Grau concedeu o writ, reportando-se às razões expendidas nos habeas corpus que deferira na 2ª Turma (HC 92961/SP, DJE de 22.2.2008; HC 90125/RS, DJE de 5.9.2008; HC 94678/RS, DJE de 22.8.2008, e.g.). Após, pediu vista dos autos o Min. Carlos Britto.
HC 94685/CE, rel. Min. Ellen Gracie, 30.10.2008. (HC-94685)

Interrogatório por Videoconferência - 2

O Tribunal, por maioria, concedeu habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática do delito previsto no art. 157, § 2º, I e II, do CP, e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade formal da Lei paulista 11.819/2005, que previu a utilização de aparelho de videoconferência nos procedimentos judiciais destinados ao interrogatório e à audiência de presos — v. Informativo 518. Na espécie, o interrogatório do paciente, a despeito da discordância de sua defesa, realizara-se sem a presença do paciente na sala da audiência, por meio da videoconferência. Entendeu-se que a norma em questão teria invadido a competência privativa da União para legislar sobre direito processual (CF, art. 22, I). Vencidos, em parte, os Ministros Carlos Britto e Marco Aurélio, que também consideravam caracterizada a inconstitucionalidade material do diploma examinado. Vencida a Min. Ellen Gracie, relatora, que indeferia o writ, por não vislumbrar vício formal, já que o Estado de São Paulo não teria legislado sobre processo, e sim sobre procedimento (CF, art. 24, XI), nem vício material, haja vista que o procedimento instituído teria preservado todos os direitos e garantias fundamentais, bem como por reputar não demonstrado qualquer prejuízo na realização do interrogatório do paciente.
HC 90900/SP, rel. orig. Min. Ellen Gracie, rel. p/ o acórdão Min. Menezes Direito, 30.10.2008. (HC-90900)


PRIMEIRA TURMA

Regime de Cumprimento de Pena e Estabelecimento Adequado

A Turma deferiu habeas corpus para garantir ao paciente o cumprimento da pena em estabelecimento prisional adequado ao regime fixado na sentença condenatória. Tratava-se, na espécie, de writ em que condenado à pena em regime semi-aberto, por roubo qualificado, questionava a imposição de seu recolhimento à cadeia pública da comarca. Ocorre que o mesmo juízo que ordenara a custódia do paciente, em informações prestadas a esta Corte, noticiara a interdição do mencionado estabelecimento, aduzindo que a partir daquela data nenhum réu fora lá recolhido. Observou-se que, no caso, embora não houvesse expressa determinação judicial no sentido de que o paciente fosse posto em regime prisional mais gravoso do que o fixado na sentença e tampouco processo de execução formalmente instaurado, dever-se-ia levar em conta a expedição de mandado de prisão a uma cadeia pública cuja interdição fora informada pela mesma autoridade judicial que decretara a custódia. Assim, reputou-se configurado constrangimento ilegal para o paciente que, nos termos do mandado, seria preso se comparecesse e considerado foragido se não se apresentasse.
HC 94810/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 28.10.2008. (HC-94810)

Decreto de Expulsão e Direito à Progressão de Regime - 1

A Turma negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus no qual nacional norte-americano, condenado, com terceiros, pelo crime de tráfico de substâncias entorpecentes (Lei 6.368/76, art. 12, caput), a cumprimento da reprimenda em regime integralmente fechado, sustentava: a) inobservância do princípio constitucional da individualização da pena, por ausência de fundamentação para a fixação da pena-base acima do mínimo legal; b) indevida incidência da majoração decorrente do disposto no art. 18, III, da Lei 6.368/76, em face da sua absolvição relativamente ao delito de associação para o tráfico (Lei 6.368/76, art. 14); c) desnecessidade de prequestionamento em habeas corpus e d) possibilidade de progressão de regime prisional para o crime de tráfico de drogas. No caso, o STJ, para evitar supressão de instância, não conhecera da impetração porquanto a alegação referente à fixação da pena não fora apreciada pelo tribunal de origem. De início, ressaltou-se que a situação dos autos apresentaria peculiaridade, consistente no fato de que o recorrente tivera decretada a sua expulsão do Brasil em 1981, mas que retornara clandestinamente, vindo a ser preso novamente, em 1999, pela prática do delito que ensejara a condenação em análise. Salientou-se que a aludida decretação de expulsão estaria suspensa para se aguardar o cumprimento da pena ora questionada (Lei 6.368/76, art. 12), já que ele estaria em débito com a sociedade brasileira por causa desses crimes. Considerou-se que, não obstante a pendência de um decreto de expulsão — o qual não poderia ser executado —, dever-se-ia observar o direito constitucional do recorrente à progressão no regime de cumprimento da pena.
RHC 93469/RS, rel. Min. Carmén Lúcia, 28.10.2008. (RHC-93469)

Decreto de Expulsão e Direito à Progressão de Regime - 2

Preliminarmente, entendeu-se que não houve ilegalidade no mencionado ato do STJ e, em conseqüência, desproveu-se o recurso. Contudo, de ofício, deferiu-se a ordem. Aplicou-se a orientação assente no Supremo de que o habeas corpus não se sujeita ao requisito do prequestionamento na decisão impugnada, uma vez que basta para o seu conhecimento que a coação seja imputável a órgão de gradação jurisdicional inferior, o que ocorre tanto quando esse haja examinado e repelido a ilegalidade aventada quanto se se omite de decidir sobre a alegação do impetrante ou sobre matéria em relação a qual, no âmbito de conhecimento da causa a ele devolvida, se devesse pronunciar de ofício. No mérito, enfatizou-se que o recorrente teria jus à pleiteada progressão de regime. Writ concedido, de ofício, para: a) excluir da condenação do recorrente a majorante do art. 18, III, da Lei 6.368/76, oriunda da associação eventual para a prática do crime de tráfico ilícito de entorpecentes, ante sua revogação pela Lei 11.343/2006 que, sendo novatio legis, aplica-se, quando mais benéfica, em favor do réu e b) na linha da jurisprudência aqui firmada desde o julgamento do HC 82959/SP (DJU de 1º.9.2006), afastar o óbice à progressão de regime quanto ao cumprimento da pena em regime integralmente fechado por força do art. 2º, § 2º, da Lei 8.072/90, cabendo ao Juízo das Execuções a análise relativa aos eventuais requisitos da progressão, de acordo com os critérios estabelecidos no CP e na Lei de Execução Penal - LEP. Determinou-se, por fim, a comunicação da presente decisão aos Ministérios da Justiça e das Relações Exteriores — em virtude do processo de expulsão pendente para aguardar o cumprimento desta condenação —, bem como ao Juízo da 1ª Vara Criminal da Comarca de São Leopoldo - RS e ao Juízo da Execução Criminal competente.
RHC 93469/RS, rel. Min. Carmén Lúcia, 28.10.2008. (RHC-93469)

Porte de Arma e Perícia sobre a Potencialidade Lesiva

A Turma indeferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que, ao prover recurso especial do Ministério Público, restabelecera a condenação do paciente por porte ilegal de arma (Lei 10.826/2003, art. 14, caput). A impetração pretendia a restituição de decisão absolutória proferida pelo juízo de 1º grau (CPP, 386, II), sob o argumento de que seria atípica a conduta imputada ao paciente, uma vez que a prova pericial obtida não teria comprovado a potencialidade lesiva do revólver, e tampouco sido realizada por órgão imparcial. Para tanto, sustentava: a) que a condenação pelo delito de porte de arma pressuporia a demonstração da potencialidade lesiva do artefato; b) que a perícia efetuada seria nula e c) que haveria prova testemunhal a qual colocaria em dúvida o fato de arma estar municiada. Aduziu-se que, no presente writ, somente seria possível a apreciação das questões abrangidas pelo âmbito de devolutividade restrita do recurso especial, ou que tivessem sido objeto da decisão ora impugnada. No ponto, asseverou-se que o Tribunal a quo não apreciara todas as teses da defesa, limitando-se a afirmar que a nulidade do exame pericial no revólver não descaracterizaria o delito atribuído ao paciente, quando amparado pelo contexto fático-probatório delineado nos autos. No entanto, por se entender que o STJ não deveria ter condenado, desde logo, o paciente, concedeu-se a ordem, de ofício, para afastar a condenação imposta e determinar que o tribunal de justiça local prossiga no julgamento da apelação da defesa. Precedente citado: HC 94231/RS (DJE de 5.9.2008).
HC 94881/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, 28.10.2008. (HC-94881)


SEGUNDA TURMA


Conexão: Competência Relativa e Prevenção - 1

A Turma indeferiu habeas corpus no qual se discutia a possível nulidade de processo criminal, em virtude de suposta incompetência do juízo processante. Na espécie, os pacientes foram processados no Juízo da Comarca de Angélica/MS pela prática dos crimes de latrocínio (CP, art. 157, § 3º), ocultação de cadáver (CP, art. 211), formação de quadrilha (CP, art. 288), adulteração de chassi (CP, art. 311) e corrupção de menores (Lei 2.252/54, art. 1º), em decorrência do fato de terem matado duas pessoas, após subtração de veículo para ulterior desmanche em uma oficina situada na cidade de Dourados/MS. Pleiteava-se a remessa dos autos a essa Comarca ao argumento de que o crime de latrocínio fora lá perpetrado, não obstante a subtração tivesse ocorrido na Comarca de Angélica. Aduzia-se, ademais, que, nos denominados crimes plurilocais, em que a conduta e o resultado acontecem em lugares distintos, a competência seria fixada pelo lugar da consumação do delito, não havendo o que se cogitar da perpetuatio jurisdictionis (CPC, art. 87).
HC 96453/MS, rel. Min. Ellen Gracie, 28.10.2008. (HC-96453)

Conexão: Competência Relativa e Prevenção - 2

Consignou-se que a tese da impetração, no que tange à argüição de incompetência relativa ao Juízo da Comarca de Angélica, restringira-se apenas a cuidar do lugar da consumação do crime de latrocínio, quando, na verdade, haveria também outros crimes a serem analisados, os quais apontavam para a fixação da competência desse mesmo Juízo. Salientou-se, assim, que o crime de formação de quadrilha — que é crime permanente, porque sua consumação se prolonga no tempo —, teria sido, em tese, praticado em território de duas ou mais jurisdições — Municípios de Angélica, Dourados, entre outros — e, nesta hipótese, a competência seria firmada pela prevenção (CPP, artigos 71 e 83). Destarte, como o Juízo da Comarca de Angélica fora o primeiro a praticar atos no processo, concluiu-se que a competência territorial teria sido fixada com base na prevenção. Além disso, levando-se em conta a existência de conexão entre os crimes de quadrilha e os demais delitos atribuídos aos pacientes, o Juiz de Direito da Comarca de Angélica teria se tornado competente para processá-los e julgá-los também relativamente a esses outros delitos (CPP, art. 76). Por fim, esclareceu-se que a conexão é o liame que se estabelece entre dois ou mais fatos, que se tornam, dessa forma, ligados por algum motivo, oportunizando sua reunião no mesmo processo, de modo a permitir que sejam julgados por um só juiz, com base no mesmo substrato probatório, e evitando o surgimento de decisões contraditórias.
HC 96453/MS, rel. Min. Ellen Gracie, 28.10.2008. (HC-96453)

Ministério Público e Investigação Criminal - 1

A Turma negou provimento a recurso extraordinário, em que se sustentava invasão das atribuições da polícia judiciária pelo Ministério Público Federal, porque este estaria presidindo investigação criminal, e ilegalidade da quebra do sigilo de dados do recorrente. Na espécie, o recorrente tivera seu sigilo bancário e fiscal quebrado para confrontação de dados da CPMF com a declaração de imposto de renda, com o intuito de se apurar possível sonegação fiscal. Quanto à questão relativa à possibilidade de o parquet promover procedimento administrativo de cunho investigatório e à eventual violação da norma contida no art. 144, § 1º, I e IV, da CF, considerou-se irrelevante o debate. Asseverou-se que houvera a devida instauração de inquérito policial para averiguar fatos relacionados às movimentações de significativas somas pecuniárias em contas bancárias, bem como que o Ministério Público requerera, a título de tutela cautelar inominada, ao juízo competente, a concessão de provimento jurisdicional que afastasse o sigilo dos dados bancários do recorrente.
RE 535478/SC, rel. Min. Ellen Gracie, 28.10.2008. (RE-535478)

Ministério Público e Investigação Criminal - 2

Considerou-se, ademais, que, mesmo que se tratasse da temática dos poderes investigatórios do Ministério Público, melhor sorte não assistiria ao recorrente, haja vista que a denúncia pode ser fundamentada em peças de informação obtidas pelo órgão do Ministério Público sem a necessidade do prévio inquérito policial, como já previa o CPP. Reputou-se não haver óbice a que o Ministério Público requisite esclarecimentos ou diligencie diretamente a obtenção da prova de modo a formar seu convencimento a respeito de determinado fato, aperfeiçoando a persecução penal, especialmente em casos graves como o presente que envolvem altas somas em dinheiro movimentadas em contas bancárias. Aduziu-se, tendo em conta ser princípio basilar da hermenêutica constitucional o dos “poderes implícitos”, segundo o qual, quando a Constituição Federal concede os fins, dá os meios, que se a atividade fim — a promoção da ação penal pública — foi outorgada ao parquet em foro de privatividade, não haveria como não lhe oportunizar a colheita de prova para tanto, já que o CPP autoriza que peças de informação embasem a denúncia. Dessa forma, concluiu-se pela possibilidade de, em algumas hipóteses, ser reconhecida a legitimidade da promoção de atos de investigação por parte do Ministério Público, especialmente quando se verifique algum motivo que se revele autorizador dessa investigação. No mais, afastou-se a apontada violação ao princípio da irretroatividade das leis, devido à invocação do disposto na Lei 10.174/2001 para utilização de dados da CPMF, haja vista que esse diploma legal passou a autorizar a utilização de certas informações bancárias do contribuinte para efeitos fiscais, mas, mesmo no período anterior a sua vigência, já era possível a obtenção desses dados quando houvesse indícios de prática de qualquer crime. Não se trataria, portanto, de eficácia retroativa dessa lei, e sim de apuração de ilícito penal mediante obtenção das informações bancárias. No que tange aos demais argumentos apresentados, não se conheceu do recurso, já que as matérias teriam natureza infraconstitucional.
RE 535478/SC, rel. Min. Ellen Gracie, 28.10.2008. (RE-535478)


SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno29.10.200830.10.200811
1ª Turma28.10.2008——289
2ª Turma28.10.2008——130


R E P E R C U S S Ã O  G E R A L

DJE de 31 de outubro de 2008

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 566.349-MG
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: PRECATÓRIO. ART. 78, § 2º, DO ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS. COMPENSAÇÃO DE PRECATÓRIOS COM DÉBITOS TRIBUTÁRIOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.
Reconhecida a repercussão geral dos temas relativos à aplicabilidade imediata do art. 78, § 2º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT e à possibilidade de se compensar precatórios de natureza alimentar com débitos tributários.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 571.184 -SP
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ARTIGOS 1º E 2º DA LEI COMPLEMENTAR N. 110/2001. ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. CORREÇÃO MONETÁRIA DO FGTS: ÍNDICES ABAIXO DA INFLAÇÃO REAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. IMPOSSIBILIDADE DE SE INSTITUIR TRIBUTO PARA CUSTEAR O ÔNUS FINANCEIRO DECORRENTE DA RESPONSABILIDADE OBJETIVA. MANIFESTAÇÃO PELA AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.
A tese suscitada no recurso extraordinário, segundo a qual a correção monetária de determinados períodos de correção do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço por índices abaixo da inflação real caracterizaria responsabilidade objetiva do Estado, razão pela qual o ônus financeiro decorrente daquele ato não pode ser custeado pela instituição de novos tributos, não tem repercussão geral dada a existência de várias decisões no Supremo Tribunal Federal pela constitucionalidade dos arts. 1º e 2º da Lei Complementar n. 110/2001.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 572.499-SC
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ARTIGO 142, § 3º, INCISO X, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA: LEI SOBRE INGRESSO NAS FORÇAS ARMADAS. ARTIGO 9º DA LEI N. 11.279/2006. LIMITE DE IDADE: FIXAÇÃO EM EDITAL. MANIFESTAÇÃO PELA EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.
Reconhecida a repercussão sobre o tema relativo à constitucionalidade do art. 9º da Lei n. 11.279/2006, que atribui ao edital de concurso público para ingresso nas forças armadas a fixação das condições de escolaridade, preparo técnico e profissional, sexo, limites de idade, idoneidade, saúde, higidez física e aptidão psicológica, à luz do disposto no art. 142, § 3º, inciso X, da Constituição da República.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 575.526-PR
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ALTERAÇÃO DO REGIME CELETISTA PARA O ESTATUTÁRIO. DIREITO PREVISTO NO ESTATUTO DOS SERVIDORES PÚBLICOS. AUSÊNCIA DE TRANSCENDÊNCIA DE INTERESSES. RECURSO EXTRAORDINÁRIO RECUSADO.
1. O tema constitucional suscitado no recurso extraordinário - possibilidade de se deferir a servidor público, cujo regime jurídico é alterado do celetista para o estatutário, direito previsto no estatuto dos servidores públicos - não tem transcendência de interesses, além de ser meramente residual por decorrer da interpretação do art. 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
2. Recurso extraordinário recusado.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 578.801-RS
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: DIREITO INTERTEMPORAL. APLICAÇÃO RETROATIVA DE LEIS SOBRE PLANOS DE SAÚDE. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.
Há repercussão geral na questão sobre a aplicação retroativa de leis sobre planos de saúde aos contratos firmados antes da sua vigência, à luz do art. 5º, inc. XXXVI, da Constituição da República.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 580.264-RS
RELATOR: MIN. JOAQUIM BARBOSA
EMENTA: CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMUNIDADE RECÍPROCA. SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. ENTIDADES QUE PRESTAM SERVIÇOS DE SAÚDE. HOSPITAIS. ALEGADA AUSÊNCIA DE INTUITO DE EXPLORAÇÃO ECONÔMICA. VINCULAÇÃO AO MINISTÉRIO DA SAÚDE. CONFIGURAÇÃO COMO ENTIDADE DE INTERESSE PÚBLICO. ART. 150, IV, ‘A’ DA CONSTITUIÇÃO.
PROCESSUAL CIVIL. MANIFESTAÇÃO ENCAMINHADA PELA PRESENÇA DE REPERCUSSÃO GERAL.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 591.470-MG
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: CONSTITUCIONAL. DIREITO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CABIMENTO DE RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. ART. 121, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.
1. Tem repercussão geral a questão constitucional relativa à delimitação da competência que a Constituição da República outorgou ao Tribunal Superior Eleitoral para examinar recurso especial eleitoral (art. 121, § 4º, da Constituição da República), mormente no que diz respeito à dúvida de seu cabimento nas prestações de contas de campanhas eleitorais.
2. Relevância jurídica e transcendência de interesses caracterizados.

Decisões Publicadas: 7




C L I P P I N G  D O  DJ

31 de outubro de 2008

ACO N. 1.179-PB
RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE
DIREITO PROCESSUAL PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE ATRIBUIÇÕES. CARACTERIZAÇÃO. COMPETÊNCIA DO STF. POSSÍVEL CRIME DE DESACATO CONTRA JUIZ DO TRABALHO. FATO OCORRIDO EM RAZÃO DE SUA FUNÇÃO. ART. 331, CP.
1. Suposto conflito de atribuições entre membros do Ministério Público do Estado da Paraíba e do Ministério Público Federal, relacionados aos fatos investigados no procedimento investigatório instaurado pela Procuradoria da República em Campina Grande/PB.
2. Com fundamento no art. 102, I, f, da Constituição da República, deve ser conhecido o presente conflito de atribuição entre os membros do Ministério Público do Estado da Paraíba e do Ministério Público Federal diante da competência do Supremo Tribunal Federal para julgar conflito entre órgãos de Estados-membros diversos.
3. O juiz federal de Campina Grande reconheceu, expressamente, que a competência para eventual ação penal é da justiça federal e, por isso, realmente não há que se cogitar de conflito de jurisdição (ou de competência), mas sim de conflito de atribuições.
4. Servidora da Justiça do Trabalho Maria do Socorro teria tentado se valer de sua função pública, baseada na ordem de serviço referida, para não se submeter à fila existente no local, ocasião em que o juiz do trabalho também resolveu fazer o mesmo. Assim, no momento em que a servidora afirmou que o juiz somente mandava “no seu gabinete, aqui deve ser tratado como cidadão comum...”, manifestou desprestígio à função pública exercida pelo magistrado, revelando nexo causal entre a conduta e a condição de juiz do trabalho da suposta vítima.
5. Em tese, houve infração penal praticada em detrimento do interesse da União (CF, art. 109, IV), a atrair a competência da justiça federal.
6. Atribuição do Ministério Público Federal para funcionar no procedimento, exercitando a opinio delicti.
7. Entendimento original da relatora, em sentido oposto, abandonado para participar das razões prevalecentes.
8. Conflito não conhecido, determinando-se a remessa dos autos ao Superior Tribunal de Justiça.
*noticiado no Informativo 519

MI N. 670-ES E MI N. 708-DF
REL. P/ O ACÓRDÃO: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. GARANTIA FUNDAMENTAL (CF, ART. 5º, INCISO LXXI). DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS (CF, ART. 37, INCISO VII). EVOLUÇÃO DO TEMA NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). DEFINIÇÃO DOS PARÂMETROS DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL PARA APRECIAÇÃO NO ÂMBITO DA JUSTIÇA FEDERAL E DA JUSTIÇA ESTADUAL ATÉ A EDIÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA PERTINENTE, NOS TERMOS DO ART. 37, VII, DA CF. EM OBSERVÂNCIA AOS DITAMES DA SEGURANÇA JURÍDICA E À EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL NA INTERPRETAÇÃO DA OMISSÃO LEGISLATIVA SOBRE O DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS, FIXAÇÃO DO PRAZO DE 60 (SESSENTA) DIAS PARA QUE O CONGRESSO NACIONAL LEGISLE SOBRE A MATÉRIA. MANDADO DE INJUNÇÃO DEFERIDO PARA DETERMINAR A APLICAÇÃO DAS LEIS Nos 7.701/1988 E 7.783/1989.

1. SINAIS DE EVOLUÇÃO DA GARANTIA FUNDAMENTAL DO MANDADO DE INJUNÇÃO NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).
1.1. No julgamento do MI no 107/DF, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 21.9.1990, o Plenário do STF consolidou entendimento que conferiu ao mandado de injunção os seguintes elementos operacionais: i) os direitos constitucionalmente garantidos por meio de mandado de injunção apresentam-se como direitos à expedição de um ato normativo, os quais, via de regra, não poderiam ser diretamente satisfeitos por meio de provimento jurisdicional do STF; ii) a decisão judicial que declara a existência de uma omissão inconstitucional constata, igualmente, a mora do órgão ou poder legiferante, insta-o a editar a norma requerida; iii) a omissão inconstitucional tanto pode referir-se a uma omissão total do legislador quanto a uma omissão parcial; iv) a decisão proferida em sede do controle abstrato de normas acerca da existência, ou não, de omissão é dotada de eficácia erga omnes, e não apresenta diferença significativa em relação a atos decisórios proferidos no contexto de mandado de injunção; iv) o STF possui competência constitucional para, na ação de mandado de injunção, determinar a suspensão de processos administrativos ou judiciais, com o intuito de assegurar ao interessado a possibilidade de ser contemplado por norma mais benéfica, ou que lhe assegure o direito constitucional invocado; v) por fim, esse plexo de poderes institucionais legitima que o STF determine a edição de outras medidas que garantam a posição do impetrante até a oportuna expedição de normas pelo legislador.
1.2. Apesar dos avanços proporcionados por essa construção jurisprudencial inicial, o STF flexibilizou a interpretação constitucional primeiramente fixada para conferir uma compreensão mais abrangente à garantia fundamental do mandado de injunção. A partir de uma série de precedentes, o Tribunal passou a admitir soluções “normativas” para a decisão judicial como alternativa legítima de tornar a proteção judicial efetiva (CF, art. 5o, XXXV). Precedentes: MI no 283, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 14.11.1991; MI no 232/RJ, Rel. Min. Moreira Alves, DJ 27.3.1992; MI nº 284, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. para o acórdão Min. Celso de Mello, DJ 26.6.1992; MI no 543/DF, Rel. Min. Octavio Gallotti, DJ 24.5.2002; MI no 679/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 17.12.2002; e MI no 562/DF, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 20.6.2003.
2. O MANDADO DE INJUNÇÃO E O DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS NA JURISPRUDÊNCIA DO STF.
2.1. O tema da existência, ou não, de omissão legislativa quanto à definição das possibilidades, condições e limites para o exercício do direito de greve por servidores públicos civis já foi, por diversas vezes, apreciado pelo STF. Em todas as oportunidades, esta Corte firmou o entendimento de que o objeto do mandado de injunção cingir-se-ia à declaração da existência, ou não, de mora legislativa para a edição de norma regulamentadora específica. Precedentes: MI no 20/DF, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 22.11.1996; MI no 585/TO, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 2.8.2002; e MI no 485/MT, Rel. Min. Maurício Corrêa, DJ 23.8.2002.
2.2. Em alguns precedentes(em especial, no voto do Min. Carlos Velloso, proferido no julgamento do MI no 631/MS, Rel. Min. Ilmar Galvão, DJ 2.8.2002), aventou-se a possibilidade de aplicação aos servidores públicos civis da lei que disciplina os movimentos grevistas no âmbito do setor privado (Lei no 7.783/1989).
3. DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS. HIPÓTESE DE OMISSÃO LEGISLATIVA INCONSTITUCIONAL. MORA JUDICIAL, POR DIVERSAS VEZES, DECLARADA PELO PLENÁRIO DO STF. RISCOS DE CONSOLIDAÇÃO DE TÍPICA OMISSÃO JUDICIAL QUANTO À MATÉRIA. A EXPERIÊNCIA DO DIREITO COMPARADO. LEGITIMIDADE DE ADOÇÃO DE ALTERNATIVAS NORMATIVAS E INSTITUCIONAIS DE SUPERAÇÃO DA SITUAÇÃO DE OMISSÃO.
3.1. A permanência da situação de não-regulamentação do direito de greve dos servidores públicos civis contribui para a ampliação da regularidade das instituições de um Estado democrático de Direito (CF, art. 1o). Além de o tema envolver uma série de questões estratégicas e orçamentárias diretamente relacionadas aos serviços públicos, a ausência de parâmetros jurídicos de controle dos abusos cometidos na deflagração desse tipo específico de movimento grevista tem favorecido que o legítimo exercício de direitos constitucionais seja afastado por uma verdadeira “lei da selva”.
3.2. Apesar das modificações implementadas pela Emenda Constitucional no 19/1998 quanto à modificação da reserva legal de lei complementar para a de lei ordinária específica (CF, art. 37, VII), observa-se que o direito de greve dos servidores públicos civis continua sem receber tratamento legislativo minimamente satisfatório para garantir o exercício dessa prerrogativa em consonância com imperativos constitucionais.
3.3. Tendo em vista as imperiosas balizas jurídico-políticas que demandam a concretização do direito de greve a todos os trabalhadores, o STF não pode se abster de reconhecer que, assim como o controle judicial deve incidir sobre a atividade do legislador, é possível que a Corte Constitucional atue também nos casos de inatividade ou omissão do Legislativo.
3.4. A mora legislativa em questão já foi, por diversas vezes, declarada na ordem constitucional brasileira. Por esse motivo, a permanência dessa situação de ausência de regulamentação do direito de greve dos servidores públicos civis passa a invocar, para si, os riscos de consolidação de uma típica omissão judicial.
3.5. Na experiência do direito comparado (em especial, na Alemanha e na Itália), admite-se que o Poder Judiciário adote medidas normativas como alternativa legítima de superação de omissões inconstitucionais, sem que a proteção judicial efetiva a direitos fundamentais se configure como ofensa ao modelo de separação de poderes (CF, art. 2o).
4. DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS. REGULAMENTAÇÃO DA LEI DE GREVE DOS TRABALHADORES EM GERAL (LEI No 7.783/1989). FIXAÇÃO DE PARÂMETROS DE CONTROLE JUDICIAL DO EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE PELO LEGISLADOR INFRACONSTITUCIONAL.
4.1. A disciplina do direito de greve para os trabalhadores em geral, quanto às “atividades essenciais”, é especificamente delineada nos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989. Na hipótese de aplicação dessa legislação geral ao caso específico do direito de greve dos servidores públicos, antes de tudo, afigura-se inegável o conflito existente entre as necessidades mínimas de legislação para o exercício do direito de greve dos servidores públicos civis (CF, art. 9o, caput, c/c art. 37, VII), de um lado, e o direito a serviços públicos adequados e prestados de forma contínua a todos os cidadãos (CF, art. 9o, §1o), de outro. Evidentemente, não se outorgaria ao legislador qualquer poder discricionário quanto à edição, ou não, da lei disciplinadora do direito de greve. O legislador poderia adotar um modelo mais ou menos rígido, mais ou menos restritivo do direito de greve no âmbito do serviço público, mas não poderia deixar de reconhecer direito previamente definido pelo texto da Constituição. Considerada a evolução jurisprudencial do tema perante o STF, em sede do mandado de injunção, não se pode atribuir amplamente ao legislador a última palavra acerca da concessão, ou não, do direito de greve dos servidores públicos civis, sob pena de se esvaziar direito fundamental positivado. Tal premissa, contudo, não impede que, futuramente, o legislador infraconstitucional confira novos contornos acerca da adequada configuração da disciplina desse direito constitucional.
4.2 Considerada a omissão legislativa alegada na espécie, seria o caso de se acolher a pretensão, tão-somente no sentido de que se aplique a Lei no 7.783/1989 enquanto a omissão não for devidamente regulamentada por lei específica para os servidores públicos civis (CF, art. 37, VII).
4.3 Em razão dos imperativos da continuidade dos serviços públicos, contudo, não se pode afastar que, de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto e mediante solicitação de entidade ou órgão legítimo, seja facultado ao tribunal competente impor a observância a regime de greve mais severo em razão de tratar-se de “serviços ou atividades essenciais”, nos termos do regime fixado pelos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989. Isso ocorre porque não se pode deixar de cogitar dos riscos decorrentes das possibilidades de que a regulação dos serviços públicos que tenham características afins a esses “serviços ou atividades essenciais” seja menos severa que a disciplina dispensada aos serviços privados ditos “essenciais”.
4.4. O sistema de judicialização do direito de greve dos servidores públicos civis está aberto para que outras atividades sejam submetidas a idêntico regime. Pela complexidade e variedade dos serviços públicos e atividades estratégicas típicas do Estado, há outros serviços públicos, cuja essencialidade não está contemplada pelo rol dos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989. Para os fins desta decisão, a enunciação do regime fixado pelos arts. 9o a 11 da Lei no 7.783/1989 é apenas exemplificativa (numerus apertus).
5. O PROCESSAMENTO E O JULGAMENTO DE EVENTUAIS DISSÍDIOS DE GREVE QUE ENVOLVAM SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS DEVEM OBEDECER AO MODELO DE COMPETÊNCIAS E ATRIBUIÇÕES APLICÁVEL AOS TRABALHADORES EM GERAL (CELETISTAS), NOS TERMOS DA REGULAMENTAÇÃO DA LEI No 7.783/1989. A APLICAÇÃO COMPLEMENTAR DA LEI No 7.701/1988 VISA À JUDICIALIZAÇÃO DOS CONFLITOS QUE ENVOLVAM OS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS NO CONTEXTO DO ATENDIMENTO DE ATIVIDADES RELACIONADAS A NECESSIDADES INADIÁVEIS DA COMUNIDADE QUE, SE NÃO ATENDIDAS, COLOQUEM “EM PERIGO IMINENTE A SOBREVIVÊNCIA, A SAÚDE OU A SEGURANÇA DA POPULAÇÃO” (LEI No 7.783/1989, PARÁGRAFO ÚNICO, ART. 11).
5.1. Pendência do julgamento de mérito da ADI no 3.395/DF, Rel. Min. Cezar Peluso, na qual se discute a competência constitucional para a apreciação das “ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios” (CF, art. 114, I, na redação conferida pela EC no 45/2004).
5.2. Diante da singularidade do debate constitucional do direito de greve dos servidores públicos civis, sob pena de injustificada e inadmissível negativa de prestação jurisdicional nos âmbitos federal, estadual e municipal, devem-se fixar também os parâmetros institucionais e constitucionais de definição de competência, provisória e ampliativa, para a apreciação de dissídios de greve instaurados entre o Poder Público e os servidores públicos civis.
5.3. No plano procedimental, afigura-se recomendável aplicar ao caso concreto a disciplina da Lei no 7.701/1988 (que versa sobre especialização das turmas dos Tribunais do Trabalho em processos coletivos), no que tange à competência para apreciar e julgar eventuais conflitos judiciais referentes à greve de servidores públicos que sejam suscitados até o momento de colmatação legislativa específica da lacuna ora declarada, nos termos do inciso VII do art. 37 da CF.
5.4. A adequação e a necessidade da definição dessas questões de organização e procedimento dizem respeito a elementos de fixação de competência constitucional de modo a assegurar, a um só tempo, a possibilidade e, sobretudo, os limites ao exercício do direito constitucional de greve dos servidores públicos, e a continuidade na prestação dos serviços públicos. Ao adotar essa medida, este Tribunal passa a assegurar o direito de greve constitucionalmente garantido no art. 37, VII, da Constituição Federal, sem desconsiderar a garantia da continuidade de prestação de serviços públicos - um elemento fundamental para a preservação do interesse público em áreas que são extremamente demandadas pela sociedade.
6. DEFINIÇÃO DOS PARÂMETROS DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL PARA APRECIAÇÃO DO TEMA NO ÂMBITO DA JUSTIÇA FEDERAL E DA JUSTIÇA ESTADUAL ATÉ A EDIÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA PERTINENTE, NOS TERMOS DO ART. 37, VII, DA CF. FIXAÇÃO DO PRAZO DE 60 (SESSENTA) DIAS PARA QUE O CONGRESSO NACIONAL LEGISLE SOBRE A MATÉRIA. MANDADO DE INJUNÇÃO DEFERIDO PARA DETERMINAR A APLICAÇÃO DAS LEIS Nos 7.701/1988 E 7.783/1989.
6.1. Aplicabilidade aos servidores públicos civis da Lei no 7.783/1989, sem prejuízo de que, diante do caso concreto e mediante solicitação de entidade ou órgão legítimo, seja facultado ao juízo competente a fixação de regime de greve mais severo, em razão de tratarem de “serviços ou atividades essenciais” (Lei no 7.783/1989, arts. 9o a 11).
6.2. Nessa extensão do deferimento do mandado de injunção, aplicação da Lei no 7.701/1988, no que tange à competência para apreciar e julgar eventuais conflitos judiciais referentes à greve de servidores públicos que sejam suscitados até o momento de colmatação legislativa específica da lacuna ora declarada, nos termos do inciso VII do art. 37 da CF.
6.3. Até a devida disciplina legislativa, devem-se definir as situações provisórias de competência constitucional para a apreciação desses dissídios no contexto nacional, regional, estadual e municipal. Assim, nas condições acima especificadas, se a paralisação for de âmbito nacional, ou abranger mais de uma região da justiça federal, ou ainda, compreender mais de uma unidade da federação, a competência para o dissídio de greve será do Superior Tribunal de Justiça (por aplicação analógica do art. 2o, I, “a”, da Lei no 7.701/1988). Ainda no âmbito federal, se a controvérsia estiver adstrita a uma única região da justiça federal, a competência será dos Tribunais Regionais Federais (aplicação analógica do art. 6o da Lei no 7.701/1988). Para o caso da jurisdição no contexto estadual ou municipal, se a controvérsia estiver adstrita a uma unidade da federação, a competência será do respectivo Tribunal de Justiça (também por aplicação analógica do art. 6o da Lei no 7.701/1988). As greves de âmbito local ou municipal serão dirimidas pelo Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal com jurisdição sobre o local da paralisação, conforme se trate de greve de servidores municipais, estaduais ou federais.
6.4. Considerados os parâmetros acima delineados, a par da competência para o dissídio de greve em si, no qual se discuta a abusividade, ou não, da greve, os referidos tribunais, nos âmbitos de sua jurisdição, serão competentes para decidir acerca do mérito do pagamento, ou não, dos dias de paralisação em consonância com a excepcionalidade de que esse juízo se reveste. Nesse contexto, nos termos do art. 7o da Lei no 7.783/1989, a deflagração da greve, em princípio, corresponde à suspensão do contrato de trabalho. Como regra geral, portanto, os salários dos dias de paralisação não deverão ser pagos, salvo no caso em que a greve tenha sido provocada justamente por atraso no pagamento aos servidores públicos civis, ou por outras situações excepcionais que justifiquem o afastamento da premissa da suspensão do contrato de trabalho (art. 7o da Lei no 7.783/1989, in fine).
6.5. Os tribunais mencionados também serão competentes para apreciar e julgar medidas cautelares eventualmente incidentes relacionadas ao exercício do direito de greve dos servidores públicos civis, tais como: i) aquelas nas quais se postule a preservação do objeto da querela judicial, qual seja, o percentual mínimo de servidores públicos que deve continuar trabalhando durante o movimento paredista, ou mesmo a proibição de qualquer tipo de paralisação; ii) os interditos possessórios para a desocupação de dependências dos órgãos públicos eventualmente tomados por grevistas; e iii) as demais medidas cautelares que apresentem conexão direta com o dissídio coletivo de greve.
6.6. Em razão da evolução jurisprudencial sobre o tema da interpretação da omissão legislativa do direito de greve dos servidores públicos civis e em respeito aos ditames de segurança jurídica, fixa-se o prazo de 60 (sessenta) dias para que o Congresso Nacional legisle sobre a matéria.
6.7. Mandado de injunção conhecido e, no mérito, deferido para, nos termos acima especificados, determinar a aplicação das Leis nos 7.701/1988 e 7.783/1989 aos conflitos e às ações judiciais que envolvam a interpretação do direito de greve dos servidores públicos civis.
*noticiado no Informativo 485

MI N. 712-PA
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: MANDADO DE INJUNÇÃO. ART. 5º, LXXI DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. CONCESSÃO DE EFETIVIDADE À NORMA VEICULADA PELO ARTIGO 37, INCISO VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. LEGITIMIDADE ATIVA DE ENTIDADE SINDICAL. GREVE DOS TRABALHADORES EM GERAL [ART. 9º DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. APLICAÇÃO DA LEI FEDERAL N. 7.783/89 À GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO ATÉ QUE SOBREVENHA LEI REGULAMENTADORA. PARÂMETROS CONCERNENTES AO EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE PELOS SERVIDORES PÚBLICOS DEFINIDOS POR ESTA CORTE. CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO. GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO. ALTERAÇÃO DE ENTENDIMENTO ANTERIOR QUANTO À SUBSTÂNCIA DO MANDADO DE INJUNÇÃO. PREVALÊNCIA DO INTERESSE SOCIAL. INSUBSSISTÊNCIA DO ARGUMENTO SEGUNDO O QUAL DAR-SE-IA OFENSA À INDEPENDÊNCIA E HARMONIA ENTRE OS PODERES [ART. 2O DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL] E À SEPARAÇÃO DOS PODERES [art. 60, § 4o, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL]. INCUMBE AO PODER JUDICIÁRIO PRODUZIR A NORMA SUFICIENTE PARA TORNAR VIÁVEL O EXERCÍCIO DO DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS, CONSAGRADO NO ARTIGO 37, VII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
1. O acesso de entidades de classe à via do mandado de injunção coletivo é processualmente admissível, desde que legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano.
2. A Constituição do Brasil reconhece expressamente possam os servidores públicos civis exercer o direito de greve — artigo 37, inciso VII. A Lei n. 7.783/89 dispõe sobre o exercício do direito de greve dos trabalhadores em geral, afirmado pelo artigo 9º da Constituição do Brasil. Ato normativo de início inaplicável aos servidores públicos civis.
3. O preceito veiculado pelo artigo 37, inciso VII, da CB/88 exige a edição de ato normativo que integre sua eficácia. Reclama-se, para fins de plena incidência do preceito, atuação legislativa que dê concreção ao comando positivado no texto da Constituição.
4. Reconhecimento, por esta Corte, em diversas oportunidades, de omissão do Congresso Nacional no que respeita ao dever, que lhe incumbe, de dar concreção ao preceito constitucional. Precedentes.
5. Diante de mora legislativa, cumpre ao Supremo Tribunal Federal decidir no sentido de suprir omissão dessa ordem. Esta Corte não se presta, quando se trate da apreciação de mandados de injunção, a emitir decisões desnutridas de eficácia.
6. A greve, poder de fato, é a arma mais eficaz de que dispõem os trabalhadores visando à conquista de melhores condições de vida. Sua auto-aplicabilidade é inquestionável; trata-se de direito fundamental de caráter instrumental.
7. A Constituição, ao dispor sobre os trabalhadores em geral, não prevê limitação do direito de greve: a eles compete decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dela defender. Por isso a lei não pode restringi-lo, senão protegê-lo, sendo constitucionalmente admissíveis todos os tipos de greve.
8. Na relação estatutária do emprego público não se manifesta tensão entre trabalho e capital, tal como se realiza no campo da exploração da atividade econômica pelos particulares. Neste, o exercício do poder de fato, a greve, coloca em risco os interesses egoísticos do sujeito detentor de capital — indivíduo ou empresa — que, em face dela, suporta, em tese, potencial ou efetivamente redução de sua capacidade de acumulação de capital. Verifica-se, então, oposição direta entre os interesses dos trabalhadores e os interesses dos capitalistas. Como a greve pode conduzir à diminuição de ganhos do titular de capital, os trabalhadores podem em tese vir a obter, efetiva ou potencialmente, algumas vantagens mercê do seu exercício. O mesmo não se dá na relação estatutária, no âmbito da qual, em tese, aos interesses dos trabalhadores não correspondem, antagonicamente, interesses individuais, senão o interesse social. A greve no serviço público não compromete, diretamente, interesses egoísticos do detentor de capital, mas sim os interesses dos cidadãos que necessitam da prestação do serviço público.
9. A norma veiculada pelo artigo 37, VII, da Constituição do Brasil reclama regulamentação, a fim de que seja adequadamente assegurada a coesão social.
10. A regulamentação do exercício do direito de greve pelos servidores públicos há de ser peculiar, mesmo porque “serviços ou atividades essenciais” e “necessidades inadiáveis da coletividade” não se superpõem a “serviços públicos”; e vice-versa.
11. Daí porque não deve ser aplicado ao exercício do direito de greve no âmbito da Administração tão-somente o disposto na Lei n. 7.783/89. A esta Corte impõe-se traçar os parâmetros atinentes a esse exercício.
12. O que deve ser regulado, na hipótese dos autos, é a coerência entre o exercício do direito de greve pelo servidor público e as condições necessárias à coesão e interdependência social, que a prestação continuada dos serviços públicos assegura.
13. O argumento de que a Corte estaria então a legislar — o que se afiguraria inconcebível, por ferir a independência e harmonia entre os poderes [art. 2o da Constituição do Brasil] e a separação dos poderes [art. 60, § 4o, III] — é insubsistente.
14. O Poder Judiciário está vinculado pelo dever-poder de, no mandado de injunção, formular supletivamente a norma regulamentadora de que carece o ordenamento jurídico.
15. No mandado de injunção o Poder Judiciário não define norma de decisão, mas enuncia o texto normativo que faltava para, no caso, tornar viável o exercício do direito de greve dos servidores públicos.
16. Mandado de injunção julgado procedente, para remover o obstáculo decorrente da omissão legislativa e, supletivamente, tornar viável o exercício do direito consagrado no artigo 37, VII, da Constituição do Brasil.
*noticiado no Informativo 485

HC N. 89.222-RJ
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
NULIDADE - HABEAS CORPUS - PASSAGEM DO TEMPO - IRRELEVÂNCIA. A passagem do tempo não prejudica o habeas corpus quando voltado ao reconhecimento de nulidade absoluta e presente o direito de ir e vir.
DEFESA - CONCRETUDE - ESTAGIÁRIO - DEFENSORIA PÚBLICA. A garantia constitucional da defesa há de ser observada sob o ângulo efetivo e não simplesmente formal. Veiculada por estagiário, sem a presença de profissional da advocacia quer na fase de instrução, quer na de alegações finais, longe fica de atender aos ditames legais.
*noticiado no Informativo 478

RE N. 331.086-PR
RELATOR: MIN. MENEZES DIREITO
EMENTA
Desapropriação. Terreno reservado. Súmula nº 479 da Suprema Corte.
1. A área de terreno reservado, como assentado pela Suprema Corte na Súmula nº 479, é insuscetível de indenização.
2. Recurso extraordinário conhecido e provido.
* noticiado no Informativo 518

RE N. 428.991-RS
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
RECURSO EXTRAORDINÁRIO - PRINCÍPIOS DA LEGALIDADE E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL - NORMAS LEGAIS - CABIMENTO. A intangibilidade do preceito constitucional que assegura o devido processo legal direciona ao exame da legislação comum. Daí a insubsistência da tese de que a ofensa à Carta da República suficiente a ensejar o conhecimento de extraordinário há de ser direta e frontal. Caso a caso, compete ao Supremo apreciar a matéria, distinguindo os recursos protelatórios daqueles em que versada, com procedência, a transgressão a texto do Diploma Maior, muito embora se torne necessário, até mesmo, partir-se do que previsto na legislação comum. Entendimento diverso implica relegar à inocuidade dois princípios básicos em um Estado Democrático de Direito: o da legalidade e o do devido processo legal, com a garantia da ampla defesa, sempre a pressuporem a consideração de normas estritamente legais.
EMBARGOS DECLARATÓRIOS - OBJETO - VÍCIO DE PROCEDIMENTO - PERSISTÊNCIA - DEVIDO PROCESSO LEGAL. Os embargos declaratórios visam ao aperfeiçoamento da prestação jurisdicional. Cumpre julgá-los com espírito de compreensão. Deixando de ser afastada omissão, tem-se o vício de procedimento a desaguar em nulidade.
NULIDADE - ARTIGO 249 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - COLEGIADO - JULGAMENTO DE FUNDO. O vício na arte de proceder conduz, de início, à declaração de nulidade, que, no entanto, é sobrepujada pela possibilidade de julgar-se o mérito a favor da parte a quem aproveitaria o reconhecimento da pecha, cabendo ao Colegiado o olhar flexível quanto à aplicação da regra processual a homenagear a razão.
PESSOAL - DESPESAS - LIMITE - ARTIGO 169 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - LEI - OBSERVÂNCIA - AFASTAMENTO - IMPROPRIEDADE. Entre as formas constitucionais de diminuição de despesas com pessoal objetivando reduzi-las a certo limite, não há a relatividade de dispositivo legal, mormente quando, de natureza imperativa, a estampar a reposição do poder aquisitivo de parcela a revelar prestação alimentícia.
* noticiado no Informativo 517

RE N. 496.718-RS
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
EMENTA
Processo civil. Ministério Público. Legitimidade ativa. Medida judicial para internação compulsória de pessoa vítima de alcoolismo. Ausência.
1. O Ministério Público não tem legitimidade ativa ad causam para requerer a internação compulsória, para tratamento de saúde, de pessoa vítima de alcoolismo.
2. Existindo Defensoria Pública organizada, tem ela competência para atuar nesses casos.
3. Recurso extraordinário desprovido.
*noticiado no Informativo 515

RHC N. 94.350-SC
RELATORA: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. JUNTADA DE PARECER E ADITAMENTO DA APELAÇAO. DOCUMENTO: NÃO-CARACTERIZAÇÃO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL INEXISTENTE. RECURSO ORDINÁRIO AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
1. Parecer da lavra de jurista renomado não constitui documento nos termos da legislação processual penal vigente.
2. A apelação da defesa, salvo limitação explícita no ato de sua interposição, devolve ao Tribunal todas as questões relevantes do processo, independentemente delas terem sido argüidas pelos Recorrentes nas razões de apelação ou, no caso, no pedido de aditamento.
3. Recurso Ordinário ao qual se nega provimento.
*noticiado no Informativo 524

HC N. 94.085-SP
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: PORTE DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE - QUANTIDADE ÍNFIMA - USO PRÓPRIO - DELITO PERPETRADO DENTRO DE ORGANIZAÇÃO MILITAR - CRIME MILITAR (CPM, ART. 290) - PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA - APLICABILIDADE - IDENTIFICAÇÃO DOS VETORES CUJA PRESENÇA LEGITIMA O RECONHECIMENTO DESSE POSTULADO DE POLÍTICA CRIMINAL - CONSEQÜENTE DESCARACTERIZAÇÃO DA TIPICIDADE PENAL EM SEU ASPECTO MATERIAL - DOUTRINA - CONSIDERAÇÕES EM TORNO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - PEDIDO DEFERIDO, COM EXTENSÃO DE SEUS EFEITOS AO CO-RÉU.
O PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA QUALIFICA-SE COMO FATOR DE DESCARACTERIZAÇÃO MATERIAL DA TIPICIDADE PENAL.
- O princípio da insignificância - que deve ser analisado em conexão com os postulados da fragmentariedade e da intervenção mínima do Estado em matéria penal - tem o sentido de excluir ou de afastar a própria tipicidade penal, examinada na perspectiva de seu caráter material. Doutrina.
Tal postulado - que considera necessária, na aferição do relevo material da tipicidade penal, a presença de certos vetores, tais como (a) a mínima ofensividade da conduta do agente, (b) a nenhuma periculosidade social da ação, (c) o reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento e (d) a inexpressividade da lesão jurídica provocada - apoiou-se, em seu processo de formulação teórica, no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público.
O POSTULADO DA INSIGNIFICÂNCIA E A FUNÇÃO DO DIREITO PENAL: “DE MINIMIS, NON CURAT PRAETOR”.
- O sistema jurídico há de considerar a relevantíssima circunstância de que a privação da liberdade e a restrição de direitos do indivíduo somente se justificam quando estritamente necessárias à própria proteção das pessoas, da sociedade e de outros bens jurídicos que lhes sejam essenciais, notadamente naqueles casos em que os valores penalmente tutelados se exponham a dano, efetivo ou potencial, impregnado de significativa lesividade.
O direito penal não se deve ocupar de condutas que produzam resultado cujo desvalor - por não importar em lesão significativa a bens jurídicos relevantes - não represente, por isso mesmo, prejuízo importante, seja ao titular do bem jurídico tutelado, seja à integridade da própria ordem social.
APLICABILIDADE, AOS DELITOS MILITARES, INCLUSIVE AO CRIME DE POSSE DE QUANTIDADE ÍNFIMA DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE, PARA USO PRÓPRIO, MESMO NO INTERIOR DE ORGANIZAÇÃO MILITAR (CPM, ART. 290), DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.
- A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem admitido a aplicabilidade, aos crimes militares, do princípio da insignificância, mesmo que se trate do crime de posse de substância entorpecente, em quantidade ínfima, para uso próprio, ainda que cometido no interior de Organização Militar. Precedentes.
*noticiado no Informativo 499

Acórdãos Publicados: 430




T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Co-réus - Interrogatório - Direito de Repergunta (Transcrições)

HC 94601 MC/CE*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: “HABEAS CORPUS”. RESPEITO, PELO PODER PÚBLICO, ÀS PRERROGATIVAS JURÍDICAS QUE COMPÕEM O PRÓPRIO ESTATUTO CONSTITUCIONAL DO DIREITO DE DEFESA. A GARANTIA CONSTITUCIONAL DO “DUE PROCESS OF LAW” COMO EXPRESSIVA LIMITAÇÃO À ATIVIDADE PERSECUTÓRIA DO ESTADO (INVESTIGAÇÃO PENAL E PROCESSO PENAL). O CONTEÚDO MATERIAL DA CLÁUSULA DE GARANTIA DO “DUE PROCESS”. INTERROGATÓRIO JUDICIAL. NATUREZA JURÍDICA. POSSIBILIDADE DE QUALQUER DOS LITISCONSORTES PENAIS PASSIVOS FORMULAR REPERGUNTAS AOS DEMAIS CO-RÉUS, NOTADAMENTE SE AS DEFESAS DE TAIS ACUSADOS SE MOSTRAREM COLIDENTES. PRERROGATIVA JURÍDICA CUJA LEGITIMAÇÃO DECORRE DO POSTULADO CONSTITUCIONAL DA AMPLA DEFESA. PRECEDENTE DO STF (PLENO). MAGISTÉRIO DA DOUTRINA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.
- Assiste, a cada um dos litisconsortes penais passivos, o direito – fundado em cláusulas constitucionais (CF, art. 5º, incisos LIV e LV) – de formular reperguntas aos demais co-réus, que, no entanto, não estão obrigados a respondê-las, em face da prerrogativa contra a auto-incriminação, de que também são titulares. O desrespeito a essa franquia individual do réu, por implicar grave transgressão ao estatuto constitucional do direito de defesa, qualifica-se como causa geradora de nulidade processual absoluta. Doutrina. Precedentes do STF.

DECISÃO: Trata-se de “habeas corpus”, com pleito de ordem cautelar, impetrado contra decisão emanada de eminente Ministra de Tribunal Superior da União, que, em sede de outra ação de “habeas corpus” então em curso no Superior Tribunal de Justiça (HC 93.125/CE), denegou medida liminar que lhe havia sido requerida em favor do ora paciente.
Os ora impetrantes alegam inobservância do devido processo legal em relação ao ora paciente, pelos seguintes fundamentos (fls. 03):

“A) em razão de ter sido produzido depoimentos judiciais de pessoas envolvidas com a conduta imputada ao paciente antes dele ser citado; B) não ter sido oportunizado aos advogados constituídos pelo paciente a presença na audiência de interrogatório dos co-réus; C) o paciente ter sido citado e interrogado em menos de 24 horas; D) por ter sido nomeado advogado ‘ad doc’ para acompanhar os interrogatórios do co-réu à revelia da manifestação pessoal do paciente.” (grifei)

Presente tal contexto, impende verificar, desde logo, se a situação processual versada nestes autos justifica, ou não, o afastamento, sempre excepcional, da Súmula 691/STF.
Como se sabe, o Supremo Tribunal Federal, ainda que em caráter extraordinário, tem admitido o afastamento, “hic et nunc”, da Súmula 691/STF, em hipóteses nas quais a decisão questionada divirja da jurisprudência predominante nesta Corte ou, então, veicule situações configuradoras de abuso de poder ou de manifesta ilegalidade (HC 85.185/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO – HC 86.634-MC/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO - HC 86.864-MC/SP, Rel. Min. CARLOS VELLOSO - HC 87.468/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO – HC 89.025-MC-AgR/SP, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA - HC 90.112-MC/PR, Rel. Min. CEZAR PELUSO – HC 94.016/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).
Parece-me que a situação exposta nesta impetração ajustar-se-ia às hipóteses que autorizam a superação do obstáculo representado pela Súmula 691/STF. Passo, em conseqüência, a examinar a postulação cautelar ora deduzida nesta sede processual.
É que se impõe, ao Judiciário, o dever de assegurar, ao réu, os direitos básicos que resultam do postulado do devido processo legal, notadamente as prerrogativas inerentes à garantia da ampla defesa, à garantia do contraditório, à igualdade entre as partes perante o juiz natural e à garantia de imparcialidade do magistrado processante.
A essencialidade dessa garantia de ordem jurídica reveste-se de tamanho significado e importância no plano das atividades de persecução penal que ela se qualifica como requisito legitimador da própria “persecutio criminis”.
Daí a necessidade de se definir o alcance concreto dessa cláusula de limitação que incide sobre o poder persecutório do Estado.
O exame da garantia constitucional do “due process of law” permite nela identificar alguns elementos essenciais à sua própria configuração, destacando-se, dentre eles, por sua inquestionável importância, as seguintes prerrogativas: (a) direito ao processo (garantia de acesso ao Poder Judiciário); (b) direito à citação e ao conhecimento prévio do teor da acusação; (c) direito a um julgamento público e célere, sem dilações indevidas; (d) direito ao contraditório e à plenitude de defesa (direito à autodefesa e à defesa técnica); (e) direito de não ser processado e julgado com base em leis “ex post facto”; (f) direito à igualdade entre as partes; (g) direito de não ser processado com fundamento em provas revestidas de ilicitude; (h) direito ao benefício da gratuidade; (i) direito à observância do princípio do juiz natural; (j) direito ao silêncio (privilégio contra a auto-incriminação); (l) direito à prova; e (m) direito de presença e de “participação ativa” nos atos de interrogatório judicial dos demais litisconsortes penais passivos, quando existentes.
Não constitui demasia assinalar, neste ponto, analisada a função defensiva sob uma perspectiva global, que o direito do réu à observância, pelo Estado, da garantia pertinente ao “due process of law”, além de traduzir expressão concreta do direito de defesa, também encontra suporte legitimador em convenções internacionais que proclamam a essencialidade dessa franquia processual, que compõe o próprio estatuto constitucional do direito de defesa, enquanto complexo de princípios e de normas que amparam qualquer acusado em sede de persecução criminal por suposta prática de delitos a ele atribuídos.
A justa preocupação da comunidade internacional com a preservação da integridade das garantias processuais básicas reconhecidas às pessoas meramente acusadas de práticas delituosas tem representado, em tema de proteção aos direitos humanos, um dos tópicos mais sensíveis e delicados da agenda dos organismos internacionais, seja em âmbito regional, como o Pacto de São José da Costa Rica (Artigo 8º), aplicável ao sistema interamericano, seja em âmbito global, como o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Artigo 14), celebrado sob a égide da Organização das Nações Unidas, e que representam instrumentos que reconhecem, a qualquer réu, dentre outras liberdades eminentes, o direito à plenitude de defesa e às demais prerrogativas que derivam da cláusula concernente à garantia do devido processo.
Tendo em consideração as prerrogativas básicas que derivam da cláusula constitucional do “due process of law”, passo a examinar o pedido de medida cautelar ora formulado nesta sede processual.
E, ao fazê-lo, entendo que a magnitude do tema constitucional versado na presente impetração impõe que se conceda a presente medida cautelar, seja para impedir que se desrespeite uma garantia instituída pela Constituição da República em favor de qualquer réu, seja para evitar eventual declaração de nulidade do processo penal em referência, ora em curso perante a Justiça Federal da Seção Judiciária do Estado do Ceará (11ª Vara Federal).
A questão suscitada nesta causa concerne ao debate em torno da possibilidade jurídica de um dos litisconsortes penais passivos, invocando a garantia do “due process of law”, ver assegurado o seu direito de formular reperguntas aos co-réus, quando do respectivo interrogatório judicial.
Daí as razões que dão suporte à presente impetração deduzida em favor de réu que pretende ver respeitado, em procedimento penal contra ele instaurado, o direito à plenitude de defesa e ao tratamento paritário com o Ministério Público, em ordem a que se lhe garanta, por intermédio de seus Advogados, o direito “(...) de estar presente na audiência de colheita de provas contra si, oferecendo por meio de seu defensor a necessária contradita, bem como no direito de ser citado de forma a possibilitar o conhecimento não só da peça acusatória, mas também de todos os elementos incriminativos colhidos durante a fase inquisitiva (...)” (fls. 24).
Não foi por outro motivo que os ora impetrantes, para justificar sua pretensão, buscam, por este meio processual, que se permita a observância dos “(...) princípios constitucionais concernentes ao devido processo legal, cujo interesse de preservação é público e não está restrito às partes, mas representa antes de mais nada, o interesse estatal de que a função jurisdicional seja exercida dentro de um processo justo, imparcial, em que seja garantido paridade de forças entre os litigantes com a possibilidade ampla do acusado em defender-se no litígio, afinal é ele o maior interessado na colheita da prova” (fls. 24).
As razões ora expostas justificam – ao menos em juízo de estrita delibação – a plausibilidade jurídica da pretensão deduzida nesta sede processual, especialmente se se considerar o precedente que o Plenário desta Suprema Corte firmou no exame da matéria:

“(...) AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA (...). INTERROGATÓRIOS (...). PARTICIPAÇÃO DOS CO-RÉUS. CARÁTER FACULTATIVO. INTIMAÇÃO DOS DEFENSORES NO JUÍZO DEPRECADO.
.......................................................
É legítimo, em face do que dispõe o artigo 188 do CPP, que as defesas dos co-réus participem dos interrogatórios de outros réus.
Deve ser franqueada à defesa de cada réu a oportunidade de participação no interrogatório dos demais co-réus, evitando-se a coincidência de datas, mas a cada um cabe decidir sobre a conveniência de comparecer ou não à audiência (...).”
(AP 470-AgR/MG, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA - grifei)

Ninguém ignora a importância de que se reveste, em sede de persecução penal, o interrogatório judicial, cuja natureza jurídica permite qualificá-lo, notadamente após o advento da Lei nº 10.792/2003, como ato de defesa (ADA PELLEGRINI GRINOVER, “O interrogatório como meio de defesa (Lei 10.792/2003)”, “in” Revista Brasileira de Ciências Criminais nº 53/185-200; GUILHERME DE SOUZA NUCCI, “Código de Processo Penal Comentado”, p. 387, item n. 3, 6ª ed., 2007, RT; DAMÁSIO E. DE JESUS, “Código de Processo Penal Anotado”, p. 174, 21ª ed., 2004, Saraiva; DIRCEU A. D. CINTRA JR., “Código de Processo Penal e sua Interpretação Jurisdicional”, coordenação: ALBERTO SILVA FRANCO e RUI STOCO, p. 1.821, 2ª ed., 2004, RT; FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO, “Processo Penal”, vol. 3/269-273, item n. 1, 28ª ed., 2006, Saraiva, v.g.), ainda que passível de consideração, embora em plano secundário, como fonte de prova, em face dos elementos de informação que dele emergem.
Essa particular qualificação jurídica do interrogatório judicial, ainda que nele se veja um ato simultaneamente de defesa e de prova (JULIO FABBRINI MIRABETE, “Código de Processo Penal Interpretado”, p. 510, item n. 185.1, 11ª ed., 2007, Atlas, v.g.), justifica o reconhecimento de que se revela possível, no plano da persecutio criminis in judicio, “(...) que as defesas dos co-réus participem dos interrogatórios de outros réus (...)” (AP 470-AgR/MG, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, Pleno – grifei).
Esse entendimento que o Plenário do Supremo Tribunal Federal firmou no precedente referido reflete-se, por igual, no magistério da doutrina, como resulta claro da lição de EUGÊNIO PACELLI DE OLIVEIRA (“Curso de Processo Penal”, p. 29, item n. 3.1.4, 9ª ed., 2008, Lumen Juris):

“Embora ainda haja defensores da idéia de que a ampla defesa vem a ser apenas o outro lado ou a outra medida do contraditório, é bem de ver que semelhante argumentação peca até mesmo pela base.
É que, da perspectiva da teoria do processo, o contraditório não pode ir além da ‘garantia de participação’, isto é, a garantia de a parte poder impugnar - no processo penal, sobretudo a defesa - toda e qualquer alegação contrária a seu interesse, sem, todavia, maiores indagações acerca da concreta efetividade com que se exerce aludida impugnação.
E, exatamente por isso, não temos dúvidas em ver incluído, no princípio da ampla defesa, o direito à participação da defesa técnica - do advogado - de co-réu durante o interrogatório de ‘todos os acusados’. Isso porque, em tese, é perfeitamente possível a colisão de interesses entre os réus, o que, por si só, justificaria a participação do defensor daquele co-réu sobre quem recaiam acusações por parte de outro, por ocasião do interrogatório. A ampla defesa e o contraditório exigem, portanto, a participação dos defensores de co-réus no interrogatório de ‘todos os acusados’.” (grifei)

Esse mesmo entendimento, por sua vez, é perfilhado por ANTONIO SCARANCE FERNANDES (“Prova e sucedâneos da prova no processo penal”, “in” Revista Brasileira de Ciências Criminais nº 66, p. 224, item n. 12.2):

“(...) Ressalta-se que, em virtude de recente reforma do Código, o advogado do co-réu tem direito a participar do interrogatório e formular perguntas.” (grifei)

Igual percepção do tema é revelada por AURY LOPES JR (“Direito Processual e sua Conformidade Constitucional”, vol. I/603-605, item n. 2.3, 2007, Lumen Juris):

“No que tange à disciplina processual do ato, cumpre destacar que - havendo dois ou mais réus - deverão eles ser interrogados separadamente, como exige o art. 191 do CPP. Aqui existe uma questão muito relevante e que não tem obtido o devido tratamento por parte de alguns juízes, até pela dificuldade de compreensão do alcance do contraditório inserido nesse ato, por força da Lei nº 10.792/2003, que alterou os arts. 185 a 196 do CPP.
Até essa modificação legislativa, o interrogatório era um ato pessoal do juiz, não submetido ao contraditório, pois não havia qualquer intervenção da defesa ou acusação.
Agora a situação é radicalmente distinta. Tanto a defesa como a acusação podem formular perguntas ao final. Isso é manifestação do contraditório.
Nessa linha, discute-se a possibilidade de a defesa do co-réu fazer perguntas no interrogatório. Pensamos que, principalmente se as teses defensivas forem colidentes, deve o juiz permitir o contraditório pleno, com o defensor do outro co-réu (também) formulando perguntas ao final. Ou seja, deve o juiz admitir que o defensor do interrogando formule suas perguntas ao final, mas também deve permitir que o advogado do(s) outro(s) co-réu(s) o faça. Contribui para essa exigência o fato de que à palavra do co-réu é dado, pela maioria da jurisprudência, o valor probatório similar ao de prova testemunhal.” (grifei)

Observo, finalmente, que essa orientação vem de ser reafirmada em recentíssimo julgamento emanado da colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, que, ao decidir o HC 94.016/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, reiterou o entendimento de que cada litisconsorte penal passivo tem o direito, fundado em cláusulas constitucionais (CF, art. 5º, incisos LIV e LV), de formular reperguntas aos demais co-réus, que, no entanto, não estão obrigados a respondê-las, em face da prerrogativa contra a auto-incriminação, de que também são titulares.
As razões que venho de expor, como ora salientado nesta decisão, convencem-me da absoluta plausibilidade jurídica de que se acha impregnada a pretensão deduzida pelos ilustres impetrantes, notadamente porque referida postulação tem integral suporte em precedentes firmados por esta Suprema Corte (AP 470-AgR/MG, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA – HC 94.016/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO).
Concorre, por igual, o requisito concernente ao “periculum in mora”, que foi adequadamente demonstrado na presente impetração (fls. 27/28).
Sendo assim, em face das razões expostas, defiro o pedido de medida liminar, em ordem a suspender, cautelarmente, até final julgamento da presente ação de “habeas corpus”, o andamento do Processo-crime nº 2006.81.00.009709-1, ora em tramitação perante a 11ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Ceará.
Comunique-se, com urgência, encaminhando-se cópia da presente decisão ao E. Superior Tribunal de Justiça (HC 93.125/CE), ao E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região (HC nº 2007.05.00.057218-1) e ao Senhor Juiz da 11ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Ceará (Processo nº 2006.81.00.009709-1).
2. Ouça-se a douta Procuradoria-Geral da República.

Publique-se.

Brasília, 24 de outubro de 2008.

Ministro CELSO DE MELLO
Relator

* decisão publicada no DJE de 31.10.2008

INOVAÇÕES LEGISLATIVAS
27 a 31 de outubro de 2008

ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO (AGU) - Súmula - Servidor Público - Poder Judiciário - Ministério Público da União (MPU) - Vencimentos - Unidade Real de Valor (URV)
Súmula nº 42/AGU, de 30 de outubro de 2008 - A Súmula nº 20, da Advocacia-Geral da União, passa a vigorar com a seguinte redação: Os servidores administrativos do Poder Judiciário e do Ministério Público da União têm direito ao percentual de 11,98%, relativo à conversão de seus vencimentos em URV, por se tratar de simples recomposição estipendiária, que deixou de ser aplicada na interpretação das Medidas Provisórias nºs 434/94, 457/94 e 482/94. Publicado no DOU de 31/10/2008, Seção 1, p.1.

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR (CDC) - Publicidade - Serviço de Telefonia - Linha Telefônica
Lei nº 11.800, de 29 de outubro de 2008 - Acrescenta parágrafo único ao art. 33 da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 - Código de Defesa do Consumidor, para impedir que os fornecedores veiculem publicidade ao consumidor que aguarda na linha telefônica, o atendimento de suas solicitações. Publicado no DOU de 30/10/2008, Seção 1, p.2.

CONSELHO DA JUSTIÇA FEDERAL (CJF) - Composição - Competência
Lei nº 11.798, de 29 de outubro de 2008 - Dispõe sobre a composição e a competência do Conselho da Justiça Federal, revoga a Lei nº 8.472, de 14 de outubro de 1992, e dá outras providências. Publicado no DOU de 30/10/2008, Seção 1, p.1.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF) - Súmula Vinculante - Proposta de Súmula Vinculante (PSV) - Edição - Revisão - Cancelamento
Resolução nº 381/STF, de 29 de outubro de 2008 - Estabelece procedimentos para a edição, a revisão e o cancelamento de súmulas vinculantes. Publicado no DJE de 31/10/2008, n. 206, p.6.

RESOLUÇÃO Nº 381, DE 29 DE OUTUBRO DE 2008

Estabelece procedimentos para a edição, a revisão e o cancelamento de súmulas vinculantes.

O PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, no uso da competência prevista no art. 363, I, do Regimento Interno e considerando o disposto no Processo Administrativo nº 333.431/2008.
Considerando o disposto no art. 103-A da Constituição Federal e na Lei nº 11.417, de 19 de dezembro de 2006, que instituíram e regulamentaram a súmula vinculante;
Considerando a importância de estabelecer mecanismo célere e eficaz para a tramitação dos pedidos de edição, revisão ou cancelamento de súmula vinculante, no âmbito do Tribunal;
Considerando os procedimentos já adotados e reconhecidos como válidos, pelo Plenário do STF, para a edição, a revisão ou o cancelamento de súmulas vinculantes; e
Considerando o teor da proposta encaminhada pela Comissão de Jurisprudência para regulamentação do procedimento;

R E S O L V E:
Art. 1º Fica instituída nova classe processual, denominada Proposta de Súmula Vinculante, que corresponderá à sigla PSV, para o processamento de proposta de edição, revisão ou cancelamento de súmula vinculante, nos termos do art. 103-A da Constituição Federal e da Lei nº 11.417, de 2006.
Art. 2º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

Ministro GILMAR MENDES




Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos
informativo@stf.gov.br

 
Praça dos Três Poderes - Brasília - DF - CEP 70175-900 Telefone: 61.3217.3000

Informativo STF - 526 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário