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terça-feira, 25 de novembro de 2008

Informativo STF 522 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Informativo STF


Brasília, 29 de setembro a 3 de outubro de 2008 - Nº 522.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO

Plenário
Tutela Antecipada contra a Fazenda Pública - 2
ICMS e Transporte Rodoviário de Passageiros - 2
ICMS e Transporte Rodoviário de Passageiros - 3
Magistrado: Atuação em Inquérito e Ausência de Impedimento para a Ação Penal - 1
Magistrado: Atuação em Inquérito e Ausência de Impedimento para a Ação Penal - 2
Magistrado: Atuação em Inquérito e Ausência de Impedimento para a Ação Penal - 3
Repercussão Geral
Dissolução do Casamento no Curso de Mandato e Inelegibilidade de Ex-Cônjuge
Princípio da Não-Cumulatividade: IPI e Produtos Isentos ou Tributados à Alíquota Zero - 1
Princípio da Não-Cumulatividade: IPI e Produtos Isentos ou Tributados à Alíquota Zero - 2
Princípio da Não-Cumulatividade: IPI e Produtos Isentos ou Tributados à Alíquota Zero - 3
Princípio da Não-Cumulatividade: IPI e Produtos Isentos ou Tributados à Alíquota Zero - 4
Princípio da Não-Cumulatividade: IPI e Produtos Isentos ou Tributados à Alíquota Zero - 5
Princípio da Não-Cumulatividade: IPI e Produtos Isentos ou Tributados à Alíquota Zero - 6
Depósito Prévio e Recurso Administrativo
1ª Turma
Art. 1º, Parágrafo Único, da Lei 8.666/93 e Petrobrás - 1
Art. 1º, Parágrafo Único, da Lei 8.666/93 e Petrobrás - 2
Art. 1º, Parágrafo Único, da Lei 8.666/93 e Petrobrás - 3
2ª Turma
Tráfico de Drogas: Liberdade Provisória e Excepcionalidade
Cerceamento de Defesa e Irregularidades na Instrução - 2
Conexão: Competência Relativa e Princípio do Juiz Natural - 1
Conexão: Competência Relativa e Princípio do Juiz Natural - 2
Precatório Adquirido por Terceiro e Compensação de Crédito Tributário
Transcrições
Tráfico de Drogas: Liberdade Provisória e Excepcionalidade (HC 94916/RS)
Inovações Legislativas


PLENÁRIO


Tutela Antecipada contra a Fazenda Pública - 2

Em conclusão, o Tribunal, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação declaratória de constitucionalidade, proposta pelo Presidente da República e pelas Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, para declarar a constitucionalidade do art. 1º da Lei 9.494/97 ("Aplica-se à tutela antecipada prevista nos arts. 273 e 461 do Código de Processo Civil o disposto nos arts. 5º e seu parágrafo único e 7º da Lei 4.348, de 26 de junho de 1964, no art. 1º e seu § 4º da Lei 5.021, de 9 de junho de 1966, e nos arts. 1º, 3º e 4º da Lei 8.437, de 30 de junho de 1992.") - v. Informativo 167. Entendeu-se, tendo em vista a jurisprudência do STF no sentido da admissibilidade de leis restritivas ao poder geral de cautela do juiz, desde que fundadas no critério da razoabilidade, que a referida norma não viola o princípio do livre acesso ao Judiciário (CF, art. 5º, XXXV). O Min. Menezes Direito, acompanhando o relator, acrescentou aos seus fundamentos que a tutela antecipada é criação legal, que poderia ter vindo ao mundo jurídico com mais exigências do que veio, ou até mesmo poderia ser revogada pelo legislador ordinário. Asseverou que seria uma contradição afirmar que o instituto criado pela lei oriunda do poder legislativo competente não pudesse ser revogada, substituída ou modificada, haja vista que isto estaria na raiz das sociedades democráticas, não sendo admissível trocar as competências distribuídas pela CF. Considerou que o Supremo tem o dever maior de interpretar a Constituição, cabendo-lhe dizer se uma lei votada pelo Parlamento está ou não em conformidade com o texto magno, sendo imperativo que, para isso, encontre a viabilidade constitucional de assim proceder. Concluiu que, no caso, o fato de o Congresso Nacional votar lei, impondo condições para o deferimento da tutela antecipada, instituto processual nascido do processo legislativo, não cria qualquer limitação ao direito do magistrado enquanto manifestação do poder do Estado, presente que as limitações guardam consonância com o sistema positivo. Frisou que os limites para concessão de antecipação da tutela criados pela lei sob exame não discrepam da disciplina positiva que impõe o duplo grau obrigatório de jurisdição nas sentenças contra a União, os Estados e os Municípios, bem assim as respectivas autarquias e fundações de direito público, alcançando até mesmo os embargos do devedor julgados procedentes, no todo ou em parte, contra a Fazenda Pública, não se podendo dizer que tal regra seja inconstitucional. Os Ministros Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Ellen Gracie e Gilmar Mendes incorporaram aos seus votos os adendos do Min. Menezes Direito. Vencido o Min. Marco Aurélio, que, reputando ausente o requisito de urgência na medida provisória da qual originou a Lei 9.494/97, julgava o pedido improcedente, e declarava a inconstitucionalidade formal do dispositivo mencionado, por julgar que o vício na medida provisória contaminaria a lei de conversão.
ADC 4/DF, rel. orig. Min. Sydney Sanches, rel. p/ o acórdão Min. Celso de Mello, 1º.10.2008. (ADC-4)

ICMS e Transporte Rodoviário de Passageiros - 2

O Tribunal retomou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Confederação Nacional do Transporte - CNT contra os artigos 4º; 11, II, a e c; 12, V e XIII, da Lei Complementar 87/96 (Lei Kandir), que, ao dispor sobre o imposto dos Estados e do Distrito Federal sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, elenca os contribuintes do ICMS, estabelece o local da operação ou da prestação de serviço de transporte, para os efeitos da cobrança do imposto e definição do estabelecimento responsável, bem como fixa o momento de ocorrência da hipótese de incidência do tributo - v. Informativo 415. Pleiteia a requerente, em suma, a extensão da orientação firmada no julgamento da ADI 1600/DF (DJU de 20.6.2003), sobre transporte aéreo de passageiros, para evitar a incidência de ICMS também sobre o transporte terrestre. O Min. Gilmar Mendes, em voto-vista, acompanhou o voto do Min. Nelson Jobim, relator, no sentido de julgar procedente o pedido formulado, para declarar a inconstitucionalidade da instituição do ICMS sobre a prestação de serviços de transporte terrestre de passageiros, por entender, na linha do que decidido no julgamento da ADI 1600/DF, que a norma impugnada apresenta insuficiência de identificação dos elementos fundamentais da relação tributária, o que impede a aplicação dos princípios constitucionais relativos ao ICMS.
ADI 2669/DF, rel. Min. Nelson Jobim, 1º.10.2008. (ADI-2669)

ICMS e Transporte Rodoviário de Passageiros - 3

O Min. Gilmar Mendes ainda acompanhou o relator quanto à modulação dos efeitos, ressalvando apenas a aplicação da eficácia ex tunc aos casos concretos sub judice em período anterior à conclusão do julgamento da presente ADI. No ponto, tendo em conta que há vários anos os Estados-membros têm exigido ICMS sobre transporte terrestre de passageiros, mesmo antes da edição da LC 87/96, e que, em mais de uma oportunidade, o Tribunal sinalizou a inconstitucionalidade da instituição do ICMS enquanto insuficientes as indispensáveis regras para prevenção de controvérsias entre os Estados federados, asseverou ser preciso, a um só tempo, em homenagem ao princípio da segurança jurídica, resguardar as situações consolidadas e garantir aos contribuintes que não se quedaram inertes, mas se insurgiram contra a imposição fiscal inadequada, a viabilidade de suas pretensões. Em divergência, o Min. Marco Aurélio julgou improcedente o pleito. Considerou que a situação ligada ao transporte aéreo, examinada no julgamento da ADI 1600/DF, foi excepcionalíssima, presente a quadra vivenciada pelas empresas de transporte, mas que não há, no caso, uma justificativa socialmente aceitável para fulminar-se o tributo em questão, desaguando essa postura no afastamento da incidência de qualquer tributo, porque, por força da Constituição, não incide, nos termos do seu art. 156, III, o ISS, que é da competência dos Municípios. Após, pediu vista dos autos o Min. Joaquim Barbosa.
ADI 2669/DF, rel. Min. Nelson Jobim, 1º.10.2008. (ADI-2669)

Magistrado: Atuação em Inquérito e Ausência de Impedimento para a Ação Penal - 1

O Tribunal indeferiu habeas corpus em que se pretendia fosse declarada a nulidade de decisão da Corte Especial do STJ que recebera denúncia, porque o mesmo Ministro que presidira o inquérito tornara-se, posteriormente, prevento para atuar como relator da ação penal. Alegava-se, na espécie, em síntese: a) ofensa aos princípios da impessoalidade dos atos de Administração da Justiça e da imparcialidade do magistrado; b) impossibilidade de ser fixada a competência pela prevenção quando o juiz tivesse atuado anteriormente no inquérito; c) vedação de tal prática pelo art. 8º do Pacto de San José da Costa Rica, que assegura, no âmbito criminal, a imparcialidade do julgador; d) inadmissibilidade, nos termos do art. 252 do CPP, da participação de juiz em processo no qual se manifestou anteriormente; e) inconstitucionalidade do art. 75 do CPP e seus reflexos nos regimentos internos do STJ e do STF por violação aos princípios do devido processo legal e da imparcialidade do magistrado. Inicialmente, o Tribunal rejeitou preliminar suscitada pelo Ministério Público - no sentido de ser inviável debater-se, no âmbito do habeas corpus, o impedimento ou a suspeição de magistrado por envolver análise aprofundada de elementos fático-probatórios -, haja vista não se estar, a rigor, discutindo impedimento ou suspeição do Ministro do STJ, mas uma tese de direito, constitucional. No ponto, o Min. Marco Aurélio, sustentando a envergadura maior do habeas corpus, asseverou ser suficiente que se tenha, na via direta ou indireta, o envolvimento da liberdade de ir e vir e a assertiva sobre a prática de um ato ilícito à margem da ordem jurídica, para concluir-se pela adequação do writ, e que, portanto, se no curso de uma ação penal, surge um questionamento sobre suspeição ou impedimento do relator, esse questionamento pode desafiar o habeas corpus.
HC 92893/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2.10.2008. (HC-92893)

Magistrado: Atuação em Inquérito e Ausência de Impedimento para a Ação Penal - 2

No mérito, afastaram-se todos os argumentos do impetrante. Ao salientar que as hipóteses de impedimento elencadas no art. 252 do CPP constituem um rol taxativo, considerou-se não ser possível interpretar extensivamente os incisos I e II desse artigo para entender que um juiz que atuou na fase pré-processual haja desempenhado função equivalente a de delegado de polícia ou membro do Ministério Público. Em seguida, afirmou-se que, no Brasil, não foi adotada a sistemática do juizado de instrução, na qual o magistrado exerce, simultaneamente, as funções próprias da autoridade policial e do parquet no que respeita à coleta das provas. Esclareceu-se que, no modelo acusatório aplicado em nosso ordenamento processual penal, caracterizado pela publicidade, pelo contraditório, pela igualdade entre as partes e pela neutralidade do juiz, quando o magistrado preside o inquérito, apenas atua como um administrador, um supervisor, um coordenador, no que tange à montagem do acervo probatório e às providências acautelatórias, agindo sempre por provocação, e nunca de ofício. Portanto, não exterioriza nenhum juízo de valor sobre os fatos ou as questões de direito, emergentes nessa fase preliminar, que o impeça de proceder com imparcialidade no curso da ação penal. Assim, o Judiciário, em nosso sistema processual penal, atua no inquérito para assegurar a observância dos direitos e liberdades fundamentais e dos princípios sobre os quais se assenta o Estado Democrático de Direito.
HC 92893/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2.10.2008. (HC-92893)

Magistrado: Atuação em Inquérito e Ausência de Impedimento para a Ação Penal - 3
Ressaltou-se, também, que, no caso dos processos penais originários, que tramitam no STJ e no STF, regulados pela Lei 8.038/90, o relator escolhido, na forma regimental, terá as atribuições que a legislação processual confere aos juízes singulares, dentre as quais a de presidir o andamento do inquérito (art. 2º), e que, finda a instrução, o tribunal procederá ao julgamento, na forma determinada pelo regimento interno (art. 12, II). Ou seja, ainda que determinado relator seja escolhido, nos termos regimentais, para presidir à instrução, o julgamento é feito pelo órgão colegiado do tribunal prescrito pela Constituição para julgar a autoridade com prerrogativa de foro. Em razão disso, repeliu-se a afirmação de que seria inconstitucional o parágrafo único do art. 75 do CPP, que estabelece a prevenção do magistrado que houver determinado qualquer diligência anterior à denúncia ou à queixa para o julgamento da ação penal. Por fim, aduziu-se que eventuais incompatibilidades ou impedimento do Ministro relator do feito devem ser argüidos mediante o procedimento previsto no art. 112 do CPP, de espectro mais amplo quanto à apreciação de fatos e provas. Precedentes citados: HC 86579/ES (DJU de 31.8.2007); HC 68784/SP (DJU de 26.3.93); HC 73099/SP (DJU de 13.10.95); HC 67997/DF (DJU de 20.9.90); ADI 1517 MC/DF (DJU de 22.11.2002).
HC 92893/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2.10.2008. (HC-92893)


REPERCUSSÃO GERAL

Dissolução do Casamento no Curso de Mandato e Inelegibilidade de Ex-Cônjuge

A dissolução da sociedade conjugal, durante o exercício do mandato, não afasta a regra da inelegibilidade, prevista no art. 14, § 7º, da CF ("São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição."). Com base nesse entendimento, o Tribunal, por maioria, desproveu recurso extraordinário interposto contra acórdão do TSE e cassou liminar, que suspendera os efeitos do recurso extraordinário, deferida em favor de ex-cônjuge de prefeito (eleito no período de 1997 a 2000, e reeleito no período de 2001 a 2004), que fora eleita vereadora, em 2004, para o período de 2005 a 2008. Na espécie, a separação de fato da vereadora, ora recorrida, ocorrera em 2000, a judicial em 2001, tendo o divórcio se dado em 2003, antes do registro de sua candidatura. Asseverou-se, na linha de precedentes da Corte, que o vínculo de parentesco persiste para fins de inelegibilidade até o fim do mandato, inviabilizando a candidatura do ex-cônjuge ao pleito subseqüente, na mesma circunscrição, a não ser que o titular se afaste do cargo seis meses antes da eleição. Aduziu-se que, apesar de o aludido dispositivo constitucional se referir à inelegibilidade de cônjuges, a restrição nele contida se estende aos ex-cônjuges, haja vista a própria teleologia do preceito, qual seja, a de impedir a eternização de determinada família ou clã no poder, e a habitualidade da prática de separações fraudulentas com o objetivo de contornar essa vedação. Citou-se, ainda, a resposta à consulta formulada ao TSE, da qual resultou a Resolução 21.775/2004, nesse sentido. Vencido o Min. Marco Aurélio, que, salientando que o parentesco civil é afastado com a dissolução do casamento, provia o recurso, por considerar que o vício na manifestação da vontade não se presume, devendo ser provado caso a caso, e que as normas que implicam cerceio à cidadania têm de receber interpretação estrita. Por fim, o Tribunal determinou o imediato cumprimento da presente decisão, ficando vencido, neste ponto, o Min. Marco Aurélio, que averbava a necessidade da tramitação natural do processo, aguardando-se a confecção do acórdão e a possível interposição de embargos declaratórios. Precedentes citados: RE 433460/PR (DJU de 19.10.2006); RE 446999/PE (DJU de 9.9.2005).
RE 568596/MG, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1º.10.2008. (RE-568596)

Princípio da Não-Cumulatividade: IPI e Produtos Isentos ou Tributados à Alíquota Zero - 1

O Tribunal iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto pela União contra acórdão do TRF da 4ª Região que reconheceu a possibilidade de manutenção de créditos decorrentes da aquisição de insumos e matérias primas tributados, empregados no fabrico de produtos cuja saída é isenta ou tem alíquota zero. Inicialmente, o relator registrou ser diversa da dos presentes autos a matéria examinada no RE 353657/PR (DJE de 7.3.2008) e no RE 370682/SC (DJE de 19.12.2007), nos quais se tratava da existência de crédito presumido, decorrente da aquisição de produtos não tributados ou sujeitos à alíquota zero, com subseqüente venda de produto tributado. Asseverou cuidar-se, aqui, da questão da desoneração de IPI na saída e dos seus efeitos sobre a manutenção dos créditos, reais e não fictos, obtidos nas aquisições tributadas. Em seguida, reputou ser imprescindível assentar que o nascimento do crédito na entrada não está sujeito à realização do fato gerador tributado na saída, isto a significar que o direito ao crédito pelos insumos entrados no estabelecimento industrial não se subordina nem vincula a saída tributada, tendo o contribuinte direito ao crédito por força da só aquisição de insumos tributados, não obstante precise, para dele fruir, da realização de operação integrante da classe típica de incidência do IPI, conquanto não necessariamente tributada pelo IPI. Assim, afirmou ser suficiente que a empresa, cujas saídas sejam exoneradas, realize operações com produtos industrializados (CF, art. 153, IV), para que lhe seja assegurado o creditamento relativo às aquisições, pouco se dando a modalidade do tratamento normativo-tributário reservado às vendas, isto é, tributação, não-tributação, alíquota zero ou isenção.
RE 475551/PR, rel. Min. Cezar Peluso, 1º.10.2008. (RE-475551)

Princípio da Não-Cumulatividade: IPI e Produtos Isentos ou Tributados à Alíquota Zero - 2

O relator considerou que a própria concepção dogmática do instituto da não-cumulatividade torna claro que, ocorrido o pagamento de tributo na entrada dos insumos e de material similar, não há lugar para dúvida acerca do nascimento dos créditos oriundos dessa operação ou operações, pois apenas a compensação total dos impostos pagos na aquisição de insumos, produtos intermediários, viabiliza a não-cumulação, a competitividade nos preços e a desoneração total do produtor ou comerciante. Esclareceu que, se a empresa comprou matéria-prima, com incidência do IPI, industrializou o produto final, mas não o vendeu, ou vendeu apenas parte da produção, disso não resulta que perde o crédito adquirido em razão da compra, nem que o perde se vende produtos industrializados desonerados. Ressaltou que não se lhe pode negar, em nenhum caso, direito, de raiz constitucional, ao crédito, que será compensado, na forma da legislação vigente. No ponto, afirmou que lei futura pode até admitir negociação e venda dos créditos a terceiros, mas a lei não tem competência para, à margem da norma constitucional, vedar a própria formação de créditos ou deixar de prever alguma forma para sua fruição. Para o relator apenas uma limitação é concebível ao propósito, qual seja, a empresa não pode utilizar o crédito, de cujo direito já se tornou titular, até que promova saída da produção, realizando operação característica do regime de IPI, quando uma de duas situações pode configurar-se: (a) empregará o crédito que acumulou para abater do imposto devido na saída, o que se dá ordinariamente, porque a tributação na saída é a regra; ou (b) havendo desoneração na saída, como no caso, poderá compensá-lo com outros tributos, cedê-los a terceiros, ou utilizá-los de outra maneira, consentânea com o princípio da não-cumulatividade. Assim, em nenhuma hipótese, pode a empresa ser condenada a acumulá-los inútil e indefinidamente, ser compelida a abdicar os créditos, ou suportar-lhes anulação prática, já que nasceram de imposição constitucional. Dessa forma, a despeito da distinção conceitual e técnica entre geração de créditos, no primeiro momento da aquisição de insumos tributados, e sua fruição em momento ulterior, substanciada, via de regra, no abatimento do valor de tributos por recolher, a desoneração da saída não se propõe nunca como óbice ao total aproveitamento dos créditos adquiridos pelo contribuinte.
RE 475551/PR, rel. Min. Cezar Peluso, 1º.10.2008. (RE-475551)

Princípio da Não-Cumulatividade: IPI e Produtos Isentos ou Tributados à Alíquota Zero - 3

Enfatizou, ademais, que, ainda que a Lei 9.799/99 não tivesse permitido o aproveitamento do crédito acumulado, mediante compensação, isso não repercutiria sobre o momento anterior, o da geração dos créditos, nem retiraria o ônus do legislador de prever meios para a fruição dos valores correlatos. Aduziu que o que importa é só que se dê operação típica de IPI, sendo suficiente à fruição dos créditos que a empresa realize a operação com o produto industrializado, e que esse é o cerne da norma que autoriza a instituição do imposto (CF, art. 153, IV), independentemente do tratamento tributário que a lei reserve à saída, haja vista que a não-cumulatividade exige a possibilidade de manutenção dos créditos tributários, decorrentes da aquisição de matérias-primas, produtos intermediários e materiais de embalagem, independentemente da forma de tributação a incidir no resultado do processo produtivo. Expôs, em seqüência, as razões pelas quais entende que nenhuma espécie desonerativa pode implicar anulação dos créditos oriundos de entradas tributadas. Disse que, na saída com isenção ou alíquota zero, é manifesta a ocorrência de operação típica de IPI. Em ambas, ocorre a venda de produto industrializado, mas, por técnicas diferentes, não há imposto por pagar, sendo evidente que, em relação à não-cumulatividade, tanto a isenção quanto a alíquota zero produzem o mesmo efeito jurídico e prático, não se justificando, pois, a idéia de tratamentos diferenciados. Ademais, a supressão de algum aspecto da regra-matriz da incidência ou a nulificação do elemento quantitativo não subtraem a operação concreta à categoria das ações em tese submissas à incidência do IPI. Asseverou que se dá o mesmo em quase todas as hipóteses de não-tributação, que se manifesta de maneiras distintas.
RE 475551/PR, rel. Min. Cezar Peluso, 1º.10.2008. (RE-475551)

Princípio da Não-Cumulatividade: IPI e Produtos Isentos ou Tributados à Alíquota Zero - 4

Reportou-se aos fundamentos que expendeu no julgamento do RE 353657/PR, no sentido de que, em relação aos produtos não tributados, embora o resultado prático seja o mesmo, isto é, o não pagamento do tributo, é preciso identificar e distinguir três situações teóricas possíveis: i) produtos não tributados por ausência de competência tributária (imunidade ou ausência de competência por exclusão lógico-residual da norma atributiva); ii) produtos não tributados por não estarem incluídos na lei que fixa o âmbito de incidência, mas estarem incluídos no da competência; iii) produtos não tributados por expressa disposição legal (dentro do âmbito de competência e dentro do âmbito de incidência). Estas duas últimas situações equiparam-se às da isenção e da alíquota zero por subtraírem à regra-matriz de incidência determinado aspecto, no caso, o material (o fato gerador), podendo ser adotadas pelo Poder Legislativo como instrumento de política fiscal. Por estarem no âmbito de competência do tributo, permitem a incidência da norma da não-cumulatividade e autorizam o contribuinte a creditar-se do valor relativo à aquisição de produto, atendendo à finalidade inerente à mesma norma. Já em relação à primeira situação, a regra da não-cumulatividade não enseja direito a crédito, porque alheio ao ciclo econômico tomado como pressuposto de fato do imposto (não se trata de produto industrializado). Tendo isso em conta, e aprofundando tais afirmações, concluiu que o verdadeiro fator desencadeante da regra da não-cumulatividade não é a competência stricto sensu, mas a existência do pressuposto de fato legitimador da competência para instituição do IPI e que é a existência de um produto industrializado (CF, art. 153, IV).
RE 475551/PR, rel. Min. Cezar Peluso, 1º.10.2008. (RE-475551)

Princípio da Não-Cumulatividade: IPI e Produtos Isentos ou Tributados à Alíquota Zero - 5

Prosseguindo, o relator reconheceu, daí, haver grande diferença entre imunidade e falta de competência por exclusão lógico-residual. No primeiro caso, afirmou ser induvidosa ocorrência do pressuposto de fato, devendo-se cindir a categoria "i", em duas classes distintas: (i.a) nas situações imunes, a operação com produto industrializado ocorre, a despeito da norma de incompetência veiculada pela imunidade. Opção constitucional expressa, a norma imunizante que prevê a não-tributação tem por finalidade o estabelecimento de benefício fiscal que seria frustrado se fora negado direito ao creditamento. Somente na segunda hipótese (i.b), de exclusão lógico-residual, em que não se cuida de operação com produto industrializado, é que quadra cogitar de fato alheio ao ciclo econômico tomado como pressuposto de fato do imposto (pois não se trata de produto industrializado). Não há direito a crédito, porque se trata de bem (mercadoria ou produto) que não pertence ao universo factual pressuposto à disciplina do IPI. Assim, embora retire a competência para instituição de IPI sobre certa situação ou posição jurídica, a imunidade não elide a existência do pressuposto de fato do tributo, cuja presença invoca a não-cumulatividade. Essa situação, aliada a uma interpretação teleológica e sistemática, permite discernir as duas espécies de não-tributação por incompetência: uma, de imunidade, autoriza a manutenção dos créditos pelas entradas, que só podem ser anulados na outra, e exclusiva, hipótese de falta de competência por exclusão lógico-residual, ou seja, nos casos em que se não realizem operações com produtos industrializados. Por isso, deve-se garantir sempre o aproveitamento de créditos na isenção, na não-incidência, na alíquota zero e, também, na não-tributação, salvo nos casos restritos que não envolvam produtos industrializados, porque seu estorno, anulação ou não-aproveitamento tornariam o imposto cumulativo.
RE 475551/PR, rel. Min. Cezar Peluso, 1º.10.2008. (RE-475551)

Princípio da Não-Cumulatividade: IPI e Produtos Isentos ou Tributados à Alíquota Zero - 6

Por fim, o Min. Cezar Peluso realçou que geração e utilização de créditos derivam, pois, diretamente da Constituição, que agasalha, no ponto, norma de eficácia plena e incidência imediata, a todos oponível, não sendo possível interpretá-la à luz de normas subalternas. Daí, a geração de créditos não pode ser impedida por norma infraconstitucional, nem pode seu aproveitamento ser obviado, tendo em conta a própria natureza da não-cumulatividade. Em suma, entendeu o relator que acertou o acórdão recorrido, ao reconhecer, embora sob fundamento de natureza diversa, o direito de o contribuinte manter créditos decorrentes da aquisição de inputs tributados, ainda na hipótese em que se dedique à fabricação de produtos desonerados (isentos, sujeitos a alíquota zero ou não-tributados), pelas seguintes razões: (a) a natureza exclusivamente constitucional e ilimitada do princípio da não-cumulatividade do IPI; (b) a existência de efetiva incidência de tributo na aquisição de insumos (onerados); (c) a autonomia entre os momentos de geração do crédito e de seu aproveitamento; (d) a ocorrência de operação de saída inserta no âmbito daquelas típicas do IPI e reveladora do pressuposto de fato da competência (venda de produto industrializado); (e) a insignificância jurídico-constitucional, para fins de creditamento, da disciplina tributária da saída dos produtos industrializados (imunidade, não-tributação, isenção, alíquota zero, não-incidência); (f) a possibilidade de aproveitamento de créditos, na forma prevista em lei (compensação com outros tributos, ou meios diversos de fruição que venham a ser estabelecidos); e (g) a inviabilidade jurídica de, sob qualquer pretexto, anular ou estornar créditos, ou permitir-lhes acumulação indefinida, em razão da desoneração das saídas. Após, pediu vista dos autos o Min. Menezes Direito.
RE 475551/PR, rel. Min. Cezar Peluso, 1º.10.2008. (RE-475551)

Depósito Prévio e Recurso Administrativo

O Tribunal, ao dar provimento a agravo de instrumento, convertendo-o em recurso extraordinário (CPC, art. 544, §§ 3º e 4º), resolveu questão de ordem no sentido de reconhecer a existência de repercussão geral da matéria discutida no apelo extremo - exigência de depósito prévio como requisito de admissibilidade de recurso administrativo - e ratificar o entendimento firmado na Corte sobre o tema, a fim de que sejam observadas as disposições do art. 543-B do CPC. Asseverou-se que a questão constitucional já foi apreciada pelo Tribunal no julgamento do RE 388359/PE (DJU de 22.6.2007), do RE 389383/SP e do RE 390513/SP (DJU de 29.6.2007), tendo sido consignado em suas ementas que a garantia constitucional da ampla defesa afasta a exigência do depósito como pressuposto de admissibilidade de recurso administrativo.
AI 698626/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 2.10.2008. (AI-698626)


PRIMEIRA TURMA

Art. 1º, Parágrafo Único, da Lei 8.666/93 e Petrobrás - 1

A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário, interposto com fundamento no art. 102, III, a e b, da CF, em que se discute a aplicação, ou não, à Petrobrás, do disposto no art. 1º, parágrafo único, da Lei 8.666/93 ("Art. 1o Esta Lei estabelece normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Parágrafo único. Subordinam-se ao regime desta Lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios."). Na espécie, o tribunal local reformara sentença concessiva de indenização em favor das empresas recorrentes e assentara, por seu Órgão Especial, a não incidência do aludido dispositivo legal à Petrobrás, ao fundamento de que, por se tratar de sociedade de economia mista, seu regime jurídico seria de natureza privada. As recorrentes sustentam violação ao art. 37, XXI, da CF, ao argumento de que seria nulo o ato da Petrobrás que cancelara contrato com elas firmado e submetera a outra empresa os serviços de afretamento de navios, sem observância à regra constitucional que exige licitação. Inicialmente, a Turma, por maioria, rejeitou questão de ordem suscitada pelo Min. Marco Aurélio no sentido de se submeter ao Plenário a apreciação do presente recurso. Entendeu-se que, não obstante tenha sido argüido, na origem, incidente de inconstitucionalidade, aquela Corte limitara-se a assentar o não cabimento do art. 1º, parágrafo único, da Lei de Licitações, às sociedades de economia mista. Assim, concluiu-se que não haveria, no caso, matéria a envolver declaração de constitucionalidade, ou não, do mencionado dispositivo, o que permitiria o julgamento no âmbito da própria Turma. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto que, ressaltando estar-se diante de extraordinário apresentado também com base na alínea b ("III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida: ... b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal;"), asseveravam competir ao Plenário o exame da causa, uma vez que o afastamento, pelo Órgão Especial, do artigo questionado pressuporia a pecha de inconstitucionalidade.
RE 441280/RS, rel. Min. Menezes Direito, 30.9.2008. (RE-441280)

Art. 1º, Parágrafo Único, da Lei 8.666/93 e Petrobrás - 2

No mérito, o Min. Menezes Direito, relator, negou provimento ao recurso, no que foi acompanhado pelo Min. Ricardo Lewandowski. Salientou que, ao tempo dos fatos, vigorava o art. 173 da CF, na sua redação original, o qual estabelecia que empresa pública, sociedade de economia mista e outras entidades que explorassem atividade econômica, sujeitar-se-iam ao regime jurídico próprio das empresas privadas. Contudo, com o advento da EC 19/98, esse preceito ganhou nova redação para determinar que a lei estabeleceria o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorassem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, elencando a disciplina que deveria constar desse estatuto jurídico. Dessa forma, esclareceu que o constituinte visou, nesses dois momentos, proteger a atividade dessas sociedades exploradoras de atividade econômica, pondo-as sob o regime das empresas privadas, para garantir que mantivessem o mesmo desempenho das demais empresas que atuam no mercado, de modo a afastar qualquer mecanismo de proteção ou de privilégios. Nesse sentido, aduziu que a submissão legal da Petrobrás a um regime diferenciado de licitação estaria justificado pelo fato de que, com a relativização do monopólio do petróleo trazida pela EC 9/95, a empresa passou a exercer a atividade econômica de exploração do petróleo em regime de livre competição com as empresas privadas concessionárias da atividade, as quais, frise-se, não estão submetidas às regras rígidas de licitação e contratação da Lei 8.666/93. Em conseqüência, reputou não ser possível conciliar o regime previsto nessa lei com a agilidade própria do mercado de afretamento. Daí observar que a interpretação que afasta a aplicação do art. 1º, parágrafo único, do aludido diploma ser uma conseqüência direta da própria natureza constitucional da sociedade de economia mista, tal como declarado pelo constituinte originário e reiterado pelo constituinte derivado.
RE 441280/RS, rel. Min. Menezes Direito, 30.9.2008. (RE-441280)

Art. 1º, Parágrafo Único, da Lei 8.666/93 e Petrobrás - 3

A Min. Cármen Lúcia abriu divergência e proveu o recurso extraordinário por considerar que os princípios constantes do art. 3º da Lei 8.666/93 e as regras, genéricas, que estruturam o instituto da licitação, aplicam-se indistintamente a todos os entes integrantes da Administração Pública, seja direta ou indireta. Não vislumbrou, em conseqüência, obstáculo para que a recorrida adotasse o processo licitatório. No ponto, realçou que o processo seria um meio, enquanto o procedimento, um modo e que este diferenciar-se-ia para empresas prestadoras de serviço público e para empresas que intervêm na atividade econômica. Não conheceu do extraordinário, todavia, no que se refere à indenização, porquanto implicaria o revolvimento de matéria probatória. Em adição, o Min. Carlos Britto enfatizou que a Lei 9.478/97 - que dispõe sobre as atividades relativas ao monopólio do petróleo entre outras providências - remeteu ao Decreto 2.745/98 o tema relativo aos contratos celebrados pela Petrobrás (art. 67), sem observar a imposição de reserva legal para tratamento do tema. Em decorrência disso, registrou que, enquanto prevalecer essa anomia, incidiria, in totum, a Lei 8.666/93. Verificado o empate na votação, pediu vista dos autos o Min. Marco Aurélio.
RE 441280/RS, rel. Min. Menezes Direito, 30.9.2008. (RE-441280)


SEGUNDA TURMA


Tráfico de Drogas: Liberdade Provisória e Excepcionalidade

Ante as peculiaridades da situação dos autos, a Turma deferiu habeas corpus para que a paciente permaneça em liberdade até eventual sentença penal condenatória transitada em julgado. Na espécie, a paciente fora presa em flagrante por portar maconha quando visitava seu marido em presídio, sendo denunciada como incursa nas sanções dos artigos 12 e 18 da Lei 6.368/76. Insurgia-se contra decisão que cassara o benefício de liberdade provisória a ela concedido e expedira mandado de prisão, ainda não cumprido, em seu desfavor. Inicialmente, enfatizou-se que, apesar da controvérsia a respeito da possibilidade, ou não, da liberdade provisória em caso de prisão em flagrante por tráfico ilícito de entorpecentes, o writ deveria ser concedido, sob pena de ofensa à dignidade da pessoa humana, valor transformado em princípio normativo no texto da CF/88. No ponto, tendo em conta o debilitado estado de saúde da paciente - portadora do vírus HIV, o que lhe acarretara doenças como hepatite C e câncer de medula -, bem como o fato de possuir filha pequena que dela dependeria economicamente, entendeu-se estar-se diante de exceção, a qual deveria ser capturada pelo ordenamento jurídico. Asseverou-se que a regra seria no sentido do não cabimento de liberdade provisória nas hipóteses de prisão em flagrante por tráfico ilícito de entorpecentes, contudo ela não poderia acolher as circunstâncias descritas no presente feito. Observou-se que a custódia preventiva da paciente não anteciparia a sua condenação, mas consistiria em autêntica vingança da sociedade civil, uma vez que manter enclausurada pessoa doente não restabeleceria a ordem, além de nada reparar. Desse modo, concluiu-se que submetê-la ao cárcere seria incompatível com o direito, mesmo que adequado à regra. Leia o inteiro teor do voto condutor do acórdão na seção Transcrições deste Informativo.
HC 94916/RS, rel. Min. Eros Grau, 30.9.2008. (HC-94916)

Cerceamento de Defesa e Irregularidades na Instrução - 2

A Turma concluiu julgamento de recurso ordinário em habeas corpus no qual se discutia possível nulidade de processo criminal. Alegava-se a ocorrência de suposto cerceamento de defesa decorrente da admissão de testemunhas arroladas a destempo pelo assistente de acusação e do indeferimento do pedido de oitiva do médico-legista - v. Informativo 517. Negou-se provimento ao recurso ao fundamento de que não haveria, nos autos, cópia da decisão que deferira a devolução do prazo para apresentação de rol de testemunhas pelo assistente de acusação, tratando-se de providência apenas mencionada na decisão que indeferira o requerimento de desentranhamento de peças dos autos. Ademais, aduziu-se que foram apenas duas as testemunhas arroladas pelo assistente de acusação, as quais foram ouvidas durante a instrução, enfatizando-se que nenhuma delas presenciara os fatos narrados na denúncia. Observou-se que, da mesma forma, existiria indicação de que o juiz de direito admitira a presença de assistente de acusação, configurando-se mera irregularidade (erro material) a menção aos familiares da vítima em determinadas peças dos autos. No tocante à negativa do pleito de oitiva do médico-legista, afirmou-se que não constaria indicação acerca de qual teria sido o prejuízo suportado pelo ora recorrente, dado que, cuidando-se de prova pericial, eventual apresentação de quesitos complementares ou realização de nova prova técnica seriam as providências adequadas. Por fim, considerou-se ser o writ meio impróprio para apreciar as alegações que demandassem reexame do conjunto fático-probatório.
RHC 86941/MG, rel. Min. Ellen Gracie, 30.9.2008. (RHC-86941)

Conexão: Competência Relativa e Princípio do Juiz Natural - 1

A Turma indeferiu habeas corpus no qual se pretendia, em face de suposta conexão, o julgamento, na Justiça Federal, de todos os crimes objeto da denúncia. No caso, juiz federal recebera a inicial acusatória somente em relação aos delitos de contrabando, descaminho e formação de quadrilha, declinando da competência para a Justiça Estadual quanto à acusação por homicídio qualificado. Ocorre que o magistrado do tribunal do júri suscitara conflito negativo de competência e remetera os autos ao STJ. A impetração requeria a suspensão da ação penal em curso na Justiça Federal até o julgamento definitivo do mencionado conflito de competência. Alegava, para tanto, que a não suspensão do processo - que se encontra na fase de alegações finais - resultaria na perda de objeto do conflito, de modo a causar dano irreparável ao paciente, consubstanciado na ofensa ao princípio do juiz natural, pois a imputação relativa ao homicídio não seria apreciada em conjunto com as demais acusações, tendo em conta o que disposto no art. 82 do CPP ("Se, não obstante a conexão ou continência, forem instaurados processos diferentes, a autoridade de jurisdição prevalente deverá avocar os processos que corram perante os outros juízes, salvo se já estiverem com sentença definitiva. Neste caso, a unidade dos processos só se dará, ulteriormente, para o efeito de soma ou de unificação das penas.") e no Enunciado 235 da Súmula do STJ ("A conexão não determina a reunião dos processos, se um deles já foi julgado.").
HC 95291/RJ, rel. Min. Cezar Peluso, 30.9.2008. (HC-95291)

Conexão: Competência Relativa e Princípio do Juiz Natural - 2

Esclareceu-se que o reputado constrangimento ilegal não teria origem no desmembramento dos processos, nem na provável prejudicialidade do conflito de competência que pende no STJ, mas resultaria da análise da ação penal referente aos crimes de contrabando, descaminho e formação de quadrilha por outro juiz que não o mesmo para julgar o paciente por homicídio. Assim, considerou-se não caber a esta Corte decidir sobre a viabilidade da tese da defesa no que diz respeito à conexão entre as causas relativas ao homicídio e aos demais crimes atribuídos ao paciente, limitando-se apenas à questão de saber se a conexão seria critério absoluto de definição de competência, a ponto de eventual julgamento de uma das ações e a conseqüente impossibilidade de incidência das regras de conexão representarem afronta ao art. 5º, LIII, da CF. Observou-se que as regras de conexão são aplicáveis a causas que, em princípio, seriam examinadas em separado e que, verificada a conexão entre os feitos, deve-se recorrer aos critérios de modificação ou prorrogação das competências já conferidas. Asseverou-se que, se incabíveis as regras modificativas da competência, as atribuições jurisdicionais originárias devem ser mantidas, visto que competência absoluta não se modifica ou prorroga. Nesse sentido, afirmou-se que a conexão só altera competência relativa, pois torna competente para o caso concreto juiz que não o seria sem ela. Enfatizou-se que, sendo relativa a competência por conexão, o julgamento da ação penal pelos delitos de contrabando, descaminho e formação de quadrilha não violaria o princípio do juiz natural. Ademais, afirmou-se que, na hipótese de o conflito de competência perder o objeto, será porque o órgão competente para apreciar cada uma das ações não poderá ser determinado por conexão, mas pelas regras de distribuição originária de competência, a saber: juízo competente será aquele que, segundo essas, já o seria para julgar a mesma ação, se não tivesse havido nexo entre as infrações penais. Aduziu-se, ainda, ser questionável o argumento de que a incidência do referido Verbete levaria à perda do objeto do conflito de competência, uma vez que possível reconhecimento de conexão entre causas provocará junção dos processos para o efeito de soma ou de unificação das penas (CPP, art. 82, parte final). Dessa forma, não se vislumbrou dano irreparável a incidir no prosseguimento da ação penal em curso na Justiça Federal.
HC 95291/RJ, rel. Min. Cezar Peluso, 30.9.2008. (HC-95921)

Precatório Adquirido por Terceiro e Compensação de Crédito Tributário

A Turma, acolhendo proposta do Min. Eros Grau, deliberou submeter ao Plenário julgamento de agravo regimental em recurso extraordinário, do qual relator, em que se discute a possibilidade, ou não, de utilização de precatório, cedido por terceiro e oriundo de autarquia previdenciária de Estado-membro, para pagamento de tributos estaduais à Fazenda Pública. A Corte de origem afastara a pretendida compensação ao fundamento de não se confundirem o credor do débito fiscal (unidade federativa) e o devedor do crédito oponível (autarquia previdenciária). No presente caso, a decisão agravada assentara que o fato de o devedor ser diverso do credor não seria relevante, pois ambos integrariam a Fazenda Pública do mesmo ente federado. Salientara, ainda, a inexistência de limitações constitucionais aos institutos da cessão e da compensação, bem como o poder liberatório de precatórios para pagamento de tributo.
RE 550400 AgR/RS, rel. Min. Eros Grau, 30.9.2008. (RE-550400)

SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno1º.10.20082.10.200812
1ª Turma30.9.2008--191
2ª Turma30.9.2008--509



T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Tráfico de Drogas: Liberdade Provisória e Excepcionalidade (Transcrições)


HC 94916/RS*

RELATOR: MIN. EROS GRAU

RELATÓRIO: A paciente foi presa em flagrante portando pequena quantidade de maconha quando visitava seu marido na penitenciária.
2. Processada pelo crime de tráfico de entorpecentes, foi beneficiada com a liberdade provisória.
3. A Terceira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul deu provimento a recurso em sentido estrito, interposto pelo Ministério Público, cassando o benefício concedido à paciente.
4. Foi expedido novo mandado de prisão, não cumprido porque o novo endereço da paciente não fora corretamente cadastrado.
5. A paciente posteriormente tomou conhecimento desse mandado de prisão.
6. A impetrante afirma que entre a expedição do mandado de prisão e a presente data passaram-se cinco anos.
7. Sobreveio a impetração de habeas corpus no STJ, que o indeferiu.
8. Daí este habeas corpus, no qual se alega o quanto segue:
(i) a paciente é inocente, não é traficante; viciada, tinha a droga para consumo próprio, vindo a ser presa no estabelecimento prisional porque a comprara antes da visita ao marido e não tinha onde deixá-la;
(ii) a paciente chegou a pensar em apresentar-se à autoridade policial, porém descobriu ser portadora do vírus da AIDS, "o que acarretou a contração de novas enfermidades como HEPATITE C e também HTLV que é um câncer na medula, doença que já deixou alguns músculos do corpo da PACIENTE sem movimentação, e que necessitava de muitos cuidados que não seriam concedidos no cárcere e acabou mudando sua opinião, já que teve medo inclusive de morrer por falta de medicamentos";
(iii) a paciente tem interesse em provar sua inocência, está trabalhando com dificuldades para sustentar sua filha e jamais voltou a delinqüir no período em que permaneceu em liberdade; mantém atividade lícita e endereço fixo; e
(iv) não há fundamentação cautelar para negar a liberdade provisória; isso porque a paciente não representa perigo para a sociedade e, em relação à garantia da instrução criminal, "A MESMA SÓ SE AUSENTOU POR MEDO, O QUE É NORMAL, AINDA MAIS QUE TRATA-SE (sic) DE PESSOA DOENTE".
9. Requer, liminarmente, inaudita altera parte, seja deferida a liberdade provisória. No mérito, a concessão definitiva da ordem.
10. A PGR é pela concessão da ordem.
É o relatório.

VOTO: Não obstante a controvérsia a respeito da possibilidade, ou não, da liberdade provisória em caso de prisão em flagrante por tráfico ilícito de entorpecentes, tenho, na linha do parecer da Subprocuradora-Geral da República Cláudia Sampaio Marques e em face das peculiaridades do caso, que a ordem deve ser concedida. Leio trecho desse parecer:

"[...]
4. O parecer é pela concessão da ordem.
5. A Paciente foi presa em flagrante e denunciada como incursa nos artigos 12 e 18 da Lei nº 6368/76, por fato praticado, em tese, no dia 6 (seis) de julho de 2002, no interior da Penitenciária Modulada de Charqueadas.
6. Em 10 (dez) de julho de 2002, a Paciente obteve o benefício da liberdade provisória. Entretanto, a Egrégia 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul cassou a decisão que deferiu a liberdade provisória, determinando a expedição de mandado de prisão (fls. 303).
7. A Defesa impetrou habeas corpus perante o Superior Tribunal de Justiça, que foi denegado. Impetrou-se então o presente habeas corpus no intuito de obter o benefício da liberdade provisória.
8. Segundo consta dos autos, o mandado prisional ainda não foi cumprido, pois a Paciente tem medo de ser presa e de morrer deixando sua filha desamparada, bem como morrer sem assistência no cárcere.
9. Em princípio, o crime de tráfico, qualificado como hediondo, não comporta liberdade provisória.
10. No entanto, os documentos constantes dos autos comprovam algumas peculiaridades que justificam o abrandamento dessa regra. É que a paciente é portadora do vírus HIV, o que lhe acarretou doenças como Hepatite C e câncer na medula. Tem uma filha pequena, que precisa dos seus cuidados.
11. Desde a data dos fatos, em 6 de julho de 2002, já transcorreram mais de 6 (seis) anos, não constando notícia de que a paciente tenha voltado a delinqüir.
12. Em pesquisa realizada no site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, não foi localizado nenhum outro processo criminal em que a paciente figure como acusada. Ao que tudo indica, o processo criminal a que responde foi um fato isolado na sua vida, praticado em circunstâncias excepcionais.
13. Ademais, o Juiz da causa, próximo dos fatos, entendeu por bem conceder a liberdade à paciente, dando os seguintes fundamentos para a sua decisão:

'No caso em tela, a materialidade restou comprovada e existem indícios de autoria, corroborada pelas declarações que a ré prestou na polícia.
Por outro lado, a ré demonstrou ter endereço certo e que exerce atividade remunerada o que, em tese, afastaria a condição da conveniência da instrução criminal e eventual aplicação da lei penal.
Quanto a condição de garantia da ordem pública, tenho que a conduta da ré, embora grave, não justifica, por si só, a segregação provisória por esse motivo.
Na lição do mesmo doutrinador (op. cit., p. 577), 'a ordem pública é a paz, a tranqüilidade no meio social. Assim, se o indiciado ou ré estiver cometendo novas infrações penais, ou se ele já vinha cometendo várias, sem que a Polícia lograsse prendê-lo em flagrante; se estiver fazendo apologia do crime, ou incitando ao crime, ou se reunido em quadrilha ou bando, haverá perturbação da ordem pública...', situações que não podem ser imputadas à ré. Além disso, a ré não registra antecedentes policiais nem judiciais.
Cumpre salientar que, na quase totalidade das vezes, estas mulheres que são flagradas levando droga para o interior das penitenciárias, ou são ameaçadas diretamente pelos seus maridos e companheiros, ou estes por outros detentos, ou seja, não tem escolha.
Por fim, a ré tem uma filha que depende de seus cuidados e, certamente, da renda que a mesma obtém com o seu trabalho.
Por todos esses motivos, aliado ao fato de que não se encontram presentes quaisquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva, ou seja, nem a ordem pública, a instrução criminal ou a eventual aplicação da lei penal estão ameaçadas. Além disso, mesmo em razão de eventual condenação, considerando a possibilidade de substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, não há razão para manutenção da segregação cautelar.' (apenso 1)

14. A decisão do Tribunal de Justiça, que determinou o retorno da paciente à prisão, fundamentou-se no fato de o crime ser definido em lei como hediondo, 'onde é expressamente vedada a concessão de liberdade provisória conforme preconiza o disposto no inciso II do art. 2º da Lei nº 8.072/90, cuja constitucionalidade vem sendo reafirmada pelo Supremo Tribunal Federal e esmagadora jurisprudência' (Apenso 1), não apresentando outra justificativa, que retratasse a real necessidade de submeter a paciente, que apresenta estado de saúde debilitado, ao cárcere.
15. Assim, considerando as peculiaridades do caso concreto, que autorizam o abrandamento do rigor com que se vem aplicando a regra que impõe a prisão dos acusados por crime definido como hediondo, manifesta-se o Ministério Público Federal pela concessão da ordem."

Dizer "peculiaridades do caso concreto" é dizer exceção. Exceção que se impõe seja capturada pelo ordenamento jurídico, mesmo porque, no caso, a afirmação da dignidade da pessoa humana acode a paciente.
A transgressão à lei é punida de modo que a lei [= o direito] seja restabelecida. Nesse sentido, a condenação restabelece o direito, restabelece a ordem, além de pretender reparar o dano sofrido pela vítima. A prisão preventiva antecipa o restabelecimento a longo termo do direito; promove imediatamente a ordem. Mas apenas imediatamente, já que haverá sempre o risco, em qualquer processo, de ao final verificar-se que o imediato restabelecimento da ordem transgrediu a própria ordem, porque não era devido.
A regra diz ser incabível a liberdade provisória em caso de prisão em flagrante por tráfico ilícito de entorpecentes. Daí que, nos seus termos, a prisão preventiva da paciente dela necessariamente decorreria. No caso, contudo, a exceção afasta a regra.
A exceção é o caso que não cabe no âmbito de normalidade abrangido pela norma geral. A norma geral deixaria de sê-lo [= deixaria de ser geral] se a contemplasse. Da exceção não se encontra alusão no discurso da ordem jurídica vigente. Define-se como tal justamente por não ter sido descrita nos textos escritos que compõem essa ordem. É como se nesses textos de direito positivo não existissem palavras que tornassem viável a sua descrição - daí dizermos que a exceção está no direito, ainda que não se a encontre nos textos normativos de direito positivo.
Pois ela não está situada além do ordenamento, senão no seu interior. O estado de exceção é uma zona de indiferença entre o caos e o estado da normalidade, zona de indiferença no entanto capturada pelo direito. De sorte que não é a exceção que se subtrai à norma, mas ela que, suspendendo-se, dá lugar à exceção - somente desse modo ela se constitui como regra, mantendo-se em relação com a exceção. Daí que ao Judiciário, sempre que necessário, incumbe decidir regulando também essas situações de exceção. Mas ao fazê-lo não se afasta do ordenamento. Aplica a norma à exceção desaplicando-a, isto é, retirando-a da exceção, retirando-se desta. Este tribunal tem assim procedido em alguns casos, assumindo claramente tê-lo feito. Menciono, para dar exemplo disso, as decisões tomadas na Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.240, da qual fui relator, e na Reclamação 3.034.
Aqui, no caso de que cogitamos, estamos diante de exceção. A regra que diz ser incabível a liberdade provisória em caso de prisão em flagrante por tráfico ilícito de entorpecentes não pode colher a situação descrita nestes autos, pena de transgredir a própria ordem na qual se compõe. Pois é certo que sua aplicação conduziria a afronta à dignidade da pessoa humana, valor transformado em princípio normativo no texto da Constituição de 1988.
É que a prisão preventiva da paciente não anteciparia meramente a sua condenação, porém uma autêntica vingança do Estado, rectius da sociedade civil. A condenação cederia espaço à violência incontida da vendeta. É como se a sociedade civil, representada por um Estado que ainda com ela se confunde, se vingasse de si própria por ser o que é, e como é, na pessoa da paciente. Explico-me.
O Estado moderno é ainda determinado por certos particularismos, antagônicos a outros. Ainda se confunde, por uma larga parte, com o Estado do exterior, o Estado da necessidade e do entendimento, isto é, carrega características da sociedade civil, que, logicamente suprassumida no sistema hegeliano, ainda não encontrou a sua plena realização nas estruturas engendradas pela modernidade. Nele se constrói a paz burguesa, dotada de caráter temporário na medida em que o dissenso entre os particularismos antagônicos é apenas mediado, superado pela conveniência - o que, no direito, não consubstancia, a rigor, nenhuma mediação efetiva, nem suprassunção, mas justaposição conflitante.
Por certo superpõem-se, no mundo da vida, manifestações próprias a ambos, ao Estado moderno e ao Estado na concepção hegeliana. Mas o que prevalece, na forma institucional do primeiro, é a apropriação, pela burguesia, dos monopólios da violência e da tributação, caracterizando uma eticidade (Sittlichkeit) ainda não de todo permeada pela racionalidade como razão efetiva.
A justiça produzida pelo Estado moderno condena para restabelecer o direito que ele mesmo põe, para restabelecer a ordem, pretendendo reparar os danos sofridos pela vítima. Mas a vítima no caso dos autos não é identificada. É a própria sociedade, beneficiária de vingança que como que a pacifica em face, talvez, da frustração que resulta de sua incapacidade de punir os grandes impostores. De vingança se trata, pois é certo que manter presa em condições intoleráveis uma pessoa doente não restabelece a ordem, além de nada reparar. Essa brutalidade, infernal, não pode ser tida - repito - senão como expressiva pura e simplesmente de vingança, exclusivamente de vingança de quem se compraz em fazer o mal.
A este tribunal incumbe a elevada missão de afirmar a força normativa da Constituição e de conferir efetividade à dignidade do ser humano, que o seu artigo 1º declara. A paciente apresenta estado de saúde debilitado - diz o Juiz da causa - e dela depende inclusive economicamente uma filha. Submetê-la ao cárcere, isso é incompatível com o direito, ainda que se possa ter como adequado à regra. Daí que a captura da exceção se impõe. Aliás, é da inclusão de situações como tais no ordenamento - e da exclusão de outras, a pretexto de razoabilidades e proporcionalidades - que depende a regularidade do seu funcionamento. Direi mesmo que a preservação dos princípios impõe, seguidas vezes, a transgressão das regras.
Concedo a ordem, a fim de que a paciente permaneça em liberdade até eventual sentença penal condenatória transitada em julgado.

* acórdão pendente de publicação
INOVAÇÕES LEGISLATIVAS
29 de setembro a 3 de outubro de 2008

CERTIDÃO DE NASCIMENTO - Certidão de Óbito - Registro Público - Lei
Lei nº 11.789, de 2 de outubro de 2008 - Proíbe a inserção nas certidões de nascimento e de óbito de expressões que indiquem condição de pobreza ou semelhantes e altera as Leis nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973 - Lei de Registros Públicos, e 8.935, de 18 de novembro de 1994. Publicado no DOU de 3/10/2008, Seção 1, p.1.

LEI Nº 11.789, DE 2 DE OUTUBRO DE 2008.

Proíbe a inserção nas certidões de nascimento e de óbito de expressões que indiquem condição de pobreza ou semelhantes e altera as Leis nos 6.015, de 31 de dezembro de 1973 - Lei de Registros Públicos, e 8.935, de 18 de novembro de 1994.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o Esta Lei proíbe a inserção nas certidões de nascimento e de óbito de expressões que indiquem condição de pobreza ou semelhantes, alterando as Leis nos 6.015, de 31 de dezembro de 1973 - Lei de Registros Públicos; e 8.935, de 18 de novembro de 1994, que regulamenta o art. 236 da Constituição Federal, dispondo sobre serviços notariais e de registro.
Art. 2o O art. 30 da Lei no 6.015, de 31 de dezembro de 1973 - Lei de Registros Públicos, passa a vigorar acrescida do seguinte § 4o:

"Art. 30. ............................................................
§ 4o É proibida a inserção nas certidões de que trata o § 1o deste artigo de expressões que indiquem condição de pobreza ou semelhantes." (NR) 

Art. 3o  O art. 45 da Lei no 8.935, de 18 de novembro de 1994, passa a vigorar com as seguintes alterações:

"Art. 45. ........................................................ 
§ 1º Para os reconhecidamente pobres não serão cobrados emolumentos pelas certidões a que se refere este artigo. 
§ 2º É proibida a inserção nas certidões de que trata o § 1º deste artigo de expressões que indiquem condição de pobreza ou semelhantes." (NR)

Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 2 de outubro de 2008; 187º da Independência e 120º da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Tarso Genro
 
CONCURSO PÚBLICO - Taxa de Inscrição - Pagamento - Isenção - Poder Executivo Federal
Decreto nº 6.593, de 2 de outubro de 2008 - Regulamenta o art. 11 da Lei nº 8.112, de 11 de dezembro de 1990, quanto à isenção de pagamento de taxa de inscrição em concursos públicos realizados no âmbito do Poder Executivo Federal. Publicado no DOU de 3/10/2008, Seção 1, p.3.

DECRETO Nº 6.593, DE 2 DE OUTUBRO DE 2008.

Regulamenta o art. 11 da Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990, quanto à isenção de pagamento de taxa de inscrição em concursos públicos realizados no âmbito do Poder Executivo federal.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto no art. 11 da Lei no 8.112, de 11 de dezembro de 1990,

DECRETA:

Art. 1o Os editais de concurso público dos órgãos da administração direta, das autarquias e das fundações públicas do Poder Executivo federal deverão prever a possibilidade de isenção de taxa de inscrição para o candidato que:
I - estiver inscrito no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal - CadÚnico, de que trata o Decreto no 6.135, de 26 de junho de 2007; e
II - for membro de família de baixa renda, nos termos do Decreto nº 6.135, de 2007. 
§ 1º A isenção mencionada no caput deverá ser solicitada mediante requerimento do candidato, contendo:
I - indicação do Número de Identificação Social - NIS, atribuído pelo CadÚnico; e
II - declaração de que atende à condição estabelecida no inciso II do caput.
§ 2º O órgão ou entidade executor do concurso público consultará o órgão gestor do CadÚnico para verificar a veracidade das informações prestadas pelo candidato. 
§ 3º A declaração falsa sujeitará o candidato às sanções previstas em lei, aplicando-se, ainda, o disposto no parágrafo único do art. 10 do Decreto no 83.936, de 6 de setembro de 1979.
Art. 2º O edital do concurso público definirá os prazos limites para a apresentação do requerimento de isenção, assim como da resposta ao candidato acerca do deferimento ou não do seu pedido. 
Parágrafo único. Em caso de indeferimento do pedido, o candidato deverá ser comunicado antes do término do prazo previsto para as inscrições.
Art. 3º Este Decreto também se aplica aos processos seletivos simplificados para a contratação de pessoal por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público, de que trata o art. 37, inciso IX, da Constituição.
Art. 4º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 2 de outubro de 2008; 187o da Independência e 120o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
João Bernardo de Azevedo Bringel
Patrus Ananias

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA

. Corregedoria Nacional de Justiça - Interceptação Telefônica - Informática - Dado
Instrução Normativa nº 1/CNJ, de 24 de setembro de 2008 - Recomenda às Corregedorias de Justiça e aos Juízos respectivos a adoção de medidas destinadas à observância de prazo para o envio dos dados relativos às interceptações telefônicas, de sistemas de informática e telemática em curso, nos termos da Resolução nº 59, de 09 de setembro de 2008 e dá outras providências. Publicado no DJ de 29/9/2008, n.188, p.1.

. Magistratura Nacional - Código de Ética
Resolução nº 60/CNJ, de 19 de setembro de 2008 - Institui o Código de Ética da Magistratura Nacional. Publicado no DJE/CNJ de 30/9/2008, n.57, p.2.

LÍNGUA PORTUGUESA - Acordo - Execução - Protocolo - Modificação
Decreto nº 6.585, de 29 de setembro de 2008 - Dispõe sobre a execução do Segundo Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assinado em São Tomé, em 25 de julho de 2004. Publicado no DOU de 30/9/2008, Seção 1, p.9.

LÍNGUA PORTUGUESA - Acordo - Implementação
Decreto nº 6.586, de 29 de setembro de 2008 - Dispõe sobre a implementação do Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Publicado no DOU de 30/9/2008, Seção 1, p.9.

LÍNGUA PORTUGUESA - Acordo - Promulgação
Decreto nº 6.583, de 29 de setembro de 2008 - Promulga o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assinado em Lisboa, em 16 de dezembro de 1990. Publicado no DOU de 30/9/2008, Seção 1, p.1.

LÍNGUA PORTUGUESA - Acordo - Protocolo - Modificação
Decreto nº 6.584, de 29 de setembro de 2008 - Promulga o Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assinado em Praia, em 17 de julho de 1998. Publicado no DOU de 30/9/2008, Seção 1, p.9.

SISTEMA NACIONAL DE MOBILIZAÇÃO (SINAMOB) - Logística - Estratégia - Agressão estrangeira - Soberania Nacional - Ameaça - Território Nacional - Invasão
Decreto nº 6.592, de 2 de outubro de 2008 - Regulamenta o disposto na Lei nº 11.631, de 27 de dezembro de 2007, que dispõe sobre a Mobilização Nacional e cria o Sistema Nacional de Mobilização - SINAMOB. Publicado no DOU de 3/10/2008, Seção 1, p.1.



Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos
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Informativo STF - 522 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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