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terça-feira, 4 de novembro de 2008

Informativo STF 365 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF


Brasília, 11 a 15 de outubro de 2004 - Nº 365.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO

Plenário
Carta Anônima. Veiculação pela "Internet". Calúnia. Imunidade Parlamentar Material
ADI. Medida Cautelar. Parcelamento de Multas. Trânsito
MS contra Ato do TCU e Decadência - 3
ADI. Embargos de Declaração. Estabilidade Financeira. Desvio de Função
ADI. Resolução. Magistratura. Ausência da Comarca
ADI. Concurso Público. Taxa de Inscrição. Isenção
Transcrições
Interceptação Telefônica. Prazo. Renovação. Crimes Punidos com Detenção (HC 83515/RS)
Ausência de Prequestionamento. RE. Provimento. Prevalência de Decisão do STF (AI 375011 AgR/RS)

PLENÁRIO

Carta Anônima. Veiculação pela "Internet". Calúnia. Imunidade Parlamentar Material

O Tribunal rejeitou denúncia oferecida contra deputado federal pela suposta prática dos delitos de calúnia, injúria e difamação, previstos na Lei 5.250/67 (Lei de Imprensa), decorrentes de divulgação, por meio de informativo eletrônico semanal, do conteúdo de uma carta anônima que noticiava fatos ofensivos à honra de coronel da polícia militar do Estado de Minas Gerais e que o apontava como suposto autor de atos de corrupção passiva. Inicialmente, o Tribunal asseverou que o caso deveria ser analisado com base no Código Penal e não na Lei de Imprensa, haja vista que informativo eletrônico semanal ou boletim impresso, gerado em gabinete de deputado federal, localizado na Câmara dos Deputados, não poderia ser considerado jornal ou publicação periódica e nem serviço de radiodifusão ou serviço noticioso de que cuida o parágrafo único do art. 12 da citada Lei ("Art. 12. Aqueles que, através dos meios de informação e divulgação, praticarem abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e informação ficarão sujeitos às penas desta Lei e responderão pelos prejuízos que causarem. Parágrafo único. São meios de informação e divulgação, para os efeitos deste artigo, os jornais e outras publicações periódicas, os serviços de radiodifusão e os serviços noticiosos"). Entendeu-se, também, tratar-se, em tese, do crime de calúnia, praticado na modalidade de divulgação, previsto no §1º do art. 138 do CP ("Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime: § 1º - Na mesma pena incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga."), uma vez que os fatos divulgados noticiavam suposta prática de crimes de corrupção passiva. Não obstante, concluiu-se, tendo em conta ser o denunciado deputado federal e, ainda, de ser seu gabinete uma extensão da Casa Legislativa, que a divulgação efetivada, independentemente do meio utilizado, estaria acobertada pela imunidade parlamentar material por não estar desvinculada do exercício parlamentar, já que os fatos noticiados constituiriam, em tese, crimes contra a administração pública, incidindo, na hipótese, o disposto no art. 53 da CF/88, na redação dada pela EC 35/2001 ("Os deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.").
Inq 2130/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 13.10.2004. (Inq-2130)

ADI. Medida Cautelar. Parcelamento de Multas. Trânsito

O Tribunal, por maioria, deferiu pedido de liminar em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Governador do Estado do Espírito Santo contra a Lei estadual 7.738/2004, para suspender, com eficácia ex nunc, a vigência dessa lei até o julgamento final da ação (Lei 7.738/2004: "Art. 1° Os débitos decorrentes de multas por infrações ao Código de Trânsito Brasileiro poderão ser parcelados em até 05 (cinco) vezes, conforme o estabelecido nesta Lei. § 1° O parcelamento de débitos será requerido em formulário próprio à autoridade competente. § 2° O signatário do pedido provará, ao requerer o benefício, ser proprietário do veiculo ou seu procurador legal. Art. 2º É indispensável para a concessão do parcelamento: I - o limite máximo de até 05 (cinco) parcelas mensais e sucessivas; II - o valor mínimo de R$ 50,00 (cinqüenta reais) para cada parcela; III - a aceitação do acréscimo de taxa sobre cada parcela a ser paga, referente a serviços bancários. Art. 3° O valor de cada parcela corresponderá à divisão do montante do débito pelo número de parcelas concedidas, e não incidirão sobre estas juros nem correção monetária, enquanto dentro do prazo estipulado para o efetivo pagamento. Art. 4° O pedido de parcelamento, uma vez deferido pela autoridade competente, implicará automaticamente: I - na confissão irretratável dos débitos, renúncia a qualquer impugnação, defesa ou recurso administrativo, bem como desistência dos já interpostos na esfera administrativa ou judicial; II - na impossibilidade de transferência de propriedade do veículo e de registro em outra unidade da Federação enquanto não-findas as parcelas. Art. 5° O atraso do pagamento de quaisquer das parcelas implicará no imediato cancelamento do benefício, além das penalidades e medidas administrativas ou judiciais cabíveis."). Entendeu-se presente a plausibilidade jurídica do pedido, com base em precedentes do STF, no sentido de que a norma impugnada, a princípio, invade a competência privativa da União para legislar sobre trânsito (CF, art. 22, XI: "Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:... XI - trânsito e transporte;"). Vencido o Min. Marco Aurélio que indeferia a liminar.
ADI 3196 MC/ES, rel. Min. Gilmar Mendes, 13.10.2004. (ADI-3196)

MS contra Ato do TCU e Decadência - 3

O Tribunal concluiu julgamento de mandado de segurança impetrado contra ato do Tribunal de Contas da União que julgara ilegal a concessão de pensão temporária à sobrinha de servidora falecida - v. Informativos 304 e 341. Por maioria, rejeitou-se a alegada preliminar de decadência para a impetração do writ, por se considerar que, não obstante a jurisprudência da Corte ser no sentido de que o prazo seja contado da publicação da decisão no Diário Oficial, passados mais de cinco anos da data de concessão da pensão temporária, não se poderia exigir que a impetrante permanecesse acompanhando tal publicação, sendo razoável, na espécie, admitir-se que a mesma somente tivesse tomado conhecimento da decisão do Tribunal de Contas da União com o recebimento de ofício a ela endereçado, o que ocorrera três meses após a mencionada publicação no Diário Oficial da União. Vencido, no ponto, o Min. Moreira Alves, relator, que assentava a decadência do writ, ao fundamento de que o prazo decadencial para impetração de mandado de segurança contra ato do TCU que considera ilegal aposentadoria ou concessão de pensão conta-se da publicação da decisão daquele órgão no Diário Oficial, não se reabrindo por comunicação pessoal que posteriormente seja feita ao impetrante. Com relação ao mérito, indeferiu-se o writ, por se entender não atendido o disposto na alínea d do inciso II do art. 217 da Lei 8.112/90 ("Art. 217. São beneficiários das pensões:... II - temporária:... d) a pessoa designada que viva na dependência econômica do servidor, até 21 (vinte e um) anos, ou, se inválida, enquanto durar a invalidez"). Ressaltou-se que, apesar de a impetrante alegar a dependência econômica, a inexistência de sua necessária designação como beneficiária obstaculizaria a pretensão deduzida, não sendo possível sequer se cogitar sobre uma designação tácita, tendo em conta, principalmente, o fato de a servidora, em vida, ter cancelado a indicação de outros dependentes seus para serem beneficiários da referida pensão.
MS 22938/PA, rel. Min. Moreira Alves, 13.10.2004. (MS-22938)

ADI. Embargos de Declaração. Estabilidade Financeira. Desvio de Função

O Tribunal julgou três embargos de declaração opostos contra acórdão do Pleno que, por maioria, dera provimento a recurso extraordinário e declarara, incidentemente, por ofensa ao inciso II do art. 37 da CF, a inconstitucionalidade do art. 133 da Constituição do Estado de São Paulo ("O servidor, com mais de cinco anos de efetivo exercício, que tenha exercido ou venha a exercer, a qualquer título, cargo ou função que lhe proporcione remuneração superior à do cargo de que seja titular, ou função para a qual foi admitido, incorporará um décimo dessa diferença, por ano, até o limite de dez décimos") e do art. 19 de seu ADCT ("Para os efeitos do disposto no art. 133, é assegurado ao servidor o cômputo de tempo de exercício anterior à data da promulgação desta Constituição.") - v. Informativos 152 e 193. Salientou-se, inicialmente, a constitucionalidade do instituto da estabilidade financeira e da nomeação para cargo comissionado sem concurso (CF, art. 37, II). Entendeu-se que, apesar da correta conclusão do acórdão embargado em relação à hipótese tratada nos autos, qual seja, a de impossibilidade de "o servidor, que tenha prestado concurso para um cargo, venha a receber proventos próprios ou até mesmo a denominação de cargo diferente, para o qual se exija outro concurso", a declaração de inconstitucionalidade proferida tivera um efeito mais amplo do que pretendido, porquanto afastara a legítima situação em que o servidor, ocupante de cargo de provimento efetivo, nomeado para exercer cargo de provimento em comissão, pudesse incorporar, anualmente, a diferença a mais percebida nesse cargo com vista a manter a estabilidade financeira. Dessa forma, os embargos declaratórios da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo e do Estado de São Paulo foram acolhidos, em parte, para limitar a declaração de inconstitucionalidade do art. 133 da Constituição paulista e do art. 19 do seu ADCT à expressão "a qualquer título", constante do primeiro dispositivo. Por sua vez, os embargos de declaração do servidor foram rejeitados, por se considerar não demonstrada a existência da apontada omissão, bem como por se entender que os mesmos tinham manifesto propósito infringente.
RE 219934 ED/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 13.10.2004. (RE-219934)

ADI. Resolução. Magistratura. Ausência da Comarca

O Tribunal julgou procedente pedido de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB contra a Resolução 22/2003, expedida pela Presidência do Tribunal de Justiça do Amapá ("Art. 1º. Dispor que nas Comarcas de Entrância Inicial da Justiça do Estado do Amapá, os Juízes de Direito, Titulares e Substitutos, salvo a ocorrência de casos excepcionais, poderão se ausentar da respectiva sede apenas, e no máximo, em finais de semana alternados e desde que haja prévia comunicação ao Presidente do Tribunal. § 1º. A comunicação prevista no caput deverá, obrigatoriamente, anteceder ao deslocamento do Magistrado. § 2º. Nas ausências permitidas no 'caput', deverá ser afixado no átrio do Fórum da respectiva Comarca (área externa), para conhecimento dos interessados, o número do telefone em que poderá ser contatado o Magistrado. § 3º. As ausências disciplinadas neste artigo não poderão coincidir com as dos Juízes das Comarcas competentes para a substituição regimental. Art. 2º. Alertar que a inobservância da presente Resolução, além de infringir dispositivo constitucional (CF, art. 93, VII), caracterizará falta a dever funcional do Magistrado, prevista no artigo 35, inciso V, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar nº 35, de 14.03.1979) e no artigo 2º, § 2º, do Decreto Estadual (N) nº 0069, e ensejará a aplicação das penalidades pertinentes."). Entendeu-se que a norma impugnada apresentava vício de inconstitucionalidade formal por tratar de matéria reservada a lei complementar federal (CF: "Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:... VII - o juiz titular residirá na respectiva comarca;").
ADI 3224/AP, rel. Min. Ellen Gracie, 13.10.2004. (ADI-3224)

ADI. Concurso Público. Taxa de Inscrição. Isenção

O Tribunal iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Governador do Estado do Espírito Santo contra a Lei estadual 6.663/2001 ("Art. 1º - Fica estabelecida a isenção imediata de pagamento da taxa de concurso público para emprego na Administração Direta e Indireta do Estado do Espírito Santo, aos desempregados e aos trabalhadores que ganham até 03 (três) salários mínimos por mês. Parágrafo único: Caso o concursado seja aprovado e contratado na Administração Pública, será a referida taxa descontada em duas parcelas mensais e consecutivas de seu salário. Art. 2º - O desempregado e o trabalhador que recebe até 03 (três) salários mínimos poderão participar, usufruindo do direito de isenção imediata, de até 03 (três) concursos por ano."). A Min. Ellen Gracie, relatora, julgou procedente o pedido por entender que a lei impugnada afronta a reserva de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo para dispor sobre regime jurídico de servidores públicos, prevista no art. 61, §1º, II, c, da CF. Asseverou, ainda, que a norma em questão atenta contra o art. 7º, IV, da CF, por vincular ao salário mínimo taxa de inscrição em concurso público. Em divergência, o Min. Carlos Britto, julgou improcedente o pedido por considerar que a lei analisada não versa sobre regra relativa a regime jurídico de servidor público, mas sobre condição para se alcançar a investidura de cargo público. Salientou, também, que a vinculação ao salário mínimo estabelecida por essa lei não é de tipo proibido por não estar sendo utilizada como fator de indexação. Os Ministros Joaquim Barbosa, Cezar Peluso, Marco Aurélio e Sepúlveda Pertence acompanharam o Min. Carlos Britto. Os Ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello acompanharam a relatora. O julgamento foi suspenso para aguardar os votos dos Ministros ausentes, nos termos do parágrafo único do artigo 173 do Regimento Interno do STF.
ADI 2672/ES, rel. Min. Ellen Gracie, 13.10.2004. (ADI-2672)

PRIMEIRA TURMA

Não houve sessão ordinária no dia 12.10.2004.


SEGUNDA TURMA

Não houve sessão ordinária no dia 12.10.2004.

Sessões

Ordinárias

Extraordinárias

Julgamentos

Pleno

13.10.20004

----

9

1a. Turma------------
2a. Turma------------



T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
_______________________________________________________________________________
Interceptação Telefônica. Prazo. Renovação. Crimes Punidos com Detenção (Transcrições)

(v. Informativo 361)

HC 83515/RS*

RELATOR: MINISTRO NELSON JOBIM

O presente HABEAS se funda em cinco alegações:
1. de que não teria sido respeitado o prazo de 15 (quinze) dias de interceptação telefônica, conforme estabelece o art. 5º, da Lei 9.296/96;
2. de que a quebra do sigilo telefônico teria ocorrido antes de outro meio de investigação ter sido utilizado pelo polícia, em desrespeito ao art. 2º, II, da Lei 9.296/96;
3. de que não estaria havendo as transcrições das conversas interceptadas nos relatórios encaminhados ao juízo federal de forma a subsidiar o pedido de renovação da interceptação, em violação ao art. 6º, § 1º, da Lei 9.296/96;
4. de que o Ministério Público não teria sido cientificado das quebras de sigilo telefônico autorizados pela Justiça, em afronta ao art. 6º, caput, da Lei 9.296/96; e
5. de que teriam sido interceptadas conversas entre os réus da investigação e o advogado das empresas, o que estaria em desacordo com o preceito do art. 7º, inciso II, da Lei 8.906/94; e
6. de que a maioria dos crimes apurados são punidos com penas de detenção, o que não justifica a interceptação telefônica segundo o teor do art. 2º, III, da Lei 9.296/96.
Vejamos cada argumento.

1. O ARGUMENTO DO EXCESSO DE PRAZO NA INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA (art. 5º, caput, da Lei 9.296/96).

O impetrante alega:
"............................................
Se a lei nº 9.296/96 estabeleceu o prazo de 15 dias, renováveis por mais 15 dias, fica evidente que a renovação judicial, por longos 7 meses, infringe os ditames legais, devendo ser considerada não só ilegal como, também, inconstitucional. Houvesse mesmo a possibilidade de inúmeras renovações da interceptação telefônica, não haveria qualquer razão para a existência do art. 5º da Lei nº 9.296/96.
...................................." (fls. 17)

Da análise dos autos, verifica-se que não houve a autorização de uma interceptação telefônica por um período dilatado.
O que ocorreu foi a renovação pelo juízo federal, diante dos relatórios trazidos pela polícia, da interceptação telefônica diante dos indícios e de seu livre convencimento acerca da necessidade daquela diligência.
A renovação da autorização da interceptação telefônica, longe de ser proibida pelo art. 5º da Lei 9.296/96, é permitida.
Ressalte-se que se trata de fatos complexos, que envolvem a investigação do relacionamento entre indivíduos e que acabou por resultar em denúncia de uma pluralidade de tipos e réus.
Somente uma investigação diferenciada, não-pontual e de acompanhamento contínuo poderia produzir prova suficiente a sustentar uma denúncia desse porte.
O juízo acerca da necessidade na renovação das autorizações de interceptação telefônica deve levar em conta a natureza dos fatos e dos crimes e das circunstâncias que envolvem o caso.
A denúncia (fls. 101/127), com a indicação de 13 (treze) réus, que se pauta em um conjunto complexo de relações e fatos, com a acusação de diversos crimes, dentre os quais a evasão de divisas, a formação de quadrilha, a lavagem de dinheiro e configuração de organização criminosa, não poderia ser viabilizada senão por meio de uma investigação contínua e dilatada a exigir a interceptação telefônica ao longo de diversos períodos de 15 dias.
A possibilidade de renovação da interceptação telefônica por mais de um período de 15 (quinze) dias é amplamente aceita na doutrina.
Leio VICENTE GRECO FILHO:
"..................................................
A lei não limita o número de prorrogações possíveis, devendo entender-se, então, que serão tantas quantas forem necessárias à investigação, mesmo porque 30 dias pode ser prazo muito exíguo.
.......................................................
A leitura rápida do art. 5º, poderia levar à idéia de que a prorrogação somente poderia ser autorizada uma vez. Não é assim: 'uma vez', no texto da lei, não é adjunto adverbial, é preposição. É óbvio que se existisse uma vírgula após a palavra 'tempo', o entendimento seria mais fácil.
.................................................."

Com o mesmo entendimento, cito ANTONIO SCARANCE FERNANDES:
".................................................
A decisão deve indicar a forma de execução da diligência (art. 5º). Diz a lei que a diligência não poderá exceder o prazo de quinze dias, 'renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova'. Pode-se, assim, permitir a renovação da interceptação, pelo mesmo prazo, por outras vezes, desde que, contudo, fique demonstrada a sua indispensabilidade, ou, como dizia o Projeto Miro Teixeira, quando permaneçam os pressupostos que permitem a sua autorização.
.............................."

Ainda no mesmo sentido, DAMÁSIO DE JESUS e LUIZ FLÁVIO GOMES.
Diante do exposto, são legais as sucessivas prorrogações de prazo para a interceptação telefônica em virtude da necessidade de apuração de fatos complexos - que, inclusive, foi objeto de Comissão Parlamentar de Inquérito no Rio Grande do Sul -, crimes que se configuraram no tempo e pluralidade de réus e, conseqüentemente, de relações e contados que deveriam ser investigados.
Não está configurado desrespeito ao art. 5º, caput, da Lei 9.296/96.

2. O ARGUMENTO DA EXISTÊNCIA DE OUTRO MEIO DE INVESTIGAÇÃO OU PRODUÇÃO DE PROVA (art. 2º, inciso II, da Lei 9.296/96).

Assim o impetrante expõe essa alegação:
"..............................
A Lei nº 9.296/96 é expressa em exigir a ultima ratio da interceptação, ou seja, ela só será necessária quando não houver outros meios de provas capazes de embasar eventual ação penal. Os argumentos utilizados pelo MMº Juiz Federal, ao contrário, não só conferem a natureza de prima ratio para a medida vexatória como, ademais, seriam sustentáveis para qualquer crime praticado no Brasil. Não há qualquer dado objetivo, embasando a decisão judicial supra, capaz de evidenciar a indispensabilidade da medida.
.............................." (fls. 23)

Equivocam-se os impetrantes.
As investigações relativas às atividades criminosas dos réus tiveram início a partir de notícias-crime que derem ensejo à instalação de Comissão Parlamentar de Inquérito instalada na Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul para investigar o Crime Organizado naquele Estado da Federação.
Dessa forma, somente após longa e minuciosa apuração da CPI estadual, na qual se realizaram audiências, se ouviram testemunhas e acusados e se coletaram documentos, é que a autoridade policial, em 30.4.2001 (fls. 149), requereu a quebra do sigilo telefônico.
Ademais, mesmo não tendo sido o primeiro meio de prova empregado, foi somente por meio da interceptação telefônica é que foi possível se apurar certos fatos constantes da denúncia, tais como:
a) as atividades criminosas da "Rede de Farmácias Econômica" e o pleno conhecimento de JUAREZ MARIN e WILSON JOSÉ LOPES (fls. 106 da denúncia);
b) a estratégia de criação de diversas empresas dirigidas por "laranjas" ou "testas-de-ferro" que, na verdade, seriam controladas pelos dois réus (fls. 106 da denúncia);
c) as supostas relações de poder e de mando existente no interior da organização e o provável envolvimento da esposa e dos filhos de JUAREZ MARIN (fls. 107/108 da denúncia);
d) as funções da esposa e filhos na implementação e operacionalização das diretrizes traçadas por JUAREZ MARIN e WILSON JOSÉ LOPES (fls. 107/108 da denúncia); e
e) o próprio funcionamento da organização e a participação específica de cada um em todo o processo criminoso, tais como, contas ilicitamente depositadas no exterior (fls. 108 e 115), a queima de documentação comprometedora dessas atividades (fls. 110) e a prática de crimes contra a saúde pública (fls. 116).
Tudo isso está a demonstrar que a interceptação telefônica não foi a primeira diligência probatória tomada.
Antes dela, está uma série de investigações realizadas pela polícia e mesmo antes pela Comissão Parlamentar de Inquérito.
Tanto assim que o próprio requerimento de interceptação da Delegacia de Polícia Fazendária (DELEFAZ) em Porto Alegre já narra, com grau elevado de detalhes, a estrutura e o provável funcionamento da suposta organização (fls. 132/140).
O pedido de interceptação, portanto, não foi primeira providência, mas diligência com o fim de aprofundamento e confirmação dos indícios e das provas até então coletadas.
Além disso, a interceptação foi essencial no levantamento de dados e informações que, de outra maneira, nunca poderiam ser confirmados como as acima indicadas.
Por isso, não pode prosperar o argumento de afronta ao art. 2º, inciso II, da Lei 9.296/96.

3. O ARGUMENTO DA FALTA DE TRANSCRIÇÃO DAS CONVERSAS A SUBSIDIAR CADA PEDIDO DE RENOVAÇÃO DA INTERCEPTAÇÃO (art. 6º, § 2º, da Lei 9.296/96).

O impetrante assim sustenta esse ponto:
"..............................
No caso dos autos, está bastante evidenciado que todas as interceptações telefônicas que recaíram sobre os pacientes foram objeto de gravação. Prova disso é que, em 29/11/2001, a autoridade policial encaminhou ao juízo 37 CDs contendo gravações (DOC. 34) e, em 14/11/2001, encaminhou mais 06 CDs restantes (DOC. 35). Portanto, se as conversas foram gravadas pela autoridade policial, deveria esta, ao enviar os relatórios quinzenais, transcrever todas as conversas gravadas e relevantes às investigações, a fim de propiciar ao juízo o controle de legalidade das interceptações.
.............................." (fls. 34)

Mais uma vez não assiste razão ao impetrante.
O art. 6º, § 2º, da Lei 9.296/96 tem a seguinte redação:
§ 2º. Cumprida a diligência, a autoridade policial encaminhará o resultado da interceptação ao juiz, acompanhado de auto circunstanciado, que deverá conter o resumo das operações realizadas.

Note-se que, em nenhum momento, a lei exige, já para o pedido de renovação da autorização, a transcrição completa das conversas já interceptadas.
E, por questões muitas vezes operacionais, não poderia fazê-lo.
É que o procedimento de degravação das conversas, pelo volume do material coletado, pode ser demorado, o que poderia prejudicar as investigações com a quebra no acompanhamento das conversas telefônicas.
Seria a hipótese do presente caso, uma vez que as diligências de interceptação telefônica acabaram por resultar, ao final, em 43 CDs de conversas.
Por isso, a lei apenas exige relatório circunstanciado da polícia com a explicação das conversas que já foram apuradas e, no caso de pedido de renovação, a necessidade da continuidade das investigações por meio da interceptação.
E assim foi feito, com elevado grau de detalhamento, pela Delegacia de Polícia Fazendária (DELEFAZ) por meio de seu "Relatório Pacial de Missão II - OM 056/01".
O mencionado relatório, sempre capeado por ofício do órgão policial com o pedido e resumo das providências, foi apresentado em todos os 14 (quatorze) requerimentos de renovação (fls. 152/162; 168/170; 176/182; 188/190; 217/219; 223/225; 229/237; 245/247; 254/260; 265/271; 280/282; 288/290; 298/304; 313/322; e 330/334) em que se fazia constar síntese dos trabalhos realizados, as informações apuradas e já trechos importantes das conversas interceptadas.
Por outro lado, a degravação completa de todo o material (43 CDs - fls. 338 e 340) foi encaminhada ao juízo federal, tão logo encerradas as diligências de interceptação telefônica.
A totalidade das gravações e transcrições foi colocada à disposição dos réus assim que encerrado o sigilo, segundo informações prestadas pelo juízo federal ao TRF da 4ª Região (fls. 60).
Cumpriu-se, portanto, as exigências do art. 6º, § 2º, da Lei 9.296/96.
Nessa linha, colho opinião de LUIZ FLÁVIO GOMES:
"..............................
Cumprida a diligência, a autoridade policial encaminhará o resultado da interceptação ao Juiz, acompanhado desse auto circunstanciado. Lendo-se rapidamente o art. 6º, § 2º, da Lei 9.296/96, tem-se a impressão de que a autoridade policial, em qualquer hipótese, deve encaminhar tudo 'imediatamente' ao Juiz. Não creio que assim seja. Esse dispositivo deve ser interpretado em conjunto com o art. 8º, parágrafo único, que manda apensar o auto apartado da interceptação ao inquérito policial ou ao processo. Urge distinguir duas hipóteses: interceptação feita no curso de um inquérito (ou investigação criminal) e interceptação realizada no curso de um processo. Naquela, penso que a autoridade policial não tem a obrigação de desde logo encaminhar tudo ao Juiz; assim procederá quando terminar o inquérito, apensando-se o auto apartado na fase do relatório (CPP, art. 10)...
.............................."

No mais, mantenho argumento final trazido pelo TRF/4ª região:
"..............................
Por sua vez, os Impetrantes afirmam que todas as interceptações foram objeto de gravação, haja vista a remessa ao juízo de 43 CDs. (fls. 301 e 303). Sustentam que as transcrições juntadas aos autos (fls. 305/387) não suprem a irregularidade. Em primeiro lugar, porque isso foi feito somente em 14.11.2001 e, ademais, porque a confiabilidade de tais provas é questionável, tendo em vista que não há qualquer timbre ou identificação do responsável pelas transcrições.
Ao meu ver, tais alegações não podem ser examinadas neste momento, seja porque não há elementos suficientes para formar um juízo seguro a respeito, seja porque a validade probante que será dada ao material em análise não dispensa exame aprofundado da prova. A propósito, é pacífica a jurisprudência no sentido de que o 'habeas corpus' não se presta a exame de prova.
.............................." (fls. 60 verso)

4. O ARGUMENTO DA FALTA DE CIENTIFICAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO (art. 6º, caput, da Lei 9.296/96).

Sustentam os impetrantes:
"..............................
A Lei nº 9.296/96 impôs a intimação obrigatória do Ministério Público não por desconfiança dos juízes, mas sim porque é natural que a autoridade judiciária, por estar envolvida na investigação, pode não perceber alguma ilegalidade porventura existente (aliás, o correto seria, neste tipo de procedimento, que outro juiz fosse o responsável pelo julgamento final da ação)...
...Portanto, se a lei estabelece a necessidade de cientificação do Ministério Público - medida esta que objetiva o acompanhamento da regularidade constitucional das investigações policiais -, e se o juiz não observa tal formalidade, deparamo-nos com outra ilegalidade e inconstitucionalidade da interceptação telefônica objeto do presente processo. Trata-se de caso de nulidade absoluta.
.............................." (fls. 32/33)

A análise que pretendem os impetrantes com essa alegação não é possível ser realizada em habeas corpus, salvo em caso de prova irrefutável do alegado.
É que o remédio heróico não prevê o estabelecimento de um confronto direto entre defesa e acusação, valendo-se, tão-somente, da prova documental pré-constituída da defesa dos réus.
A resposta definitiva para a alegação dos impetrantes somente seria possível com o exame minucioso dos autos da investigação para verificar se o Ministério Público, de fato, foi alijado no acompanhamento das conversas telefônicas.
Com a documentação aqui trazida, bem como da análise dos acórdãos do TRF/4ª Região e do STJ não parece ser essa a melhor suposição.
Em primeiro lugar porque o juízo federal na decisão de decretação da escuta (fls. 145/147) expressamente determinou à autoridade policial que se desse ciência da condução dos procedimentos de interceptação ao Ministério Público.
Leio trecho da decisão:
"...........................
Expeçam-se os competente alvará de escuta telefônica, bem como ofícios à Receita Federal e às instituições financeiras (Banco BCN, Banrisul, HSBC Bamerindus, Santander, América do Sul, Banco do Brasil e Boa Vista), conforme pleiteado às fls. 9/12 do ofício requerente.
Deverá a autoridade policial, quando da condução dos procedimentos de interceptação, dar ciência ao Ministério Público Federal, nos termos do artigo 6º da Lei nº 9.296/96.
..........................." (fls. 147 - grifo nosso)

E arrematou:
"...........................
Vindo as informações das diligências efetuadas pela autoridade policial, dê-se vista ao Ministério Público Federal.
..........................." (fls. 147)

Ao contrário do que pretende transparecer os impetrantes, a responsabilidade pela ciência do Ministério Público é, nos termos do art. 6º, caput, da polícia que investiga.
"Art. 6º Deferido o pedido, a autoridade policial conduzirá os procedimentos de interceptação, dando ciência ao Ministério Público, que poderá acompanhar a sua realização."

Em segundo lugar, a leitura da denúncia não revela surpresa, novidade ou desconhecimento por parte do Procurador da República.
Ao contrário, ao longo de toda peça inicial, o que se denota é prévio acompanhamento das diligências empreendidas pela autoridade policial, tanto que há farta utilização dos dados obtidos nas interceptações para subsidiar as alegações da denúncia.
Observe-se que entre a data da apresentação do último lote de CDs com as gravações telefônicas ao juízo federal (14.11.2001 - fls. 340) e a data do oferecimento da denúncia (4.12.2001 - fls. 127) perpassaram apenas 20 dias.
A riqueza de informações, detalhes e circunstâncias, bem como a comprovação de tais dados com as gravações feitas, somente encontra explicação no prévio conhecimento do Ministério Público das providências que estavam sendo tomadas.
Portanto, os elementos nos autos não permitem uma resposta definitiva acerca da cientificação do Ministério Público, muito embora seja de se supor que a informação estava sendo prestada ao MP.
Não se configura, nessa via, violação do art. 6º, caput, da Lei 9.296/96.

5. O ARGUMENTO DA INVESTIGAÇÃO DE CRIMES PUNÍVEIS COM PENAS DE DETENÇÃO (art. 2º, inciso III, da Lei 9.296/96).

Os impetrantes asseveram:
"..............................
Ora, dos crimes capitulados na denúncia, os únicos cuja lei penal atribui a pena de reclusão são os previstos nos arts. 288 do CP, art. 22 da Lei nº 7.492/86 e art. 1º da Lei nº 9.613/98. Todos os demais (sonegação fiscal, medicamentos em desacordo com receita médica, venda de substâncias nocivas à saúde e usura) são punidos com pena de detenção. Não parece possível sustentar-se a legitimidade das interceptações telefônicas que digam respeito a estes últimos delitos, tendo em vista a vedação enunciada no art. 2º, inc. III, da Lei nº 9.296/96.
.............................." (fls. 37)

Para o impetrante a interceptação telefônica estaria inabilitada a subsidiar a denúncia com base nos crimes apenáveis com detenção, conforme art. 2º, III, da Lei 9.296/96:
Art. 2º Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:
..............................
III - o fato investigado constituir infração pena punida, no máximo, com pena de detenção;

Não me parece que a interpretação literal proposta pelos impetrantes deva subsistir.
O art. 2º, inciso III, da Lei 9.296/96 tem endereço certo.
Não é possível que crime punível, no máximo, com detenção sirva de justificativa para a autorização da interceptação.
A explicação é simples: sendo intervenção drástica na privacidade do cidadão, a interceptação somente pode ser motivada com base em crime grave, no Brasil, punível, pelo menos, com pena de reclusão.
Tenta-se evitar, assim, a banalização do procedimento de interceptação telefônica com o início da diligência pautado na apuração de crime com menor gravidade.
Ocorre que o presente caso apresenta fatos e circunstâncias que supostamente demonstram a prática de diversos crimes, tidos assim como crimes conexos.
Com base nos indícios e provas levantadas, tanto na investigação policial como pela apuração trazida pela CPI, com relação aos crimes que prevêem penas de reclusão - tais como o de formação de quadrilha, evasão de divisas e o de lavagem de dinheiro praticado por organização criminosa - foi requerida a interceptação telefônica.
Assim a DELEFAZ justifica seu pedido:
"..............................
As investigações realizadas, pela Equipe de Análise desta Delegacia de Polícia Federal, noticiam que a Rede formada por JUAREZ e WILSON evidenciam:
- A dissimulação da condição de rede de farmácias, constituindo empresas em nomes de terceiros, "laranja". Figura, também, como "laranjas" empregadas domésticas, e pessoas sem poder aquisitivo para a capitalização da empresa.
- A evasão de divisas, através de empresa WINTRY & WHINTSUN PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS LTDA, sociedade originária das empresas uruguaias WHITSUN INVESTMENTS S/A e WINTRY GROUP S/A, na qual outorgaram poderes gerais para NERCY DAS GRAÇAS LOPES CAVALI irmã de WILSON LOPES e JULIANA MARIN, filha de JUAREZ MARIN;
- A sonegação fiscal, através da abertura de lojas em nome de terceiros, da utilização de inventários fictícios, das diferenças entre as compras e vendas efetivadas, das irregularidades dos lançamentos de alíquotas.
- a organização criminosa, pela busca cada vez maior de penetração social e econômica, assim como pela obtenção sempre mais ampla de poder.
.............................." (fls. 133)

Com base no pleito da autoridade policial, o juízo federal deferiu o pedido e autorizou a interceptação telefônica.
A interceptação telefônica, portanto, deu-se de maneira legal e legítima.
Diante das informações e dados obtidos com a diligência, verificou-se a presença de provas a fundamentar a denúncia com base em outros crimes.
Pergunta-se, não é possível a utilização de procedimento legal e legítimo de interceptação telefônica já executada para demonstrar a presença de novos crimes conexos aos primeiros?
Se são crimes diferentes praticados, muitas vezes, por uma única atuação, como fazer para ignorar a presença da prova se ela foi produzida de forma legítima e com a autorização judicial?
Entendo que a resposta deve ser afirmativa.
Se a escuta telefônica - repito, executada de forma legal - acabou por trazer novos elementos probatórios de outros crimes que não geraram o pleito das gravações, especialmente quando são conexos, podem e devem ser levados em consideração.
De outra forma, nunca seria possível a interceptação telefônica para a investigação de crimes apenados com reclusão quando forem estes conexos com crimes punidos com detenção.
Além disso, na análise de crimes conexos a fundamentação e o embasamento probatório de um crime aproveita outro, já que se tratam de crimes a partir de iguais práticas ou ainda delitos que englobam outros.
Como fazer para entender que a prova é legítima para uns e para outros não pode ser ela utilizada?
Não foi esse o sentido pretendido pela lei.
Vale ressaltar, ainda, que se constitui em tendência mundial a possibilidade de quebra do sigilo telefônico em crimes considerados graves "porque somente eles podem tolerar essa ingerência na intimidade alheia".
Dentre esses crimes geralmente são indicados crimes como o terrorismo, o tráfico de drogas, a quadrilha e os crimes contra a ordem econômica ou financeira.
Muito embora a Lei 9.296/96 tenha adotado modelo mais elástico, desde as primeiras propostas nunca se deixou de lado da investigação por intermédio da interceptação crimes como o de quadrilha, os crimes contra a ordem econômica e financeira e outros decorrentes de organização criminosa.
Tais crimes constaram do projeto de lei nº 3514/89, apresentado à Câmara dos Deputados pelo então Deputado Federal Miro Teixeira, fruto dos estudos de grupo de trabalho especialmente designado para essa finalidade.
Tais delitos comumente associados à investigação por escuta telefônica são, rigorosamente, os que fundamentaram o requerimento da polícia no presente processo: a evasão de divisas (art. 22 da Lei 7.492/86), a formação de quadrilha (art. 288 do CP) e a lavagem de dinheiro por meio de organização criminosa (art. 1º, VI e VII, da Lei 9.613/98).
Por isso, entendo ser plenamente constitucional a utilização de material de interceptação telefônica para a embasar a denúncia dos crimes apenados com pena de reclusão e os crimes, que embora sejam punidos com detenção, sejam conexos àqueles.

A CONCLUSÃO.
Diante de todo o exposto, indefiro o pedido de habeas corpus.

* acórdão pendente de publicação

Ausência de Prequestionamento. RE. Provimento. Prevalência de Decisão do STF (Transcrições)

(v. Informativo 364)


AI 375011 AgR/RS*

RELATORA: MINISTRA ELLEN GRACIE
Relatório: Eis o teor do despacho agravado:
"Não se encontram prequestionados os dispositivos constitucionais (artigos 2º; 18, caput; 29, caput; 34, VII, "c"; 37, XIII; 40, § 8º; 61, § 1º, II, "a" e "c"; 167, IV, e 169) em que busca apoio a petição de recurso extraordinário, pois embora suscitados na petição de apelação (fls. 35/44), não foram apreciados pelo acórdão recorrido, ao qual não foram opostos os competentes embargos de declaração, imprescindíveis a suprir eventual omissão (Súmulas 282 e 356).
Nego seguimento ao agravo." (fl. 107)

Nas razões do presente regimental o Município de Porto Alegre alega, em síntese, que a matéria dos autos se encontra devidamente prequestionada, uma vez que, para a observância deste requisito, basta a veiculação do tema constitucional tido como violado, sendo desnecessária a menção expressa ao artigo da Constituição.
Aduz que o entendimento do acórdão recorrido foi rechaçado pelo Plenário desta Corte por ocasião do julgamento do RE 251.238, quando se julgou inconstitucional o art. 7º e parágrafos da Lei nº 7.428/94, com a redação dada pelo art. 2º da Lei nº 7.539/94, ambas do Município de Porto Alegre.
Requer, ao final, o provimento do presente agravo regimental e, desde já, do recurso extraordinário inadmitido na instância a quo.
É o relatório.
Voto: 1. O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, ao prolatar o acórdão recorrido, aplicou ao caso dos autos o entendimento manifestado por seu Órgão Especial no julgamento da ADI nº 595.067.943, quando se declarou a constitucionalidade do disposto no art. 7º da Lei nº 7.428/94 do Município de Porto Alegre, com a redação da Lei nº 7.539/94, que previa o reajuste automático bimestral dos vencimentos dos servidores municipais pela variação de índice de entidade particular (ICV-DIEESE).
O Plenário desta Corte, entretanto, ao julgar o RE 251.238, rel. para o acórdão Min. Nelson Jobim, DJ de 23/08/2002, entendeu, em decisão majoritária, que esta norma ofende o postulado da autonomia municipal, declarando a sua inconstitucionalidade.
Na decisão ora agravada, apontei a ausência de prequestionamento dos dispositivos constitucionais tido como violados, porquanto a Corte gaúcha tão-somente aplicou a orientação firmada na mencionada ação direta de inconstitucionalidade - cujo acórdão não consta do traslado do presente agravo de instrumento-, sem fazer referência aos fundamentos utilizados para chegar à declaração de constitucionalidade das referidas normas municipais.
2. A despeito de a questão de fundo estar pacificada no âmbito desta Suprema Corte em relação às demandas que tratem sobre o mesmo tema, ainda assim se exige a presença dos pressupostos específicos de conhecimento do recurso extraordinário, como é o caso do prequestionamento. Foi o que decidiu a Primeira Turma desta Corte no julgamento de caso idêntico ao presente: AI 383.617-AgR, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 27/09/2002.
Estou, entretanto, mais inclinada a valorizar, preponderantemente, as manifestações do Tribunal, especialmente as resultantes de sua competência mais nobre - a de intérprete último da Constituição Federal.
Já manifestei, em ocasiões anteriores, minha preocupação com requisitos processuais que acabam por obstaculizar, no âmbito da própria Corte, a aplicação aos casos concretos dos precedentes que declaram a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade de normas. Ao votar, na Primeira Turma no RE 222.874-AgR-ED, de que fui relatora, expressei-me da seguinte forma:
"Entendo que este Supremo Tribunal deve evitar a adoção de soluções divergentes, principalmente em relação a matérias exaustivamente discutidas por seu Plenário. Manifestei esta posição no julgamento da Ação Rescisória 1.713, de que fui relatora (Plenário, unânime, DJ 19/12/2003):
'Sobre a rescisória ajuizada com base no art. 485, V do CPC, quando em jogo a violação de dispositivo constitucional, asseverou o eminente Ministro Gilmar Mendes ao proferir seu voto no RE 235.794-AgR, que 'a manutenção de soluções divergentes, em instâncias inferiores, sobre o mesmo tema, provocaria, além da desconsideração do próprio conteúdo da decisão desta Corte, última intérprete do texto constitucional, a fragilização da força normativa da Constituição.' No presente caso, da mesma forma, a manutenção da decisão proferida por esta Corte, permitindo a majoração de alíquotas do FINSOCIAL recolhido por empresa seguradora, fragilizaria a força normativa dos art. 195 da CF e 56 do ADCT.'
A adoção no âmbito desta Corte de decisões contraditórias compromete a segurança jurídica, porque provoca nos jurisdicionados inaceitável dúvida quanto à adequada interpretação da matéria submetida a esta Suprema Corte."

Com efeito, o Supremo Tribunal Federal, em recentes julgamentos, vem dando mostras de que o papel do recurso extraordinário na jurisdição constitucional está em processo de redefinição, de modo a conferir maior efetividade às decisões.
Recordo a discussão que se travou na Medida Cautelar no RE 376.852, de relatoria do Ministro Gilmar Mendes (Plenário, por maioria, DJ de 27.03.2003). Naquela ocasião, asseverou Sua Excelência o caráter objetivo que a evolução legislativa vem emprestando ao recurso extraordinário, como medida racionalizadora de efetiva prestação jurisdicional.
Registro também importante decisão tomada no RE 298.694, rel. Min. Pertence, por maioria, DJ 23/4/2004, quando o Plenário desta Casa, a par de alterar antiga orientação quanto ao juízo de admissibilidade e de mérito do apelo extremo interposto pela alínea "a" do permissivo constitucional, reconheceu a possibilidade de um recurso extraordinário ser julgado com base em fundamento diverso daquele em que se lastreou a Corte a quo.
Esses julgados, segundo entendo, constituem um primeiro passo para a flexibilização do prequestionamento nos processos cujo tema de fundo foi definido pela composição plenária desta Suprema Corte, com o fim de impedir a adoção de soluções diferentes em relação à decisão colegiada. É preciso valorizar a última palavra - em questões de direito - proferida por esta Casa.
Destaco, outrossim, que o RE 251.238 foi provido para se julgar procedente ação direta de inconstitucionalidade da competência originária do Tribunal de Justiça estadual, processo que, como se sabe, tem caráter objetivo, abstrato e efeitos erga omnes. Esta decisão, por força do art. 101 do RISTF, deve ser imediatamente aplicada aos casos análogos submetidos à Turma ou ao Plenário. É essa a orientação firmada pela 1ª Turma desta Casa no RE 323.526, rel. Min. Sepúlveda Pertence, unânime, DJ 31/5/2002, resumido na seguinte ementa:
"Declaração, pelo Plenário do STF, no julgamento do RE 251.238-RS (red. para acórdão Nelson Jobim, 7.11.2001, Inf. 249), de inconstitucionalidade do art. 7º e parágrafos da L. 7.428/94, com a redação dada pela L. 7.539/94, do Município de Porto Alegre, que previam o reajuste automático bimestral dos vencimentos dos servidores municipais pela variação do índice de entidade particular (ICV-DIEESE).
Aplicação do art. 101 RISTF, a teor do qual - salvo proposta de revisão por qualquer dos Ministros - a declaração plenária de constitucionalidade ou inconstitucionalidade de lei será de logo aplicada aos novos feitos submetidos à Turma ou ao Plenário: recurso extraordinário do Município conhecido e provido."

Lembro que estamos a tratar de uma lide envolvendo inúmeros servidores do Município de Porto Alegre e causa espécie a possibilidade de alguns deles saírem vitoriosos, a despeito da inconstitucionalidade das leis municipais nas quais basearam sua pretensão. Isso porque estaríamos diante de uma situação anti-isonômica, em que entre dois funcionários que trabalhem lado a lado e exerçam iguais atribuições, exista diferença de vencimento, pelo fato de um deles restar vencedor na sua demanda, em virtude de falta de prequestionamento da matéria constitucional suscitada no RE da municipalidade, enquanto que ao outro, em cujo processo estava atendido tal requisito de admissibilidade do apelo extremo, aplicou-se a orientação do Supremo Tribunal Federal e rejeitou-se a sua pretensão. Esta Corte não pode admitir tal disparidade de tratamento de situações idênticas.
Existe ainda outra circunstância que demanda uma solução uniforme por esta Casa: o Ministro Nelson Jobim, em seu voto no já citado RE 251.238 demonstrou os prejuízos às finanças do Município de Porto Alegre, com a manutenção do art. 7º da Lei 7.428/94. Ou seja, a manutenção dos reajustes baseados na lei municipal impediria o atendimento das limitações impostas aos gastos com pessoal pela Lei Camata (LC nº 82/95).
Registro, por fim, que todos os argumentos lançados pelo Tribunal a quo para declarar a constitucionalidade da norma municipal em comento, são conhecidos nesta Corte, pois foram exaustivamente debatidos na sessão que julgou o RE 251.238.
Por estas razões, entendo que o simples fato de constar do acórdão da origem a declaração de constitucionalidade do disposto no art. 7º da Lei nº 7.428/94 do Município de Porto Alegre, com a redação da Lei nº 7.539/94, mesmo que desacompanhadas do aresto que julgou o leading case, autoriza o conhecimento e o provimento do recurso extraordinário.
3. Diante do exposto, dou provimento ao presente agravo regimental, para, com fundamento no art. 544, § 4º do CPC, conhecer do agravo e, desde logo, dar provimento ao recurso extraordinário. Invertam-se os ônus da sucumbência, ressalvada a hipótese de concessão de justiça gratuita.


* acórdão pendente de publicação


Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
informativo@stf.jus.br

 
Praça dos Três Poderes - Brasília - DF - CEP 70175-900 Telefone: 61.3217.3000

Informativo STF - 365 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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