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terça-feira, 4 de novembro de 2008

Informativo STF 352 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF


Brasília, 14 a 18 de junho de 2004 - Nº 352.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO


Plenário
Assédio Sexual e Ausência de Provas
Nulidade de Atos: Preclusão
Vinculação de Custas Judiciais e Entidades Privadas - 2
Obrigatoriedade de Seguro Garantia
Reserva Remunerada e Novo Cargo
1ª Turma
Limite de Cognição em HC - 2
2ª Turma
Arresto e Princípio do Devido Processo Legal
Clipping do DJ
Transcrições

Concurso Público: Limite Mínimo de Altura e Previsão Legal (AI 460131 AgR/DF)
Assédio Sexual e Ausência de Provas (Inq 2033/DF)
PLENÁRIO


Assédio Sexual e Ausência de Provas

O Tribunal, por maioria, rejeitou queixa-crime apresentada por servidora do STJ na qual imputava a Ministro dessa Corte suposta prática do crime de assédio sexual (CP, art. 216-A: "Constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função."). Entendeu-se temerário o recebimento da queixa-crime, em razão da inconsistência das provas apresentadas com a inicial e da falta de perspectiva da eventual ação penal. Ressaltou-se que não basta a narração dos fatos ou circunstâncias criminosas que se atribuem ao querelado para o recebimento da queixa-crime, sendo necessário que as alegações estejam minimamente embasadas em provas ou, ao menos, indícios da efetiva ocorrência dos fatos, o que não teria ocorrido na espécie. Vencido o Min. Marco Aurélio que recebia a queixa-crime por considerar que os fatos narrados, em tese, estariam enquadrados na figura descrita no art. 216-A, do CP. Leia o inteiro teor do voto do relator na seção de Transcrições deste Informativo.
Inq 2033/DF, rel. Min. Nelson Jobim, 16.6.2004. (Inq-2033)

Nulidade de Atos: Preclusão

O Tribunal resolveu questão de ordem apresentada pelo Min. Marco Aurélio em ação cível originária proposta pelo Estado do Paraná contra a União, em que se pretende o ressarcimento de despesas decorrentes de construção de estrada de ferro, em razão de convênios celebrados entre as partes - v. Informativos 116, 254, 299 e 323. Na espécie, o Estado do Paraná protocolizara petição na qual requeria a declaração da nulidade do julgamento, em face da ausência de sua intimação para se pronunciar sobre complementação de perícia determinada pelo relator, Min. Ilmar Galvão, e documentos juntados pela União, e, em conseqüência, a abertura de vista para esse fim. Entendeu-se que a matéria levantada estava preclusa, em virtude de não ter sido alegada na primeira oportunidade em que ao Estado coubera falar nos autos, na hipótese, quando incluído o processo em pauta ou, ainda, na assentada em que ocorrera o pregão e o início do julgamento, não sendo, outrossim, caso de nulidade que se devesse decretar de ofício ou de prova pela parte de legítimo impedimento (CPC: "Art . 245. A nulidade dos atos deve ser alegada na primeira oportunidade em que couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão. Parágrafo único. Não se aplica esta disposição às nulidades que o juiz deva decretar de ofício, nem prevalece a preclusão, provando a parte legítimo impedimento."). O processo continuou com vista ao Min. Marco Aurélio para o exame do mérito.
ACO 453 QO/PR, rel. Marco Aurélio, 17.6.2004. (ACO-453)

Vinculação de Custas Judiciais e Entidades Privadas - 2

Tribunal resolveu questão de ordem apresentada pelo Min. Gilmar Mendes, relator, em ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Procurador-Geral da República contra os artigos 22 e 28 da Lei 12.381/94, do Estado do Ceará, que instituiu o Regimento de Custas desse Estado - v. Informativo 351, no sentido de explicitar o voto proferido na sessão plenária de 9.6.2004, para estender a declaração de inconstitucionalidade ao art. 5º e ao parágrafo único do art. 25 da lei cearense, impugnados pelo titular da ação somente em seu parecer. Rejeitou-se, por maioria, a preliminar suscitada pela Advocacia-Geral da União de não conhecimento da ação, em face da ausência de impugnação, na inicial, de todos os artigos mencionados no parecer. Entendeu-se que os dispositivos combatidos na peça inaugural possuíam autonomia suficiente a justificar uma declaração de inconstitucionalidade a eles restrita. Vencido o Min. Marco Aurélio que não conhecia da ação por considerar que o Tribunal estaria vinculado ao pedido inicialmente formulado. No mérito, tendo em conta que os dispositivos possuíam teor análogo, que a causa de pedir era idêntica e, ainda, que a declaração de inconstitucionalidade dos artigos impugnados na inicial acabariam por atingir os acrescidos no parecer, tornando-os inaplicáveis, retificou-se o voto anteriormente proferido e declarou-se a inconstitucionalidade dos artigos 22 e 28 e, por arrastamento, das expressões "acrescida e calculada juntamente com a Taxa Judiciária e quotas para a Associação Cearense dos Magistrados, para a Associação Cearense do Ministério Público e para a Caixa de Assistência dos Advogados", constante do caput do art. 5º, e "outra para o recolhimento dos valores destinados aos órgãos de classe especificados no Art. 5º desta Lei", contida no parágrafo único do art. 25, todos da Lei 12.381/94 ("Art. 5º - Custas prévias, acrescida e calculada juntamente com a Taxa Judiciária e quotas para a Associação Cearense dos Magistrados, para a Associação Cearense do ministério Público e para a Caixa de Assistência dos Advogados, são recolhidas no início do processo no 1º grau de Jurisdição, e abrangem a entrega da petição inicial na Portaria do Foro, distribuição, autuação, citação, notificação ou intimação, demais atos de processamento, julgamento, registro, intimação e publicação da sentença.... Art. 25 -... Parágrafo Único - As guias de recolhimento das custas totais serão duas: uma para o recolhimento dos valores do FERMOJU e Taxa Judiciária; outra para o recolhimento dos valores destinados aos órgãos de classe especificados no Art. 5º desta Lei.").
ADI 2982 QO/CE, rel. Min. Gilmar Mendes, 17.6.2004. (ADI-2982)

Obrigatoriedade de Seguro Garantia

O Tribunal deu parcial provimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão do TJ/RJ, que julgara improcedente pedido de representação de inconstitucionalidade proposta contra a Lei Complementar 35/98, do Município do Rio de Janeiro, que dispõe sobre o licenciamento de obras de projetos de construção de unidades multifamiliares ou comerciais e exige das empresas de construção civil a prévia apresentação de apólice de seguro de garantia da obra, com a finalidade de proteger a relação contratual estabelecida com os futuros compradores dos imóveis, e contra o Decreto 16.712/98, que a regulamentou, a fim de emprestar às normas municipais interpretação conforme a Constituição Federal, e julgá-las ineficazes a partir da data da publicação da Medida Provisória 2.221/2001. Entendeu-se que a exigência da apresentação prévia da apólice de seguro garantia estaria dentro dos limites da competência municipal de legislar sobre assuntos de interesse local, no caso, os requisitos para a concessão de licenciamento para construção de imóveis no território do Município (CF, art. 30, I), visto que as normas impugnadas não teriam criado o seguro, cuja competência caberia privativamente à União (CF, art. 22, VII), mas apenas exigido seguro, cuja obrigatoriedade norma federal estabelecera (Decreto-Lei 73/66: "Art 20. Sem prejuízo do disposto em leis especiais, são obrigatórios os seguros de:... e) garantia do cumprimento das obrigações do incorporador e construtor de imóveis;"). Não obstante, ressaltou-se o fato de que essa obrigatoriedade teria sido extinta, em face da revogação da alínea e do art. 20 do Decreto-Lei 73/66 pelo art. 4º da Medida Provisória 2.221, publicada em 6.9.2001, que alterou a Lei 4.591/64 e instituiu o patrimônio de afetação nas incorporações imobiliárias. Concluiu-se que, em razão disso, a LC 35/98 e seu decreto regulamentador não têm eficácia plena e aplicabilidade até que sobrevenha legislação federal que restabeleça a compulsoriedade do mencionado seguro de garantia. Vencido o Min. Marco Aurélio, que conhecia do recurso, mas lhe negava provimento, sob o fundamento de que o advento da MP 2.221/2001 seria fato superveniente que não poderia ser considerado no recurso extraordinário, cuja análise estaria adstrita às questões previamente debatidas no Tribunal de origem.
RE 390458/RJ, rel. Min. Carlos Velloso, 17.6.2004. (RE-390458)

Reserva Remunerada e Novo Cargo

O Tribunal iniciou julgamento de mandado de segurança impetrado por oficial da Marinha contra ato do Presidente da República e do Diretor de Pessoal da Marinha, consistente na negativa de autorização de posse do impetrante no cargo de professor na Universidade Federal do Estado do Ceará, para o qual fora habilitado por meio de concurso público, tornando insubsistente ato de posse autorizado anteriormente pelo Ministro da Administração Federal, que determinara a agregação do impetrante para fins de reserva remunerada. A Min. Ellen Gracie, relatora, indeferiu a segurança e cassou a liminar concedida, com base na jurisprudência do STF no sentido de que a investidura de militar em novo cargo, com sua conseqüente transferência para a reserva remunerada, está subordinada à autorização do Presidente da República, de acordo com o §3º do art. 98 da Lei 6.880/80, norma recebida pelo §9º do art. 42 da CF, na sua redação original, que expressamente remete, à lei ordinária, o estabelecimento das condições de transferência dos militares para a inatividade. Acompanharam o voto da relatora os Ministros Joaquim Barbosa, Carlos Britto e Cezar Peluso. O Min. Marco Aurélio, em divergência, concedeu a segurança, por considerar que, diante das peculiares do caso, e em prol da segurança jurídica, não se poderia admitir que os procedimentos administrativos anteriores, que autorizaram a posse e passagem do impetrante para reserva remunerada, não tivessem gerado efeitos válidos. Após, o Min. Carlos Velloso pediu vista.
MS 22369/RJ, rel. Min. Ellen Gracie, 17.6.2004. (MS-22369)

PRIMEIRA TURMA


Limite de Cognição em HC - 2

A Turma retomou julgamento de habeas corpus, substitutivo de recurso ordinário, impetrado contra acórdão do STJ que denegara igual medida, sob fundamento de inviabilidade de reexame minucioso da prova na sede eleita. Trata-se, na espécie, de condenado por corrupção ativa, em ação penal originária ajuizada perante o TJ/RJ, que pretende a anulação da decisão condenatória, sob as alegações de ausência de vinculação entre ele e os fatos que ensejaram a sua condenação e de impossibilidade de condenação do corruptor diante da absolvição do corrompido - v. Informativo 349. O Min. Joaquim Barbosa, relator, retificou o voto que proferira na sessão de 20.4.2004, para conhecer do habeas corpus, por entender que o STJ teria analisado o mérito da impetração. O relator entendeu ser o caso, também, de conhecimento da ordem para exame das questões levantadas pelo Min. Cezar Peluso, na sessão de 25.5.2004 - na qual concedera a ordem de ofício e devolvera ao STJ para novo julgamento - e que seriam as seguintes: a falta de correlação entre a acusação e a sentença; a equivocada avaliação de duas circunstâncias judiciais do art. 59, do CP, para fixação da pena (consideração de duas ações penais, ainda em curso, como maus antecedentes e o motivo invocado: enriquecimento fácil à custa das economias das camadas mais pobres da sociedade nas quais se recrutariam os apostadores do jogo do bicho e outros semelhantes, o que seria estranho ao crime pelo qual o paciente teria sido condenado) e a falta de motivação do acórdão condenatório quanto ao aumento da pena por força da continuidade delitiva. A Turma, por unanimidade, conheceu do writ. No mérito, o relator denegou a ordem quanto aos seus fundamentos originais por estas razões: 1) a existência de prova suficiente para a condenação do paciente pela prática da participação em crime de corrupção ativa; 2) o fato de ter o paciente gerido um fundo destinado à distribuição de propina que era efetivada por intermediários; 3) a existência de condenação de diversas pessoas por corrupção passiva, tanto nos autos principais quanto nos autos em que o paciente figurou como réu, em razão de terem recebido propina proveniente do fundo gerido pelo paciente, o que afastaria a tese de ofensa ao princípio da bilateralidade. Asseverou que não teria havido ausência de correlação entre a denúncia e a condenação, visto que o paciente não fora denunciado pelo Ministério Público como executor material do crime de corrupção, mas como partícipe do mesmo, em virtude de gerir um fundo voltado à distribuição de propina, tendo sido condenado pela participação. Da mesma forma, indeferiu a ordem, quanto aos demais fundamentos apresentados pelo Min. Cezar Peluso, que estariam relacionados à fixação da pena. Entendeu o relator que a existência ou não de maus antecedentes do paciente seria circunstância irrelevante, por si só, haja vista que todas as demais circunstâncias apontadas seriam desfavoráveis ao paciente, as quais teriam sido minuciosamente analisadas pelo acórdão condenatório. Além disso, considerou ser óbvio tratar-se de corrupção para impedir a atuação do Estado no combate ao jogo do bicho e que a participação do paciente, na qualidade de financiador de todo o sistema, estaria associada a essa contravenção penal, fato devidamente demonstrado nos autos que não poderia ser ignorado para fins de fixação da pena. Afastou a alegada falta de justificação de aumento da pena pela continuidade delitiva por entender que o acórdão condenatório teria justificado adequadamente esse aumento, haja vista ter apontado, em extenso laudo, o número de crimes praticados pelo paciente, as datas das respectivas ocorrências e os valores das propinas. Após, pediu vista o Min. Cezar Peluso.
HC 83658/RJ, rel. Min. Joaquim Barbosa, 15.6.2004. (HC-83658)

SEGUNDA TURMA


Arresto e Princípio do Devido Processo Legal

Por não vislumbrar ofensa aos princípios da ampla defesa e do devido processo legal na decretação de arresto dos bens do recorrente, a Turma manteve acórdão do TJ/RO que confirmara decisão que acolhera medida cautelar de arresto e indisponibilidade de bens ajuizada pelo Ministério Público estadual (Lei 6.204/74) com base em inquérito conduzido pelo Banco Central, em intervenção extrajudicial no banco do Estado do qual o recorrente era administrador, e no qual fora apontado como responsável pela ocorrência de prejuízos durante sua gestão. Entendeu-se que o arresto é medida cautelar regulada na legislação processual civil com o objetivo de garantir a efetividade de possível execução, não representando, por conseguinte, julgamento prévio ou ingerência patrimonial indevida e que, na espécie, a referida medida visava resguardar interesse público, já que em risco o patrimônio público e o dos clientes da instituição. Ressaltou-se, ainda, que a decisão que decretara o arresto encontrava-se devidamente fundamentada, presentes o fumus boni iuris e o periculum in mora, requisitos que não podem ser contestados em sede extraordinária, o que impediria o exame, pelo STF, do relatório do Banco Central, que concluíra pela responsabilidade do recorrente.
RE 379128/RO, rel. Min. Ellen Gracie, 15.6.2004. (RE-379128)

Sessões

Ordinárias

Extraordinárias

Julgamentos

Pleno

16.6.2004

17.6.2004

6

1a. Turma

15.6.2004

----

19

2a. Turma

15.6.2004

----

100



C L I P P I N G    D O    D J

18 de junho de 2004
ADI 2.424-CE
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade. 2. Lei nº 13.084, de 29.12.2000, do Estado do Ceará. Instituição de taxa de serviços prestados por órgãos de Segurança Pública. 3. Atividade que somente pode ser sustentada por impostos. Precedentes. 4. Ação julgada procedente.
* noticiado no Informativo 342

Acórdãos Publicados: 135

T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
_______________________________________

Concurso Público: Limite Mínimo de Altura e Previsão Legal (Transcrições)
(v. Informativo 351)

AI 460131 AgR/DF*

RELATOR: MINISTRO JOAQUIM BARBOSA

Relatório: É este o teor do despacho com que neguei seguimento ao agravo de instrumento:
"1. Trata-se de agravo de instrumento interposto pelo Distrito Federal de decisão que não admitiu recurso extraordinário contra acórdão da 1ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios que manteve sentença que entendeu que o limite mínimo de 1,65 m de altura para a admissão ao curso de formação de policial militar do Distrito Federal contraria a Constituição Federal por não ser previsto em lei.
2. Alegam os recorrentes violação aos arts. 5º, Caput e 37, I e II, da Constituição, uma vez que não poderia o Edital nº 234/98 fixar altura mínima para ingresso nos quadros da polícia militar. É que a legislação ordinária que regularia a matéria (Lei nº 7.289/84 que dispõe acerca do estatuto dos policiais militares da Polícia Militar do Distrito Federal) não faz qualquer ressalva acerca de altura mínima para admissão no quadro, mas apenas expressamente exige o cumprimento da exigência de possuir capacidade física. A falta de previsão legal explícita estaria a caracterizar descumprimento de preceitos constitucionais, como o princípio da legalidade - ao criar requisito não previsto em lei - e o princípio da isonomia - ao estabelecer fator discriminatório ilegítimo no edital.
3. Após o exame dos autos e da legislação pertinente, chega-se à conclusão de que, com efeito, a Lei 7.289/84, em seu art. 11, não veda a admissão ao curso de formação de policial militar do Distrito Federal aos menores de 1,65 m, mas tão-somente, e de forma aberta, preceitua que a matrícula nos estabelecimentos de ensino policial militar respeitará 'condições relativas à nacionalidade, idade, aptidão intelectual, capacidade física e idoneidade moral.'
Nesse sentido, entendo por inaplicável a jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal que autoriza a fixação, em lei, de altura mínima para o ingresso no serviço público, a depender das peculiaridades e especificidades da atividade pública a ser exercida, mesmo para a carreira específica de policial militar (conforme, RE 148.095, rel. min. Marco Aurélio; e RE 176.081, rel. min. Octávio Gallotti).
Não havendo qualquer limitação de estatura prevista em lei ordinária, não pode o edital arbitrar uma altura mínima abaixo da qual se vedaria o ingresso na carreira de policial militar, isso porque os arts. 37, I, 143, § 3º, da Constituição, estabelecem verdadeira reserva legal e, por isso, somente a lei pode determinar critérios específicos de admissão a cargos militares (MS 20.973, rel. min. Paulo Brossard).
4. Diante do exposto, nego seguimento ao agravo." (Fls. 65-66)

A essa decisão o Distrito Federal opõe agravo regimental em que alega que a decisão agravada, ao permitir o ingresso no serviço público de candidato que não preenchia os requisitos previstos no Estatuto dos Policiais Militares do Distrito Federal e no edital do concurso, ofendeu os arts. 5º, caput, e 37, I e II, da Constituição Federal.
Ademais, alega o agravante que a decisão agravada diverge da jurisprudência desta corte, que considera razoável a exigência de altura mínima para provimento de cargo, a depender da atividade a ser exercida pelo candidato.
Havendo mantido o despacho agravado, trago o agravo para julgamento da Turma.
É o relatório.
Voto: Não tem razão a parte agravante. Como se vê, a decisão agravada teve como fundamento a necessidade de previsão legal (ato normativo primário) para a definição dos requisitos do concurso para provimento de cargos da Polícia Militar do Distrito Federal, e não a razoabilidade de tal exigência como definida pela jurisprudência desta corte, uma vez que a exigência foi feita apenas no edital.
De outra parte, para chegar à conclusão contrária à que chegou o acórdão recorrido - no sentido de inexistir previsão legal para a exigência de altura mínima de 1,65 m para o ingresso na carreira militar - ou para adotar os fundamentos do agravante - de que o requisito de altura mínima está previsto no Estatuto dos Policiais Militares, não sendo arbitrário ou injustificado -, seria necessário analisar previamente o diploma legal que rege a matéria, o que é inadmissível na via extraordinária, segundo entendimento assentado por esta corte no sentido de que a ofensa à Constituição, para que viabilize a interposição do recurso extraordinário, há de verificar-se de forma direta e frontal, e não por via reflexa. (No mesmo sentido, RE 344.833, rel. min. Sepúlveda Pertence, DJ 27.06.2003).
Do exposto, nego provimento ao presente agravo.

* acórdão pendente de publicação

Assédio Sexual e Ausência de Provas (Transcrições)

Inq 2033/DF*

RELATOR: MIN. NELSON JOBIM

Relatório: GLÓRIA MARIA GUIMARÃES DE PÁDUA RIBEIRO PORTELLA, funcionária do STJ, oferece queixa crime contra o Ministro PAULO GERALDO DE OLIVEIRA MEDINA, por assédio sexual (art. 216-A do CP acrescido pela Lei 10.224/01; fls. 02/05).

1. A QUEIXA-CRIME.

Leio, em parte, os fatos trazidos na queixa-crime:
"..............................
A querelante é servidora do Quadro de Pessoal Permanente do Superior Tribunal de Justiça ... No mês de julho de 2001, assumiu a Função Comissionada de Assessora de Ministro, exercendo-a no gabinete do Ministro Paulo Geraldo de Oliveira Medina.
...............................
A partir de fevereiro do corrente ano, o querelado passou a ter, para com a querelante, atitudes estranhas, suspeitas, mas que ela, um pouco perplexa, não conseguiu, imediatamente, interpretar. Enfim, tratava-se de um Ministro do Superior Tribunal de Justiça, de um homem muito mais velho que a querelante, casado, 'amigo' de seu pai, em cuja casa era recebido com deferência e carinho. Eram olhares pouco usuais, palavras de sentido duplo, insinuações.
No mês de março, sem que a querelante modificasse, minimamente, o tratamento respeitoso que sempre dispensou ao querelado, este tentou segurar-lhe as mãos e pediu-lhe que o abraçasse. Naturalmente, a querelante não permitiu que suas mãos fossem seguradas e nem que o Ministro Paulo Medina a abraçasse. Perplexa, assustada, chocada, conseguiu a querelante dizer ao Ministro - tentando minimizar o episódio - a seguinte e literal frase: 'Ministro Medina, não temos aqui nem tempo e nem motivo para apertos de mão ou abraços. Vamos ao trabalho que é efetivamente o que nos deve interessar e interessa'.
..............................
Foi inútil, no entanto, a reação firme da querelante. No final do mês de março ou princípio do mês de abril, mais uma vez viu-se ela, a sós com o querelado, em recinto de seu gabinete. Levava ela ao Ministro, para despacho ou assinatura, processos que havia preparado.
O querelado, fitou a querelante com um olhar enlouquecido, anômalo, totalmente diferente do que ostentava normalmente e, de forma ousada, pediu à querelante que lhe desse um beijo.
Desta feita, a reação da querelante foi mais enérgica ... disse ao Ministro Paulo Medina palavras que se podem traduzir na seguinte frase: 'Ministro Medina, por acaso o senhor está me confundindo com as vagabundas das Minas Gerais? Porque o senhor, com esse tipo de conduta, está afrontando não somente a minha pessoa, mas à sua mulher, ao meu marido, aos seus filhos e aos meus filhos, e, ainda, aos meus pais, que muito lutaram para que seu nome fosse incluído na lista tríplice do Tribunal para a nomeação ao cargo de Ministro'.
Nessa oportunidade, o querelado se desculpou. A querelante - angustiada e sofrida - passou a evitar a companhia do Ministro Paulo Medina; principalmente, passou a evitar estar a sós com ele. Pareceu à querelante - que, até então, só falava de tais fatos com uma amiga, bem mais velha e experiente - que as relações entre ela e o Ministro Paulo Medina poderiam voltar a ser respeitosas e puramente funcionais.
No mês de maio, mais uma vez, a querelante se viu a sós com o querelado, fato inevitável para quem presta assessoria a um ministro de tribunal. E, nessa oportunidade, em voz baixa, o querelado disse à querelante que havia ficado excitado com os 'tapinhas' que esta lhe dera nos ombros. Referia-se, ele, a um episódio ocorrido poucos dias antes: o querelado recebera um telefonema e falara, longamente, com seu interlocutor. Terminado o telefonema, com os olhos cheios de lágrimas, o querelado disse à querelante que sua filha estava se separando e que isto lhe causava sofrimento. Foi quando a querelante deu-lhe, amigavelmente, dois ou três tapinhas no ombro, dizendo-lhe que as coisas haveriam de se acalmar.
A querelante, mais uma vez perplexa, preferiu fingir não ter ouvido o que ouvira do querelado. Dizendo a ele que o coral do tribunal, que ensaiava em sala próxima, não lhe permitira ouvir a frase dita, pediu ao querelado que a repetisse. Mas, o Ministro Paulo Medina não a repetiu.
Natural que a querelante, vivendo este verdadeiro inferno, tentando poupar seu marido e seus pais, sem saber, ao certo, se devia ou não tomar providências legais - enfim, era vítima de um crime (CP, art. 216-A) - acabasse por ter a saúde abalada. E a teve. Buscou amparo médico, que lhe foi dado com indicação de tratamento e recomendação de que se afastasse do trabalho pelo prazo de um mês. O atestado médico, indicando o afastamento, está datado de 24.06.2003...
Neste mesmo dia - 24.06 - mais uma vez o Ministro Paulo Medina assediou a querelante. Vendo-se a sós com ela ... pediu-lhe que o abraçasse. A querelante desta feita, venceu, por inteiro, o temor reverencial e, com a rispidez recomendável, disse ao Ministro Paulo Medina: 'O senhor tenha vergonha e coloque-se no seu lugar'.
Os fatos narrados constituem o crime previsto no art. 216-A, do Código Penal, nele introduzido pela Lei nº 10.224, de 15.05.2001. Por isto, a querelante oferece contra o querelado a presente queixa crime, pedindo que, autuada como inquérito, seja regularmente processada e, afinal, julgada procedente, citando antes o querelado.
..............................".

Determinei a notificação do QUERELADO, para oferecer resposta escrita, no prazo de 15 (quinze) dias (RISTF, art. 233 e L. 8.038/90, art. 4º, caput).
A querelante fez juntar a versão autenticada dos documentos trazidos na inicial (fls. 16/70).

2. A RESPOSTA ESCRITA.

A resposta escrita foi apresentada em 16.9.2003 (fls. 75/119).
Ela se pauta em dois argumentos: a atipicidade da conduta e a falta de justa causa pautada na ausência de início de prova.
Quanto a atipicidade da conduta, citando a doutrina especializada, o querelado alega:
"..............................
... Aqui a conduta é CONSTRANGER (com intuito de obter vantagem/favorecimento = elemento subjetivo do injusto inerente ao tipo), que é a finalidade.
Então.
Todos os autores brasileiros, dos clássicos aos mais modernos definem CONSTRANGIMENTO, tal qual os DICIONÁRIOS o fazem (DIC. GLOBO, pág. 246), como 'coagir, violentar, oprimir, compelir, forçar', isto é, suprimir a liberdade pessoal.
..............................
SEM A CONDUTA CONTIDA NO VERBO NÃO HÁ TIPICIDADE, NÃO HAVERA ADEQUAÇÃO TÍPICA ENTRE O QUERER DO AGENTE, CONSUBSTANCIADO NAQUELA, E A NORMA PENAL QUE SE PRETENDA SANCIONÁ-LA, NO CASO O ARTIGO 216-A CP.
..............................
Então, do texto da exordial, o tema indicativo, segundo a mesma, de CONSTRANGIMENTO PARA OBTENÇÃO DE VANTAGEM OU FAVORECIMENTO SEXUAL, JAMAIS FOI DEMONSTRADO, cinge-se à narrativa de 'olhares', 'pedidos' e à exaltação da capacidade excitante de 'tapinhas nos ombros'!!! SEMPRE REPELIDOS COM EXTRAORDINÁRIA COMPETÊNCIA E 'RISPIDEZ RECOMENDÁVEL' (SIC!)
..............................
Qualquer que seja, DATA VENIA, o ângulo preferido para o exame da narrativa da inicial , dele sempre se obterá a ótica do imutável, A CONDUTA NÃO É SUBSUMÍVEL (tal qual imaginada e traduzida pela Querelante) NO TIPO DO ARTIGO 216-a CP. De nenhum modo a situação ali reportada traduz CONSTRANGIMENTO, QUER PSICOLÓGICO, QUER FÍSICO.
.............................." (fls. 77/88).

Em relação ao diagnóstico feito pelo médico (caso f32.1) feito em 24.6.2003, alega
"..............................
Registra-se na CLASSIFICAÇÃO INTERNACIO-NAL DE DOENÇAS (CID, 10ª revisão, 1999, 7ª edição, pág. 328, vol. 1), que o código F32.1 refere-se a 'EPISÓDIO DEPRESSIVO MODERADO'.
Verifica-se que realmente o DEPRESSIVO é capaz de tornar-se inseguro, intranqüilo, até sentir-se perseguido, mudando sua ótica social. De tal forma que pode-se defini-lo como a 'denominación popular ambígua de qualquier clase de dificuldad mental o emocional, desde el más leve estado de ansiedad al extravio mental. Su misma imprecisión hace que no pueda aplicarse a ninguma afección determinada' (como o faz MORRIS FISCHBEIN, MD, in 'Enciclopédia de la Medicina...', pág. 204): Vale dizer, doença nenhuma!!! Daí, talvez, a explicação de tão insólita interpretação dada a fatos irrelevantes sexualmente e juridicamente, como o fez a Querelante.
1.5.- CONFIRMA-SE A ATIPICIDADE, CAPAZ DE TORNAR INEPTA A INICIAL, PELO INEXISTENTE ABUSO HIERÁRQUICO.
.............................." (fls. 89)
Quanto à alegada atipicidade da conduta, arremata:
"..............................
A Querelante, em momento algum, alude a abuso ou prevalecimento do poder hierárquico na conduta do Querelado.
Sequer alega haver temido qualquer conseqüência negativa na sua condição funcional, caso repelisse às supostas 'investidas'; nem mesmo cogitou de promessa ou expectativa de reconhecimento profissional, caso aquiecesse.
.............................." (fls. 92)
Com relação à falta de justa causa, argumenta-se:
"..............................
O recebimento da acusação reclama um mínimo de suporte probatório que demonstre a verossimilhança da imputação, requisito que constitui o interesse de agir, uma das condições de ação.
..............................
Portanto, a simples narrativa da suposta ofensa na queixa-crime, isoladamente, é insuficiente ao recebimento da acusação, dada a incredibilidade que resulta da inexistência de suporte mínimo de prova da imputação.
Não há, por igual, como examinar senão o que a petição descreve de forma interpretativa, até porque, como a Querelante consigna, o noticiado assédio não foi presenciado por ninguém. Não poderia sê-lo, eis que se fez inexistente.
Sobressai da inicial elevado grau de subjetivismo, aferível por intermédio dos adjetivos que emprega a Querelante para descrever as ocasiões do suposto assédio.
.............................." (fls. 27/36)

O querelado encerra sua defesa dando sua versão dos fatos que circunstanciaram o ato de dispensa da funcionária.
Registra que pretendeu realizar reforma física em seu gabinete para facilitar o acesso de advogados e que, por isso, teria a querelante que retornar a sua sala anterior.
Leio o trecho da defesa:
"..............................
Ferida em sua desmesurada auto-estima, que deforma sua percepção das coisas e pessoas e a faz postar-se em nítida proeminência perante seus colegas de trabalho, a Querelante perdeu a compostura.
Então, falou:
'- O senhor já me humilhou uma vez mandando tirar o cartaz com os dizeres de Rui ('de tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto') e agora manda que eu fique ao lado de uma corja de incompetentes?'...
Voltando propriamente ao fato, ressalte-se que a Querelante, irada com a determinação de mudança de local, pôs-se a lançar impropérios, demonstrando atitude de nítida afronta que, por fim, terminou por configurar desrespeito insustentável, razão pela qual diante de manifesta insubordinação, decidiu o Ministro por sua dispensa, informando-a de imediato e no ato.
............................." (fls. 112/113)
3. A PGR.

Assim se manifesta a PGR:
"..............................
6. Certo que o núcleo típico constranger para os delitos que atentem contra a liberdade - seja cogitado constrangimento ilegal, como tratado no artigo 146 do Código Penal - compatibilizam-se com a supressão da liberdade.
7. Mas o crime de assédio sexual - artigo 216-A - crime contra os costumes, tem no núcleo típico constranger outra dimensão...
..............................
8. Portanto, o núcleo típico constranger, no delito de assédio sexual, não faz despontar a privação da liberdade, ótica sob a qual foram feitos os escritos suscitados a fls. 78/80, pertinentes ao crime de constrangimento ilegal, mas sim exige o quadro de desconforto - a vítima se sente 'importunada' -, que desestabiliza - 'afeta' - a dignidade, a saúde, a intimidade, a segurança, a comodidade, o bem-estar, como bem relevou a il. doutrinadora Luiza Nagib Eluf.
9. A querelante, com a juntada do documento de fls. 69, e pugnando pela oitiva do profissional médico que o subscrever (rol. De testemunhas a fls. 5), quer comprovar o fato articulado no item 12 da peça acusatória a fls. 4, como resultado dos fatos precedentes avivados, na espiral do assédio (itens 3/11 a fls. 3/4).
.............................." (fls. 130/131)
E conclui:
"..............................
12. Portanto, basta que a vítima seja importunada - importunar a una persona -, mesmo por pedidos - requerimentos -.
13. A queixa-crime realçou, concretamente, realidade com isso compatível, e arrolou, a tanto demonstrá-lo, magistrados do próprio Superior Tribunal de Justiça, como indicado a fls. 5.
14. Em sede de juízo de admissibilidade, o Ministério Público Federal, pelo que articulou, pronuncia-se pelo recebimento da queixa-crime.
.............................." (fls. 131/132)

É o relatório.

Voto: Trata-se de queixa-crime oferecida por GLÓRIA MARIA GUIMARÃES DE PÁDUA RIBEIRO PORTELLA contra PAULO GERALDO DE OLIVEIRA MEDINA por suposto crime de assédio sexual, tipificado no art. 216-A do CP (fls. 02/05).
A disciplina acerca do recebimento ou não da queixa-crime está prevista no art. 41 e 43 do CPP.
Leio os artigos:

Art.41. A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.
..............................
Art.43. A denúncia ou queixa será rejeitada quando:
I - o fato narrado evidentemente não constituir crime;
II - já estiver extinta a punibilidade, pela prescrição ou outra causa;
III - for manifesta a ilegitimidade da parte ou faltar condição exigida pela lei para o exercício da ação penal.

Entretanto, não basta que a queixa-crime se limite a narrar fatos ou circunstâncias criminosas que se atribuam ao QUERELADO.
É preciso que tais alegações estejam minimamente embasadas em provas ou, ao menos, indícios de efetiva ocorrência dos fatos.
É a opinião da doutrina majoritária.
Leio JOSÉ ANTONIO PAGANELLA BOSCHI:
"..............................
Se a denúncia for oferecida em desacordo com o art. 41 do CPP, o Juiz não poderá recebê-la. Essa decisão terminativa, que deve ser naturalmente fundamentada, por não examinar o mérito fará apenas coisa julgada formal, não impedindo, por isso, que o Promotor a reapresente, desde que satisfaça a exigência legal descumprida. Inexistindo lastro probatório mínimo e idôneo a denotar a existência do fumus boni júris ou não concorrendo as condições da ação (salvo quando for o caso de ilegitimidade de parte ou condição de procedibilidade ou punibilidade - art. 43, parágrafo único do CPP) - outrossim, a denúncia deverá ser rejeitada.
.............................."
Ainda na mesma linha, ver AFRÂNIO SILVA JARDIM e JULIO FABRINI MIRABETTE.
Do contrário, estaríamos a admitir queixas-crime temerárias, cujo recebimento em nada dependeria da menor relação daquilo que foi narrado com a realidade.
Seria a utilização do processo penal como forma de vingança pessoal, sem o devido respeito às regras do indiciamento e ao princípio da presunção de inocência.
Não é possível que o único indício a ser trazido pelo QUERELANTE seja a sua própria versão dos fatos.
Além da petição, o QUERELANTE fez juntar como prova ou início de prova para suas alegações três documentos:
(a) uma cópia de sua avaliação periódica de estágio probatório (fls. 8);
(b) uma via do livro "Cidadania só com justiça", de autoria do QUERELADO, no qual consta dedicatória pessoal à QUERELANTE (fls. 21);
(c) cópia autenticada do Relatório Médico do Dr. Bonfim A. Tobias (fls. 69); e
(d) e o ato de exoneração da QUERELANTE assinada pelo Ministro Presidente do STJ (fls. 70).
Nenhum dos documentos se presta a, pelo menos, levantar dúvidas acerca da real ocorrência dos eventos descritos na inicial.
Em relação à avaliação de estágio probatório, não há como se inferir que existisse algum tipo de investida, além da profissional, por parte do QUERELADO.
O documento apenas demonstra a existência de ascendência profissional ou superioridade hierárquica entre QUERELANTE e QUERELADO, o que absolutamente normal em se tratando de vínculo profissional entre um Ministro de Tribunal e seu assessor de confiança.
Quanto ao livro, assim está redigida a dedicatória:
".............................
Querida Glorinha,
Submeto-lhe minhas idéias e princípios para a formação e promoção cada vez de mais realce do judiciário em nosso país.
A sua crítica - sempre sincera e construtiva - (que) é motivo de orgulho para mim.
Carinhosamente,
Paulo Medina
.............................." (fls. 21)
Não vejo como se extrair daí indício de que poderia existir algum tipo de desejo ou intenção maliciosa ou libidinosa por parte do QUERELADO em relação ao QUERELANTE.
O que há, na verdade, é uma dedicatória pessoal do autor a uma pessoa considerada pelo autor, como deve ocorrer na relação de trabalho e de confiança profissional entre o Ministro e sua assessora.
Não há, no trecho, tratamento que se distancie de uma relação de afeição e confiança e, ao mesmo tempo, de trabalho.
Ao contrário, não há a utilização de apelidos, termos vagos, lascivos ou frases de duplo sentido que poderiam indicar intenções outros que não a de uma simples dedicatória.
Por si só, desacompanhada de prova mais concreta, a dedicatória não demonstra nada na linha pretendida pela QUERELANTE.
Já o relatório médico, traz a seguinte redação:
"..............................
Atendi hoje, em regime de urgência, a Senhora Glória Maria Guimarães de Pádua Ribeiro Portella, de 28 anos, natural de Brasília, com sinais de intensa angústia, deprimida, taquicárdica, inquieta, dispinêica, com osteomialgia e história de emagrecimento rápido.
Informa estar sob forte pressão em seu trabalho, que segundo ela ocasionou este estado atual e os sintomas relatados e observados por mim.
O exame clínico releva paciente consciente, pálida, sudorética, peso corporal de 47Kg, estatura 1,56m, ritmo cardíaco regular, rápido, com freqüência de 100bpm, pressão arterial: 100/70mmHg, pulsos periféricos palpáveis, pulmões livres à ausculta, ausência de organomegalias abdominais, ausência de edemas periféricos.
Trata-se, portanto, de um caso de F32.1.
Sugiro afastamento do trabalho por 30 dias, a partir de hoje, para tratamento específico.
.............................." (fls. 10)
Muito embora o relatório traga sintomas não usuais observados na paciente, não há qualquer indicação de que tais sinais e a caracterização de caso F32.1 pode ter sido causado pelas situações descritas pela QUERELANTE.
Aliás, uma infinidade de circunstâncias poderiam ter causado tal estado como o próprio stress que os Ministros dos Tribunais e os servidores diretamente ligados a ele estão diariamente submetidos.
Os sintomas poderiam ter sido causados até pela situação que o QUERELADO reputa como verdadeira.
Sua versão dos fatos é esta:

"..............................
Aos 26 de junho próximo passado, aproximadamente às 14:00 horas, segundo o relato do Querelado, a seguir descrito, a Querelante entrou em seu gabinete e, como sempre fazia, disse:
'-Querido Ministro, tem alguma coisa para mim?'
Respondeu-lhe:
'-Tenho, porém não será de seu agrado, e o mesmo fato já comuniquei ao assessor Ricardo Possas, que se mostrou acolhedor à minha orientação.'
Esclareceu-lhe o Ministro:
'-No mês de julho farei nova disposição física no gabinete e você voltará para sua sala anterior; a atual, ampliada, será destinada à Chefia de Gabinete, isto é, ao Fernando.'
Explicou-lhe que a modificação visava facilitar o acesso de advogados e outras pessoas que acorriam ao gabinete, reduzindo a procura de outros assessores, exceto o Dr. Fernando, e impedindo que estranhos ao trabalho ingressassem em salas internas onde estavam a trabalhar os servidores do gabinete e tomassem contatos com os processos.
Ferida em sua desmesurada auto-estima, que deforma sua percepção das coisas e pessoas e a faz postar-se em nítida proeminência perante seus colegas de trabalho, a Querelante perdeu a compostura.
Então, falou:
'-O senhor já me humilhou uma vez mandando tirar o cartaz com os dizeres de Rui ('de tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto') e agora manda que eu fique ao lado de uma corja de incompetentes?'
Respondeu-lhe que os dizeres de Rui, praticamente, de todos conhecido, foram por ela inseridos no cartaz colado à porta de sua sala objetivamente apenas humilhar o novo Assessor Coordenador, função para a qual fora preterida, conforme entendimento do pessoal do Gabinete e ainda de sua própria interpretação.
Voltando propriamente ao fato, ressalte-se que a Querelante, irada com a determinação de mudança de local, pôs-se a lançar impropérios, demonstrando atitude de nítida afronta que, por fim, terminou por configurar desrespeito insustentável, razão pela qual diante de manifesta insubordinação, decidiu o Ministro por sua dispensa, informando-a de imediato e no ato.
.............................." (fls. 111/113)
Pela falta de provas, tais alegações do QUERELADO se colocam no mesmo patamar de falta de verossimilhança das alegações lançadas pela QUERELANTE.
O último documento apresentado pela QUERELANTE se refere ao ato de sua exoneração.
Não há dúvidas de que esse documento não traz qualquer indício dos fatos ocorridos, mas apenas prova que em 3.7.2003, a QUERELANTE foi exonerada com efeitos retroativos a 26.6.2003.
Os documentos apresentados não se apresentam como idôneos para, ao menos, indicar que as alegações da QUERELANTE possam ser verdadeiras.
Além disso, as testemunhas elencadas pela QUERELANTE, que poderiam dar alguma indicação de veracidade da narração da inicial, não se prestam a tal fim.
É que a QUERELANTE indicou 6 (seis) testemunhas.
3 (três) testemunhas são Ministros do STJ e por não terem presenciado nada apenas poderiam servir de testemunhas acerca do comportamento da QUERELANTE.
1 (uma) testemunha é o médico que assinou o relatório médico e que, por isso, não acrescentará muito além do que já está registrado em seu relatório.
1 (uma) testemunha, além de não ter presenciado nada é também amiga pessoal da QUERELANTE e, por isso, deve ser dado valor apenas relativo ao que informar ao juízo.
1 (uma) testemunha é a própria mãe da QUERELANTE e, com muito mais razão, não se presta a uma narração isenta dos fatos.
Não há o arrolamento de qualquer testemunha que trabalhasse como servidor no Gabinete ou que, de alguma forma, tivesse presenciado os fatos e que poderia, de maneira imparcial, dar declaração de como era o dia-a-dia do gabinete e, especificamente, de como se dava a relação entre o Ministro e sua assessora.
Não vejo como a instauração de ação penal e, mesmo contando com futura instrução processual, possa-se avançar na elucidação dos fatos diante de tão frágeis indicações e elementos probatórios.
Nesse sentido, diante dessa projeção infrutífera do esclarecimento das circunstâncias sustentadas, parece-me temerário o recebimento da queixa-crime.
Diante do exposto, considerando a inconsistências das provas trazidas e da falta de perspectiva da eventual ação penal, rejeito a queixa-crime.
É o voto.
*acórdão pendente de publicação

Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
informativo@stf.jus.br

 
Praça dos Três Poderes - Brasília - DF - CEP 70175-900 Telefone: 61.3217.3000

Informativo STF - 352 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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