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quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Informativo STF 389 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF


Brasília, 23 a 27 de maio de 2005 - Nº 389.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO




Plenário
Decreto Expropriatório: Transmissão "Mortis Causa" e Partes Ideais
Decreto Expropriatório: Promitente Comprador e Legitimidade
Decreto Expropriatório: Morte de Cônjuge e Produtividade do Imóvel
Execução Provisória de Pena e Princípio da Presunção da Não-Culpabilidade
Remuneração dos Membros do Congresso Nacional e Teto
Reprovação no Estágio Probatório e Vitaliciedade - 3
1ª Turma
Prescrição e HC de Ofício
Revogação de Competência e Art. 25 do ADCT - 3
ICMS. Importação. Sujeito Ativo - 3
Adicional por Tempo de Serviço e Cartórios
2ª Turma
Crime Societário e Dispensa de Individualização da Conduta
Clipping do DJ
Transcrições
Ministério Público. Legitimidade. Ação Civil Pública. Mensalidades Escolares (RE 332545/SP)
ICMS. Importação. Sujeito Ativo (RE 268586/SP)


PLENÁRIO

Decreto Expropriatório: Transmissão "Mortis Causa" e Partes Ideais

O Tribunal retomou julgamento de mandado de segurança em que se pretende anular decreto expropriatório de imóvel rural, sob a alegação de que este é explorado em condomínio, proveniente de sucessão mortis causa, constituído por diversas partes ideais, cujas áreas não se qualificam, individualmente, como grandes propriedades improdutivas passíveis de desapropriação. Na sessão de 10.3.2005, o Min. Gilmar Mendes, relator, concedeu o writ. Tendo em conta precedentes da Corte no sentido de que, com o falecimento do proprietário, posto que já iniciado o processo administrativo de desapropriação, há divisão tácita da propriedade entre os herdeiros, nos termos do § 6º do art. 46 da Lei 4.504/64 (Estatuto da Terra), entendeu que, na espécie, as frações ideais atribuíveis a cada condômino são unidades autônomas, que se caracterizam como médias propriedades rurais, sendo, portanto, insuscetíveis de desapropriação, para fins de reforma agrária, de acordo com o inciso I do art. 185 da CF, a despeito de não terem sido individualizadas no Sistema de Cadastro Nacional nem no respectivo Cartório de Registro de Imóveis. Nesta assentada, o Min. Eros Grau, em voto-vista, divergiu, para denegar a ordem, no que foi acompanhado pelos Ministros Joaquim Barbosa, Carlos Britto e Cezar Peluso. Reiterando os fundamentos que expôs em seu voto no julgamento do MS 24924/DF (v. Informativos 367 e 379), considerou inaplicável o § 6º do art. 46 do Estatuto da Terra, haja vista que a finalidade desse preceito, quanto à expressão "para os fins desta Lei", é a de instrumentar o cálculo do coeficiente de progressividade do Imposto Territorial Rural - ITR, a fim de evitar a solidariedade passiva dos condôminos no pagamento do tributo, não servindo, dessa forma, de parâmetro para dimensionamento de imóveis rurais destinados à reforma agrária, matéria afeta à Lei 8.629/93. Ressaltou, ainda, a necessidade de se interpretar o art. 1.784 em conjunto com o disposto no art. 1.791 e seu parágrafo único, ambos do CC, concluindo que a saisine somente torna múltipla a titularidade do imóvel, o qual permanece, do ponto objetivo, uma única propriedade até a partilha, unidade que não pode ser afastada quando da apuração da área do imóvel para fins de reforma agrária, razão por que não se pode tomar cada parte ideal como propriedade distinta. Salientou, por fim, que somente o registro do imóvel no cartório competente prova a titularidade do domínio (art. 252 da Lei 6.015/73, na redação conferida pela Lei 6.216/75), o que não efetuado no caso, inexistindo qualquer elemento capaz de assegurar que o imóvel em questão seja um conjunto de médias propriedades rurais. Após, pediu vista dos autos o Min. Marco Aurélio.
MS 24573/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 25.5.2005. (MS-24573)

Decreto Expropriatório: Promitente Comprador e Legitimidade

O Tribunal iniciou julgamento de agravo regimental em mandado de segurança impetrado contra ato do Presidente da República, que, por meio de decreto, declarara de interesse social, para fins de reforma agrária, imóvel rural. O Min. Joaquim Barbosa, relator, preliminarmente, manteve a decisão agravada no sentido de não conhecer do mandamus, por entender que o impetrante, promitente comprador do imóvel em questão, não é parte legítima para defender, em juízo, em nome próprio, propriedade que ainda não lhe pertence. Asseverou que, por parte do promitente comprador, poderá haver, se for o caso, o direito de sub-rogação no preço apurado com a desapropriação, mas não o direito de obstar diretamente o procedimento expropriatório. Acrescentou que a alteração promovida no novo Código Civil (art. 1.417) confere ao promitente comprador apenas o direito real à aquisição do imóvel, e não sua propriedade. No mérito, negou provimento ao recurso, por não vislumbrar, na espécie, direito líquido e certo do impetrante, porquanto as apontadas irregularidades, consistentes na falta de notificação do impetrante e da proprietária do imóvel, são afastadas pelas provas constantes dos autos, segundo as quais ambos foram notificados em tempo hábil a exercerem devidamente sua defesa e acompanhar os trabalhos da vistoria realizada. O julgamento foi suspenso com o pedido de vista do Min. Carlos Britto.
MS 24908 AgR/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 25.5.2005. (MS-24908)

Decreto Expropriatório: Morte de Cônjuge e Produtividade do Imóvel

A morte de cônjuge ou de parentes é evento natural que não configura caso fortuito ou de força maior, e não justifica o baixo nível de produtividade do imóvel, nos termos do disposto no § 7º do art. 6º da Lei 8.629/93. Com base nesse entendimento, o Plenário indeferiu mandado de segurança em que se pretendia a anulação de decreto expropriatório de imóvel rural do impetrante, sob a alegação de ocorrência de motivo fortuito ou de força maior, em razão do falecimento de sua mulher, o que o teria impedido, devido à instabilidade emocional e financeira, de manter o índice do grau de eficiência e produtividade do imóvel. Asseverou, ademais, que a questão referente à produtividade de imóvel rural seria controvertida, a demandar dilação probatória, o que é defeso na via eleita. Precedentes citados: MS 24441/DF (DJU de 6.8.2004) e MS 24518/DF (DJU de 30.4.2004).
MS 24442/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 25.5.2005. (MS-24442)

Execução Provisória de Pena e Princípio da Presunção da Não-Culpabilidade

O Tribunal iniciou julgamento de habeas corpus, afetado ao Pleno pela 1ª Turma, impetrado contra decisão do STJ, que denegara igual medida, em que se pretendia a suspensão do recolhimento imediato do paciente à prisão e o reconhecimento do seu direito de aguardar o julgamento de recursos futuros em liberdade. Na espécie, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por maioria, negara provimento à apelação do paciente, mantendo a sentença, com expedição de mandado de prisão, que o condenara, pela prática de uma série de crimes, às penas de reclusão, em regime fechado, e de detenção, em regime semi-aberto, tendo a divergência de votos se restringido à quantificação da pena imposta a um dos crimes e ao regime de cumprimento de outro. O Min. Sepúlveda Pertence, relator, concedeu a ordem, por entender que a prisão fundada em decisão condenatória recorrível, quando não motivada em razões de ordem cautelar, substantiva execução provisória de pena não definitivamente aplicada, em ofensa ao princípio da presunção de não-culpabilidade (CF, art. 5º, LVII). Após, pediu vista dos autos a Min. Ellen Gracie. O Tribunal, por unanimidade, deliberou conceder a liberdade provisória ao paciente até a decisão final do writ.
HC 85591/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 25.5.2005. (HC-85591)

Remuneração dos Membros do Congresso Nacional e Teto

Denegado, por maioria, mandado de segurança impetrado por ex-deputado contra ato conjunto das Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, que fixou subsídios dos membros do Congresso Nacional, tendo em conta o disposto no § 2º do art. 1º do Decreto Legislativo 444/2002 ("Art. 1° Até que seja aprovada a lei de iniciativa conjunta de que trata o art. 48, XV, da Constituição Federal, a remuneração dos Membros do Congresso Nacional corresponderá à maior remuneração percebida, a qualquer título, por Ministro do Supremo Tribunal Federal, incluídas as relativas ao exercício de outras atribuições constitucionais, e se constituirá de subsídio fixo, variável e adicional. ... § 2° As Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados regularão, em ato conjunto, a aplicação deste Decreto Legislativo."). Sustentava o impetrante ofensa ao caput do art. 1º do referido decreto, por não terem sido incluídas, no cálculo de sua pensão, as parcelas relativas ao exercício de outras atribuições constitucionais, em especial o "jeton", pago aos Ministros do STF que atuam perante o TSE. Considerou-se o que previsto no § 1º do art. 1º da Lei 10.474/2002 que, dispondo sobre a remuneração da magistratura da União, ressalva - assim como o faz a Resolução 236/STF - que "para os fins de quaisquer limites remuneratórios, não se incluem no cômputo da remuneração as parcelas percebidas... por Ministro do Supremo Tribunal Federal em razão de tempo de serviço ou de exercício temporário de cargo no Tribunal Superior Eleitoral.". Vencido integralmente o Min. Marco Aurélio, relator, que concedia a ordem e, em parte, o Min. Sepúlveda Pertence, que a deferia apenas para incluir os valores referentes ao pagamento da gratificação eleitoral, excluído do cálculo o adicional de tempo de serviço.
MS 24527/SP, rel. Min. Marco Aurélio, rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, 25.5.2005. (MS-24527)

Reprovação no Estágio Probatório e Vitaliciedade - 3

O Tribunal retomou julgamento de mandado de segurança no qual se pretende anular ato do Procurador-Geral da República que determinara a exoneração de Procuradora do Ministério Público do Trabalho, em razão de sua reprovação no estágio probatório, sob a alegação de a impetrante já ter adquirido vitaliciedade no cargo à época da exoneração, bem como pela existência de irregularidades na conversão do inquérito administrativo instaurado para a apuração de infração disciplinar em avaliação de estágio probatório - v. Informativos 326 e 337. A Min. Ellen Gracie, relatora, aditou seu voto e manteve o indeferimento do writ, rebatendo os fundamentos pelos quais o Min. Joaquim Barbosa, em voto-vista, deferira a segurança. Salientando a previsão do inquérito administrativo para apuração de falta funcional tanto no art. 247 da LC 75/93, quanto no art. 11, da Resolução 006/94 (que estabelece procedimento para avaliar o cumprimento de estágio probatório dos membros do Ministério Público do Trabalho), entendeu não configurar ofensa ao princípio da ampla defesa o seu aproveitamento no procedimento de avaliação do estágio probatório, afirmando que, na espécie, o inquérito continha elementos justificadores da proposta do Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho pela exoneração da impetrante por não ter cumprido as condições exigidas para aprovação em estágio probatório, sendo, dessa forma, desnecessária e inútil a abertura do novo processo administrativo para colher os mesmos dados que levariam à conclusão de que a conduta pessoal e pública da impetrante em estágio probatório não a recomendava para integrar a carreira. Asseverou, também, que a impetrante exerceu devidamente seu direito de defesa, conforme razões apresentadas tanto por ela como por seus advogados, e que a decisão de exoneração foi colegiada, não do chefe imediato da estagiária. Ressaltou, ainda, que não há norma que determine que a sessão administrativa para avaliação de estágio probatório seja aberta, nem que haja sustentação oral. Por fim, afastou o argumento de que houvera conspiração contra a impetrante por parte de toda alta cúpula da instituição, já que ele, além de ser contrário ao que se depreende da leitura do procedimento administrativo em questão, demandaria inviável revolvimento de fatos e provas. Após, pediu vista dos autos o Min. Gilmar Mendes. (Resolução 006/94, Art. 11: "A qualquer tempo, durante o estágio probatório, o Corregedor-Geral poderá instaurar inquérito administrativo, visando apuração de falta disciplinar, bem como, propor ao Conselho Superior a exoneração de membro do Ministério Público do Trabalho que não cumprir as condições do estágio probatório.").
MS 23441/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 25.5.2005. (MS-23441)


PRIMEIRA TURMA

Prescrição e HC de Ofício

Verificada a prescrição, ainda que o recurso seja intempestivo, cabe deferimento de habeas corpus de ofício. Com base nesse entendimento, a Turma, resolvendo questão de ordem, não conheceu do agravo de instrumento interposto por condenado pela prática dos crimes previstos nos arts. 129, caput, e 147, ambos do CP e no art. 311 do Código de Trânsito Brasileiro - CTB, mas, de ofício, concedeu habeas corpus para declarar a prescrição, nos termos dos arts. 110, §§ 1ºe 2º; e 109, VI, ambos do CP, com relação apenas ao delito do art. 311 do CTB. No caso, o ora agravante objetivava, em recurso extraordinário inadmitido, o reconhecimento da absorção do crime tipificado no art. 311 do CTB pelo de lesão corporal ao argumento de contrariedade ao art. 5º, LIV e LV, da CF, bem como alegava violação ao art. 93, IX, da CF, por ausência de fundamentação do acórdão recorrido quanto a suposta majoração das penas aplicadas.
AI 544607 QO/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 24.5.2005. (AI-544607)

Revogação de Competência e Art. 25 do ADCT - 3

A Turma concluiu julgamento de recurso extraordinário, interposto por instituição financeira, em que se pretendia a desconstituição de acórdão que, embora reconhecendo não ser auto-aplicável o § 3º do art. 192 da CF, determinara a redução de juros ao montante de 12% ao ano, consoante disposto no Decreto 22.626/33, por entender revogada, pelo art. 25 do ADCT, a Lei 4.595/64, na parte em que outorga poderes ao Conselho Monetário Nacional para dispor sobre as taxas de juros bancários, razão pela qual o mencionado decreto teria voltado a viger em sua integralidade - v. Informativos 381 e 386. Por maioria, deu-se provimento ao recurso para determinar que o Tribunal a quo reaprecie a questão dos juros com base nas normas aplicáveis nas resoluções e circulares baixadas pelo Banco Central e vigentes na data da celebração do negócio jurídico. Entendeu-se não haver que se falar em revogação dessa lei, haja vista que, conforme se depreende da redação do art. 25 do ADCT, o objeto da revogação, quando ultrapassado o prazo de 180 dias da promulgação da CF, é a competência atribuída ou delegada a órgão do Poder Executivo pela legislação pré-constitucional e não as normas editadas quando vigente a delegação. Concluiu-se que as normas objeto dessa ação são válidas, já que editadas dentro do prazo previsto na norma transitória, quando o Poder Executivo possuía competência para dispor sobre instituições financeiras e suas operações, sendo indiferente, para sua observância, ter ou não havido a prorrogação prevista no art. 25 do ADCT. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto que negavam provimento ao recurso, por considerar que esta delegação conflita com o art. 25 do ADCT, porquanto ausente de razoabilidade a prorrogação sucessiva de leis elastecendo um prazo de 180 dias de forma indeterminada.
RE 286963/MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 24.5.2005. (RE-286963)

ICMS. Importação. Sujeito Ativo - 3

A Turma concluiu julgamento de recurso extraordinário no qual se discutia a competência tributária quanto ao sujeito ativo do ICMS na hipótese de importação. Tratava-se, na espécie, de recurso interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo que entendera ser este Estado o beneficiário do ICMS, haja vista ter sido nele processado o desembaraço da mercadoria - v. Informativos 366 e 375. Por maioria, negou-se provimento ao recurso por se entender que o sujeito ativo da relação tributária é o Estado de São Paulo, uma vez que, em se tratando de operação iniciada no exterior, o credor do tributo é aquele no qual situado o porto em que recebidas as mercadorias, ficando mitigada a referência a estabelecimento destinatário. Asseverou-se, ainda, que, na espécie, a mercadoria apenas circulara no Estado de São Paulo, nunca tendo ingressado no Estado do Espírito Santo. Ressaltou-se, também, o caráter fraudulento, com fins de burlar o Fisco, do acordo entabulado entre a recorrente e a importadora, beneficiária de vantagens fiscais (Sistema FUNDAP), segundo o qual esta "figuraria nas operações de importação como consignatária,... vindo a ser reembolsada em tudo..., inclusive tributos,... ficando a cargo da ora recorrente a definição das mercadorias". Vencido o Min. Carlos Britto, que dava provimento ao recurso por considerar que o sujeito ativo da relação tributária seria o Estado do Espírito Santo, Estado em que estaria localizado o sujeito passivo do tributo, qual seja, aquele que promovera juridicamente o ingresso do produto (importador). Leia o inteiro teor do voto do relator na seção Transcrições deste Informativo.
RE 268586/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 24.5.2005. (RE-268586)

Adicional por Tempo de Serviço e Cartórios

A Turma manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo que, com base em lei estadual, reconhecera o direito à contagem do tempo de serviço em que o recorrido, serventuário de justiça, trabalhara em cartório não-oficializado, para efeito de gratificação de adicional de tempo de serviço. Entendeu-se que o art. 236 da CF, que prevê o caráter privado dos serviços notariais e de registro, não impede que a lei local estabeleça, para efeito de adicional por tempo de serviço, o cômputo do tempo de serviço prestado em cartório não-oficializado. Precedente citado: RE 245171/ES (DJU de 20.10.2000).
RE 235623/ES, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 24.5.2005. (RE-235623)


SEGUNDA TURMA

Crime Societário e Dispensa de Individualização da Conduta

A Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia a declaração de nulidade de processo criminal, desde o início, pelo qual o paciente fora condenado pela prática de crime contra a ordem econômica, previsto no art. 1º, I, II e IV da Lei 8.137/90, c/c os arts. 29 e 71 do CP, consubstanciado na utilização, como sócio-administrador de empresa, de artifícios fraudulentos, para o fim de eximir-se ou reduzir pagamento de tributos e contribuições federais. A impetração alegava inépcia da denúncia, sob o argumento de que a conduta do paciente não fora nela descrita pormenorizadamente, o que ofenderia o princípio do devido processo legal e, por conseguinte, caracterizaria constrangimento ilegal. Por entender que a necessidade do estabelecimento do vínculo de cada sócio ou gerente ao ato ilícito que lhe é imputado somente se faz obrigatória nas circunstâncias em que, de plano, as responsabilidades de cada um dos sócios ou gerentes são diferenciadas em razão do próprio contrato social relativo ao registro da pessoa jurídica envolvida, e considerando que, na época dos fatos, a empresa era administrada em iguais condições pelos denunciados, concluiu-se não haver razão jurídica para o detalhamento pela denúncia da conduta atribuível a cada um dos sócios, diante do que preconiza o art. 41 do CP ("A denúncia ou queixa conterá a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.").
HC 85579/MA, rel. Min. Gilmar Mendes, 24.5.2005. (HC-85579)

SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno25.5.2005--9
1ª Turma24.5.2005--678
2ª Turma24.5.2005--151



C L I P P I N G   D O   D J

27 de maio de 2005

AG. REG. NA Rcl N. 909-DF
RELATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. NELSON JOBIM
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM RECLAMAÇÃO. POSSIBILIDADE DE INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO. CABIMENTO DA RECLAMAÇÃO. EFICÁCIA DA DECISÃO CONCESSIVA DE LIMINAR NA ADC 4.
No julgamento da ADC 4 restou assentada que a decisão que concede medida cautelar em sede de ação declaratória de constitucionalidade é investida da mesma eficácia contra todos e efeito vinculante, características da decisão de mérito.
A reclamação e o agravo do art. 522 do CPC não são procedimentos idênticos, mas recursos ou remédios com diferentes efeitos e diversas razões.
A reclamação visa preservar a competência do STF e garantir a autoridade de suas decisões, motivo pelo qual a decisão proferida em reclamação não substitui a decisão recorrida como nos recursos, mas apenas cassa o ato atacado.
A reclamação tem natureza de remédio processual correcional, de função corregedora.
Ademais, o STF somente admite a reclamação nos casos de processos sem trânsito em julgado, ou seja, com recurso ainda pendente.
Agravo provido com a concessão de liminar.

RE N. 353.595-TO
RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO
APOSENTADORIA - INVALIDEZ - PROVENTOS - MOLÉSTIA GRAVE. O direito aos proventos integrais pressupõe lei em que especificada a doença. Precedente: Recurso Extraordinário nº 175.980-1/SP, Segunda Turma, relator ministro Carlos Velloso, Diário da Justiça de 20 de fevereiro de 1998, Ementário nº 1.899-3.
* noticiado no Informativo 368

RE N. 427.339-GO
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Contraditório e ampla defesa: art. 5º, LV, da Constituição: conteúdo mínimo.
A garantia constitucional da ampla defesa (CF, art. 5º, LV) tem, por força direta da Constituição, um conteúdo mínimo essencial, que independe da interpretação da lei ordinária que a discipline (RE 255.397, 1ª T., Pertence, DJ 07.05.2004).
II. Recurso extraordinário: improcedência das alegações de violação à garantia da ampla defesa: desprovimento.
1. Alegação de que a defesa não teve tempo hábil para estudar os autos corretamente afastada pelo acórdão, em face das peculiaridades do caso.
2. Substituição de testemunhas da acusação: pedido justificado: decisão recorrida suficientemente motivada: ausência de violação do art. 93, IX, da Constituição.
3. Júri: inquirição de testemunhas: não se computa como testemunha a ser inquirida no plenário, a leitura de depoimento prestado anteriormente.
4. Júri: falta de intimação de uma das testemunhas arroladas pela defesa, residente fora da Comarca, para depor em Plenário: nulidade que, acaso existente, para ela concorreu a defesa.
III. Individualização da pena: constrangimento ilegal: habeas corpus de ofício.
1. Ausência de constrangimento ilegal na consideração do fato de o recorrente estar respondendo a outros processos, o que, segundo a jurisprudência da Corte, configura maus antecedentes, circunstância não considerada em nenhum outro momento da fixação da pena.
2. Manifesto constrangimento, contudo, decorrente da ilegalidade da majoração da pena-base pela culpabilidade considerada "incisiva", sob o fundamento de que o recorrente era "plenamente imputável, cônscio da reprovabilidade de sua conduta, sendo que outra lhe era exigida", pressupostos do elemento subjetivo do crime.
3.Concessão de habeas corpus de ofício, para que o Tribunal a quo proceda a nova fixação da pena, reduzindo-a, como entender de direito.

RE N. 451.409-MA
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: I. Recurso extraordinário: descabimento: falta de prequestionamento da matéria constitucional suscitada no RE, exigível, segundo o entendimento do STF, também nas hipóteses em que a pretendida contrariedade ao texto constitucional tenha surgido na própria decisão recorrida: incidência das Súmulas 282 e 356.
II. Recurso extraordinário, requisitos específicos e habeas corpus de ofício.
Em recurso extraordinário criminal, perde relevo a inadmissibilidade do RE da defesa, por falta de prequestionamento e outros vícios formais, se, não obstante - evidenciando-se a lesão ou a ameaça à liberdade de locomoção - seja possível a concessão de habeas-corpus de ofício (v.g. RE 273.363, 1ª T., Sepúlveda Pertence, DJ 20.10.2000).
III. Contraditório e ampla defesa (CF, art. 5º, LV).
Inequívoco cerceamento do direito de defesa pela falta de intimação da Defesa para apresentar contra-razões à apelação do Ministério Público, que foi provido para agravar a situação do réu.

RHC N. 85.026-SP
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: HABEAS CORPUS. PRISÃO PROVISÓRIA. CONTAGEM PARA EFEITO DA PRESCRIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE.
O tempo de prisão provisória não pode ser computado para efeito da prescrição, mas tão-somente para o cálculo de liquidação da Pena. O artigo 113 do Código Penal, por não comportar interpretação extensiva nem analógica, restringe-se aos casos de evasão e de revogação do livramento condicional.
Ordem denegada.
* noticiado no Informativo 385

HC N. 84.768-PE
RELATOR P/ ACÓRDÃO: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: HABEAS CORPUS. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RECEBIMENTO DE DENÚNCIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ALEGAÇÃO DE INÉPCIA DA DENÚNCIA QUANTO AO CRIME DE ROUBO.
1 - A técnica da denúncia (art. 41 do Código de Processo Penal) tem merecido reflexão no plano da dogmática constitucional, associada especialmente ao direito de defesa. Precedentes.
2 - Denúncias genéricas, que não descrevem os fatos na sua devida conformação, não se coadunam com os postulados básicos do Estado de Direito. Violação também do princípio da dignidade da pessoa humana.
3 - A denúncia sob exame utiliza-se de um silogismo de feição fortemente artificial para indicar o paciente como autor intelectual do roubo. A decisão Superior Tribunal de Justiça pelo recebimento da denúncia nada acrescentou em relação ao crime de roubo.
4 - Deferimento da ordem para anular a denúncia quanto à atribuição ao paciente da conduta prevista no art. 157 do Código Penal, ressalvados os votos vencidos da Min. Ellen Gracie e do Min. Joaquim Barbosa.

HC N. 84.974-SP
RELATOR P/ O ACÓRDÃO: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: 1. Habeas Corpus. 2. Condenação pela prática de crime de roubo tipificado no art. 157, § 2º, I e II do Código Penal 3. Regime inicial fechado. 4. Alegação de incompatibilidade entre o regime fixado e a pena imposta. 5. A periculosidade do agente, a gravidade do delito e as circunstâncias de sua prática justificam a reprimenda mais severa. 6. Inaplicabilidade das Súmulas nos 718 e 719 do STF. 7. Ordem denegada.
* noticiado no Informativo 374

RE N. 212.285-PR
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
EMENTA: Recurso extraordinário. 2. Juros moratórios entre a data da expedição e a do efetivo pagamento do precatório judicial. Não-incidência. Precedentes. 3. Recurso extraordinário a que se dá provimento.


Acórdãos Publicados: 229




T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.


Ministério Público. Legitimidade. Ação Civil Pública. Mensalidades Escolares (Transcrições)

RE 332545/SP*

RELATOR: MIN. GILMAR MENDES

DECISÃO: Trata-se de recurso extraordinário fundado no art. 102, III, "a", da Constituição Federal, contra acórdão que entendeu que o Ministério Público não tem legitimidade para propor ação civil pública sobre mensalidades escolares.
 
O acórdão ficou assim ementado:
 
"Ilegitimidade 'ad causam' - Ação civil pública - Ministério Público - Mensalidades escolares - Impossibilidade do uso da ação civil pública, em juízo, para a defesa de interesses de pequenos grupos determinados, em razão de danos variáveis e divisíveis - Hipótese de prestação de serviços, de caráter patrimonial e privado, disciplinados por uma relação exclusivamente contratual - Ausência de conversão da escola particular em ente público pelo fato de desempenhar relevante missão social - Incompetência do Ministério Público na substituição dos indivíduos na esfera de seus direitos - Ilegitimidade caracterizada - Recurso improvido." (fls. 373)
 Alega-se violação aos arts. 127, caput, 129, III e IX, 205 e 209, da Carta Magna.

O acórdão recorrido extraordinariamente não está em consonância com a jurisprudência desta Corte, conforme se depreende do julgamento do RE 163.231, Plenário, Rel. Maurício Corrêa, DJ 29.06.01:
 
"EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA PROMOVER AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS, COLETIVOS E HOMOGÊNEOS. MENSALIDADES ESCOLARES: CAPACIDADE POSTULATÓRIA DO PARQUET PARA DISCUTI-LAS EM JUÍZO.
1. A Constituição Federal confere relevo ao Ministério Público como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (CF, art. 127).
2. Por isso mesmo detém o Ministério Público capacidade postulatória, não só para a abertura do inquérito civil, da ação penal pública e da ação civil pública para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente, mas também de outros interesses difusos e coletivos (CF, art. 129, I e III).
3. Interesses difusos são aqueles que abrangem número indeterminado de pessoas unidas pelas mesmas circunstâncias de fato e coletivos aqueles pertencentes a grupos, categorias ou classes de pessoas determináveis, ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base.
3.1. A indeterminidade é a característica fundamental dos interesses difusos e a determinidade a daqueles interesses que envolvem os coletivos.
4. Direitos ou interesses homogêneos são os que têm a mesma origem comum (art. 81, III, da Lei n° 8.078, de 11 de setembro de 1990), constituindo-se em subespécie de direitos coletivos.
4.1.Quer se afirme interesses coletivos ou particularmente interesses homogêneos, stricto sensu, ambos estão cingidos a uma mesma base jurídica, sendo coletivos, explicitamente dizendo, porque são relativos a grupos, categorias ou classes de pessoas, que conquanto digam respeito às pessoas isoladamente, não se classificam como direitos individuais para o fim de ser vedada a sua defesa em ação civil pública, porque sua concepção finalística destina-se à proteção desses grupos, categorias ou classe de pessoas.
5. As chamadas mensalidades escolares, quando abusivas ou ilegais, podem ser impugnadas por via de ação civil pública, a requerimento do Órgão do Ministério Público, pois ainda que sejam interesses homogêneos de origem comum, são subespécies de interesses coletivos, tutelados pelo Estado por esse meio processual como dispõe o artigo 129, inciso III, da Constituição Federal.
5.1.Cuidando-se de tema ligado à educação, amparada constitucionalmente como dever do Estado e obrigação de todos (CF, art. 205), está o Ministério Público investido da capacidade postulatória, patente a legitimidade ad causam, quando o bem que se busca resguardar se insere na órbita dos interesses coletivos, em segmento de extrema delicadeza e de conteúdo social tal que, acima de tudo, recomenda-se o abrigo estatal.
Recurso extraordinário conhecido e provido para, afastada a alegada ilegitimidade do Ministério Público, com vistas à defesa dos interesses de uma coletividade, determinar a remessa dos autos ao Tribunal de origem, para prosseguir no julgamento da ação."
 
Assim, conheço e dou provimento ao recurso (art. 557, § 1o-A, do CPC), para afastar a alegada ilegitimidade do Ministério Público Estadual.
 
Publique-se.
 
Brasília, 06 de maio de 2005.
 
Ministro GILMAR MENDES
Relator

* decisão pendente de publicação


ICMS. Importação. Sujeito Ativo (Transcrições)

(v. Informativo 375)

RE 268.586/SP*

RELATOR: MIN. MARCO AURÉLIO

RELATÓRIO: O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo negou acolhida a pedido formulado em apelação, ante fundamentos assim sintetizados (folha 381):

Ação anulatória - Débito tributário - Auto de infração - Falta de recolhimento do ICMS - Recebimento de mercadorias importadas por empresa sediada em outro Estado - Decreto de improcedência confirmado - Recurso não provido.

Os embargos de declaração que se seguiram foram desprovidos pelo Colegiado (folha 403 à 405).

No extraordinário de folha 408 a 427, interposto com alegada base na alínea "a" do permissivo constitucional, a contribuinte articula com a transgressão do artigo 155, § 2º, inciso IX, alínea "a", da Carta Política da República. Ressalta já haver esta Corte decidido que o fato gerador do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços na importação de mercadorias dá-se na ocasião do desembaraço aduaneiro, a ser recolhido pelo importador. Dessa forma, procura demonstrar não ser responsável pelo recolhimento do imposto, que já teria sido pago pela empresa Oceania, importadora dos produtos, sediada no Estado do Espírito Santo. Assegura que, na espécie, ocorreram duas operações: a de importação dos bens pela Oceania e, posteriormente, a de transferência destes bens ao estabelecimento da recorrente. Aduz que o fato gerador da exação deu-se no desembaraço aduaneiro e, "na condição de sujeito passivo e destinatário das mercadorias, de acordo com o preceito da Carta Magna, a empresa Oceania recolheu o ICMS para o Estado em que se localiza seu estabelecimento, qual seja, o Estado do Espírito Santo. Assim, não há que se falar em exigência de imposto pela Fazenda Pública do Estado de São Paulo" (folha 414). Registra que a importadora é beneficiária do sistema FUNDAP, usufruindo de benefícios fiscais previstos em lei e que "embora as mercadorias tenham sido desembaraçadas no Porto de Santos e seguido diretamente para o estabelecimento da recorrente, sem haver transitado pelo estabelecimento da importadora, a importação foi realizada pela empresa Oceania que adquiriu a disponibilidade das mercadorias quando do seu desembaraço aduaneiro e em seguida as remeteu ao estabelecimento da recorrente" (folha 416). Discorre, longamente, sobre a controvérsia, referindo-se a precedentes jurisprudenciais e a ensinamentos doutrinários.

O Estado de São Paulo apresentou as contra-razões de folha 564 a 573, nas quais evoca o Verbete nº 279 da Súmula desta Corte e defende o acerto da conclusão adotada pelo Tribunal de origem.

O procedimento atinente ao juízo primeiro de admissibilidade encontra-se à folha 586 à 589.

Registro que o especial simultaneamente interposto teve o trânsito obstado na origem, seguindo-se a protocolação de agravo, desprovido no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (folha 588 a 601).

A Procuradoria Geral da República, no parecer de folha 607 a 609, preconiza o não-conhecimento do recurso. Eis o resumo da peça:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO - TRIBUTÁRIO - ICMS - Mercadoria importada do exterior - Fato gerador - Alegação de contrariedade ao art. 155, § 2º, inciso IX, alínea "a", da CF/88 - Matéria de prova - Aplicação (sic) do Enunciado da Súmula 279/STF - Ofensa reflexa - Parecer pelo não-conhecimento do recurso.

É o relatório.

VOTO: Na interposição deste recurso, foram observados os pressupostos gerais de recorribilidade. Os documentos de folhas 10 e 488 evidenciam a regularidade da representação processual e do preparo. Quanto à oportunidade, a decisão impugnada teve notícia veiculada no Diário de 8 de setembro de 1998, terça-feira (folha 406), ocorrendo a manifestação do inconformismo em 23 imediato, quarta-feira (folha 408), no prazo assinado em lei.

Examino, então, o tema de fundo, a implicar o conhecimento, em si, do recurso e o posterior provimento ou desprovimento. Eis a verdade formal, incontroversa a esta altura, segundo os parâmetros objetivos do acórdão prolatado pela Corte de origem, da lavra proficiente do desembargador Márcio Bonilha:

a) nas guias de importação, consta como importadora a Sociedade Comercial Oceania;
b) a empresa importadora mantinha, com a ora recorrente, "acordo comercial FUNDAP", figurando como consignatária;
c) a importadora promoveu o desembaraço das mercadorias, recolhendo os tributos devidos;
d) o ICMS foi pago ao Estado do Espírito Santo;
e) o desembaraço aduaneiro realizou-se no Porto de Santos;
f) na nota fiscal, a importadora debitou o ICMS;
g) a recorrente promoveu o crédito, visando a compensar o imposto devido no Estado de São Paulo na posterior venda dos produtos;
h) as mercadorias importadas não entraram fisicamente no estabelecimento importador;
i) as mercadorias importadas não transitaram no Estado do Espírito Santo;
j) ao desembaraço alfandegário, no Porto de Santos, seguiu-se a entrada das mercadorias diretamente no estabelecimento da recorrente, situado no Estado de São Paulo.

Então, concluiu o Tribunal de origem que o tributo deveria ter sido recolhido aos cofres do Estado de São Paulo, pouco significando a circunstância de a sociedade importadora contar com estabelecimento no Estado do Espírito Santo, onde desfruta vantagens fiscais e financeiras, considerado o sistema FUNDAP. Proclamou a Corte competir à unidade da Federação em que processado o desembaraço da mercadoria cobrar o tributo, aludindo à circulação com aquisição e entrada no estabelecimento situado no próprio território da Unidade.

Poucas vezes defrontei-me com processo a revelar drible maior ao Fisco. O acordo comercial FUNDAP, formalizado entre a importadora e a ora recorrente, é pródigo na construção de ficções jurídicas para chegar-se à mitigação do ônus tributário, isso em vista do fato de a importadora encontrar-se cadastrada no sistema FUNDAP, tendo jus, por isso, a vantagens fiscais. No acordo, previu-se que a importadora figuraria nas operações de importação dele objeto como consignatária, o que implica dizer que não atuaria como senhora, em si, de importação de mercadorias para posterior venda, mas como simples intermediária, vindo a ser reembolsada em tudo o que despendesse, inclusive tributos, frete, armazenagem, desembaraço aduaneiro e demais despesas pertinentes à operação, ficando a cargo da ora recorrente a definição das mercadorias, alfim, entabular o negócio jurídico no exterior, com fixação de preço. Onde a lealdade aos princípios básicos à vida democrática, aos princípios assentados na Lei Maior? A toda evidência, tem-se quadro escancarado de simulação.
Nada obstante, examinemos também o caso à luz do que se contém na própria Carta da República, deixando momentaneamente em segundo plano os vícios de vontade estampados no acordo firmado, a manobra em que potencializado o desejo de lograr vantagens fiscais, em detrimento do interesse geral. O alcance do artigo 155, § 2º, inciso IX, alínea "a", da Constituição Federal foi elucidado pelo Plenário em julgamentos ocorridos em 23 de outubro de 1996: Recurso Extraordinário nº 144.660-9/RJ, do qual fui relator, havendo sido designado para redigir o acórdão o ministro Ilmar Galvão - Diário da Justiça de 21 de novembro de 1997; Recurso Extraordinário nº 192.711-9/SP, tendo como relator o ministro Ilmar Galvão - Diário da Justiça de 18 de abril de 1997 - e Recurso Extraordinário nº 193.817-0/RJ, também relatado pelo ministro Ilmar Galvão - Diário da Justiça de 10 de agosto de 2001. Então, a Corte apontou como fato gerador do tributo, revelando-o devido nesse momento, o despacho aduaneiro e, em interpretação sistemática do regime da Carta anterior e do regime da atual, entendeu como sujeito ativo do tributo aquele no qual situado o porto em que recebidas as mercadorias, em que realizado o despacho aduaneiro. Procedeu-se à análise da Emenda Constitucional nº 23/83, que acrescentou o § 11 ao artigo 23 da Carta anterior:

"§ 11. O imposto a que se refere o item II" - ICM - "incidirá, também, sobre a entrada em estabelecimento comercial, industrial ou produtor, de mercadoria importada do exterior por seu titular, inclusive quando se tratar de bens destinados a consumo ou ativo fixo do estabelecimento."

Sob a égide desse texto, a Corte veio a editar o Verbete nº 577 da Súmula:

Na importação de mercadorias do exterior, o fato gerador do imposto de circulação de mercadorias ocorre no momento de sua entrada no estabelecimento do importador.

Então, examinando a nova normatividade constitucional, o Plenário, na verve do relator, deixou assentado:

Desnecessário muito esforço interpretativo para concluir-se que a necessidade de definição do Estado competente para a exigência do ICMS decorreu da alteração introduzida quanto ao elemento temporal referido ao fato gerador do tributo, na hipótese em tela, que deixou de ser o momento da entrada da mercadoria no estabelecimento do importador para ser o do recebimento da mercadoria importada.

Explicitou mais:

Com efeito, no sistema anterior, em que se tinha a obrigação tributária como surgida no momento da entrada no estabelecimento do importador, não se fazia mister a alusão ao Estado credor, que não poderia ser outro senão o da situação do estabelecimento. Antecipado o elemento temporal para o momento do recebimento da mercadoria, vale dizer, do desembaraço, fez-se ela necessária, tendo em vista que a entrada da mercadoria, não raro, se dá em terminal portuário ou aéreo situado fora dos limites do Estado de destino da mercadoria.
Consagrou a nova Carta, portanto, finalmente, a pretensão, de há muito perseguida pelos Estados, de verem condicionado o desembaraço da mercadoria ou do bem importado ao recolhimento, não apenas dos tributos federais, mas também do ICMS incidente sobre a operação.

É extremo de dúvida que, ante os precedentes mencionados, o Colegiado Maior decidiu ser credor do tributo o Estado onde aportada a mercadoria, ficando mitigada a referência a estabelecimento destinatário. De qualquer forma, como já salientado, nota-se quadro a estampar, a mais não poder, procedimento conflitante com o apego às balizas normativas regedoras da espécie, porque a mercadoria apenas circulou no Estado de São Paulo, jamais havendo ingressado no Estado outorgante dos benefícios fiscais percebidos pelo ajuste entre a ora recorrente e a importadora, alfim, em estabelecimento desta situado no Estado do Espírito Santo. Cumpre, então, subscrever o que decidido pela Corte de origem, concluindo-se, assim, pelo desprovimento do recurso.

É como voto.

* acórdão pendente de publicação



Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
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Informativo STF - 389 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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