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quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Informativo STF 374 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF


Brasília, 13 a 17 de dezembro de 2004 - Nº 374.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO

Plenário
IPI. Alíquota Zero. Não-Tributação. Creditamento - 2
Ato Conjunto e Reajuste de Remuneração
Transferência "Ex Officio" entre Instituições de Ensino e Congeneridade
Crédito-Prêmio do IPI: Delegação de Atribuições - 3
Constituição Estadual: Aplicação, Integração e Interpretação de Legislação Estadual
Extradição. Direito Intertemporal. Dupla Tipicidade. "Abolitio Criminis". Prescrição - 2
Prerrogativa de Foro e Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca
1º Turma
Prisão Preventiva e Garantia da Ordem Pública

Representação de Desaforamento e Intimação de Advogado
Crime Continuado - 5
Regime Inicial de Cumprimento e Crime Apenado com Detenção - 2
Prisão Preventiva e Excesso de Prazo
Prisão Preventiva: Crime Hediondo e Prisão Domiciliar
Competência de Auditoria Militar e Furto Qualificado
2º Turma
Operação Anaconda: Trancamento de Ação Penal e Art. 288 do CP - 2

Interceptação Telefônica. Prazo. Renovação. Falsidade Ideológica. Atipicidade - 3
Crime Hediondo e Substituição de Pena Privativa de Liberdade por Restritiva de Direitos
Prisão Preventiva e Garantia da Ordem Pública - 2
Aplicação de Medida Sócio-Educativa de Internação
Roubo Qualificado e Regime de Cumprimento de Pena
Clipping do DJ
Transcrições

Extradição ativa - Incompetência do Supremo Tribunal Federal - Prerrogativa de Estados soberanos. (Ext 955/DF)

PLENÁRIO


IPI. Alíquota Zero. Não-Tributação. Creditamento - 2

O Tribunal retomou julgamento de recurso extraordinário interposto pela União contra acórdão do TRF da 4ª Região que dera parcial provimento a apelação em mandado de segurança para reconhecer o direito do contribuinte do IPI de creditar o valor do tributo na utilização de insumos favorecidos pela alíquota zero e pela não-tributação - v. Informativo 361. Após os votos dos Ministros Gilmar Mendes e Ellen Gracie, que davam provimento ao recurso, na linha do que decidido pelo relator, pediu vista dos autos o Min. Cezar Peluso.
RE 353657/PR, rel. Min. Marco Aurélio, 15.12.2004. (RE-353657)

Ato Conjunto e Reajuste de Remuneração

O Tribunal concedeu medida cautelar em ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República para suspender, com eficácia ex tunc, o ato Conjunto 1/2004, das Mesas do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, que determina a aplicação de reajuste de 15%, a partir de 1º.11.2004, sobre os estipêndios dos servidores dessas duas Casas Legislativas e do TCU. O Pleno entendeu presentes o fumus boni iuris, porquanto o ato normativo impugnado, por não ser lei, a princípio, viola os incisos X do art. 37, IV do art. 51 e XIII do art. 52, todos da CF, e o periculum in mora, já que o reajuste concedido seria implementado na folha de pagamento de dezembro, onerando os cofres públicos.
ADI 3369 MC/DF, rel. Min. Carlos Velloso, 16.12.2004. (ADI-3369)

Transferência "Ex Officio" entre Instituições de Ensino e Congeneridade

O Tribunal julgou procedente, em parte, pedido de ação direta ajuizada pelo Procurador-Geral da República contra o art. 1º da Lei 9.536/97 que prevê a possibilidade de efetivação de transferência ex officio de estudantes - servidores públicos civis ou militares, ou de seus dependentes - entre instituições vinculadas a qualquer sistema de ensino superior, quando requerida em razão de remoção ou transferência de ofício desses servidores que acarrete mudança de seu domicílio. Não obstante considerar consentânea com o texto constitucional a previsão normativa asseguradora do acesso a instituição de ensino na localidade para onde é removido o servidor, entendeu-se que a possibilidade de transferência entre instituições não congêneres permitida pela norma impugnada, especialmente a da particular para a pública, haja vista a envergadura do ensino, a própria gratuidade e a escassez de vagas oferecidas pela última, acabou por conferir privilégio, sem justificativa, a determinado grupo social em detrimento do resto da sociedade, a violar os princípios da isonomia, da impessoalidade e da moralidade da Administração Pública, da igualdade de condições para o acesso e permanência na escola superior (CF, art. 206, I) e a garantia do acesso aos níveis mais elevados do ensino (CF, art. 208, V). Por conseguinte, assentou-se a inconstitucionalidade do art. 1º da Lei 9.536/97, sem redução do texto, no que se lhe empreste o alcance de permitir a mudança, nele disciplinada, de instituição particular para pública, encerrando a cláusula "entre instituições vinculadas a qualquer sistema de ensino" a observância da natureza privada ou pública daquela de origem, viabilizada a matrícula na congênere, isto é, dar-se-á a matrícula em instituição privada se assim o for a de origem e em pública se o servidor ou o dependente for egresso de instituição pública.
ADI 3324/DF, rel. Min. Marco Aurélio, 16.12.2004. (ADI-3324)

Crédito-Prêmio do IPI: Delegação de Atribuições - 3

O Tribunal concluiu julgamento de recurso extraordinário em que se discutia a constitucionalidade do art. 1º do Decreto-lei 1.724/79, que autoriza o Ministro de Estado da Fazenda a aumentar, reduzir ou extinguir os estímulos fiscais de que tratam os artigos 1º e 5º do Decreto-lei 491/69 - v. Informativos 356 e 367. Por maioria, negou-se provimento ao recurso e declarou-se a inconstitucionalidade do referido artigo, no que implicou a delegação de atribuição ao Ministro de Estado da Fazenda para extinguir os mencionados incentivos fiscais, por ofensa ao princípio da legalidade, haja vista ter-se disposto, por meio de portaria, sobre crédito tributário, bem como ao parágrafo único do art. 6º da CF/69, que proibia a delegação de atribuições a qualquer dos Poderes ("Salvo as exceções previstas nesta Constituição, é vedado a qualquer dos Poderes delegar atribuições..."). Vencido o Min. Maurício Corrêa, relator, que dava provimento ao recurso.
RE 208260/RS, rel. orig. Min. Maurício Corrêa, rel. p/ acórdão Min. Marco Aurélio, 16.12.2004. (RE-208260)

Constituição Estadual: Aplicação, Integração e Interpretação de Legislação Estadual

O Tribunal, por maioria, julgou improcedente pedido de ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro contra o art. 369 - renumerado como art. 368 pela EC 4/91 - da Constituição fluminense ("Na aplicação, integração e interpretação das leis, decretos e outros atos normativos estaduais, ressalvada a existência de norma estadual específica, observar-se-ão os princípios vigentes quanto às da Constituição e das leis federais."). Afastou-se, inicialmente, a alegação de prejudicialidade suscitada pela Advocacia-Geral da União em decorrência da renumeração do artigo impugnado, já que promovido o devido aditamento da inicial. Quanto ao mérito, entendeu-se que o dispositivo em questão não inova a ordem jurídica, de modo a usurpar a competência legislativa da União, isto é, não dispõe sobre a interpretação e integração de leis, decretos e outros atos normativos de forma diversa da prevista na Lei de Introdução ao Código Civil, razão por que não afronta nem o pacto federativo nem a independência e harmonia entre os Poderes. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Carlos Britto que declaravam a inconstitucionalidade da referida norma.
ADI 246/RJ, rel. Min. Eros Grau, 16.12.2004. (ADI-246)

Extradição. Direito Intertemporal. Dupla Tipicidade. "Abolitio Criminis". Prescrição - 2

O Tribunal retomou julgamento de pedido de extradição formulado pelo Governo do Paraguai para entrega de nacional paraguaio processado, nesse país, pela prática dos crimes de estafa e estafa al estado, previstos, respectivamente, nos artigos 396 e 397, do Código Penal Paraguaio de 1914 - v. Informativo 366. O Min. Cezar Peluso, em voto-vista, indeferiu a extradição por entender que o pedido não atende ao requisito da precisa indicação dos fatos imputados ao extraditando na forma exigida pelo art. 2º do Tratado de Extradição entre os Governos do Brasil e do Paraguai e pelo art. 80 do Estatuto do Estrangeiro, o que impede a verificação da existência da dupla tipicidade, bem como da ocorrência ou não da prescrição. Em seguida, o Min. Carlos Britto, relator, pediu vista dos autos para melhor exame. O Tribunal, por maioria, ainda indeferiu questão de ordem suscitada no sentido de conceder prisão domiciliar ao extraditando. Vencidos, nesse ponto, os Ministros Marco Aurélio, suscitante, e Gilmar Mendes.
Ext 925/República do Paraguai, rel. Min. Carlos Britto, 17.12.2004. (Ext-925)

Prerrogativa de Foro e Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca

O Tribunal, por maioria, resolveu questão de ordem em inquérito instaurado contra o Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca da Presidência da República no sentido de declarar a incompetência do STF para julgar o feito. Na espécie, o querelado fora denunciado pela suposta prática de crimes contra a honra, previstos na Lei de Imprensa, que teriam ocorrido quando exercia o cargo de Prefeito de Chapecó-SC. Entendeu-se que o Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca, por não ser Ministro de Estado, não possui a prerrogativa de foro estabelecida no parágrafo único do art. 25, da Lei 10.683/2003, com a redação dada pela Lei 10.869/2004, e que a extensão de prerrogativas, garantias, vantagens e direitos equivalentes aos Ministros de Estado a que alude o §1º do art. 38 da referida Lei repercute somente nas esferas administrativa, financeira e protocolar, mas não na estritamente constitucional. Vencido o Min. Joaquim Barbosa que declarava a competência desta Corte (Lei 10.683/2003: "Art. 25... Parágrafo único. São Ministros de Estado os titulares dos Ministérios, o Chefe da Casa Civil, o Chefe do Gabinete de Segurança Institucional, o Chefe da Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica, o Chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, o Chefe da Secretaria de Coordenação Política e Assuntos Institucionais da Presidência da República, o Advogado-Geral da União, o Ministro de Estado do Controle e da Transparência e o Presidente do Banco Central do Brasil ... Art. 38. São criados os cargos de natureza especial de Secretário Especial do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, de Secretário Especial de Aqüicultura e Pesca, de Secretário Especial dos Direitos Humanos e de Secretário Especial de Políticas para as Mulheres da Presidência da República. § 1o Os cargos referidos no caput terão prerrogativas, garantias, vantagens e direitos equivalentes aos de Ministro de Estado.").
Inq 2044 QO/SC, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 17.12.2004. (Inq-2044)


PRIMEIRA TURMA


Prisão Preventiva e Garantia da Ordem Pública

Ressaltando a excepcionalidade do caso concreto, a Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus impetrado em favor de denunciado, juntamente com terceiros, pela suposta prática do crime de homicídio qualificado de líder ruralista de região conhecida por graves conflitos fundiários. Pretendia-se, na espécie, a revogação da prisão preventiva decretada na fase inquisitiva e mantida após a instauração da ação penal, sob a alegação de ausência de fundamentação idônea. Entendeu-se que a prisão do paciente deveria subsistir com fundamento exclusivo na garantia da ordem pública, tendo em conta a notícia de ameaça a testemunhas, não obstante a falta de vinculação a réu específico, bem como o temor dessas e a insegurança na localidade em que o crime fora cometido. Ressaltou-se, ainda, que a necessidade da prisão ficaria mais evidente em razão de o decreto mencionar outros elementos agravadores da situação, consistentes na dificuldade de acesso à região e na falta de apoio do Estado, somando-se a isso o reduzido contigente policial na comunidade. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o writ por não vislumbrar que a citada ameaça pudesse ser concretamente atribuída ao paciente.
HC 84680/PA, rel. Min. Carlos Britto, 14.12.2004. (HC-84680)

Representação de Desaforamento e Intimação de Advogado

A Turma deferiu habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que entendera não ser obrigatória a intimação do paciente e de seu advogado da decisão deferitória de pedido de desaforamento formulado pelo juízo, e, ainda, que a inobservância dessa formalidade não implicaria ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Asseverou-se que, embora o regimento interno do tribunal de justiça local adotasse para o julgamento de representação de desaforamento o rito do habeas corpus, dispensando a sua publicação em pauta, de igual modo não se poderia concluir no sentido de que apenas o paciente, e não seu defensor, como ocorrera na espécie, devesse ter sido intimado para responder à representação, de cujo envio ao Tribunal o advogado sequer fora notificado. Writ deferido para cassar o acórdão do tribunal de justiça, a fim de que, após a prévia notificação do advogado do paciente para responder à representação, outro seja proferido conforme entender de direito.
HC 85052/MG, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 14.12.2004. (HC-85052)

Crime Continuado - 5

A Turma retomou julgamento de habeas corpus impetrado em favor de diretor-superintendente de um grupo de empresas, no qual se pretende a reunião de dezesseis ações penais contra ele instauradas - v. Informativos 334, 344, 349 e 355. O Min. Cezar Peluso, em voto-vista, concedeu a ordem, de ofício, para determinar a suspensão dos processos e da prescrição penal, enquanto as pessoas jurídicas relacionadas ao agente estiverem incluídas no REFIS, por entender, na linha do que decidido no HC 81929/RJ (DJU de 27.2.2004), que a Lei 10.684/2003 possui retroatividade por ser mais benéfica que a existente ao tempo da impetração (Lei 9.249/95) - a qual previa a extinção da punibilidade quando o pagamento fosse realizado até o recebimento da denúncia. O Min. Sepúlveda Pertence, relator, reafirmou o voto proferido na questão de ordem anteriormente suscitada. Após, o julgamento foi adiado em virtude de novo pedido de vista do Min. Cezar Peluso.
HC 81134/RS, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 14.12.2004. (HC-81134)

Regime Inicial de Cumprimento e Crime Apenado com Detenção - 2

A Turma concluiu julgamento de habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática, em concurso material, dos crimes de porte ilegal de arma e de disparo de arma de fogo em local habitado (Lei 9.437/97, art. 10, caput e §1º, III, respectivamente), a dois anos de detenção e ao pagamento de multa, sendo a pena privativa de liberdade fixada em regime inicial fechado, ao fundamento de ser incompatível a sua substituição, já que o paciente encontrava-se preso provisoriamente por outro fato - v. Informativo 372. Deferiu-se o writ para determinar que a pena privativa de liberdade seja cumprida em regime aberto, haja vista o fato de o juiz haver reconhecido os bons antecedentes do paciente e as circunstâncias judiciais favoráveis, e, de oficio, anulou-se a sentença para afastar a condenação por disparo de arma de fogo, reduzindo-se, em conseqüência, a pena para um ano de detenção e pagamento de multa, substituindo-a por pena restritiva de direito de prestação de serviços à comunidade ou à entidade pública. Entendeu-se que a sentença seria nula no capítulo em que condenara o paciente no tipo previsto no art. 10, §1º, III, da citada Lei, porquanto caracterizaria provimento judicial ultra petita, dado que a denúncia descrevera o disparo de arma de fogo como mero acidente, ou seja, fruto de movimento corpóreo involuntário e indesejado pelo paciente e que, não havendo previsão expressa no ordenamento jurídico de modalidade culposa, a conduta do acusado seria atípica. Asseverou-se, ainda, que, em se tratando de mutatio libelli, o disposto no art. 384 do CPP deveria ter sido observado, embora o feito estivesse sob a competência de juizado especial criminal, por força do que estabelece o art. 92 da Lei 9.099/95 ("Aplicam-se, subsidiariamente as disposições dos Códigos Penal e de Processo Penal, no que não forem incompatíveis com esta Lei."). Salientou-se, por fim, a inaplicabilidade da suspensão condicional da pena, na espécie, por ser mais prejudicial ao réu, tendo em conta o período mínimo de prova ser de dois anos (CP, art. 77, caput). O Min. Carlos Britto, relator, retificou seu voto e aderiu aos fundamentos do voto do Min. Cezar Peluso.
HC 85043/MS, rel. Min. Carlos Britto, 14.12.2004. (HC-85043)

Prisão Preventiva e Excesso de Prazo

Por excesso de prazo, a Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de acusado pela suposta prática do crime de homicídio, juntamente com terceiros, cuja prisão preventiva ultrapassava mais de um ano, sem que tivesse sido prolatada sentença. Entendeu-se que a superação do prazo, que não poderia ser atribuída ao paciente - o qual se encontrava preso por mais de 100 dias mesmo antes de iniciada a instrução criminal -, ultrapassava os limites dos juízos de razoabilidade. Considerou-se que o atraso se dera, inclusive, em decorrência da greve do Poder Judiciário paulista, que resultara no adiamento de audiência por impossibilidade de condução do paciente, e, ainda, do adiamento de outras duas audiências por período superior a dois meses: uma pelo não comparecimento de testemunha arrolada pelo parquet e outra em razão de problemas que teriam impedido a escolta de um dos co-réus.
HC 84907/SP, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 14.12.2004. (HC-84907)

Excesso de Prazo: Crime Hediondo e Prisão Domiciliar
Também por excesso de prazo, a Turma, resolvendo questão de ordem, deferiu liminar em habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática do crime de tráfico de entorpecentes (Lei 6.368/76, art. 12), para permitir que o paciente aguarde o julgamento de seu recurso de apelação em regime de prisão domiciliar, se por outro motivo não estiver preso. Na espécie, restaria um mês para o cumprimento integral da pena de três anos imposta ao paciente, preso em flagrante, cuja apelação fora interposta e ainda não remetida ao órgão de segunda instância competente para apreciar o caso. Salientou-se, inicialmente, que seria prematuro o julgamento do mérito da impetração, porquanto não houvera manifestação da Procuradoria-Geral da República nos autos. Ponderou-se, no entanto, que o réu se encontrava na iminência de cumprir, definitivamente, em sede de prisão cautelar, a integralidade da sanção que a ele fora imposta, sem que lhe tivesse sido oportunizada a revisão de sua reprimenda em sede de apelação. Asseverou-se a existência de pronunciamento do Ministério Público no sentido da absolvição do réu, o que tornaria temerária a sua custódia cautelar. Por fim, ressaltou-se que se o paciente estivesse em fase de execução da reprimenda, já estaria usufruindo do regime aberto de cumprimento de pena, não obstante tratar-se de crime hediondo, tendo em conta o posicionamento da Corte no sentido de conferir liminar enquanto pendente o julgamento do HC 82959/SP em que se discute a constitucionalidade do §1º do art. 2º da Lei 8.072/90. Determinou-se que seja oficiado o Presidente do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, transmitindo-lhe cópia da decisão, e ordenando-lhe o julgamento imediato da apelação interposta e a remessa, ao STF, da cópia do respectivo acórdão. Precedentes citados: HC 84122 QO/SP (DJU de 27.8.2004); HC 84734 MC/SP (DJU de 24.11.2004) e AC 504/SP (DJU de 24.11.2004).
HC 84539 QO/SP, rel. Min. Carlos Britto, 16.12.2004. (HC-84539)

Competência de Auditoria Militar e Furto Qualificado

A Turma iniciou julgamento de recurso ordinário em habeas corpus interposto pelo Ministério Público Federal em favor de militares acusados da suposta prática do crime de furto qualificado, consistente na subtração, mediante arrombamento, de objetos de banca de jornal, cuja ação penal fora instaurada perante vara de auditoria militar. No caso concreto, a competência da auditoria militar fora fixada em razão de o STF haver declarado a constitucionalidade do art. 94 da LC 94/93, do Estado de Rondônia, que dispõe sobre a competência da auditoria militar para processar crimes genéricos, em face do art. 125, §4º, da CF (ADI 1218/RO, DJU de 8.11.2002). O Min. Marco Aurélio, relator, deu provimento ao recurso para declarar a competência do Juiz de Direito da 3ª Vara Criminal de Porto Velho, no que foi acompanhado pelos Ministros Eros Grau, Carlos Britto e Cezar Peluso. Inicialmente, conheceu do recurso, ressaltando a jurisprudência sedimentada do STF no sentido de o habeas corpus poder ser ajuizado pelo Ministério Público. No mérito, tendo em conta os termos da denúncia, asseverou que deve ser dado alcance consentâneo com a Constituição à nomenclatura do órgão investido do ofício judicante. Assim, conforme consignado no julgamento da mencionada ADI, a referência ao processamento de feitos criminais genéricos, contida no art. 94, IX, da referida LC, não abrangeria a competência da vara de auditoria militar, como juízo natural, para o julgamento de crimes comuns. Após, pediu vista dos autos o Min. Sepúlveda Pertence.
RHC 85025/RO, rel. Min. Marco Aurélio, 16.12.2004. (RHC-85025)


SEGUNDA TURMA


Operação Anaconda: Trancamento de Ação Penal e Art. 288 do CP - 2

A Turma concluiu julgamento de habeas corpus impetrado em favor de juiz federal denunciado com terceiros, com base em investigações procedidas na denominada "Operação Anaconda", pela suposta prática do crime de formação de quadrilha (CP, art. 288). Sustentava-se, na espécie, o trancamento da ação penal sob as seguintes alegações: a) ocorrência de violação das normas de processo; b) ausência de justa causa para a propositura da ação penal, em razão da inépcia da denúncia, bem como da inexistência de participação em quadrilha e da não descrição da elementar "estabilidade"; c) existência de omissões na denúncia e d) constrangimento ilegal ocasionado pelo acórdão do STJ que recebera a denúncia - v. Informativo 373. Por maioria, deferiu-se o habeas corpus, por se reconhecer a inépcia da denúncia oferecida contra o ora paciente, determinando-se, em conseqüência, quanto a ele, a extinção do processo penal em que oferecida. Considerou-se a denúncia vaga e indeterminada, a afrontar a proteção judicial efetiva e o princípio da dignidade humana. Ressaltou-se que, se não fosse a discussão que tramita em outro processo, não se teria menção alguma com relação à participação do paciente. Vencido o Min. Joaquim Barbosa, relator, que indeferia o writ. Retificou seu voto a Min. Ellen Gracie.
HC 84409/SP, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, 14.12.2004. (HC-84409)

Interceptação Telefônica. Prazo. Renovação. Falsidade Ideológica. Atipicidade - 3

A Turma concluiu julgamento de habeas corpus impetrado em favor de magistrado, denunciado, com base em investigações procedidas na denominada "Operação Anaconda", pela suposta prática dos crimes de falsidade ideológica (CP, art. 299) e interceptação telefônica ilegal (Lei 9.296/96, art. 10). Sustentava a impetração a atipicidade das condutas imputadas ao paciente e a nulidade das interceptações telefônicas que deram sustentação à denúncia, haja vista o excesso de prazo em sua renovação - v. Informativos 367 e 373. Por inépcia da denúncia, a Turma deferiu o writ, para afastar o crime de falsidade ideológica, extinguindo, quanto a este, o processo penal instaurado contra o paciente, tendo em conta não restar especificado o fato juridicamente relevante, resultante da suposta falsidade. No que se refere ao exame da aptidão formal da denúncia quanto ao delito de interceptação telefônica, a Turma, por maioria, deferiu o habeas corpus, para, também quanto a esse crime, extinguir a ação penal, por considerá-la inepta, uma vez que não fora demonstrada, na descrição dos fatos, a configuração dos elementos do tipo, a caracterizar quaisquer condutas, seja na forma tentada, seja na consumada, do art. 10 da Lei 9.296/96, limitando-se a peça acusatória a transcrever as conversas telefônicas, sem a observância dos requisitos à persecução penal. Vencidos, nesse ponto, os Ministros Joaquim Barbosa, relator, e Ellen Gracie, que o denegavam.
HC 84388/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 14.12.2004. (HC-84388)

Crime Hediondo e Substituição de Pena Privativa de Liberdade por Restritiva de Direitos

A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia a substituição da pena privativa de liberdade imposta aos pacientes, condenados por tráfico ilícito de entorpecentes, sob alegação de estarem presentes os requisitos previstos no art. 44 do CP. Entendeu-se incabível a substituição de pena privativa de liberdade por restritiva de direito - trazida ao CP pela Lei 9.714/98 - aos crimes elencados ou equiparados a hediondo, tendo em vista a vedação de progressão do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, hipótese em que deve ser estabelecido o regime integralmente fechado para o cumprimento da pena. Vencido o Min. Gilmar Mendes, relator, que deferia o writ por considerar aplicável à espécie a Lei 9.714/98.
HC 84422/RS, rel. orig. Min. Gilmar Mendes, rel. p/ acórdão Min. Joaquim Barbosa, 14.12.2004. (HC-84422)

Prisão Preventiva e Garantia da Ordem Pública - 2

A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia, sob alegação de insubsistência dos requisitos autorizadores da custódia cautelar, a revogação da prisão preventiva decretada contra denunciada como suposta mandante de crime de homicídio qualificado praticado contra o cônjuge - v. Informativo 373. Considerou-se que os fundamentos da conveniência da instrução criminal e da garantia de aplicação da lei penal não se sustentariam, porquanto a negativa de imputação feita pela paciente não induziria à conclusão de que ela coagiria testemunhas, e, ainda, porque o decreto de prisão teria tratado de forma genérica a questão relativa à ausência de atividade profissional dos co-réus, deixando de observar que a paciente possui residência fixa e exercia comércio. Entendeu-se, todavia, que subsistiria o fundamento da garantia da ordem pública, uma vez que o crime fora de enorme repercussão em comunidade interiorana, além de restarem demonstradas a periculosidade da paciente e a possibilidade de continuar a praticar atividades criminosas, fatores suficientes para a manutenção da custódia cautelar. Vencidos os Ministros Ellen Gracie e Celso de Mello que deferiam a ordem por não vislumbrar o risco à ordem pública, haja vista ser a denunciada primária, ter bons antecedentes, possuir atividade lícita, domicílio certo, haver praticado delito único e não ser criminosa habitual.
HC 84498/BA, rel. Min. Joaquim Barbosa, 14.12.2004. (HC-84498)

Aplicação de Medida Sócio-Educativa de Internação

A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se pretende a revogação de decisão que aplicara a adolescente medida sócio-educativa de internação, por prazo indeterminado, pela realização de ato infracional equiparado ao delito de seqüestro. Alega-se, na espécie, ausência de motivação na imposição de medida sócio-educativa mais gravosa, em violação ao previsto nos arts. 227, caput, da CF, e 18 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (Lei 8.069/90). Sustenta-se, também, a ofensa ao direito de proteção especial do adolescente, consubstanciado nos princípios constitucionais da excepcionalidade de qualquer medida privativa de liberdade e do respeito à condição especial de pessoa em desenvolvimento (CF, art. 227, § 3º e ECA, art. 121). No caso concreto, o adolescente fora representado pela prática das condutas tipificadas nos arts. 157, § 2º, I e II, e 148 c/c art. 29, todos do CP, por haver, em concurso e unidade de desígnios, assaltado, utilizando-se de arma de fogo, e mantido a vítima em cárcere privado. A sentença de 1º grau, reformada, julgara improcedente a representação ao fundamento de que o menor agira mediante coação. A Min. Ellen Gracie, relatora, indeferiu o writ. Inicialmente, ressaltou que, tendo sido a representação julgada procedente no que concerne ao ato infracional correspondente ao seqüestro, incide, em tese, o disposto no art. 122, I, do ECA ("Art. 122. A medida de internação só poderá ser aplicada quando: I - tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa"). Entendeu que o acórdão proferido pelo tribunal de justiça estadual fundamentara suficientemente a imposição da medida, porquanto ficara comprovado não tratar o caso de coação irresistível, tal como alegado pelo paciente em juízo, tendo em conta as afirmações feitas à técnica em entrevista na qual dissera que sua atuação fora espontânea no episódio, e ainda, em razão de a vítima ter declarado que o paciente vigiara o cativeiro por quase uma hora, sem que ali estivesse outra pessoa. Ademais, a gravidade do fato justificaria a internação porque o paciente revelara inaptidão para conviver em sociedade. Salientou, por fim, que juízo diverso acerca da adequação da medida sócio-educativa aplicada, implicaria, necessariamente, o exame de fatos e provas, inviável em habeas corpus. Após, pediu vista o Min. Joaquim Barbosa.
HC 85148/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 14.12.2004. (HC-85148)

Roubo Qualificado e Regime de Cumprimento de Pena

A Turma, por maioria, indeferiu pedido de habeas corpus impetrado em favor de condenado, por roubo qualificado, a cumprimento de pena inicialmente no regime fechado. O impetrante alegava que a condenação se dera com fundamento apenas na gravidade em abstrato do delito, sem que houvesse motivação concreta para a imposição do regime fechado. Entendeu-se que, ao deferir o writ, ocorreria abrandamento excessivo no cumprimento da pena, a estimular no criminoso, que faz do crime de roubo um meio habitual de vida, o sentimento de impunidade. Ademais, ressaltou-se que o paciente fará jus à progressão de regime com o cumprimento de 1/6 da pena, o que equivaleria, no caso concreto, a aproximadamente 10 meses em regime fechado, haja vista que lhe fora aplicada a pena de 5 anos e 4 meses. Vencido o Min. Joaquim Barbosa, relator, que, por considerar inexistente qualquer outro fundamento para embasar o regime mais severo, aplicava os Enunciados das Súmulas 718 ("A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada") e 719 ("A imposição do regime de cumprimento mais severo do que a pena aplicada permitir exige motivação idônea") do STF.
HC 84974/SP, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, rel. p/ acórdão Min. Gilmar Mendes, 14.12.2004. (HC-84974)

Sessões

Ordinárias

Extraordinárias

Julgamentos

Pleno15.12.200416 e 17.12.200419
1a. Turma14.12.200416.12.2004277
2a. Turma14.12.2004----235


C L I P P I N G    D O    DJ
17 de dezembro de 2004

Inq N. 2.033-DF
RELATOR: MIN. NELSON JOBIM
EMENTA: INQUÉRITO. CRIME DE ASSÉDIO SEXUAL. RECEBIMENTO DE QUEIXA-CRIME. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS MÍNIMOS DE PROVA. QUEIXA-CRIME REJEITADA.
Para o recebimento de queixa-crime é necessário que as alegações estejam minimamente embasadas em provas ou, ao menos, em indícios de efetiva ocorrência dos fatos. Posição doutrinária e jurisprudencial majoritária. Não basta que a queixa-crime se limite a narrar fatos e circunstâncias criminosas que são atribuídas pela querelante ao querelado, sob o risco de se admitir a instauração de ação penal temerária, em desrespeito às regras do indiciamento e ao princípio da presunção de inocência. Queixa-crime rejeitada.
* noticiado no Informativo 352

HC N. 84.253-RO
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: HABEAS CORPUS - PROCEDIMENTO PENAL - RECONHECIMENTO DE QUE SE CONSUMOU, NA ESPÉCIE, A PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA DO ESTADO - PEDIDO, NESSE SENTIDO, FORMULADO PELO PRÓPRIO MINISTÉRIO PÚBLICO - IMPOSSIBILIDADE DE O "PARQUET", POR INTERMÉDIO DE NOVO REPRESENTANTE E MEDIANTE REINTERPRETAÇÃO E NOVA QUALIFICAÇÃO DOS MESMOS FATOS, CHEGAR A CONCLUSÃO DIVERSA DAQUELA QUE MOTIVOU O SEU ANTERIOR PEDIDO DE EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE - SITUAÇÃO QUE IMPEDE O PROSSEGUIMENTO DA PERSECUÇÃO PENAL - PEDIDO DEFERIDO.
- O arquivamento judicial do inquérito ou das peças que consubstanciam a "notitia criminis", quando requerido pelo Ministério Público, por ausência ou insuficiência de elementos informativos, não afasta a possibilidade de aplicação do que dispõe o art. 18 do CPP, hipótese em que, havendo notícia de provas substancialmente novas (Súmula 524/STF - RTJ 91/831), legitimar-se-á a reabertura das investigações penais (RTJ 106/1108 - RTJ 134/720 - RT 570/429 - Inq 1.947/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.).
- Inexistirá, contudo, essa possibilidade, se o Poder Judiciário, ao reconhecer consumada a prescrição penal, houver declarado extinta a punibilidade do indiciado/denunciado, pois, em tal caso, esse ato decisório revestir-se-á da autoridade da coisa julgada em sentido material, inviabilizando, em conseqüência, o ulterior ajuizamento (ou prosseguimento) de ação penal contra aquele já beneficiado por tal decisão, ainda que o Ministério Público, agindo por intermédio de novo representante e mediante reinterpretação e nova qualificação dos mesmos fatos, chegue a conclusão diversa daquela que motivou o seu anterior pleito de extinção da punibilidade. Precedentes.


Acórdãos Publicados: 406

T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.


Extradição ativa - Incompetência do Supremo Tribunal Federal - Prerrogativa de Estados soberanos. (Transcrições)

Ext 955/DF*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO


EMENTA: EXTRADIÇÃO ATIVA. FALTA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PEDIDO FORMULADO POR PESSOA FÍSICA. INADMISSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE ATIVA. PRERROGATIVA QUE APENAS ASSISTE A ESTADOS ESTRANGEIROS. EXTRADIÇÃO NÃO CONHECIDA.
- O Supremo Tribunal Federal, no sistema constitucional brasileiro, somente dispõe de competência originária para processar e julgar as extradições passivas, requeridas, ao Governo do Brasil, por Estados estrangeiros. Não compete à Suprema Corte apreciar, nem julgar da legalidade de extradições ativas, pois estas deverão ser requeridas, diretamente, pelo Estado brasileiro, aos Governos estrangeiros, em cujo território esteja a pessoa reclamada pelas autoridades nacionais.
- Os pedidos de extradição, por envolverem uma relação de caráter necessariamente intergovernamental, somente podem ser formulados por Estados soberanos, falecendo legitimação, para tanto, a meros particulares. Doutrina. Precedentes.


DECISÃO: Trata-se de pedido de extradição (fls. 02/05), "com antecipação de tutela", formulado por brasileiro que pretende, por este meio processual, obter o reconhecimento de que lhe assiste o direito de cumprir, no Brasil, a pena de prisão que lhe foi imposta, pela prática de dois (02) crimes de roubo, pela Justiça da República Portuguesa (fls. 14/22).
O autor da presente ação de extradição invoca, como fundamento jurídico de sua postulação, o Tratado que a República Federativa do Brasil e a República Portuguesa celebraram, em Brasília, em 05/09/2001, visando a disciplinar, entre essas Altas Partes Contratantes, a "Transferência de Pessoas Condenadas", em ordem a possibilitar "a transferência de uma pessoa condenada no território de uma delas para o território da outra, para nele cumprir ou continuar a cumprir uma condenação que lhe foi imposta por sentença transitada em julgado" (Artigo 2º, nº 1).
O pedido ora formulado, tal como deduzido, consubstancia verdadeiro pleito de extradição ativa, revelando-se estranho, por isso mesmo, à competência originária do Supremo Tribunal Federal, cujas atribuições jurisdicionais, em tema extradicional, restringem-se, unicamente, aos pedidos de extradição passiva, vale dizer, às postulações extradicionais submetidas, por Estados estrangeiros, à apreciação do Governo do Brasil.
Isso significa, portanto, que o pleito ora em exame refoge, por completo, à competência originária desta Corte, cuja disciplina - por derivar de matriz eminentemente constitucional - não pode estender-se a situações estranhas ao rol exaustivo inscrito no art. 102, I, da Carta Política (RTJ 39/56-59 - RTJ 43/129 - RTJ 44/563 - RTJ 50/72 - RTJ 53/776 - RTJ 159/28 - RTJ 171/101, v.g.).
Mais do que isso, cumpre advertir que apenas Estados estrangeiros dispõem de legitimidade ativa para deduzir, perante o Supremo Tribunal Federal, pedidos de extradição passiva (RTJ 99/1003 - Ext 313/Argentina, Rel. Min. LUIZ GALLOTTI), tendo em vista a norma consubstanciada no art. 102, I, "g", da Constituição da República:

"Extradição. Pressuposto. Competência.
1. É pressuposto essencial da extradição que seja ela requerida por Governo de país estrangeiro.
2. Pedido não conhecido, visto que formulado por autoridade judiciária estrangeira."
(RTJ 64/22, Rel. Min. BILAC PINTO - grifei)

"Extradição: inadmissibilidade da formulação do pedido por carta rogatória de juiz estrangeiro, suprida, porém, em diligência, por manifestação da representação diplomática do Estado de origem: HC por ausência do pedido que se julga prejudicado.
1. O processo de extradição passiva só se instaura mediante pedido de governo do Estado estrangeiro. (...)."
(RTJ 184/674, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Pleno - grifei)

Não custa ressaltar, neste ponto, na linha da diretriz jurisprudencial firmada por esta Corte, que o processo de extradição faz instaurar uma relação de caráter necessariamente intergovernamental, o que afasta a possibilidade de terceiros (como os particulares em geral), desvestidos de estatalidade, formularem pleitos de natureza extradicional.
Esse entendimento - não constitui demasia enfatizar - reflete-se no magistério de autorizados doutrinadores, como resulta claro das lições de CAROLINA CARDOSO GUIMARÃES LISBOA ("A Relação Extradicional no Direito Brasileiro", p. 130/131, item n. 2.2.1, 2001, Del Rey), de ALEXANDRE DE MORAES ("Constituição do Brasil Interpretada", p. 347, item n. 5.91, 2ª ed., 2003, Atlas), de UADI LAMMÊGO BULOS ("Constituição Federal Anotada", p. 271, 5ª ed., 2003, Saraiva), de GILDA MACIEL CORRÊA MEYER RUSSOMANO ("A Extradição no Direito Internacional e no Direito Brasileiro", p. 136, item n. 4, 3ª ed., 1981, RT) e de YUSSEF SAID CAHALI ("Estatuto do Estrangeiro", p. 363, item n. 27, 1983, Saraiva), dentre outros.
Cabe acentuar que o pleito ora deduzido por André Luiz Beltramin Guardia, embora impropriamente formulado por meio processual inadequado, poderá constituir objeto de apreciação das autoridades competentes, observado o contexto delineado pelo referido Tratado luso-brasileiro de "Transferência de Pessoas Condenadas", tão logo essa convenção bilateral complete o ciclo de sua incorporação ao plano do direito positivo interno brasileiro (RTJ 58/70 - RTJ 174/463-465 - RTJ 179/493-496), eis que - até o presente momento - o tratado internacional em questão, apesar de celebrado em 2001, não foi, até agora, aprovado, em caráter definitivo, pelo Congresso Nacional (CF, art. 49, I), o que impede que se pratiquem os atos subseqüentes: a ratificação presidencial, de um lado, e a ulterior promulgação executiva, por decreto governamental, de outro.
Vê-se, portanto, que, enquanto não se formalizar, em caráter definitivo, a recepção, por nosso ordenamento positivo interno, da mencionada convenção bilateral, esta não poderá ser aplicada, no plano doméstico, pelas autoridades nacionais brasileiras.
É que o sistema constitucional brasileiro não consagrou o efeito direto nem acolheu o postulado da aplicabilidade imediata dos tratados ou convenções internacionais.
Impende referir, neste ponto, observação que o Supremo Tribunal Federal fez no exame desse específico aspecto concernente ao procedimento de transposição formal, para a ordem jurídica doméstica, dos tratados, acordos, protocolos e convenções celebrados, pelo Brasil, no plano internacional:

"- A Constituição brasileira não consagrou, em tema de convenções internacionais ou de tratados de integração, nem o princípio do efeito direto, nem o postulado da aplicabilidade imediata.
Isso significa, de jure constituto, que, enquanto não se concluir o ciclo de sua transposição, para o direito interno, os tratados internacionais e os acordos de integração, além de não poderem ser invocados, desde logo, pelos particulares, no que se refere aos direitos e obrigações neles fundados (princípio do efeito direto), também não poderão ser aplicados, imediatamente, no âmbito doméstico do Estado brasileiro (postulado da aplicabilidade imediata).
- O princípio do efeito direto (aptidão de a norma internacional repercutir, desde logo, em matéria de direitos e obrigações, na esfera jurídica dos particulares) e o postulado da aplicabilidade imediata (que diz respeito à vigência automática da norma internacional na ordem jurídica interna) traduzem diretrizes que não se acham consagradas, nem positivadas no texto da Constituição da República, motivo pelo qual tais princípios não podem ser invocados para legitimar a incidência, no plano do ordenamento doméstico brasileiro, de qualquer convenção internacional, ainda que se cuide de tratado de integração, enquanto não se concluírem os diversos ciclos que compõem o seu processo de incorporação ao sistema de direito interno do Brasil. Magistério da doutrina. (...)."
(RTJ 174/463-465, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)

Registre-se, finalmente, que o tratado em questão ainda tramita perante a Câmara dos Deputados, sob a forma de Projeto de Decreto Legislativo (PDL nº 123/2003).
Em suma: a transferência demandada pelo ora requerente - uma vez concluído o ciclo de integração do tratado em referência (aprovação congressual + ratificação presidencial + promulgação executiva + publicação oficial) - deverá ser pleiteada, diretamente, pelo próprio interessado, perante a República Portuguesa (Artigo 4º), em petição dirigida à Procuradoria-Geral da República daquele Estado, designada, por Portugal, como autoridade central para efeito de exame do pedido em causa (Artigo 5º).
Sendo assim, pelas razões expostas, e considerando, sobretudo, a absoluta impropriedade do meio processual ora utilizado pelo interessado, não conheço, por incabível, deste "Pedido de Extradição com Antecipação de Tutela (...)" (fls. 02).
Arquivem-se os presentes autos.
Publique-se.

Brasília, 17 de dezembro de 2004.


Ministro CELSO DE MELLO
Relator


* decisão pendente de publicação


Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
informativo@stf.jus.br

 
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Informativo STF - 374 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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