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quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Informativo STF 372 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF


Brasília, 29 de novembro a 3 de dezembro de 2004 - Nº 372.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO


Plenário
Efeito Devolutivo de Recurso e Coisa Julgada

Denúncia. Peculato. Governador de Estado. §2º do Art. 327 do CP
Prerrogativa de Foro: Modelo Federal - 3
Ampliação de Estação Ecológica. Estudos Técnicos e Consulta Pública - 2
Medida Provisória: Arrecadação e Alienação de Diamantes Extraídos de Terras Indígenas
Lei 8.072/90: Art. 2º, § 1º - 3
MP Comum e Tribunal de Contas
1º Turma
Regime Inicial de Cumprimento e Crime Apenado com Detenção
Demissão de Servidor Público e Controle Jurisdicional
2º Turma
Imunidade de Advogado e Desacato

Clipping do DJ
Transcrições
Partidos Políticos - Legitimidade - Mandado de Segurança Coletivo - Tributo (RE 196184/AM)


PLENÁRIO


Efeito Devolutivo de Recurso e Coisa Julgada

O Tribunal julgou procedente pedido de ação cautelar para conferir efeito suspensivo a recurso extraordinário interposto contra acórdão do TSE e restabelecer sentença que cassara diploma de Prefeito por captação ilícita de sufrágio e que absolvera o Vice-Prefeito, requerente desta ação, da imputação de abuso de poder econômico. Na espécie, da sentença referida, apenas o Prefeito recorrera. Não obstante, o TRE reformara a decisão de 1º grau para cassar também o mandato do Vice-Prefeito, o que ensejara a interposição de recurso especial, sob a alegação de ofensa à coisa julgada, o qual fora improvido pelo TSE, por maioria, ao fundamento de que seria lícita a correção da questão atinente à matéria de ordem pública, qual seja, a subordinação jurídica do Vice-Prefeito ao que decidido em relação ao Prefeito, tendo em conta o efeito translativo do recurso ordinário. Preliminarmente, indeferiu-se, por ausência de interesse jurídico, o pedido de intervenção de terceiro, que alegava ter sido candidato da eleição anulada em que fora derrotada a chapa que encabeçara. No mérito, entendeu-se que a pronúncia do órgão recursal sobre a parcela não impugnada do capítulo decisório de sentença, ao transpor os limites do efeito devolutivo do recurso (CPC, art. 515, §1º), ofendeu a coisa julgada. Asseverou-se que o efeito translativo é apenas um dos subtipos do efeito devolutivo e que, salvo o caso de vício processual absoluto, que leve à anulação ou extinção do processo, sempre devolvido à cognição do Tribunal por conta daquele efeito, só serão conhecidas pelo Tribunal aquelas questões cuja solução serviu ou devia servir de fundamento dos capítulos decisórios impugnados pelo recurso, ou seja, o órgão recursal terá plena liberdade para análise das questões de fato e de direito debatidas na causa, inclusive as de ordem pública, desde que se restrinja aos limites da parcela impugnada do conteúdo decisório da sentença. Afastou-se, por fim, a possibilidade de o efeito do recurso do Prefeito alcançar o Vice-Prefeito, seu litisconsorte, com base no art. 509 do CPC, visto que a regra de extensão subjetiva do efeito devolutivo dos recursos só incide nos casos de litisconsórcio unitário.
AC 112/RN, rel. Min. Cezar Peluso, 1º.12.2004. (AC-112)

Denúncia. Peculato. Governador de Estado. §2º do Art. 327 do CP

O Tribunal concluiu julgamento de inquérito instaurado contra Deputado Federal pela suposta prática do crime previsto no art. 312 c/c art. 327, §2º, do CP, decorrente de desvio de recursos do Banco do Estado do Pará - BANPARÁ ocorrido em 1984, ano em que o acusado exercia o cargo de Governador daquele Estado - v. Informativo 371. Inicialmente, por maioria, rejeitou-se a alegação de prescrição relativa ao crime de peculato, por se entender aplicável ao caso a causa especial de aumento do § 2º do art. 327 do CP, já que, sendo o BANPARÁ espécie do gênero paraestatal, por essa razão, ter-se-ia conferido ao Governador de Estado poder de direcionamento e atuação nos seus negócios. Asseverou-se que a razão da regra do §2º do art. 327 do CP seria a de que os exercentes dos cargos de chefia do Executivo, dirigentes superiores da Administração Pública, teriam responsabilidade muito maior que a do mero exercente de cargo em comissão, e, portanto, maior poder de disposição dos bens públicos. Dessa forma, estariam, por interpretação compreensiva, incluídos na referida previsão legal. O Min. Carlos Britto, ratificando seu voto, salientou, ainda, que o texto constitucional, ao atribuir ao Presidente da República a direção superior da Administração Federal (CF, art. 84, II), fez do exercício das chefias do Poder Executivo, nas três esferas, uma função de direção da Administração Pública, e que seria interpretação lógica do §2º do art. 327 do CP a incidência da majorante também em relação a esses cargos políticos que são ocupados por autoridades nomeantes dos cargos em comissão e das funções de assessoramento, pois, do contrário, poderia ocorrer hipótese em que o auxiliar seria punido mais severamente que o responsável geral pela Administração Pública. Vencidos, no ponto, os Ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello, Eros Grau, que reformulou seu voto, e Nelson Jobim, Presidente, que, considerando inaplicável a referida majorante aos agentes políticos, sob pena de ofensa ao princípio da reserva de lei em matéria penal, reconheciam a prescrição relativa ao crime de peculato. Em seguida, por unanimidade, recebeu-se a denúncia por se considerar configurado, em tese, o crime imputado ao acusado. (CP: "Art. 327 ... § 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.").
Inq 1769/DF, rel. Min. Carlos Velloso, 1º.12.2004. (Inq-1769)

Prerrogativa de Foro: Modelo Federal - 3

O Tribunal concluiu julgamento de ação direta ajuizada pelo Partido dos Trabalhadores - PT contra a alínea e do inciso VIII do art. 46 da Constituição do Estado de Goiás, na redação dada pela EC 29/2001, que, ampliando as hipóteses de foro especial por prerrogativa de função, outorgou ao Tribunal de Justiça estadual competência para processar e julgar, originariamente, "os Delegados de Polícia, os Procuradores do Estado e da Assembléia Legislativa e os Defensores Públicos, ressalvadas as competências da Justiça Eleitoral e do Tribunal do Júri" - v. Informativos 340 e 370. Por maioria, acompanhando a divergência iniciada pelo Min. Carlos Britto, julgou-se procedente, em parte, o pedido, e declarou-se a inconstitucionalidade da expressão "e os Delegados de Polícia", contida no dispositivo impugnado. Entendeu-se que somente em relação aos Delegados de Polícia haveria incompatibilidade entre a prerrogativa de foro conferida e a efetividade de outras regras constitucionais, tendo em conta, principalmente, a que trata do controle externo da atividade policial exercido pelo Ministério Público. Considerou-se, também, nos termos dos fundamentos do voto do Min. Gilmar Mendes, a necessidade de se garantir a determinadas categorias de agentes públicos, como a dos advogados públicos, maior independência e capacidade para resistir a eventuais pressões políticas, e, ainda, o disposto no §1º do art. 125 da CF, que reservou às constituições estaduais a definição da competência dos respectivos tribunais. Vencidos, em parte, os Ministros Maurício Corrêa, relator, Joaquim Barbosa, Cezar Peluso e Carlos Velloso que julgavam o pedido integralmente procedente, e Marco Aurélio e Celso de Mello que o julgavam integralmente improcedente.
ADI 2587/GO, rel. orig. Min. Maurício Corrêa, rel. p/ acórdão Min. Carlos Britto, 1º.12.2004. (ADI-2587)

Ampliação de Estação Ecológica. Estudos Técnicos e Consulta Pública - 2

O Tribunal concluiu julgamento de mandado de segurança impetrado contra ato do Presidente da República que, por decreto, ampliara os limites territoriais de estação ecológica no Estado do Rio Grande do Sul - v. Informativo 360. Concedeu-se, por maioria, a ordem por se entender imprescindível, para ampliação de estação ecológica, a existência da consulta pública a que alude o §2º do art. 22 da Lei 9.985/2000 (que regulamenta o art. 225, § 1º, incisos I, II, III e VII da CF e institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza). Salientou-se, ainda, a inaplicabilidade do §4º do referido art. 22, porquanto o mesmo dispensa a consulta pública somente no caso de criação de estação ecológica. Vencidos os Ministros Marco Aurélio, relator, Eros Grau, Joaquim Barbosa e Ellen Gracie, que denegavam a segurança por considerarem extensível a regra do mencionado §4º à hipótese de ampliação. (Lei 9.985/2000: "Art. 22. ...§ 2º A criação de uma unidade de conservação deve ser precedida de estudos técnicos e de consulta pública que permitam identificar a localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade, conforme se dispuser em regulamento. ... § 4º Na criação de Estação Ecológica ou Reserva Biológica não é obrigatória a consulta de que trata o § 2º deste artigo.").
MS 24665/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ acórdão Min. Cezar Peluso, 1º.12.2004. (MS-24665)

Medida Provisória: Arrecadação e Alienação de Diamantes Extraídos de Terras Indígenas

O Tribunal, por maioria, indeferiu cautelar em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB contra a Medida Provisória 225/2004, que autoriza a Caixa Econômica Federal, em caráter excepcional e por tempo determinado, a arrecadar e alienar em hasta pública os diamantes brutos em poder de indígenas. Entendeu-se carente de plausibilidade jurídica o pedido de suspensão da MP, visto que - consideradas as peculiaridades do caso, quais sejam, a lavra já consumada e a situação emergencial descrita na exposição de motivos da MP, consistente nos conflitos existentes na região decorrentes da comercialização ilegal das pedras - estariam preenchidos os pressupostos autorizadores da edição da norma, bem como não teria havido, a princípio, usurpação da competência exclusiva do Congresso Nacional para autorizar pesquisa e lavra de riquezas minerais de terras indígenas (CF, art. 49, XVI e 231, §3º). Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia a cautelar.
ADI 3352 MC/DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 2.12.2004. (ADI-3352)

Lei 8.072/90: Art. 2º, § 1º - 3

O Tribunal retomou julgamento de habeas corpus no qual se discute a constitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90, que veda a possibilidade de progressão do regime de cumprimento da pena nos crimes hediondos definidos no art. 1º da mesma Lei, em face dos princípios da individualização da pena e da isonomia, bem como se os crimes de estupro e atentado violento ao pudor, dos quais não resulta lesão corporal grave ou morte, caracterizam-se como hediondos - v. Informativos 315 e 334. O Min. Gilmar Mendes, em voto-vista, declarou a inconstitucionalidade do §1º do art. 2º da Lei 8.072/90, com eficácia ex nunc, e deferiu a ordem para que se devolva ao juízo de origem o exame sobre o preenchimento pelo paciente das condições para a progressão de regime. Entendeu que a vedação de progressão de regime prevista na Lei 8.072/90 afronta o direito fundamental à individualização da pena (CF, art. 5º, LXVI), já que, ao não permitir que se considerem as particularidades de cada pessoa, a sua capacidade de reintegração social e os esforços aplicados com vistas à ressocialização, acaba por afetar o núcleo essencial desse direito - limite ao qual a atuação do legislador estaria submetida -, tornando inócua a garantia constitucional. Afirmou que o dispositivo impugnado também ofende o princípio da proporcionalidade, em face da desnecessidade da medida como instrumento de combate à criminalidade, haja vista a existência de outros meios eficazes menos lesivos aos direitos fundamentais, e, ainda, apresenta incoerência, porquanto impede a progressividade, mas admite o livramento condicional após o cumprimento de dois terços da pena (CP, art. 83, V). Salientou, ainda, a incidência do disposto no art. 27 da Lei 9.868/99 também no controle incidental, e, considerando o reiterado posicionamento do Tribunal quanto ao reconhecimento da constitucionalidade da vedação da progressão de regime nos crimes hediondos e as possíveis conseqüências decorrentes da referida declaração nos âmbitos civil, processual e penal, ressaltou que o efeito ex nunc conferido deve ser entendido como aplicável às condenações que envolvam situações passíveis de serem submetidas ao regime de progressão. Quanto às demais questões levantadas, manteve a orientação da Corte no sentido de que o atentado violento ao pudor, tanto na forma simples quanto qualificada, é considerado crime hediondo, e de que incide a causa de aumento prevista no inciso III do art. 226 do CP. O julgamento foi suspenso com o pedido de vista da Min. Ellen Gracie.
HC 82959/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 2.12.2004. (HC-82959)

MP Comum e Tribunal de Contas

O Tribunal julgou procedente, em parte, pedido de ação direta proposta pelo Governador do Estado do Rio de Janeiro contra o inciso II do §2º do art. 128 da Constituição fluminense, o art. 18 de seu ADCT, e outros dispositivos das Leis Complementares estaduais 62/90 e 106/2003, que tratam da atuação de membros do Ministério Público comum estadual junto ao Tribunal de Contas estadual. Considerando a jurisprudência firmada sobre a matéria, consubstanciada no Enunciado 653 da Súmula do STF ("No Tribunal de Contas estadual, composto por sete conselheiros, quatro devem ser escolhidos pela Assembléia Legislativa e três pelo Chefe do Poder Executivo estadual, cabendo a este indicar um dentre auditores e outro dentre membros do Ministério Público, e um terceiro à sua livre escolha."), bem como a imprescindibilidade de que uma das vagas existentes no Tribunal de Contas estadual deva ser, necessariamente, destinada a membro do Ministério Público especial, entendeu-se que as normas impugnadas, ao permitirem que membros do Ministério Público comum estadual integrassem a composição do Tribunal de Contas local em vaga que deveria ser destinada à integrante do Ministério Público especial junto à Corte de Contas, violaram os arts. 73, §2º, I (determina que a nomeação recaia sobre membro do Ministério Público junto ao Tribunal); 75 (dispõe que os estados-membros devem observar o modelo federal instituído, quanto à organização, composição e fiscalização dos respectivos Tribunais de Contas) e 130 ("Aos membros do Ministério Público junto aos Tribunais de Contas aplicam-se as disposições desta seção pertinentes a direitos, vedações e forma de investidura."), todos da CF. Declarou-se, por conseguinte, a inconstitucionalidade art. 1º; do art. 3º e seu parágrafo único; do art. 4º; da expressão "dentre os Procuradores em exercício junto ao Tribunal de Contas", constante do parágrafo único do art. 5º; do inciso I do parágrafo único do art. 5º; e do art. 6º, todos da LC estadual 62/90, e da expressão "e a lista de que trata o art. 128, § 2º, II, da Constituição do Estado", constante do inciso V do caput do art. 9º; da alínea b do inciso III do art. 39; e da expressão "e ao Tribunal de Contas do Estado", constante do caput do art. 42, todos da LC estadual 106/2003. No que se refere ao art. 128, § 2º, II, da Constituição fluminense, na redação dada pela EC estadual 13/2000, e ao art. 18 de seu ADCT, na redação dada pela EC estadual 25/2002, o Tribunal deu interpretação conforme a Constituição, para, sem redução de texto, restringir-lhes a exegese, em ordem a que, afastada qualquer outra possibilidade interpretativa, seja fixado o entendimento de que o MP referido em tais normas é o MP especial com atuação exclusiva junto ao Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro.
ADI 2884/RJ, rel. Min. Celso de Mello, 2.12.2004. (ADI-2884)

PRIMEIRA TURMA


Regime Inicial de Cumprimento e Crime Apenado com Detenção

A Turma iniciou julgamento de habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática, em concurso material, dos crimes de porte ilegal de arma e de disparo de arma de fogo em local habitado (Lei 9.437/97, art. 10, caput e §1º, III, respectivamente), a dois anos de detenção e ao pagamento de multa, cuja pena privativa de liberdade fora fixada em regime inicial fechado, ao fundamento de ser incompatível a sua substituição, já que o paciente encontrava-se preso provisoriamente por outro fato. Pretende-se, na espécie, a concessão da ordem para que seja fixado o regime aberto, sob a alegação de ilegalidade do regime imposto, uma vez que os bons antecedentes do paciente e a existência de circunstâncias judiciais favoráveis (CP, art. 59) restaram reconhecidos na sentença condenatória, o que ensejara a fixação de ambas as reprimendas no mínimo legal previsto. Além disso, sustenta-se que o art. 33 do CP proíbe a fixação de regime fechado para os condenados à pena de detenção e que não constituiria fundamento válido o fato de o paciente, à época da sentença, encontrar-se preso provisoriamente por outro fato, já que inexiste condenação em relação a este. O Min. Carlos Britto, relator, tendo em conta as circunstâncias judiciais favoráveis consignadas na sentença, deferiu o writ por entender que a custódia provisória do acusado em processo diverso, dada a sua natureza cautelar, por ser o único fundamento da sentença para fixar o regime fechado, não poderia servir de óbice para a fixação do regime legalmente previsto na ocasião da sentença condenatória. Asseverou que eventual condenação posterior no outro processo implicaria o recálculo das penas pelo juízo da execução e a atualização do regime adequado de cumprimento da condenação (LEP, arts. 111 e 118), mas que não caberia a imposição, desde logo, de regime mais gravoso. Esclareceu que a ressalva quanto à regressão da pena (CP, art. 33) não se aplicaria à hipótese, visto que esta diz respeito à fixação de regime inicial de cumprimento de pena. Ressaltou, por fim, que tal decisão não impediria a ocorrência de eventual regressão por fato posterior, nos termos do art. 118 da LEP e tampouco inviabilizaria, por si só, eventuais prisões cautelares decretadas contra o paciente. Após, pediu vista dos autos o Min. Cezar Peluso.
HC 85043/MS, rel. Min. Carlos Britto, 30.11.2004. (HC-85043)

Demissão de Servidor Público e Controle Jurisdicional

A Turma deu provimento a recurso ordinário em mandado de segurança interposto contra acórdão do STJ que, não vislumbrando nulidade em processo administrativo, dado que o exame das questões ensejaria a análise de fatos e do mérito de ato administrativo, denegara mandado de segurança impetrado contra ato do Advogado-Geral da União e do Ministro de Estado dos Transportes que culminara na demissão do recorrente do cargo de engenheiro do quadro de pessoal do Departamento Nacional de Estradas e Rodagem - DNER, por improbidade administrativa e por valer-se do cargo para lograr proveito pessoal de outrem, em detrimento da dignidade da função pública (Lei 8.112/90, art. 117, IX e Lei 8.429/92, art. 11, caput, e I). Na espécie, a autoridade competente fundamentara o ato punitivo em preceito diverso do sugerido pela comissão processante (Lei 8.112//90, art. 117, XV e Lei 8.429/92, arts. 10, caput e 11, caput), nos autos de processo administrativo disciplinar instaurado para apurar a responsabilidade funcional do recorrente na utilização de índices e métodos supostamente incorretos, quando da elaboração de cálculos de atualização da dívida objeto de acordo extrajudicial que seria celebrado entre o DNER e determinada construtora. Inicialmente, assentou-se a possibilidade, e o dever, de o Poder Judiciário, mediante análise dos motivos do ato administrativo, rever a pena de demissão imposta a servidor público. Em seguida, afastou-se a penalidade aplicada ao servidor, com base na referida Lei 8.112/90, porquanto violado o seu direito de ampla defesa, eis que no procedimento administrativo fora discutido apnas o fato de ele ter agido ou não com desídia, sem ser abordada a questão de a empresa ter logrado proveito, motivo determinante de sua demissão. Considerou-se, ainda, inválido esse mesmo motivo, já que verificada a inexistência de proveito da empresa, em virtude da rescisão do acordo extrajudicial, sem o pagamento de qualquer quantia. Quanto à penalidade imposta com base na Lei 8.492/92, entendeu-se que, verificada a prática de atos de improbidade administrativa, caberia representação ao Ministério Público para ajuizamento da competente ação e não a demissão, haja vista que a aplicação das penalidades previstas nessa Lei não incumbe à Administração por ser privativa do Poder Judiciário. RMS provido para, reformando o acórdão proferido pelo STJ, cassar o ato mediante o qual imposta a penalidade de demissão ao recorrente e determinar sua imediata reintegração ao cargo.
RMS 24699/DF, rel. Min. Eros Grau, 30.11.2004. (RMS-24699)

SEGUNDA TURMA


Imunidade de Advogado e Desacato

A Turma indeferiu habeas corpus no qual se pretendia o trancamento da ação penal instaurada contra o paciente, advogado, pela suposta prática do crime de desacato contra magistrada cometido em audiência. Alegava-se, na espécie, ausência de justa causa para a ação penal, pois o paciente teria sido preso antes do cometimento do crime e sua conduta seria "decorrente da irresignação de estar sofrendo uma pena injustamente e ilegalmente". Invocava-se como fundamento a imunidade do advogado. Considerou-se que a deficiência da impetração, sequer acompanhada da denúncia, impedia a análise da alegação de constrangimento ilegal. Salientou-se, com base na jurisprudência da Corte, estar excluída da imunidade profissional do advogado a ofensa dirigida a magistrado, bem como não ser cabível, na via processual eleita, a verificação da existência ou não do dolo do paciente. Por fim, ressaltou-se que a expressão "ou desacato", contida no § 2º do art. 7º da Lei 8.906/94, teve sua eficácia suspensa na ADI 1127/DF (DJU de 29.6.2001). (Lei 8.906/94, art. 7º, § 2º: "O advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria, difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a OAB, pelos excessos que cometer.").
HC 84795/GO, rel. Min. Gilmar Mendes, 30.11.2004. (HC-84795)

Sessões

Ordinárias

Extraordinárias

Julgamentos

Pleno

1º.12.2004

2.12.2004

9

1a. Turma

30.11.2004

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259

2a. Turma

30.11.2004

----

120


C L I P P I N G    D O    D J
3 de dezembro de 2004


ADI N. 1.991-DF
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. TRANSCRIÇÃO LITERAL DO TEXTO IMPUGNADO NA INICIAL. JUNTADA DA PUBLICAÇÃO DA LEI NO DIÁRIO OFICIAL NA CONTRACAPA DOS AUTOS. INÉPCIA. INEXISTÊNCIA. ARTIGOS 1º, 2º E 3º DA LEI DISTRITAL N. 1.516, DE 1997. EDUCAÇÃO: SEGURANÇA NO TRÂNSITO. INCLUSÃO DE NOVA DISCIPLINA NOS CURRÍCULOS DO PRIMEIRO E SEGUNDO GRAUS DE ENSINO DA REDE PÚBLICA DO DISTRITO FEDERAL. CONSTITUCIONALIDADE. COMPETÊNCIA COMUM DO ART. 23, XII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. RESSALVA QUANTO A EVENTUAL ANÁLISE DE LEGALIDADE DA CRIAÇÃO DAS DISCIPLINAS. LEI DE DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO (LEI N. 4.024/61). DISPENSA DO EXAME TEÓRICO PARA OBTENÇÃO DA CARTEIRA DE MOTORISTA. INCONSTITUCIONALIDADE. COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO. OFENSA AO ART. 22, XI DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. Não há falar-se em inépcia da inicial da ação direta de inconstitucionalidade quando transcrito literalmente o texto legal impugnado, anexada a cópia do Diário Oficial à contracapa dos autos. 2. É constitucional o preceito legal que inclui nova disciplina escolar nos currículos de primeiro e segundo graus de ensino da rede pública do Distrito Federal, conforme competência comum prevista no art. 23, XII, da Constituição do Brasil, ressalvada a eventual análise quanto à legalidade da inclusão das disciplinas, matéria de competência dos Conselhos de Educação Estadual e Federal, afeta à Lei de Diretrizes e Bases da Educação. 3. Inconstitucionalidade de artigo que dispensa do exame teórico para obtenção de carteira nacional de habilitação os alunos do segundo grau que tenham obtido aprovação na disciplina, sob pena de ofensa à competência privativa da União prevista no art. 22, XI, da Constituição do Brasil. 4. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente.
* noticiado no Informativo 368

ADI N. 2.851-RO
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. PRECATÓRIO. COMPENSAÇÃO DE CRÉDITO TRIBUTÁRIO COM DÉBITO DO ESTADO DECORRENTE DE PRECATÓRIO. C.F., art. 100, art. 78, ADCT, introduzido pela EC 30, de 2002. I. - Constitucionalidade da Lei 1.142, de 2002, do Estado de Rondônia, que autoriza a compensação de crédito tributário com débito da Fazenda do Estado, decorrente de precatório judicial pendente de pagamento, no limite das parcelas vencidas a que se refere o art. 78, ADCT/CF, introduzido pela EC 30, de 2000. II. - ADI julgada improcedente.
* noticiado no Informativo 367

ADI N. 3.210-PR
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO: CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. C.F., art. 37, IX. Lei 9.198/90 e Lei 10.827/94, do Estado do Paraná. I. - A regra é a admissão de servidor público mediante concurso público: C.F., art. 37, II. As duas exceções à regra são para os cargos em comissão referidos no inciso II do art. 37 e a contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público: C.F., art. 37, IX. Nessa hipótese, deverão ser atendidas as seguintes condições: a) previsão em lei dos casos; b) tempo determinado; c) necessidade temporária de interesse público excepcional. II. - Precedentes do Supremo Tribunal Federal: ADI 1.500/ES, 2.229/ES e 1.219/PB, Ministro Carlos Velloso; ADI 2.125-MC/DF e 890/DF, Ministro Maurício Corrêa; ADI 2.380-MC/DF, Ministro Moreira Alves; ADI 2.987/SC, Ministro Sepúlveda Pertence. III. - A lei referida no inciso IX do art. 37, C.F., deverá estabelecer os casos de contratação temporária. No caso, as leis impugnadas instituem hipóteses abrangentes e genéricas de contratação temporária, não especificando a contingência fática que evidenciaria a situação de emergência, atribuindo ao chefe do Poder interessado na contratação estabelecer os casos de contratação: inconstitucionalidade. IV. - Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente.
* noticiado no Informativo 369

MED. CAUT. EM ADI N. 3.269-DF
RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO
EMENTA: INCONSTITUCIONALIDADE. Ação direta. Lei distrital. Lei n° 2903/02 do Distrito Federal. Trânsito. Infrações. Tipificação. Direção de veículo em estado de embriaguez. Flagrante. Cominação de penalidades. Inconstitucionalidade aparente. Ofensa ao art. 22, XI, da CF. Liminar cautelar deferida. Precedentes. Deve concedida, em ação direta de inconstitucionalidade, medida cautelar para suspensão da vigência de lei que, aparentando ofensa direta ao disposto no art. 22, XI, da Constituição da República, tipifica infrações de trânsito e lhes comina penalidades.
* noticiado no Informativo 367

AG. REG. NA Rcl N. 1.908-SP
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: RECLAMAÇÃO - TÍTULOS DE CRÉDITO CONSTITUÍDOS NO EXTERIOR - PRETENDIDA HOMOLOGAÇÃO, PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, COM O OBJETIVO DE OUTORGAR-LHES EFICÁCIA EXECUTIVA - INADMISSIBILIDADE - INAPLICABILIDADE DO ART. 102, I, "H" DA CONSTITUIÇÃO - CONSEQÜENTE INOCORRÊNCIA DE USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - DESCABIMENTO DA RECLAMAÇÃO - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. - Os títulos de crédito constituídos em país estrangeiro, para serem executados no Brasil (CPC, art. 585, § 2º), não dependem de homologação pelo Supremo Tribunal Federal. A eficácia executiva que lhes é inerente não se subordina ao juízo de delibação a que se refere o art. 102, I, "h", da Constituição, que incide, unicamente, sobre "sentenças estrangeiras", cuja noção conceitual não compreende, não abrange e não se estende aos títulos de crédito, ainda que sacados ou constituídos no exterior. Doutrina. Precedentes. - Não estando em causa a possibilidade de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal, torna-se inviável a utilização da reclamação, quando promovida contra decisão de Tribunal judiciário, que, por entender incabível a exigência da prévia homologação a que se refere o art. 102, I, "h", da Carta Política, declara revestir-se de plena eficácia executiva, em território nacional, título de crédito constituído em país estrangeiro.

RE N. 401.436-GO
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO: REMUNERAÇÃO: REAJUSTE: 3,17%. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.225-45/2001. PARCELAMENTO DOS ATRASADOS: MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.225-45/2001, ART. 11. I. - O direito dos servidores ao índice residual de 3,17% foi reconhecido pela Administração: Medida Provisória 2.225-45/2001. II. - Parcelamento dos valores devidos até 31.12.2001, que passam a ser considerados passivos: Medida Provisória 2.225-45/2001, art. 11. Esse parcelamento, assim previsto, se for considerado de aceitação compulsória por parte do servidor público, é inconstitucional. É que dependeria ele do assentimento do servidor. No caso, inocorre a anuência do servidor. III. - Declaração da inconstitucionalidade parcial, sem redução do texto, do art. 11 da Medida Provisória nº 2.225-45/2001, mediante interpretação conforme, de modo a excluir do seu alcance as hipóteses em que o servidor se recuse, explícita ou tacitamente, a aceitar o parcelamento previsto. IV. - Recurso extraordinário conhecido e improvido.
* noticiado no Informativo 342

HC N. 84.593-SP
RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO
EMENTA: HABEAS CORPUS. REVOGAÇÃO DO SURSIS PROCESSUAL APÓS O PERÍODO DE PROVA, MAS POR FATOS OCORRIDOS ATÉ O TÉRMINO DAQUELE PERÍODO. PRETENSÃO DE QUE SEJA DECLARADA EXTINTA A PUNIBILIDADE DO PACIENTE, QUE ESTARIA CONSUMADA NO MOMENTO EM QUE SE VERIFICA O TÉRMINO DO PERÍODO DE PROVA. Caso em que a revogação teve como fundamento o descumprimento das condições estipuladas e aceitas na concessão do benefício, relativas ao comparecimento mensal e obrigatório em Juízo e à proibição de se ausentar da comarca sem prévia autorização (art. 89, § 4º, da Lei nº 9.099/95). Não se discute, portanto, aqui, a revogação pelo fato de o beneficiário vir a ser processado por outro crime (art. 89, § 3º, primeira parte), cujo exame da constitucionalidade, à luz do princípio da não-culpabilidade, foi afetado ao Plenário (HC 84.660). A melhor interpretação do art. 89, § 5º, da Lei nº 9.099/95 leva à conclusão de que não há óbice a que o juiz decida acerca da revogação do sursis ou da extinção da punibilidade após o final do período de prova. Assim, pode haver a revogação mesmo após expirado o referido período, desde que motivada por fatos ocorridos até o seu término. Precedente: HC 80.747. Habeas corpus indeferido.

HC N. 84.603-SP
RELATOR: MIN. SEPÚLVEDA PERTENCE
EMENTA: 1. Descumprimento da medida sócio-educativa aplicada pela prática de ato infracional, em tese, não sujeito à medida de internação e cometimento de novo ato infracional mediante grave ameaça ou violência à pessoa, apurado em processo diverso: Substituição da medida aplicada por outra de internação, com fundamento no art. 113 do Estatuto da Criança e do Adolescente (L. 8.069/90): Impossibilidade. A prática de ato infracional "mediante grave ameaça ou violência a pessoa" ou a reiteração "no cometimento de outras infrações graves" (Art. 122, I e II, respectivamente), embora justifiquem, per si - após o procedimento de apuração do ato infracional, com as garantias previstas -, a aplicação da medida de internação de que trata o art. 121, não servem para fundamentar a substituição da medida já aplicada pela de internação. De outro lado, descumprida, a medida de semiliberdade, por uma única vez, sequer caberia invocar, a regressão prevista no art. 122, III, aplicável apenas às hipóteses de "descumprimento reiterado e injustificado". Também não há falar em "internação-substituição" com fundamento no art. 113 da 8.069/90, tendo em vista que a substituição - na linha da tese adotada no HC 74.715, 2ª T., Maurício Corrêa, DJ 16.5.97 - somente é aplicável quanto às medidas específicas de proteção (arts. 101; e 112, VII). 2. Ordem deferida.
* noticiado no Informativo 369

HC N. 84.525-MG
RELATOR: MIN. CARLOS VELLOSO
EMENTA: PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE AMPARADA EM CERTIDÃO DE ÓBITO FALSA. DECRETO QUE DETERMINA O DESARQUIVAMENTO DA AÇÃO PENAL. INOCORRÊNCIA DE REVISÃO PRO SOCIETATE E DE OFENSA À COISA JULGADA. FUNDAMENTAÇÃO. ART. 93, IX, DA CF. I. - A decisão que, com base em certidão de óbito falsa, julga extinta a punibilidade do réu pode ser revogada, dado que não gera coisa julgada em sentido estrito. II. - Nos colegiados, os votos que acompanham o posicionamento do relator, sem tecer novas considerações, entendem-se terem adotado a mesma fundamentação. III. - Acórdão devidamente fundamentado. IV. - H.C. indeferido.
* noticiado no Informativo 370

T R A N S C R I Ç Õ E S
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Partidos Políticos - Legitimidade - Mandado de Segurança Coletivo - Tributo (Transcrições)

(v. Informativo 367)

RE 196184/AM*

RELATORA: MIN. ELLEN GRACIE

Voto: 1. O Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas entendeu, com fundamento no art. 5º, LXX, da Constituição, pela legitimidade ativa do Partido Socialista Brasileiro para impetrar mandado de segurança coletivo contra decreto do prefeito de Manaus que altera a planta de valores imobiliários para efeito de lançamento do IPTU, e que, conseqüentemente, majorou o tributo.
A discussão que se apresenta no recurso extraordinário é saber se partido político pode impetrar mandado de segurança coletivo, substituindo a todos os contribuintes do IPTU.
Dispõe o inciso LXX do art. 5º, da Constituição:

"LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:
a) partido político com representação no Congresso Nacional;
b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados."

A tese do recorrente no sentido da legitimidade dos partidos políticos para impetrar mandado de segurança coletivo estar limitada aos interesses de seus filiados não resiste a uma leitura atenta do dispositivo constitucional supra. Ora, se o Legislador Constitucional dividiu os legitimados para a impetração do Mandado de Segurança Coletivo em duas alíneas, e empregou somente com relação à organização sindical, à entidade de classe e à associação legalmente constituída a expressão "em defesa dos interesses de seus membros ou associados" é porque não quis criar esta restrição aos partidos políticos. Isso significa dizer que está reconhecido na Constituição o dever do partido político de zelar pelos interesses coletivos, independente de estarem relacionados a seus filiados.
Também entendo não haver limitações materiais ao uso deste instituto por agremiações partidárias, à semelhança do que ocorre na legitimação para propor ações declaratórias de inconstitucionalidade. Com efeito, o Plenário desta Corte, no julgamento da ADIMC 1.096 (DJ 07/04/2000), entendeu que o requisito da pertinência temática é inexigível no exercício do controle abstrato de constitucionalidade pelos partidos políticos. Naquela ocasião o relator, Min. Celso de Melo assentou:

"Tenho para mim que os Partidos Políticos com representação no Congresso Nacional acham-se incluídos, para efeito de ativação da jurisdição constitucional concentrada do Supremo Tribunal Federal, no rol daqueles que possuem legitimação ativa universal, gozando, em conseqüência, da prerrogativa de impugnarem qualquer ato normativo do Poder Público, independentemente de seu conteúdo material.
A posição institucional dos Partidos Políticos no sistema consagrado pela Constituição do Brasil confere-lhes o poder-dever de, mediante instauração do controle abstrato de constitucionalidade perante o STF, zelarem tanto pela preservação da supremacia normativa da Carta Política quanto pela defesa da integridade jurídica do ordenamento consubstanciado na Lei Fundamental da República.
É preciso não perder de perspectiva a circunstância de que a Constituição Federal, ao delinear os mecanismos de atuação do regime democrático e ao proclamar os postulados básicos concernentes às instituições partidárias, consagrou, em seu texto, o próprio estatuto jurídico dos partidos políticos, definindo princípios que, revestidos de estatura jurídica incontrastável, fixam diretrizes normativas e instituem vetores condicionantes da organização e funcionamento das agremiações partidárias.
A normação constitucional dos partidos políticos tem por objetivo, desse modo, regular e disciplinar, em seus aspectos gerais, não só o processo de institucionalização desses corpos intermediários, como também assegurar o acesso dos cidadãos ao exercício do poder estatal, na medida em que pertence às agreamiações partidárias - e somente a estas - o monopólio das candidaturas aos cargos eletivos.
As agremiações partidárias, como corpos intermediários que são, atuam como canais institucionalizados de expressão dos anseios políticos e das reinvindicações sociais dos diversos estratos e correntes de pensamento que se manifestam no seio da comunhão nacional.
A ação dos partidos políticos - que se dirige, na concepção weberiana, à conquista do poder estatal - é informada por um substrato doutrinário de que deriva o perfil ideológico que ostentam.
Os partidos políticos constituem, pois, instrumentos de ação democrática, destinados a assegurar a autenticidade do sistema representativo. Formam-se em decorrência do exercício concreto da liberdade de associação consagrada no texto constitucional.
A importância jurídico-política das agremiações partidárias revela-se tão intensa que o ordenamento positivo nacional, ao consagrar o princípio do monopólio partidário das candidaturas, estabeleceu que a disputa dos cargos eletivos dar-se-á, apenas, através de partidos políticos. Desse modo, somente candidatos registrados por Partidos podem concorrer às eleições.
É extremamente significativa a participação dos partidos políticos no processo de poder. As agremiações partidárias, cuja institucionalização jurídica é historicamente recente, atuam como corpos intermediários, posicionando-se, nessa particular condição, entre a sociedade civil e a sociedade política. Os partidos políticos não são órgãos do Estado e nem se acham incorporados ao aparelho estatal. Constituem, no entanto, entidades revestidas de caráter institucional, absolutamente indispensáveis à dinâmica do processo governamental, na medida em que, consoante registra a experiência constitucional comparada, 'concorrem para a formação política do povo' (v. art. 21, n. 1, da Lei Fundamental de Bonn).
A essencialidade dos partidos políticos, no Estado de Direito, tanto mais se acentua quando se tem em consideração que representam eles um instrumento decisivo na concretização do princípio democrático e exprimem, na perspectiva do contexto histórico que conduziu à sua formação e institucionalização, um dos meios fundamentais no processo de legitimação do poder estatal, na exata medida em que o Povo - fonte de que emana a soberania nacional - tem, nessas agremiações o veículo necessário ao desempenho das funções de regência política do Estado.
Desse modo, o reconhecimento da legitimidade ativa das agremiações partidárias para a instauração do controle normativo abstrato, sem as restrições decorrentes do vínculo da pertinência temática, constitui natural derivação da própria natureza e dos fins institucionais que justificam a existência, em nosso sistema normativo, dos Partidos Políticos.
Não se pode perder de perspectiva que as entidades partidárias, necessariamente presentes em todas as instâncias legislativas, participam, por intermédio de seus representantes parlamentares, do processo de formação de quaisquer leis, cabendo-lhes, em conseqüência - e, sobretudo, no que concerne às minorias parlamentares que nos partidos políticos atuam -, o indisponível direito à fiscalização jurisdicional da constitucionalidade dos atos normativos."

Dessa forma, tudo o que foi dito a respeito da legitimação dos partidos políticos na ação direta de inconstitucionalidade pode ser aplicado ao mandado de segurança coletivo.
A previsão do art. 5º, LXX, da Constituição objetiva aumentar os mecanismos de atuação dos partidos políticos no exercício de seu mister, tão bem delineado na transcrição supra, não podendo, portanto, ter esse campo restrito à defesa de direitos políticos, e sim de todos aqueles interesses difusos e coletivos que afetam a sociedade.
A defesa da ordem constitucional pelos Partidos Políticos não pode ficar adstrita somente ao uso do controle abstrato das normas. A Carta de 1988 consagra uma série de direitos que exigem a atuação destas instituições, mesmo em sede de controle concreto. À agremiação partidária, não pode ser vedado o uso do mandado de segurança coletivo em hipóteses concretas em que estejam em risco, por exemplo, o patrimônio histórico, cultural ou ambiental de determinada comunidade.
Assim, se o partido político entender que determinado direito difuso se encontra ameaçado ou lesado por qualquer ato da administração, poderá fazer uso do mandado de segurança coletivo, que não se restringirá apenas aos assuntos relativos a direitos políticos e nem a seus integrantes.
Não se está a excluir a necessidade do atendimento dos requisitos formais previstos nos estatutos dos partidos, tampouco afastando a necessidade de respeito aos pressupostos de cabimento de mandado de segurança, que, no presente feito, não foram objeto de impugnação no recurso extraordinário. **
2. A hipótese dos autos, todavia, não trata de direito coletivo ou interesse difuso, mas da majoração de um tributo, o que, conforme já decidido pelo Plenário desta Corte, no RE 213.631, rel. Min. Ilmar Galvão (DJ 07/04/2000) configura um direito individualizável ou divisível, nos termos da ementa ora transcrita verbis:

"MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. TAXA DE ILUMINAÇÃO PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE RIO NOVO-MG. EXIGIBILIDADE IMPUGNADA POR MEIO DE AÇÃO PÚBLICA, SOB ALEGAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE. ACÓRDÃO QUE CONCLUIU PELO SEU NÃO-CABIMENTO, SOB INVOCAÇÃO DOS ARTS. 102, I, a, E 125, § 2º, DA CONSTITUIÇÃO.
Ausência de legitimação do Ministério Público para ações da espécie, por não configurada, no caso, a hipótese de interesses difusos, como tais considerados os pertencentes concomitantemente a todos e a cada um dos membros da sociedade, como um bem não individualizável ou divisível, mas, ao revés, interesses de grupo ou classe de pessoas, sujeitos passivos de uma exigência tributária cuja impugnação, por isso, só pode ser promovida por eles próprios, de forma individual ou coletiva.
Recurso não conhecido."

Se o Partido Político pode atuar na defesa do interesse de várias pessoas, independente de filiação, não pode, contudo, substituir todos os cidadãos na defesa de interesses individuais a serem postulados em juízo por meio de ações próprias.
Por estes motivos, entendo que o Partido Político pode impetrar mandado de segurança coletivo na defesa de qualquer interesse difuso, abrangendo, inclusive, pessoas não filiadas a ele, não estando, porém, autorizado a se valer desta via para impugnar uma exigência tributária.
3. Diante do exposto, conheço do recurso e lhe dou provimento, para, declarando a ilegitimidade ativa do recorrido, cassar a segurança. Custas ex lege.


* acórdão pendente de publicação

** a tese acerca da legitimidade irrestrita dos partidos políticos para mandado de segurança coletivo não foi acompanhada à unanimidade


Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
informativo@stf.jus.br

 
Praça dos Três Poderes - Brasília - DF - CEP 70175-900 Telefone: 61.3217.3000

Informativo STF - 372 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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