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quinta-feira, 26 de novembro de 2009

JURID - Direito aduaneiro. Transporte de mercadorias. [26/11/09] - Jurisprudência


Direito aduaneiro. Transporte de mercadorias. Avarias em container.


Superior Tribunal de Justiça - STJ.

RECURSO ESPECIAL Nº 958.956 - ES (2007/0129818-2)

RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI

RECORRENTE: COMPANHIA DOCAS DO ESPÍRITO SANTO - CODESA

ADVOGADO: ESMERALDO A L RAMACCIOTTI E OUTRO(S)

RECORRIDO: COMPANHIA DE SEGUROS MINAS BRASIL S/A

ADVOGADO: RENAN ELIAS DA SILVA

EMENTA

Direito aduaneiro. Transporte de mercadorias. Avarias em container. Falta de imediata lavratura do termo de avaria, pela entidade portuária. Matéria regulada pelo revogado Responsabilidade da entidade portuária, na qualidade de depositária dos bens. Arts. 470 e 479 do antigo Regulamento Aduaneiro (Decreto 91.030/85). Recurso improvido.

- Conforme entendimento pacificado pela Corte Especial, o termo "lei federal' abrange também os decretos, de modo que é possível conhecer de recurso especial interposto com base em sua violação (EREsp 663.562/RJ, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ de 18/2/2008).

- Os arts. 470 e 479 do antigo Regulamento Aduaneiro (Decreto 91.030/85), ao falarem da necessidade de imediata lavratura de termo de vistoria nas hipóteses de descarga de "volume avariado', referem-se aos danos verificados nos containeres, não nas mercadorias nele contidas. Assim, o momento de lavratura do referido termo é o do desembarque de tais containeres do navio, e não da respectiva abertura, no porto.

- Não tendo, a entidade portuária, feito qualquer ressalva quanto ao desembarque de container avariado, ela responde pelos danos verificados nas mercadorias importadas, nos termos do art. 2º do Decreto-lei 116/1967.

Recurso especial improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, Vasco Della Giustina e Paulo Furtado votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília (DF), 05 de novembro de 2009(data do julgamento)

MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):

Trata-se de recurso especial interposto por CODESA - COMPANHIA DOCAS DO ESPÍRITO SANTO, pelas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, para impugnação de acórdão exarado pelo TJ/ES no julgamento de recurso de apelação.

Ação: regressiva de cobrança, proposta por CIA. DE SEGUROS MINAS BRASIL em face de CODESA - CIA. DE DOCAS DO ESPÍRITO SANTO. Alega a autora, na inicial, que indenizou seu segurado, CHOCOLATES GAROTO S.A., pelo valor de quatro máquinas eletrônicas contadoras de bombons que haviam sido por ele importadas, mas que chegaram avariadas ao Porto.

A Autora argumenta que as avarias deveriam ter sido prontamente constatadas pela equipe que fez o desembarque dos containeres, no Porto de Capuaba, em Vila Velha, ES. A negligência quanto ao dever de imediata constatação das avarias implicaria assunção da responsabilidade pela respectiva indenização, pela administradora do porto.

Sentença: julgou procedente o pedido. A sentença foi impugnada por recurso de apelação, interposto pela CODES.

Acórdão: negou provimento ao recurso, nos termos da seguinte ementa:

"APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. TRANSPORTE MARÍTIMO. AÇÃO REGRESSIVA DE COBRANÇA MOVIDA POR SEGURADORA. RECEBIMENTO DE CONTAINER PELO PORTO. MERCADORIA AVARIADA. TERMO DE AVARIA LAVRADO A DESTEMPO. VISTORIA TARDIA. RESPONSABILIDADE ATRIBUÍDA À ENTIDADE PORTUÁRIA. PRESUNÇÃO LEGAL EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE PROTESTO POR OCASIÃO DO DESEMBARQUE DA MERCADORIA. PRECEDENTES DO STJ. AUSÊNCIA DE RECONHECIMENTO DO DIREITO AO ABATIMENTO DO VALOR DOS SALVADOS. FALTA DE PROVA DE QUE A MERCADORIA VARIADA FORA ENTREGUE À SEGURADORA. ÔNUS DA RÉ POR SER FATO MODIFICATIVO DO PLEITO AUTORAL. NÃO COMPROVADO O AN DEBEATUR NA FASE DE CONHECIMENTO, NÃO HÁ QUE SE RELEGAR A SUA PROVA PARA A LIQUIDAÇÃO DE SENTENÇA, SOB PENA DE PROLAÇÃO DE SENTENÇA CONDICIONAL. RECURSO DESPROVIDO.

I - A entidade portuária somente não tem responsabilidade pelo conteúdo do container avariado, se lavrar o termo de avaria oportunamente, ou seja, logo após o desembarque da carga pelo transportador, formalizando, assim, o protesto pela avaria externa verificada no container, solicitando, ato contínuo, a sua vistoria. Do contrário, incide presunção legal de que a avaria tenha ocorrido com a carga já na área portuária, quando já era de responsabilidade do porto, na qualidade de depositário. inteligência dos arts. 1º, §3º, 2º, caput, e 3º, caput; todos do Decreto-lei nº 116/1967; e dos arts. 42-D; 470, caput; e 479, parágrafo único, todos do Regulamento Aduaneiro (decreto nº 91.030/1985). Precedentes do STJ.

II - A simples menção, na fundamentação da Sentença recorrida, de que, se a Ré Apelante provar a entrega da mercadoria, poderá abater da condenação o valor dos salvados não caracteriza declaração desse direito, na medida em que parte da premissa de que não foi provado o fato modificativo do pleito autoral de que a Autora Apelada apossou-se dos salvados.

III - A prova de fato modificativo do direito autoral deve ser produzida na fase de conhecimento, pois constitui o 'an debeatur', ou seja, a existência do direito em si. Relevar a sua prova para a fase de liquidação de sentença, que se destina somente a apurar o 'quantum debeatur', tornaria condicional a sentença, eivando-a de nulidade. Exegese do art. 460, parágrafo único, do CPC.

IV - Recurso desprovido"

Embargos de declaração: opostos, foram rejeitados pelo TJ/ES.

Recurso especial: interposto com fundamento na alínea "a" do permissivo constitucional. Alega-se violação aos arts. 470 e 479 do Decreto 91.030/85 e do art. 1.267 do CC/16.

É o relatório.

VOTO

A EXMA. SRA. MINISTRA NANCY ANDRIGHI (Relator):

I - Delimitação da controvérsia

Cinge-se a controvérsia a definir a responsabilidade de concessionária de serviços portuários por avarias em mercadoria importada, na hipótese em que esta, na qualidade de depositária das mercadorias após o desembarque no porto, demora a promover a abertura dos contêineres, não obstante estes apresentem, no lado externo, avarias aparentes.

II - O Recurso especial contra Decreto

Antes de promover a análise do mérito recursal cabe, preliminarmente, debater a possibilidade de se argüir, em sede de recurso especial, violação a Decreto emanado do Poder Executivo.

A jurisprudência, tanto da 3ª como da 4ª Turmas, vinham se estabelecendo no sentido da impossibilidade de conhecimento do recurso especial em tais hipóteses. Nesse sentido citem-se, a título exemplificativo, o AgRg no Ag 1046039/SC (Rel. Min. Fernando Gonçalves, 4ª Turma, DJe de 22/6/2009) e REsp 295.310/RS (Rel. Min. Ari Pargendler, tendo eu sido designada relatora para acórdão, DJ de 10/5/2004). No âmbito da 1ª Seção, contudo, havia precedentes em sentido diverso, do que são exemplos o REsp 886.763/RS (Rel. Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, DJ de 18/4/2008) e o REsp 820.372/PR (Rel. Min. Teori Albino Zavascki, 1ª Turma, DJ de 29/5/2006).

A matéria foi levada à Corte Especial, que, em acórdão relatado pelo i. Min. Ari Pargendler, pacificou o entendimento no âmbito do STJ no sentido da possibilidade de interposição de recurso especial nessas hipóteses (EREsp 663.563/RJ, Rel. Min. Ari Pargendler, Corte Especial, DJ de 18/2/2008). Eis a ementa do julgado:

Processo civil. Recurso especial. Lei federal. O termo lei federal, para fins de interposição de recurso especial, abrange também os decretos. Embargos de divergência conhecidos e não providos.

Com isso, a matéria se pacificou, de modo que é possível, em princípio, conhecer deste recurso com fundamento na violação dos arts. 470 e 479 do Regulamento anexo ao Decreto 91.030/85.

III - A responsabilidade da depositária (arts. 470 e 479 do Regulamento Aduaneiro - Dec. 91.030/85 - e art. 1.267 do CC/16)

A norma do art. 1.266 do CC/16 (art. 630 do CC/02) regula, de maneira geral, as hipóteses de depósito voluntário de bens. O depósito tratado nos autos, contudo, é regulado, de maneira específica, pelas disposições do Regulamento Aduaneiro, que prevalecem, portanto, sobre a disciplina geral do Código Civil. Não se cogita, portanto, da violação do art. 1.266 do CC/16 que, de resto, sequer foi prequestionado.

À época dos fatos, o Regulamento Aduaneiro era o estabelecido do Decreto nº 91.030/85. Hoje esse decreto se encontra revogado, tendo sido substituído, primeiramente, pelo Decreto nº 4.543/2002 e, depois, pelo Decreto nº 6.759/2009, que consubstancia o Regulamento Aduaneiro atual. De todo modo, tendo em vista que a lide se estabeleceu à época em que vigia referido Decreto 91.030/85, é com base nas suas disposições que o recurso deve ser julgado.

O art. 470 do Regulamento de então disciplinava:

Art. 470. Cabe ao depositário, logo após a descarga de volume avariado, lavrar termo de avaria, que será assinado também pelo transportador e visado pela fiscalização aduaneira.

Já o art. 479, cuja violação também é suscitada, dispunha:

Art. 479. O depositário responde por avaria ou falta de mercadoria sob sua custódia, assim como por danos causados em operação de carga ou descarga realizada por seus prepostos.

Parágrafo único. Presume-se a responsabilidade do depositário no caso de volumes recebidos sem ressalva ou protesto.

A tese desenvolvida no recurso especial é a de que o referido art. 470, ao determinar a lavratura de termo de avaria logo após a descarga, refere-se, não ao momento de recebimento dos containeres fechados no porto, mas ao momento de sua abertura e descarga da mercadoria. Para o recorrente "o container é mero equipamento ou acessório do veículo transportador, conforme preceitua o art. 3º, da Lei 6.288/75 e art. 24 parágrafo único, da Lei 9.611/98". Assim, ele "de maneira alguma pode ser confundido com a carga que transporta".

Em que pese a eloquência do raciocínio desenvolvido pelo recorrente, sua defesa não se sustenta porque se constata no antigo Regulamento Aduaneiro a não indicação da necessidade de lavratura de termo de avaria para as hipótese de mercadorias danificadas, mas de volumes avariados. Ao mencionar volume, o Regulamento claramente se referia aos containeres, não a seu conteúdo. O conteúdo é sempre tratado pelo termo mercadoria, sem sinônimos.

Isso fica claro pela leitura de diversos outros dispositivos do Regulamento Aduaneiro antigo. O art. 468, por exemplo, reza que a "a vistoria aduaneira destina-se a verificar a ocorrência de avaria ou falta de mercadoria estrangeira". Essa determinação, consoante dispõe o art. 469 do Regulamento, faz-se de imediato, pela análise do container (volume) desembargado: "O volume" diz a norma, "que, ao ser descarregado, apresentar-se quebrado (...) deverá ser objeto de conserto e pesagem, fazendo-se, ato contínuo, a devida anotação do registro de descarga".

A diferença entre volume, como continente, e mercadoria, como conteúdo, fica mais clara pela análise do art. 471 do Decreto, que disciplina: "Não será iniciada a verificação em volume que apresentar indícios de avaria ou falta de mercadoria, enquanto não for realizada a vistoria". Naturalmente, o volume que apresenta falta de mercadoria só pode ser o container.

Disso decorre, ao contrário do que sustenta o recorrente, a menção, feita pelo art. 470 do Regulamento Aduaneiro antigo, à necessidade da lavratura de termo de avaria logo após a descarga do volume avariado, refere-se, como bem notado pelo acórdão recorrido, ao container.

É importante ressaltar que esta interpretação se ajusta de maneira perfeita ao regime de responsabilidade pelos danos decorrentes do transporte marítimo de mercadorias. Com efeito, conforme ressaltou o TJ/ES, na hipótese dos autos, de duas, uma: (i) ou o container foi descarregado sem avarias, sofrendo os danos quando depositado sob a responsabilidade da recorrente; (ii) ou o container foi avariado durante o transporte, antes do desembarque.

Na primeira hipótese, a responsabilidade da depositária decorreria de maneira direta do art. 2º do Decreto-lei 116/1967 que determina que "a responsabilidade da entidade portuária começa com a entrada da mercadoria em seus armazéns, pátios ou locais outros destinados para o depósito (...)". Na segunda hipótese, a imediata lavratura do termo de avaria seria imprescindível para eximir a entidade portuária de responsabilidade pelos danos, à medida que o art. 3º do Decreto-lei 116/1967 determina que "a responsabilidade do navio ou embarcação transportadora começa com o recebimento da mercadoria a bordo, e cessa com a sua entrega à entidade portuária ou trapiche municipal, no porto de destino, ao costado do navio".

Forte em tais razões, nego provimento ao recurso especial.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

TERCEIRA TURMA

Número Registro: 2007/0129818-2 REsp 958956 / ES

Números Origem: 781622007 24950076141

PAUTA: 05/11/2009 JULGADO: 05/11/2009

Relatora
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro SIDNEI BENETI

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. MAURÍCIO VIEIRA BRACKES

Secretária
Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

AUTUAÇÃO

RECORRENTE: COMPANHIA DOCAS DO ESPÍRITO SANTO - CODESA

ADVOGADO: ESMERALDO A L RAMACCIOTTI E OUTRO(S)

RECORRIDO: COMPANHIA DE SEGUROS MINAS BRASIL S/A

ADVOGADO: RENAN ELIAS DA SILVA

ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Obrigações - Espécies de Contratos - Seguro

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.

Os Srs. Ministros Massami Uyeda, Sidnei Beneti, Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS) e Paulo Furtado (Desembargador convocado do TJ/BA) votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília, 05 de novembro de 2009

MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA
Secretária

Documento: 926812

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 18/11/2009




JURID - Direito aduaneiro. Transporte de mercadorias. [26/11/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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