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terça-feira, 24 de novembro de 2009

JURID - Ação penal. Condenação. Sentença condenatória. Pena. [24/11/09] - Jurisprudência


Ação penal. Condenação. Sentença condenatória. Pena. Individualização. Crime de guarda de substância entorpecente.
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Supremo Tribunal Federal - STF.

DJe nº 195 Divulgação 15/10/2009 Publicação 16/10/2009 Ementário nº 2378 - 3

SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 97.992-1 SÃO PAULO

RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO

PACIENTE(S): EDMAR DE ALMEIDA

IMPETRANTE(S): PAULO MARIOLA NETO E OUTRO(A/S)

COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

1. AÇÃO PENAL. Condenação. Sentença condenatória. Pena. Individualização. Crime de guarda de substância entorpecente. Delito de mera conduta. Circunstâncias judiciais favoráveis. Quantidade de droga. Elevação da pena-base. Fixação no triplo do mínimo legal. Abuso do poder discricionário do magistrado. Capítulo da sentença anulado. Precedente. Inteligência do artigo 59 do CP. No caso de crime de guarda de substância entorpecente, o qual é de mera conduta, não pode a pena-base ser fixada no triplo do mínimo pela só quantidade da droga apreendida.

2. AÇÃO PENAL. Condenação. Pena. Privativa de liberdade. Prisão. Causa de diminuição prevista no artigo 33 da Lei nº 11.343/2006. Cálculo sobre a pena cominada no artigo 12, caput, da Lei nº 6.368/76, e já definida em concreto. Admissibilidade. Criação jurisdicional de terceira norma. Não ocorrência. Nova valoração da conduta do chamado "pequeno traficante". Retroatividade da lei mais benéfica. HC concedido. Inteligência do artigo 5º, XL, da CF. A causa de diminuição de pena prevista no artigo 33 da Lei nº 11.343/2006, mais benigna, pode ser aplicada sobre a pena fixada com base no disposto no artigo 12, caput, da Lei nº 6.368/76.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência da Senhora Ministra ELLEN GRACIE, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em deferir o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Senhores Ministros CELSO DE MELLO e JOAQUIM BARBOSA.

Brasília, 08 de setembro de 2009.

Ministro CEZAR PELUSO - Relator

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - (Relator): 1. Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de EDMAR DE ALMEIDA, contra acórdão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que lhe denegou a ordem no HC º 113.005.

O paciente foi condenado à pena de 12 (doze) anos de reclusão, em regime integralmente fechado, pela prática do delito previsto no artigo 12, caput c.c. artigo 18, inc. III, da Lei nº 6.368/76.

Interpôs, então, recurso de apelação, ao qual o Tribunal de Justiça deu parcial provimento, para, afastando a causa de aumento de pena prevista no artigo 18, inc. III, da Lei nº 6.368/76, reduzir a pena para 9 (nove) anos de reclusão, em regime inicialmente fechado, de acordo com a Lei nº 11.464/07.

A defesa ingressou com pedido de writ perante o Superior Tribunal de Justiça, e no qual alegava constrangimento ilegal em razão da não aplicação da causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, parágrafo quarto, na proporção de 2/3 (dois terços), da Lei nº 11.343/06, bem como por ter sido a pena base aplicada acima do mínimo legal. A ordem foi denegada nos seguintes termos:

"HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. DOSIMETRIA DA PENA. QUANTIDADE E VARIEDADE DA DROGA. FUNDAMENTO IDÔNEO PARA A FIXAÇÃO DA PENA BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DA PENA. ARTIGO 33, PARÁGRAFO QUARTO, DA LEI 11.343/06. NÃO-PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS PARA A CONCESSÃO DO BENEFÍCIO.ORDEM DENEGADA.

1. No crime de tráfico de drogas, a quantidade do entorpecente deve ser considerada na fixação da pena-base, amparada no artigo 59 do Código Penal, uma vez que, atendendo à finalidade da Lei 6.368/76, que visa coibir o tráfico ilícito de entorpecentes, esse fundamento apresenta-se válido para individualizar a pena, dado o maior grau de censurabilidade da conduta. Precedentes do STJ.

2. Segundo o parágrafo quarto do artigo 33 da Lei 11.343/06, nos crimes relacionados ao tráfico ilícito de entorpecentes, as penas poderão ser reduzidas de 1/6 a 2/3, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa.

3. É inaplicável a minorante legal ao caso, uma vez que, embora o paciente seja primário e de bons antecedentes, ele não atende ao requisito previsto no mencionado dispositivo atinente à vedação de se dedicar à atividade criminosa, pois evidenciada nos autos a prática do tráfico, em razão da grande quantidade de substância entorpecente apreendida.

Precedentes do STJ.

4. Ordem denegada" (fl. 81, em apenso)

Alega o impetrante que a pena-base do paciente não poderia ter sido fixada em três vezes o mínimo legal tão-somente em razão da quantidade de droga apreendida.

Alega, ainda, que deve ser aplicada a causa de diminuição de pena prevista no artigo 33, parágrafo quarto, da Lei nº 11.343/06, não obstante a condenação do paciente ter-se dado ainda sob a vigência da Lei nº 6.368/76.

Requer, liminarmente, a declaração de nulidade do acórdão que fixou a pena-base do paciente em 9 (nove) anos de reclusão, bem como aplique, na proporção de 2/3 (dois terços), a causa especial de diminuição de pena prevista na nova lei de tóxicos. No mérito, reproduz idêntico pleito.

A liminar foi indeferida (fls. 35-37).

A Procuradoria-Geral da República manifestou-se pela denegação da ordem (fls. 40-45).

É o relatório.

VOTO

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - (Relator): 1. É caso de concessão da ordem.

Quanto à fixação da pena-base, extraio do capítulo da sentença:

"Na aplicação da pena, atento às diretrizes do artigo 59 do Código Penal, considero o delito como de alta gravidade pelos motivos acima argumentados (especialmente a elevada quantidade da droga apreendida - quase meia tonelada) e levo em consideração a culpabilidade e antecedentes, de modo que fixo a pena base para os dois réus, no triplo acima do mínimo" (fl. 24, em apenso).

Verifica-se, portanto, que o juízo de primeiro grau se ateve a dois fundamentos para fixar a pena-base acima do mínimo legal: a gravidade do delito, evidenciada pela quantidade de maconha que o réu mantinha em depósito, e as suas circunstâncias pessoais.

No que se refere à gravidade do delito, a Corte já decidiu que a quantidade de droga apreendida pode justificar a elevação da pena-base; não, porém, quando em aberta desproporcionalidade:

"EMENTA: I. Sentença condenatória: motivação bastante da participação no crime atribuída ao paciente, não se prestando o procedimento sumário e documental do habeas corpos para responder à indagação sobre o ajustamento de fundamentação ao conjunto da prova.

II Individualização da pena: limites da chamada "discricionariedade judicial": fixação da pena no triplo do mínimo cominado ao crime que se funda exclusivamente nos resultados potenciais de um crime de mera conduta, como o de guarda de substância entorpecente, ainda que em grande quantidade: nulidade parcial da condenação." (RHC nº 84.082, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, DJ 04.06.2004)

No caso do precedente - que, a propósito, cuidava de apreensão de quantidade substancialmente maior de droga - ponderou o eminente relator:

"Basta a circunstância de que, no caso, que é da modalidade de guarda de substância entorpecente -, o crime é de mera conduta, para evidenciar que falta coerência lógica-jurídica entre a circunstância invocada - os resultados potenciais da quantidade da droga apreendida - e a elevação da pena-base"

Tal consideração, a toda evidência, convém ao caso. A quantidade de droga apreendida não é, por si só, suficiente a justificar a elevação da pena-base na proporção adotada.

Quanto ao segundo fundamento, cumpre notar que, não obstante ter dado parcial provimento à apelação, o Tribunal local reconheceu os bons antecedentes do paciente:

"Conquanto o MMº Juiz de primeiro grau tenha reconhecido na sentença que o réu é primário e, a princípio, não integra organização criminosa e nem se dedica a atividade criminosa, tal causa de diminuição de pena não deve ser aplicada aos crimes cometidos sob a égide da lei antiga, como o caso em testilha" (fl. 42, em apenso).

De fato, o juízo de primeiro grau já havia afirmado, na sentença condenatória, que "a prova não indica que os acusados mantivessem duradoura e organizada ligação para a prática do delito" (fl. 24). E, como comprova o impetrante (fl. 25) e reconhece o acórdão ora impugnado (fl. 66, em apenso), o paciente é primário, sem registro de inquéritos ou de processos anteriores. Assim, incurial a majoração da pena-base por conta dos "antecedentes" do réu.

2. Quanto à aplicação da causa especial de diminuição de pena inscrita no artigo 33, parágrafo quarto, da Lei nº 11.343/06, também assiste razão ao impetrante.

Centra-se a questão em apurar, nos contornos do caso, o alcance do princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica. É que, ao mesmo tempo em que introduziu causa de diminuição da pena para o delito de tráfico de entorpecentes, a nova lei de tóxicos lhe aumentou a pena mínima e proibiu a aplicação de diversos institutos.

Resta saber, pois, se é lícita a aplicação isolada da causa de diminuição de pena aos delitos cometidos sob a égide da lei antiga, tendo por base as penas então cominadas.

Em caso análogo, já me manifestei sobre a rabo da nova lei de tóxicos, verbis:

"[Não há como repudiar a aplicabilidade da causa de diminuição também a situações anteriores, pois foi essa nova valoração da conduta menos perigosa daquele que se convencionou chamar de "pequeno traficante", em oposição ao "grande traficante", que lhe motivou a previsão legal. O propósito claro da lei foi punir de maneira menos severa pessoas nas condições nela disciplinadas, sem nenhuma correlação, por si, com as novas penas aplicáveis ou aplicadas." (HC nº 95.435, Rel. p/ ac. Min. CEZAR PELUSO, DJ 06.11.2008)

Assim, não se está a tratar de tertia lex ou conjugação indireta de leis, o que não se admite. É que o instituto que prevê a causa especial de diminuição de pena, qual seja, o artigo 33, parágrafo quarto, da Lei nº 11.343/06, pode incidir independentemente de quaisquer outros critérios ou requisitos previstos nesta ou em outra lei, conforme afirmei no julgamento do referido habeas corpus.

Está-se, portanto, simplesmente diante do princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica, que não pode ser afastado.

Possível a aplicação da causa especial de diminuição de pena, cumpre verificar se estão presentes, no caso, os requisitos objetivos. O acórdão do STJ respondeu negativamente à questão, nos seguintes termos:

"É inaplicável a minorante legal ao caso, porquanto, embora o paciente seja primário, ele não atende aos requisitos previstos no mencionado dispositivo atinente á vedação de se dedicar á atividade criminosa, pois evidenciada nos autos a prática do tráfico, em razão da grande quantidade da substância entorpecente apreendida, bem como a ter bons antecedentes, inclusive, utilizado pelo juízo sentenciante para elevar a pena-base acima do mínimo legal" (fl 66)

Mas já apontei que os documentos trazidos à impetração e o teor das decisões impugnadas dão conta de que o paciente não apresenta maus antecedentes, pelo que ressaltei a impropriedade da majoração da pena-base sob tal fundamento.

Sobre o requisito de que o réu "não se dedique à atividades criminosas nem integre organização criminosa", é evidente que não se exige que o acusado não tenha cometido nenhum crime, caso em que o agente não poderia sequer ser processado. A expressão legal "atividades criminosas" somente faz sentido se interpretada como prática reiterada de crimes como meio de vida.

Ora, ao examinar o conjunto probatório, tanto o juízo de primeiro grau (fls. 24), quanto o Tribunal de Justiça (fl. 42, em apenso) afastaram, expressamente, tal hipótese, fundamentando a inaplicabilidade do benefício tão-somente em lei diversa.

Assim, preenchidos os requisitos legais, incide a causa de diminuição de pena.

3. Isto posto, concedo a ordem, para, cassando a sentença condenatória de primeiro grau no capítulo da fixação da pena, determinar seja outra proferida a respeito, atendendo ao caráter formal do delito, e observando o disposto no artigo 33, parágrafo quarto, da Lei nº 11.343/06, bem como o afastamento da causa de aumento prevista no artigo 18, inc. III, da Lei nº 6.368/76, nos termos determinados pelo Tribunal local.

Ministro CEZAR PELUSO - Relator

EXTRATO DE ATA

HABEAS CORPUS 97.992-1

PROCED.: SÃO PAULO

RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO

PACTE.(S): EDMAR DE ALMEIDA

IMPTE.(S): PAULO MARIOLA NETO E OUTRO (A/S)

COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Decisão: A Turma, à unanimidade, deferiu o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Senhores Ministros Celso de Mello e Joaquim Barbosa. 2ª Turma, 08.09.2009.

Presidência da Senhora Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Senhores Ministros Cezar Peluso, Joaquim Barbosa e Eros Grau. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Celso de Mello.

Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto Nóbrega.

Carlos Alberto Cantanhede - Coordenador




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