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quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Informativo STF 567 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF

Informativo STF


Brasília, 9 a 13 de novembro de 2009 - Nº 567.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO

Plenário
Art. 3º, I, da EC 58/2009: Recomposição das Câmaras Municipais e Devido Processo Eleitoral - 1
Art. 3º, I, da EC 58/2009: Recomposição das Câmaras Municipais e Devido Processo Eleitoral - 2
Extradição: Legalidade do Ato de Concessão de Refúgio e Natureza dos Crimes Imputados ao Extraditando - 11
Extradição: Legalidade do Ato de Concessão de Refúgio e Natureza dos Crimes Imputados ao Extraditando - 12
1ª Turma
Organização Criminosa e Enquadramento Legal - 1
Organização Criminosa e Enquadramento Legal - 2
Livramento Condicional e Preenchimento dos Requisitos Objetivos e Subjetivos
Dosimetria da Pena e Mesmas Circunstâncias Judiciais
Princípio da Insignificância e Crime de Roubo
2ª Turma
Legitimidade do Ministério Público: Ação Civil Pública e Patrimônio Público Municipal
Repercussão Geral
Clipping do DJ
Transcrições
Rebelião - Carandiru - Responsabilidade Civil Objetiva - Dever de Indenizar (AI 299125/SP)
Inovações Legislativas


PLENÁRIO

Art. 3º, I, da EC 58/2009: Recomposição das Câmaras Municipais e Devido Processo Eleitoral - 1

O Tribunal, por maioria, referendou liminar concedida, em ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo Procurador-Geral da República, pela Min. Cármen Lúcia, relatora, que suspendera os efeitos do inciso I do art. 3º da EC 58/2009 o qual alterou o inciso IV do caput do art. 29 e do art. 29-A da CF, disposições relativas à recomposição das Câmaras Municipais, determinando a retroação dos efeitos das alterações procedidas e fixando a sua aplicação ao processo eleitoral, já aperfeiçoado, de 2008. Considerou-se configurada a plausibilidade da tese de inconstitucionalidade da retroação de efeitos das novas regras de composição das Câmaras Municipais, por afronta, sobretudo, ao devido processo eleitoral (CF, artigos 5º, LIV, 14 e 16) e à segurança jurídica, bem como presentes riscos inegáveis à legitimidade das composições dessas Câmaras. Asseverou-se que a eleição é processo político aperfeiçoado, de acordo com as normas jurídicas vigentes em sua preparação e realização, e que as eleições de 2008 constituiriam processo político juridicamente perfeito, guardando inteira coerência com a garantia de segurança jurídica que resguarda o ato jurídico perfeito, de modo expresso e imodificável até mesmo pela atuação do constituinte reformador (CF, artigos 5º, XXXVI, 60, § 4º, IV). Salientou-se que os eleitos, diplomados e empossados vereadores, no número definido pela legislação eleitoral vigente segundo a previsão do art. 16 da CF (“A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.”), compõem os órgãos legislativos municipais e estão em pleno exercício de suas atribuições. Aduziu-se que a modificação do número de cargos em disputa para vereadores teria notória repercussão no sistema de representação proporcional (Código Eleitoral, artigos 106, 107 e 109), atingindo candidatos naquele pleito de 2008, os eleitos, partidos políticos e, principalmente, causando instabilidade nos eleitores, que foram às urnas, acreditaram no Estado que, pela Justiça Eleitoral, proclamou os eleitos, promoveu a sua diplomação e validou a posse, ficando eles sem saber ao certo o destino do seu voto e sem ter ciência de quem se elegeu e de quem não se elegeu.
ADI 4307 Referendo-MC/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 11.11.2009. (ADI-4307) Audio

Art. 3º, I, da EC 58/2009: Recomposição das Câmaras Municipais e Devido Processo Eleitoral - 2

Ressaltou-se, ademais, que, se se permitisse que alguém pudesse ser empossado vereador, ainda que não eleito conforme as regras vigentes no processo eleitoral, por cargo surgido posteriormente à eleição, poder-se-ia chegar a duas incongruências da nova regra jurídica com os princípios básicos da Constituição: a) não eleitos passariam a prover cargos de representantes do povo, em transgressão ao que dispõe o parágrafo único do art. 1º da CF; b) o constituinte reformador teria alterado, tacitamente, o modelo de composição e duração dos mandatos, pois a regra do inciso I do art. 29 da CF estabelece que a eleição do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos Vereadores, é para mandato de quatro anos, mediante pleito direto. Vencido o Min. Eros que não referendava a liminar, por não vislumbrar as alegadas violações aos citados dispositivos constitucionais. Precedentes citados: ADI 4232 MC/DF (DJE de 22.5.2009); ADI 2849 MC/RN (DJU de 3.4.2003); ADI 1899 MC/DF (DJU de 1º.6.2001): ADI 4190 MC/DF (DJU de 6.1.2001); ADPF 172 Referendo-MC/RJ (DJE de 21.8.2009); ADI 830/DF (DJU de 16.9.94); ADI 939/DF (DJU de 18.3.94); ADI 1805 MC/DF (DJU de 14.11.2003); ADI 2024 MC/DF (DJU de 1º.12.2000); ADI 3105/DF (DJU de 18.2.2005); ADI 2395/DF (DJE de 23.5.2008); MI 233/DF (DJU de 8.2.2001).
ADI 4307 Referendo-MC/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, 11.11.2009. (ADI-4307)

Extradição: Legalidade do Ato de Concessão de Refúgio e Natureza dos Crimes Imputados ao Extraditando - 11

O Tribunal retomou julgamento de extradição executória formulado pelo Governo da Itália contra nacional italiano condenado à pena de prisão perpétua pela prática de quatro homicídios naquele país — v. Informativo 558. Inicialmente, o Tribunal rejeitou questão de ordem suscitada pelo Min. Marco Aurélio que asseverava a necessidade de se contar no Plenário com, no mínimo, oito integrantes, para julgar processo que envolve matéria constitucional, conforme estabelecido pelo Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal - RISTF (art. 143, parágrafo único). Resolveu-se, no ponto, prosseguir com o julgamento, considerando a competência do Tribunal tal como formado, ao fundamento de que o quórum fixado no RISTF cingir-se-ia à declaração, ou não, de inconstitucionalidade de uma determinada norma. Vencido o suscitante. Na seqüência, o Min. Marco Aurélio, em voto-vista, proclamando não ter ocorrido desvio de finalidade do ato de concessão de refúgio, assentou, uma vez admitida a revisão ampla, para ele inadequada, do seu merecimento, a plena harmonia do refúgio com a ordem jurídico-constitucional, óbice à continuidade do exame do pedido de extradição. Rejeitou-se, por maioria, questão de ordem também suscitada pelo Min. Marco Aurélio acerca da conclusão do julgamento sobre a prejudicialidade do mandado de segurança.
Ext 1085/Governo da Itália, rel. Min. Cezar Peluso, 12.11.2009. (Ext-1085)  Audio

Extradição: Legalidade do Ato de Concessão de Refúgio e Natureza dos Crimes Imputados ao Extraditando - 12

Em seguida, o Min. Marco Aurélio indeferiu o pleito extradicional. Entendeu que os crimes pelos quais condenado o extraditando teriam natureza política, considerado, especialmente, o que contido na sentença condenatória que ensejara o pedido de extradição, a qual, em trinta e quatro passagens, assentara que as práticas criminosas em análise teriam por motivação a subversão da ordem estatal, e, ainda, a própria postura de dirigentes e políticos italianos da atualidade ao se referirem ao deferimento do refúgio, sendo aplicável o disposto no inciso LII do art. 5º da CF (“não será concedida extradição de estrangeiro por crime político ou de opinião”.) e no art. 3º, item 1, alínea e, do Tratado de Extradição entre a República Federativa do Brasil e a República Italiana. Asseverou, também, no que tange à prescrição, que seria imprópria inclusive a evocação do parágrafo único do art. 116 do CP (“Depois de passada em julgado a sentença condenatória, a prescrição não corre durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo”), ao fundamento de que a prisão preventiva não se incluiria no rol das causas impeditivas da prescrição, incidindo tal dispositivo apenas no caso de encontrar-se o cidadão preso, ante culpa formada. Acrescentou que, cuidando-se de causa impeditiva do curso de prescrição, situação prejudicial ao réu, aplicar-se-ia a interpretação estrita. Frisou não caber assentar o pedido de extradição ou o de reconhecimento da condição de refugiado como impeditivos da continuidade do prazo prescricional, asseverando ser a prescrição penal vista a partir das regras disciplinadoras, de cunho instrumental e material. Reconheceu, tendo em conta que a condenação que interrompera o prazo prescricional dataria de 13.12.88, que teria ocorrido a prescrição da pretensão executória da pena em 2008. Em continuidade, rejeitou as demais causas de pedir. Aduziu, por fim, que o pronunciamento no processo de extradição é declaratório, considerada a legitimidade ou não do pedido formalizado, e, salientando competir privativamente ao Presidente da República solucionar questões de política internacional, com o referendo, em certos casos, do Congresso Nacional, entendeu que, declarada a legitimidade do pleito extradicional, abrir-se-ia oportunidade ao Chefe do Poder Executivo de, à frente da política brasileira no campo internacional, entregar, ou não, o estrangeiro, que poderia merecer o status de asilado. Registrou, no ponto, que isso estaria em harmonia com a regra do art. 89 da Lei 6.815/80, a revelar, mesmo ante a execução de sentença penal condenatória imposta pelo Judiciário brasileiro ao extraditando, mitigando o título judicial, a possibilidade de o Executivo — em ato próprio ao exercício da soberania nacional — expulsar de imediato o estrangeiro, entregando-o ao Governo requerente e interessado. O Tribunal ainda rejeitou questão de ordem suscitada pelo advogado do extraditando, ressaltando a necessidade de, em matéria constitucional, o Presidente da Corte votar, conforme disposto no art. 146, I, do RISTF. Após, o julgamento foi suspenso por falta de quórum de, no mínimo, seis integrantes da Corte, para funcionamento do Pleno (RISTF, art. 143, caput). Os Ministros Celso de Mello e Dias Toffoli, que se declararam suspeitos, não estiveram presentes à sessão.
Ext 1085/Governo da Itália, rel. Min. Cezar Peluso, 12.11.2009. (Ext-1085) Audio

Assista a trechos dos julgamentos:

1ª parte Vídeo
2ª parte Vídeo
3ª parte Vídeo


PRIMEIRA TURMA

Organização Criminosa e Enquadramento Legal - 1

A Turma iniciou julgamento de habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que denegara idêntica medida por considerar que a denúncia apresentada contra os pacientes descreveria a existência de organização criminosa que se valeria da estrutura de entidade religiosa e de empresas vinculadas para arrecadar vultosos valores, ludibriando fiéis mediante fraudes, desviando numerários oferecidos para finalidades ligadas à Igreja, da qual aqueles seriam dirigentes, em proveito próprio e de terceiros. A impetração sustenta a atipicidade da conduta imputada aos pacientes — lavagem de dinheiro e ocultação de bens, por meio de organização criminosa (Lei 9.613/98, art. 1º, VII) — ao argumento de que a legislação brasileira não contempla o tipo “organização criminosa”. Pleiteia, em conseqüência, o trancamento da ação penal. O Min. Marco Aurélio, relator, deferiu o writ para trancar a ação penal, no que foi acompanhado pelo Min. Dias Toffoli.
HC 96007/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 10.11.2009. (HC-96007)

Organização Criminosa e Enquadramento Legal - 2

Inicialmente, ressaltou que, sob o ângulo da organização criminosa, a inicial acusatória remeteria ao fato de o Brasil, mediante o Decreto 5.015/2004, haver ratificado a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional - Convenção de Palermo (“Artigo 2 Para efeitos da presente Convenção, entende-se por: a) ‘Grupo criminoso organizado’ - grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material;”). Em seguida, aduziu que, conforme decorre da Lei 9.613/98, o crime nela previsto dependeria do enquadramento das condutas especificadas no art. 1º em um dos seus incisos e que, nos autos, a denúncia aludiria a delito cometido por organização criminosa (VII). Disse que o parquet, a partir da perspectiva de haver a definição desse crime mediante o acatamento à citada Convenção das Nações Unidas, afirmara estar compreendida a espécie na autorização normativa. Tendo isso em conta, entendeu que tal assertiva mostrar-se-ia discrepante da premissa de não existir crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal (CF, art. 5º, XXXIX). Asseverou que, ademais, a melhor doutrina defenderia que a ordem jurídica brasileira ainda não contempla previsão normativa suficiente a concluir-se pela existência do crime de organização criminosa. Realçou que, no rol taxativo do art. 1º da Lei 9.613/98, não consta sequer menção ao delito de quadrilha, muito menos ao de estelionato — também narrados na exordial. Assim, arrematou que se estaria potencializando a referida Convenção para se pretender a persecução penal no tocante à lavagem ou ocultação de bens sem se ter o delito antecedente passível de vir a ser empolgado para esse fim, o qual necessitaria da edição de lei em sentido formal e material. Estendeu, por fim, a ordem aos co-réus. Após, pediu vista dos autos a Min. Cármen Lúcia.
HC 96007/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 10.11.2009. (HC-96007)

Livramento Condicional e Preenchimento dos Requisitos Objetivos e Subjetivos

O deferimento de benefícios prisionais está vinculado ao preenchimento, pelo apenado, de requisitos objetivos e subjetivos para a sua concessão. Com base nessa orientação, a Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia o restabelecimento de decisão do juízo das execuções criminais que deferira ao paciente o direito ao livramento condicional, com base, exclusivamente, no atendimento do requisito temporal de 2/3 da reprimenda ante a demora na exibição, pela casa prisional, do atestado de conduta carcerária e a falta de informações prejudiciais quanto a seu comportamento. Concedeu-se, porém, a ordem, de ofício, para determinar a devida celeridade na elaboração do atestado de conduta carcerária do paciente, de modo a possibilitar às instituições de origem a apreciação do laudo.
HC 94208/RS, rel. Min. Carlos Britto, 10.11.2009. (HC-94208)

Dosimetria da Pena e Mesmas Circunstâncias Judiciais

A Turma, por maioria, negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus no qual condenado por tentativa de roubo qualificado pelo concurso de pessoas (CP, art. 157, § 2º, II c/c o art. 14, II) insurgia-se contra acórdão do tribunal de justiça local que, ao prover recurso de apelação do Ministério Público, majorara a pena aplicada pelo juízo sentenciante, em desconformidade com o art. 59 do CP. Tendo em conta que a apelação devolve ao tribunal a análise dos fatos e de seu enquadramento, reputou-se que o órgão revisor poderia exasperar a pena pelas mesmas circunstâncias judiciais apontadas na sentença, fixando-a em patamar acima daquele prolatado pelo juízo. Aduziu-se que, mesmo sem modificação dessas circunstâncias judiciais, o tribunal teria competência para valorá-las novamente e concluir que a pena mais adequada — dentro do balizamento do tipo — para a situação concreta não seria aquela disposta na sentença. Salientou-se que, se o órgão revisor só pudesse alterar a pena-base se constatada uma circunstância judicial não contemplada na sentença, ele ficaria manietado quanto à devolutividade e à revisão. Vencidos os Ministros Cármen Lúcia, relatora, e Ricardo Lewandowski que, embora reconhecendo a devolutividade da apelação, proviam o recurso ao fundamento de que as razões do acórdão impugnado teriam sido mera repetição dos motivos da sentença, sem que houvesse qualquer justificativa concreta capaz de validar a elevação da pena, o que gerara arbitrariedade.
HC 97473/DF, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o acórdão Min. Dias Toffoli, 10.11.2009. (HC-97473)

Princípio da Insignificância e Crime de Roubo

A Turma iniciou julgamento de habeas corpus no qual a Defensoria Pública da União pleiteia o reconhecimento do princípio da insignificância em favor de condenado por roubo (CP, art. 157, § 2º, II), em decorrência de haver empregado grave ameaça para subtrair, em companhia de dois adolescentes, a quantia de R$ 3,25 (três reais e vinte e cinco centavos). O Min. Dias Toffoli, relator, indeferiu o writ. Enfatizou que, apesar de ínfimo o valor subtraído, houvera concurso de pessoas, com adolescentes, o que agravaria o contexto. Reportou-se, ademais, a jurisprudência do STF no sentido de ser inaplicável o princípio da insignificância ao delito de roubo. Após, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Carlos Britto.
HC 97190/GO, rel. Min. Dias Toffoli, 10.11.2009. (HC-97190)


SEGUNDA TURMA


Legitimidade do Ministério Público: Ação Civil Pública e Patrimônio Público Municipal

A Turma deliberou afetar ao Plenário julgamento de recurso extraordinário no qual se discute a legitimidade ativa ad causam do Ministério Público para promover ação civil pública em defesa do patrimônio público municipal, nos termos do art. 129, III, da CF (“São funções institucionais do Ministério Público: ... III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;”). No caso, tribunal de justiça desprovera apelação interposta pelo parquet estadual para manter sentença que indeferira liminarmente petição inicial, por entender que o dispositivo constitucional em comento não dera à ação civil pública a amplitude pretendida pelo Ministério Público.
RE 225777/MG, rel. Min. Eros Grau, 10.11.2009. (RE-225777)

SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno11.11.200912.11.20092
1ª Turma10.11.200914
2ª Turma10.11.200968



R E P E R C U S S Ã O  G E R A L

DJE de 13 de novembro de 2009

REPERCUSSÃO GERAL EM AI N. 759.421-RJ
RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO
EMENTA: RECURSO. Extraordinário. Incognoscibilidade. Gratuidade de justiça. Declaração de hipossuficiência. Questão infraconstitucional. Precedentes. Ausência de repercussão geral. Recurso extraordinário não conhecido. Não apresenta repercussão geral o recurso extraordinário que, tendo por objeto questão relativa à declaração de hipossuficiência, para obtenção de gratuidade de justiça, versa sobre matéria infraconstitucional.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 579.073-DF
RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO
EMENTA: RECURSO. Extraordinário. Incognoscibilidade. Sistema financeiro da habitação. Contrato de mútuo. Saldo devedor. Critério de reajuste. Questão infraconstitucional. Precedentes. Ausência de repercussão geral. Recurso extraordinário não conhecido. Não apresenta repercussão geral o recurso extraordinário que, tendo por objeto questão relativa ao critério de reajuste de saldo devedor de contrato de mútuo firmado no âmbito do sistema financeiro da habitação, versa sobre matéria infraconstitucional.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 588.944-SE
RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO
EMENTA: RECURSO. Extraordinário. Incognoscibilidade. Lei Complementar estadual nº 61/2001 de Sergipe. Redutor salarial. Desconto. Matéria infraconstitucional. Ausência de repercussão geral. Recurso não conhecido. Não apresenta repercussão geral o recurso extraordinário que, tendo por objeto restituição de valores descontados da remuneração do funcionalismo público local, versa sobre matéria infraconstitucional.

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 588.954-SC
RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO
EMENTA: RECURSO. Extraordinário. Tributo. Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS. Creditamento. Direito não reconhecido na origem. Aquisição de energia elétrica por supermercado. Exercício de atividade industrial. Processamento de alimentos. Questão da ofensa ao princípio constitucional da não-cumulatividade. Relevância. Repercussão geral reconhecida. Apresenta repercussão geral o recurso extraordinário que verse sobre a admissibilidade de se considerar como atividade industrial o processamento de alimentos realizado por supermercado, para fins de crédito de ICMS.

Decisões Publicadas: 4




C L I P P I N G  D O  DJ

13 de novembro de 2009

REFERENDO EM MED. CAUT. EM AC N. 2.197-DF
RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A: AÇÃO CAUTELAR PREPARATÓRIA - MEDIDA LIMINAR – RECUSA DE PRESTAÇÃO DE AVAL PELA UNIÃO FEDERAL E NEGATIVA DE AUTORIZAÇÃO, POR PARTE DA SECRETARIA DO TESOURO NACIONAL (OFÍCIO Nº 10.540/2008-COPEM/STN) – OBSTÁCULOS QUE IMPEDEM O DISTRITO FEDERAL DE CELEBRAR OPERAÇÕES DE CRÉDITO COM ENTIDADES DE FOMENTO E INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS INTERNACIONAIS – RESTRIÇÕES, QUE, EMANADAS DA UNIÃO, INCIDEM SOBRE O DISTRITO FEDERAL, POR ALEGADO DESCUMPRIMENTO, POR PARTE DE SUA CÂMARA LEGISLATIVA E DE SEU TRIBUNAL DE CONTAS, DOS LIMITES SETORIAIS QUE A LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL IMPÕE A TAIS ÓRGÃOS PÚBLICOS (LC Nº 101/2000, ART. 20, II, “A”) – CONFLITO DE INTERESSES ENTRE A UNIÃO E O DISTRITO FEDERAL – LITÍGIO QUE SE SUBMETE À ESFERA DE COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – HARMONIA E EQUILÍBRIO NAS RELAÇÕES INSTITUCIONAIS ENTRE O DISTRITO FEDERAL E A UNIÃO FEDERAL – O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL COMO TRIBUNAL DA FEDERAÇÃO - PRETENSÃO CAUTELAR FUNDADA NAS ALEGAÇÕES DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA INTRANSCENDÊNCIA DAS MEDIDAS RESTRITIVAS DE DIREITOS – MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA - DECISÃO DO RELATOR REFERENDADA PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
O ALTO SIGNIFICADO DA LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E A QUESTÃO DE SUA APLICABILIDADE AO DISTRITO FEDERAL: LIMITE GLOBAL E LIMITES SETORIAIS EM TEMA DE DESPESA COM PESSOAL (CÂMARA LEGISLATIVA E TRIBUNAL DE CONTAS).
- O Poder Executivo do Distrito Federal não pode sofrer sanções nem expor-se a restrições impostas pela União Federal em tema de celebração de operações financeiras internacionais (recusa de prestação de aval e negativa de autorização), sob a alegação de que o Tribunal de Contas e o Poder Legislativo locais – embora observando o índice setorial de 3% - teriam descumprido, cada qual, os limites individuais a eles impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal (art. 20, inciso II, “a”), pois o Governo do Distrito Federal não tem competência para intervir na esfera orgânica da Câmara Legislativa e do Tribunal de Contas, por se tratar de órgãos investidos de autonomia institucional, por força e efeito de expressa determinação constitucional. Precedentes.
- O art. 20, inciso II, “a”, da Lei de Responsabilidade Fiscal – cuja validade constitucional foi inteiramente confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (ADI 3.756/DF) - aplica-se, de modo plenamente legítimo, no que se refere ao índice setorial de 3% (três por cento), ao Distrito Federal.
NECESSIDADE DE OUTORGA DE PROVIMENTO CAUTELAR, NO CASO, EM ORDEM A NÃO FRUSTRAR A REGULAR PRESTAÇÃO, NO PLANO LOCAL, DE SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS.
- A recusa de prestação de aval pela União Federal e a negativa da Secretaria do Tesouro Nacional em autorizar o Distrito Federal a celebrar operações de crédito com entidades de fomento e instituições financeiras internacionais comprometem, de modo irreversível, a prestação, no plano local, de serviços públicos de caráter primário, pois inviabilizam a obtenção de recursos financeiros necessários ao desenvolvimento e ao fortalecimento de áreas sensíveis, tais como a gestão das águas e a drenagem urbana, a preservação ambiental (proteção de nascentes e recuperação de erosões), bem assim a execução de obras de saneamento básico, na modalidade abastecimento de água, além do aperfeiçoamento institucional da administração tributária do Distrito Federal, para efeito de adequado custeio dos serviços públicos, notadamente no domínio da saúde e da educação públicas. Situação que configura, de modo expressivo, para efeito de outorga de provimento cautelar, hipótese caracterizadora de “periculum in mora”. Precedentes.
* noticiado no Informativo 528

RE N. 475.551-PR
RELATORA P/ O ACÓRDÃO: MIN. CÁRMEN LÚCIA
EMENTA: IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS – IPI. INSUMOS OU MATÉRIAS PRIMAS TRIBUTADOS. SAÍDA ISENTA OU SUJEITA À ALÍQUOTA ZERO. ART. 153, § 3º, INC. II, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ART. 11 DA LEI N. 9.779/1999. PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE. DIREITO AO CREDITAMENTO: INEXISTÊNCIA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO.
1. Direito ao creditamento do montante de Imposto sobre Produtos Industrializados pago na aquisição de insumos ou matérias primas tributados e utilizados na industrialização de produtos cuja saída do estabelecimento industrial é isenta ou sujeita à alíquota zero.
2. A compensação prevista na Constituição da República, para fins da não cumulatividade, depende do cotejo de valores apurados entre o que foi cobrado na entrada e o que foi devido na saída: o crédito do adquirente se dará em função do montante cobrado do vendedor do insumo e o débito do adquirente existirá quando o produto industrializado é vendido a terceiro, dentro da cadeia produtiva.
3. Embora a isenção e a alíquota zero tenham naturezas jurídicas diferentes, a consequência é a mesma, em razão da desoneração do tributo.
4. O regime constitucional do Imposto sobre Produtos Industrializados determina a compensação do que for devido em cada operação com o montante cobrado nas operações anteriores, esta a substância jurídica do princípio da não cumulatividade, não aperfeiçoada quando não houver produto onerado na saída, pois o ciclo não se completa.
5. Com o advento do art. 11 da Lei n. 9.779/1999 é que o regime jurídico do Imposto sobre Produtos Industrializados se completou, apenas a partir do início de sua vigência se tendo o direito ao crédito tributário decorrente da aquisição de insumos ou matérias primas tributadas e utilizadas na industrialização de produtos isentos ou submetidos à alíquota zero.
6. Recurso extraordinário provido.
* noticiado no Informativo 545

Acórdãos Publicados: 286



T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Rebelião - Carandiru - Responsabilidade Civil Objetiva - Dever de Indenizar (Transcrições)

AI 299125/SP*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

EMENTA: RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO (CF, ART. 37, § 6º). CONFIGURAÇÃO. REBELIÃO NO COMPLEXO PENITENCIÁRIO DO CARANDIRU. RECONHECIMENTO, PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA LOCAL, DE QUE SE ACHAM PRESENTES TODOS OS ELEMENTOS IDENTIFICADORES DO DEVER ESTATAL DE REPARAR O DANO. NÃO-COMPROVAÇÃO, PELO ESTADO DE SÃO PAULO, DA ALEGADA RUPTURA DO NEXO CAUSAL. CARÁTER SOBERANO DA DECISÃO LOCAL, QUE, PROFERIDA EM SEDE RECURSAL ORDINÁRIA, RECONHECEU, COM APOIO NO EXAME DOS FATOS E PROVAS, A INEXISTÊNCIA DE CAUSA EXCLUDENTE DA RESPONSABILIDADE CIVIL DO PODER PÚBLICO. INADMISSIBILIDADE DE REEXAME DE PROVAS E FATOS EM SEDE RECURSAL EXTRAORDINÁRIA (SÚMULA 279/STF). DOUTRINA E PRECEDENTES EM TEMA DE RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO ESTADO. ACÓRDÃO RECORRIDO QUE SE AJUSTA À JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. AGRAVO IMPROVIDO.

DECISÃO: O recurso extraordinário a que se refere o presente agravo de instrumento foi interposto contra acórdão, que, confirmado, em sede de embargos de declaração (fls. 101/103), pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, está assim ementado (fls. 96):

“RESPONSABILIDADE CIVIL – DETENTO FALECIDO EM REBELIÃO OCORRIDA NA CASA DE DETENÇÃO – INDENIZAÇÃO DEVIDA – EMBARGOS INFRINGENTES COM VOTO VENCIDO QUE ENTENDE IMPROCEDENTE A AÇÃO – EMBARGOS REJEITADOS.” (grifei)

O Estado de São Paulo, no apelo extremo em questão, alega que, “Ao apontar a responsabilidade estatal pelo episódio, desconsiderou o E. Tribunal o fato de que os agentes policiais agiram no estrito cumprimento do dever legal, em contraposição à injusta agressão dos amotinados, durante rebelião nas dependências da Casa de Detenção” (fls. 109 – grifei).
O exame destes autos convence-me de que não assiste razão ao Estado ora agravante, quando sustenta que o estrito cumprimento de dever legal e a prática de legítima defesa - que, alegadamente, teriam pautado a conduta de seus agentes - bastariam para descaracterizar a responsabilidade civil objetiva do Poder Público a respeito do evento danoso em causa.
Com efeito, a situação de fato que gerou o trágico evento narrado neste processo põe em evidência a configuração, no caso, de todos os pressupostos primários que determinam o reconhecimento da responsabilidade civil objetiva da entidade estatal ora agravante.
Como se sabe, a teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros, desde a Carta Política de 1946, revela-se fundamento de ordem doutrinária subjacente à norma de direito positivo que instituiu, em nosso sistema jurídico, a responsabilidade civil objetiva do Poder Público, pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, por ação ou por omissão (CF, art. 37, § 6º).
Essa concepção teórica - que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, tanto no que se refere à ação quanto no que concerne à omissão do agente público - faz emergir, da mera ocorrência de lesão causada à vítima pelo Estado, o dever de indenizá-la pelo dano moral e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais, não importando que se trate de comportamento positivo (ação) ou que se cuide de conduta negativa (omissão) daqueles investidos da representação do Estado, consoante enfatiza o magistério da doutrina (HELY LOPES MEIRELLES, “Direito Administrativo Brasileiro”, p. 650, 31ª ed., 2005, Malheiros; SERGIO CAVALIERI FILHO, “Programa de Responsabilidade Civil”, p. 248, 5ª ed., 2003, Malheiros; JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, “Curso de Direito Administrativo”, p. 90, 17ª ed., 2000, Forense; YUSSEF SAID CAHALI, “Responsabilidade Civil do Estado”, p. 40, 2ª ed., 1996, Malheiros; TOSHIO MUKAI, “Direito Administrativo Sistematizado”, p. 528, 1999, Saraiva; CELSO RIBEIRO BASTOS, “Curso de Direito Administrativo”, p. 213, 5ª ed., 2001, Saraiva; GUILHERME COUTO DE CASTRO, “A Responsabilidade Civil Objetiva no Direito Brasileiro”, p. 61/62, 3ª ed., 2000, Forense; MÔNICA NICIDA GARCIA, “Responsabilidade do Agente Público”, p. 199/200, 2004, Fórum, v.g.), cabendo ressaltar, no ponto, a lição expendida por ODETE MEDAUAR (“Direito Administrativo Moderno”, p. 430, item n. 17.3, 9ª ed., 2005, RT):

“Informada pela ‘teoria do risco’, a responsabilidade do Estado apresenta-se hoje, na maioria dos ordenamentos, como ‘responsabilidade objetiva’. Nessa linha, não mais se invoca o dolo ou culpa do agente, o mau funcionamento ou falha da Administração. Necessário se torna existir relação de causa e efeito entre ação ou omissão administrativa e dano sofrido pela vítima. É o chamado nexo causal ou nexo de causalidade. Deixa-se de lado, para fins de ressarcimento do dano, o questionamento do dolo ou culpa do agente, o questionamento da licitude ou ilicitude da conduta, o questionamento do bom ou mau funcionamento da Administração. Demonstrado o nexo de causalidade, o Estado deve ressarcir.” (grifei)

É certo, no entanto, que o princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite abrandamento e, até mesmo, exclusão da própria responsabilidade civil do Estado nas hipóteses excepcionais (de todo inocorrentes na espécie em exame) configuradoras de situações liberatórias - como o caso fortuito e a força maior - ou evidenciadoras de culpa atribuível à própria vítima (RDA 137/233 - RTJ 55/50 - RTJ 163/1107-1109, v.g.).
Impõe-se destacar, neste ponto, na linha da jurisprudência prevalecente no Supremo Tribunal Federal (RTJ 163/1107-1109, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), que os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o “eventus damni” e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva imputável a agente do Poder Público, que, nessa condição funcional, tenha incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do seu comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 - RTJ 71/99 - RTJ 91/377 - RTJ 99/1155 - RTJ 131/417).
A compreensão desse tema e o entendimento que resulta da exegese dada ao art. 37, § 6º, da Constituição foram bem definidos e expostos pelo Supremo Tribunal Federal em julgamentos cujos acórdãos estão assim ementados:

“RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA DO PODER PÚBLICO - PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL.
- A teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais brasileiros desde a Carta Política de 1946, confere fundamento doutrinário à responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou por omissão. Essa concepção teórica, que informa o princípio constitucional da responsabilidade civil objetiva do Poder Público, faz emergir, da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima pelo Estado, o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta do serviço público.
- Os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade civil objetiva do Poder Público compreendem (a) a alteridade do dano, (b) a causalidade material entre o ‘eventus damni’ e o comportamento positivo (ação) ou negativo (omissão) do agente público, (c) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independentemente da licitude, ou não, do comportamento funcional (RTJ 140/636) e (d) a ausência de causa excludente da responsabilidade estatal (RTJ 55/503 - RTJ 71/99 - RTJ 91/377 - RTJ 99/1155 - RTJ 131/417).
- O princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite o abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais configuradoras de situações liberatórias - como o caso fortuito e a força maior - ou evidenciadoras de ocorrência de culpa atribuível à própria vítima (RDA 137/233 - RTJ 55/50). (...).”
(RTJ 163/1107-1108, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

“- Recurso extraordinário. Responsabilidade civil do Estado. Morte de preso no interior do estabelecimento prisional. 2. Acórdão que proveu parcialmente a apelação e condenou o Estado do Rio de Janeiro ao pagamento de indenização correspondente às despesas de funeral comprovadas. 3. Pretensão de procedência da demanda indenizatória. 4. O consagrado princípio da responsabilidade objetiva do Estado resulta da causalidade do ato comissivo ou omissivo e não só da culpa do agente. Omissão por parte dos agentes públicos na tomada de medidas que seriam exigíveis a fim de ser evitado o homicídio. 5. Recurso conhecido e provido para condenar o Estado do Rio de Janeiro a pagar pensão mensal à mãe da vítima, a ser fixada em execução de sentença.”
(RTJ 182/1107, Rel. Min. NÉRI DA SILVEIRA - grifei)

É por isso que a ausência de qualquer dos pressupostos legitimadores da incidência da regra inscrita no art. 37, § 6º, da Carta Política basta para descaracterizar a responsabilidade civil objetiva do Estado, especialmente quando ocorre circunstância que rompe o nexo de causalidade material entre o comportamento do agente público e a consumação do dano pessoal ou patrimonial infligido ao ofendido.
Estabelecidas tais premissas, passo ao exame destes autos. E, ao fazê-lo, observo que as circunstâncias do presente caso - apoiadas em pressupostos fáticos soberanamente reconhecidos pelo Tribunal “a quo” - evidenciam que todos os elementos identificadores da responsabilidade civil objetiva do Estado acham-se demonstrados no caso ora em análise, especialmente o nexo de causalidade material (que restou plenamente configurado) e cuja ruptura a parte ora agravante, que alegara a ocorrência de causa excludente de sua responsabilidade civil, não conseguiu demonstrar.
Daí a correta observação feita pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, quando do julgamento da apelação cível interposta pela parte ora agravante (fls. 81/82):

“Com a prisão do indivíduo, assume o Estado o dever de cuidar de sua incolumidade física, quer por ato do próprio preso (suicídio), quer por ato de terceiro (agressão perpetrada por outro preso).
Assim, ante a rebelião que eclodiu no Pavilhão 9, da Casa de Detenção, tinha o Estado o dever de proteger a incolumidade física dos presos e dos próprios revoltosos, uns dos atos dos outros. Sua intervenção no episódio era, portanto, de rigor.
E ocorrendo ofensa à integridade física e morte do detento, é seu dever arcar com a indenização correspondente. A propósito, ressalta RUY BARBOSA: - ‘a legalidade do ato, ainda que irrepreensível, não obsta à responsabilidade civil da administração desde que haja dano a um direito’ (‘A Culpa Civil das Administrações Públicas’ – 1898, Rio, pág. 67).
Tal dever somente restaria afastado se a ação causadora do evento danoso tivesse ocorrido em legítima defesa própria (entenda-se: - do agente policial) ou de terceiro (de outro preso) que, no momento, estaria sendo agredido ou na iminência de o ser, frise-se, pelo detento morto.
Mas mesmo encontrando-se nessa situação lícita (legítima defesa), se tivesse produzido, com sua ação, a morte de outrem não envolvido no fato (‘aberratio ictus’), sua seria também a obrigação de indenizar, pois a ação, apesar de necessária, foi agressiva, atingindo quem não estava em posição de ataque (art. 1519 do Código Civil).
Assim, para afastar sua obrigação de reparar o dano, deveria a Fazenda do Estado demonstrar que o detento falecido, Francisco Ferreira dos Santos, estava, no momento de sua morte, agredindo os policiais ou outro preso. Mas esta prova não foi produzida (o ‘onus probandi’ é seu). Como não a produziu, certa é sua obrigação de indenizar.” (grifei)

Inquestionável, desse modo, que o Tribunal de Justiça local – ao reconhecer não comprovada, pelo Estado de São Paulo, a ocorrência da alegada causa de exclusão da responsabilidade estatal – assim decidiu com apoio no conjunto probatório subjacente ao pronunciamento jurisdicional em referência.
Esse dado assume relevo processual, pois a discussão ora suscitada pelo Estado de São Paulo - em torno da pretendida existência, na espécie, de causa excludente de responsabilidade - revela-se incabível em sede de recurso extraordinário, por depender do exame de matéria de fato, de todo inadmissível na via do apelo extremo.
Como se sabe, o recurso extraordinário não permite que se reexaminem, nele, em face de seu estrito âmbito temático, questões de fato ou aspectos de índole probatória (RTJ 161/992 – RTJ 186/703). É que o pronunciamento do Tribunal “a quo” sobre matéria de fato reveste-se de inteira soberania (RTJ 152/612 – RTJ 153/1019 – RTJ 158/693, v.g.).
Impende destacar, neste ponto, que esse entendimento (inadmissibilidade do exame, em sede recursal extraordinária, da existência, ou não, de causa excludente de responsabilidade), tratando-se do tema suscitado pela parte ora agravante, tem pleno suporte no magistério jurisprudencial desta Suprema Corte (AI 411.502/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – AI 586.270/RJ, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA – RE 508.315/CE, Rel. Min. ELLEN GRACIE – RE 595.267/SC, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, v.g.):
“ACÓRDÃO QUE DECIDIU CONTROVÉRSIA ACERCA DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO COM BASE NA PROVA DOS AUTOS. ALEGADA OFENSA AOS ARTS. 37, § 6.º, E 196 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
Impossibilidade da abertura da via extraordinária em razão da incidência, na hipótese, do óbice das Súmulas 279, 282 e 356 desta Corte.
Agravo desprovido.”
(AI 391.371-AgR/RJ, Rel. Min. ILMAR GALVÃO - grifei)

Cumpre ressaltar, por tal razão, em face do caráter soberano do acórdão recorrido (que reconheceu, com apoio no exame de fatos e provas, a ausência de demonstração da ruptura do nexo causal sustentada pelo Estado de São Paulo), que o Tribunal de Justiça interpretou, com absoluta fidelidade, a norma constitucional que consagra, em nosso sistema jurídico, a responsabilidade civil objetiva do Poder Público.
Com efeito, o acórdão impugnado em sede recursal extraordinária, ao fazer aplicação do preceito constitucional em referência (CF, art. 37, § 6º), reconheceu, com inteiro acerto, no caso em exame, a cumulativa ocorrência dos requisitos concernentes (1) à consumação do dano, (2) à conduta dos agentes estatais, (3) ao vínculo causal entre o evento danoso e o comportamento dos agentes públicos e (4) à ausência de qualquer causa excludente de que pudesse eventualmente decorrer a exoneração da responsabilidade civil do Estado de São Paulo.
Cabe acentuar, por relevante, que a colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar controvérsia virtualmente idêntica à versada nesta causa, proferiu decisão que se reflete, por igual, no presente julgamento (RTJ 140/636, Rel. Min. CARLOS VELLOSO).
Essa orientação jurisprudencial - cabe enfatizar - reflete-se no magistério da doutrina (RUI STOCO, “Tratado de Responsabilidade Civil – Doutrina e Jurisprudência”, p. 1.204, 7ª ed., 2007, RT; ARNALDO RIZZARDO, “Responsabilidade Civil”, p. 362 e 369/371, 1ª ed., 2005, Forense; JOSIVALDO FÉLIX DE OLIVEIRA, “A Responsabilidade do Estado por ato lícito”, p. 74/82, Editora Habeas; GUILHERME COUTO DE CASTRO, “A responsabilidade civil objetiva no direito brasileiro”, p. 52/55, 3ª ed., 2000, Forense; CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, “Curso de Direito Administrativo”, p. 995/997, 1002 e 1026/1027, 26ª ed., 2009, Malheiros; GIANNA CARLA RUBINO LOSS, “Responsabilidade Civil do Estado por Atos Lícitos”, “in” Cadernos do Ministério Público do Paraná, vol. 8, nº 01, janeiro/março de 2005, p. 08/12, e JOSÉ ANTONIO LOMONACO e FLÁVIA VANINI MARTINS MARTORI, “A Responsabilidade Patrimonial do Estado por Ato Lícito”, “in” Revista Nacional de Direito e Jurisprudência nº 06, Ano 1, Junho de 2000, p. 23/24), valendo referir, ante a pertinência de suas observações, o preciso (e sempre valioso) entendimento de YUSSEF SAID CAHALI (“Responsabilidade Civil do Estado”, p. 44, item n. 3.5, 3ª ed., 2007, RT):

“A responsabilidade civil do Estado, com base no risco administrativo, que admite pesquisa em torno da culpa do particular, para o fim de abrandar ou mesmo excluir a responsabilidade estatal, ocorre, em síntese, diante dos seguintes requisitos: a) do dano; b) da ação administrativa; e c) desde que haja nexo causal entre o dano e a ação administrativa. A consideração no sentido da licitude da ação administrativa é irrelevante, pois o que interessa é isto: sofrendo o particular um prejuízo, em razão da atuação estatal, regular ou irregular, no interesse da coletividade, é devida a indenização, que se assenta no princípio da igualdade dos ônus e encargos sociais.” (grifei)

Sendo assim, e pelas razões expostas, nego provimento ao presente agravo de instrumento, eis que se revela inviável o recurso extraordinário a que ele se refere.

Publique-se.

Brasília, 05 de outubro de 2009.

(21º Aniversário da promulgação da Constituição democrática de 1988)

Ministro CELSO DE MELLO
Relator

* decisão publicada no DJE de 20.10.2009


INOVAÇÕES LEGISLATIVAS

9 a 13 de novembro de 2009

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ) - Tribunal - Obrigação Trabalhista - Empresa Prestadora de Serviço
Resolução/CNJ nº 98, de 10 de novembro de 2009 - Dispõe as provisões de encargos trabalhistas a serem pagos pelos Tribunais às empresas contratadas para prestar serviços de forma contínua no âmbito do Poder Judiciário. Publicada no DOU de 13/11/2009, Seção 1, p. 178. Publicada também no DJE/CNJ de 13/11/2009, n. 194, p. 3.

DESMATAMENTO - Controle - Amazônia
Decreto nº 7008, de 12 de novembro de 2009 - Institui a Operação Arco Verde, no âmbito do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal, e dá outras providências. Publicado no DOU de 13/11/2009, Seção 1, p. 1.


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Anna Daniela de A. M. dos Santos
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Informativo STF - 567 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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