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terça-feira, 18 de novembro de 2008

Informativo STF 431 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF


Brasília, 12 a 16 de junho de 2006 - Nº 431.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO




Plenário
Sindicato e Substituição Processual - 3
Alteração de Limites de Município - 1
Alteração de Limites de Município - 2
Decreto Expropriatório: Transmissão "Mortis Causa" e Partes Ideais - 3
ADPF e Enunciado de Súmula
Auditoria Militar e Cumulação de Competências - 2
Compensação por Empreendimentos de Significativo Impacto Ambiental - 1
Compensação por Empreendimentos de Significativo Impacto Ambiental - 2
HC contra Inadmissão de Recurso - 2
Meio Ambiente e Poluição: Competência Municipal - 2
Decreto Expropriatório e Doação
1ª Turma
HC contra Decisão Monocrática de Ministro do STJ
RMS e Art. 515, § 3º, do CPC - 3
RMS e Art. 515, § 3º, do CPC - 4
Expedição de Precatório e Art. 739 do CPC - 3
Reserva de Plenário e Juntada de Acórdão
2ª Turma
Depositário Infiel: Formalidade do Ato e Força Maior
Inconstitucionalidade de Lei e Segurança Jurídica - 1
Inconstitucionalidade de Lei e Segurança Jurídica - 2
Transportador Autônomo: Alteração da Base de Cálculo e Princípio da Legalidade
Responsabilidade Civil do Estado e Servidor de Fato
Transcrições
Decreto Expropriatório: Transmissão "Mortis Causa" e Partes Ideais (MS 24573/DF)


PLENÁRIO


Sindicato e Substituição Processual - 3

Concluído julgamento de uma série de recursos extraordinários nos quais se discutia sobre o âmbito de incidência do inciso III do art. 8º da CF/88 ("ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais e administrativas;") - v. Informativos 84, 88, 330 e 409. O Tribunal, por maioria, na linha da orientação fixada no MI 347/SC (DJU de 8.4.94), no RE 202063/PR (DJU de 10.10.97) e no AI 153148 AgR/PR (DJU de 17.11.95), conheceu dos recursos e lhes deu provimento para reconhecer que o referido dispositivo assegura ampla legitimidade ativa ad causam dos sindicatos como substitutos processuais das categorias que representam na defesa de direitos e interesses coletivos ou individuais de seus integrantes. Vencidos, em parte, os Ministros Nelson Jobim, Cezar Peluso, Eros Grau, Gilmar Mendes e Ellen Gracie, que conheciam dos recursos e lhes davam parcial provimento, para restringir a legitimação do sindicato como substituto processual às hipóteses em que atuasse na defesa de direitos e interesses coletivos e individuais homogêneos de origem comum da categoria, mas apenas nos processos de conhecimento, asseverando que, para a liquidação e a execução da sentença prolatada nesses processos, a legitimação só seria possível mediante representação processual, com expressa autorização do trabalhador.
RE 193503/SP. (RE-193503)
RE 193579/SP. (RE-193579)
RE 208983/SC. (RE-208983)
RE 210029/RS. (RE-210029)
RE 211874/RS. (RE-211874)
RE 213111/SP. (RE-213111)
RE 214668/ES, rel. orig. Min. Carlos Velloso, rel. p/ o acórdão Min. Joaquim Barbosa, 12.6.2006. (RE-214668)


Alteração de Limites de Município - 1

O Tribunal iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Partido da Frente Liberal - PFL contra o art. 51 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias do Estado da Paraíba, que altera os limites territoriais do Município do Conde. Inicialmente, a Min. Ellen Gracie, relatora, afastou a preliminar suscitada pelo Advogado-Geral da União de que não seria possível a aferição da constitucionalidade da norma impugnada, por ser esta anterior à modificação do art. 18, § 4º, da CF, promovida pela EC 15/96. A relatora asseverou que, no caso, para a análise da violação apontada ao referido dispositivo, consistente na inobservância das exigências de consulta prévia e de edição de lei estadual para o desmembramento de município, não teria havido alteração substancial do parâmetro constitucional em exame, haja vista que aludidos requisitos, também constantes da redação original, não teriam sido modificados após a edição da EC 15/96. Também rejeitou a preliminar de que a norma impugnada gozaria de presunção de constitucionalidade por decorrer de atividade do legislador constituinte estadual. Citou, no ponto, diversos precedentes da Corte no sentido de que o exercício do poder constituinte conferido aos Estados-membros submete-se aos princípios da CF, destacando, inclusive, decisão plenária em que se concluíra pela inconstitucionalidade da criação de município por lei constitucional estadual.
ADI 3615/PB, rel. Min. Ellen Gracie, 12.6.2006. (ADI-3615)

Alteração de Limites de Município - 2

No mérito, a Min. Ellen Gracie julgou procedente o pedido formulado, com efeitos ex nunc. Entendeu que houve afronta ao art. 18, § 4º, da CF, porquanto a redefinição dos limites territoriais do Município do Conde, que representou o desmembramento de parte do contíguo Município de Alhandra, se fez sem a necessária e prévia consulta plebiscitária das populações envolvidas. Justificou a aplicação dos efeitos ex nunc, em face da adoção do rito do art. 12 da Lei 9.868/99, uma vez que, na espécie, a norma hostilizada permanecera em vigor por dezesseis anos, período em que diversas situações jurídicas foram consolidadas, notadamente nos âmbitos financeiro, tributário e administrativo, as quais deveriam ser mantidas, sob pena de ofensa à segurança jurídica. Após, o julgamento foi suspenso com o pedido de vista do Min. Eros Grau.
ADI 3615/PB, rel. Min. Ellen Gracie, 12.6.2006. (ADI-3615)

Decreto Expropriatório: Transmissão "Mortis Causa" e Partes Ideais - 3

Em conclusão de julgamento, o Tribunal, por maioria, denegou mandado de segurança em que se pretendia anular decreto expropriatório de imóvel rural, sob a alegação de que este seria explorado em condomínio, proveniente de sucessão mortis causa, constituído por diversas partes ideais, cujas áreas não se qualificavam, individualmente, como grandes propriedades improdutivas passíveis de desapropriação - v. Informativos 389 e 391. Entendeu-se inaplicável o § 6º do art. 46 do Estatuto da Terra (Lei 4.504/64), haja vista que a finalidade desse preceito, quanto à expressão "para os fins desta Lei", é a de instrumentar o cálculo do coeficiente de progressividade do Imposto Territorial Rural - ITR, não servindo, dessa forma, de parâmetro para dimensionamento de imóveis rurais destinados à reforma agrária, matéria afeta à Lei 8.629/93. Ressaltou-se, ainda, a necessidade de se interpretar o art. 1.784 em conjunto com o disposto no art. 1.791 e seu parágrafo único, ambos do CC, concluindo que a saisine somente torna múltipla a titularidade do imóvel, o qual permanece, do ponto objetivo, uma única propriedade até a partilha. Salientou-se, por fim, que somente o registro do imóvel no cartório competente prova a titularidade do domínio (art. 252 da Lei 6.015/73, na redação conferida pela Lei 6.216/75), o que não efetuado no caso, inexistindo qualquer elemento capaz de assegurar ser o imóvel em questão um conjunto de médias propriedades rurais. Vencidos os Ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Ellen Gracie que, tendo em conta precedentes da Corte no sentido de que, com o falecimento do proprietário, posto que já iniciado o processo administrativo de desapropriação, há divisão tácita da propriedade entre os herdeiros, nos termos do § 6º do art. 46 do Estatuto da Terra, consideravam que, na espécie, as frações ideais atribuíveis a cada condômino seriam unidades autônomas, que se caracterizariam como médias propriedades rurais, sendo, portanto, insuscetíveis de desapropriação, para fins de reforma agrária. Leia a íntegra do voto-vencedor na Seção "Transcrições" deste Informativo.
MS 24573/DF, rel. orig. Min. Gilmar Mendes, rel. p/ o acórdão Min. Eros Grau, 12.6.2006. (MS-24573)

ADPF e Enunciado de Súmula

Os Enunciados das Súmulas do Supremo não podem ser concebidos como atos do Poder Público lesivos a preceito fundamental. Nesse sentido concluiu o Tribunal ao desprover agravo regimental interposto contra decisão que negara seguimento a argüição de descumprimento de preceito fundamental proposta pela Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria, na qual se indicava como ato lesivo o Enunciado da Sumula 666 da Corte ("A contribuição confederativa de que trata o art. 8º, IV, da Constituição, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo."), e se pleiteava, mediante a revogação do verbete, a alteração do entendimento do Tribunal quanto à questão relativa à restrição da exigência da contribuição confederativa prevista no aludido dispositivo constitucional aos filiados ao sindicato respectivo. Ressaltou-se que os enunciados de Súmula são apenas expressões sintetizadas de orientações reiteradamente assentadas pela Corte, cuja revisão deve ocorrer de forma paulatina, assim como se formam os entendimentos jurisprudenciais que resultam na edição dos verbetes. Precedente citado: ADI 594/DF (DJU de 15.4.94).
ADPF 80 AgR/DF, rel. Min. Eros Grau, 12.6.2006. (ADPF-80)

Auditoria Militar e Cumulação de Competências - 2

Concluído julgamento de habeas corpus impetrado contra acórdão do STJ que, em idêntica medida, mantivera decisão que entendera, com base no que decidido na ADI 1218/RO (DJU de 8.11.2002), ser da competência do Juízo da Auditoria Militar da Comarca de Porto Velho-RO o julgamento de processo penal instaurado contra denunciado pela suposta prática do crime de roubo (CP, art. 157, § 2º, I e II c/c o art. 69). O Tribunal, por maioria, denegou a ordem, na linha de precedentes da 1ª Turma (RHC 85025/RO; RHC 86805/RO, acórdãos pendentes de publicação, e RHC 84944/RO, DJU de 6.2.2005), no sentido de que a Lei de Organização Judiciária do Estado de Rondônia (Lei Complementar 94/93) não ofende a Constituição ao atribuir a juiz de direito, excepcionalmente no exercício da função de juiz auditor, a competência para processar e julgar feitos criminais genéricos. Asseverou-se que a Vara de Auditoria Militar da Comarca de Porto Velho tem por titular um juiz de direito, e que, atribuir-lhe cumulativamente as funções de juiz da Justiça Comum e as de auditor da Justiça Militar, é objeto de juízo de conveniência do legislador local. Vencido o Min. Marco Aurélio que concedia a ordem, por considerar que, sob pena de ofensa ao princípio do juiz natural, não se haveria de admitir o julgamento de crime comum por um juiz de direito com exercício específico na auditoria militar e que a referência ao processamento de feitos criminais genéricos, contida no art. 94, IX, da aludida lei complementar, não abrangeria a competência da Vara de Auditoria Militar para o julgamento de crimes comuns.
HC 85720/RO, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 14.6.2006. (HC-85720)

Compensação por Empreendimentos de Significativo Impacto Ambiental - 1

O Tribunal iniciou julgamento de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Confederação Nacional da Indústria - CNI contra o art. 36, caput e parágrafos, da Lei 9.985/2000, que determina que, nos casos de licenciamento ambiental de empreendimentos de significativo impacto ambiental, o empreendedor será obrigado a apoiar, nos termos que disciplina, a implantação e manutenção de unidade de conservação do Grupo de Proteção Integral. O Min. Carlos Britto, relator, julgou improcedente o pedido formulado. Ressaltou que a Lei 9.985/2000, tendo em conta o especial trato conferido pela Constituição Federal ao meio-ambiente, criou uma forma de compartilhamento das despesas com as medidas oficiais de específica prevenção em face de empreendimentos de significativo impacto ambiental. Afirmou que esse compartilhamento-compensação ambiental não viola o princípio da legalidade, já que a própria lei impugnada previu o modo de financiar os gastos da espécie, nem ofende o princípio da harmonia e independência dos Poderes, visto que não houve delegação do Poder Legislativo ao Executivo da tarefa de criar obrigações e deveres aos administrados.
ADI 3378/DF, rel. Min. Carlos Britto, 14.6.2006. (ADI-3378)

Compensação por Empreendimentos de Significativo Impacto Ambiental - 2

O relator asseverou que a definição do valor do financiamento compartilhado não é arbitrária, uma vez que o órgão licenciador, cuja atuação está jungida aos princípios elencados no art. 37 da CF, deve estrita observância aos dados técnicos do EIA/RIMA, cabendo ao Poder Judiciário impedir, no caso concreto, os excessos ocasionais quanto à sua fixação. No ponto, destacou que o valor mínimo da compensação foi fixado em 0,5% dos custos totais com a implantação do empreendimento ante a impossibilidade de o legislador ordinário prever o grau do impacto ambiental provocado por essa implantação, restando atendido o que previsto no inciso IV do art. 225 da CF, que exigiu a elaboração de prévio estudo de impacto ambiental para a validade de qualquer obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ao meio ambiente. Também considerou que o dispositivo hostilizado densifica o princípio usuário-pagador, que impõe ao empreendedor a obrigação de responder pelas medidas de prevenção de impactos ambientais que possam decorrer da implementação da atividade econômica, razão pela qual a inexistência de efetivo dano ambiental não exime o empreendedor do compartilhamento dos custos dessas medidas. Por fim, afastou o argumento de desrespeito ao princípio da razoabilidade, dado que a compensação ambiental é instrumento adequado ao fim visado pela CF de preservação do meio ambiente; não há outro meio eficaz para atingir tal finalidade; e o encargo imposto é compensado pelos benefícios que derivam de um meio ambiente ecologicamente garantido em sua higidez. Após, pediu vista dos autos o Min. Marco Aurélio.
ADI 3378/DF, rel. Min. Carlos Britto, 14.6.2006. (ADI-3378)

HC contra Inadmissão de Recurso - 2

Concluído julgamento de habeas corpus impetrado contra decisão proferida pelo Min. Joaquim Barbosa, que, por intempestividade, negara seguimento a agravo de instrumento em que se visava à subida de recurso extraordinário criminal - v. Informativo 408. Salientado a peculiaridade do caso, o Tribunal reconheceu a tempestividade do extraordinário e concedeu o writ para anular a decisão impugnada, determinando que outra seja proferida. Entendeu-se ter havido equívoco quanto à análise da tempestividade do agravo, já que existentes duas informações sucessivas nos autos acerca da data de publicação da decisão prolatada no recurso extraordinário, sendo que a última, constante de certidão, seria apta a suplantar a anterior.
HC 85099/CE, rel. Min. Marco Aurélio, 14.6.2006. (HC-85099)

Meio Ambiente e Poluição: Competência Municipal - 2

Retomado julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que, ao julgar apelação em mandado de segurança, considerara recebidos, pela Constituição Federal, a Lei 4.253/85 e o Decreto 5.893/88, ambos do Município de Belo Horizonte que punem, com multa, a emissão de fumaça acima de certo padrão, por veículos automotores, no perímetro urbano - v. Informativo 347. O Min. Cezar Peluso, em voto-vista, divergiu do relator, para conhecer e dar provimento ao recurso e conceder a segurança, no que foi acompanhado pelo Min. Eros Grau. Entendeu que, no caso, falece ao referido ente federativo competência para, sob pretexto de legislar em matéria de interesse local, tipificar infração e cominar multa. Asseverou que a prescrição de sanções por emissão de fumaça acima de determinados níveis implica interdição normativa das condutas cuja prática tem por resultado a emissão proibida e, portanto, obrigatoriedade jurídica da adoção de especificações e regulagens de componentes dos veículos das quais tratam regras gerais de trânsito estabelecidas pela União. Ressaltou que, não cabendo ao município legislar sobre a especificação técnica dos motores, dos combustíveis e dos emissores de gases, em relação aos veículos, não poderia, mediante lei, cominar sanção por emissão desconforme, resultante da inobservância da legislação federal sobre a matéria, já que, assim procedendo, legislaria sobre aquelas mesmas especificações técnicas, alheias a sua competência. Dessa forma, concluiu que a proteção do meio-ambiente e o combate à poluição pelo município só poderiam dar-se por meio da aplicação da legislação federal sobre a matéria, notadamente o Código Nacional de Trânsito - CNT, e que a citada legislação municipal estaria autorizando punição dúplice sobre o mesmo fato. Após, pediu vista dos autos o Min. Joaquim Barbosa.
RE 194704/MG, rel. Min. Carlos Velloso, 14.6.2006. (RE-194704)

Decreto Expropriatório e Doação

O Tribunal, por maioria, denegou dois mandados de segurança impetrados contra decreto do Presidente da República que declarara de interesse social, para fins de reforma agrária, imóvel rural objeto de doação aos impetrantes, a título de adiantamento de herança. Alegava-se, na espécie, que, em decorrência da doação, o imóvel teria sido dividido em diversas frações que se caracterizariam como médias propriedades rurais, insuscetíveis de desapropriação, conforme disposto no art. 4º, parágrafo único, da Lei 8.629/93 c/c o art. 185, I, da CF. Entendeu-se que o imóvel em questão, por não ter sofrido divisão ou desmembramento, seria passível de desapropriação. Ressaltou-se que a doação do bem se dera com cláusulas de reserva de usufruto, inalienabilidade, impenhorabilidade, incomunicabilidade e de preferência dos donatários para a aquisição das frações, o que impedia o desmembramento da área até a extinção do ônus, e que, mesmo após esta, com o falecimento dos usufrutuários, jamais fora registrada. Além disso, a escritura pública de divisão amigável que individualizaria as glebas, firmada depois do decreto expropriatório, também não fora registrada na matrícula do bem, não tendo demonstrado os impetrantes que tal registro fora obstado por imposição do INCRA, dado que o ofício do Cartório de Registro de Imóveis apenas comunicara a impossibilidade de desmembramento da área no prazo de seis meses, por força do art. 4º, § 2º, da Lei 8.629/93, sendo que, quando da lavratura da mencionada escritura pública, tal prazo já expirara. Asseverou-se, também, não haver se falar em aplicação do princípio da saisine, no caso, haja vista a ocorrência da doação do imóvel como adiantamento da legítima. Por fim, afastou-se a alegação de que a divisão fora efetivada, tendo em conta o recolhimento individualizado do Imposto Territorial Rural - ITR, porquanto o procedimento previsto no Estatuto da Terra (Lei 4.504/64) se restringe a fins tributários, não servindo de parâmetro para o dimensionamento de imóveis rurais destinados à reforma agrária. Vencido o Min. Gilmar Mendes que concedia as ordens, ao fundamento de que, tendo havido a divisão do imóvel por doação, não haveria possibilidade de se ter a desapropriação.
MS 25304/DF e MS 25299/DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 14.6.2006. (MS-25304) (MS-25299)



PRIMEIRA TURMA


HC contra Decisão Monocrática de Ministro do STJ

A Turma deferiu habeas corpus impetrado contra decisão monocrática de Ministro do STJ que, ao cassar acórdão que desclassificara crime imputado ao paciente, remetera os autos ao tribunal de origem para que este fixasse a pena a ser aplicada. No caso, o paciente fora denunciado pela suposta prática do crime de tráfico de drogas (Lei 6.368/73, art. 12, caput), vindo a ser condenado como incurso no art. 16 da Lei 6.368/76. Contra esta decisão, o Ministério Público estadual apelara e a desclassificação fora mantida. Daí a interposição de recurso especial em que requerida a condenação do paciente pela prática do delito descrito na denúncia, cujo julgamento não fora submetido à apreciação do Colegiado. Considerou-se incabível o julgamento monocrático, haja vista que o relator dera provimento ao recurso, alterando a classificação da conduta, a partir de um juízo de mérito da causa. No ponto, asseverou-se que a Lei 8.038/90 apenas autoriza esse julgamento quando o recurso tenha perdido o seu objeto; quando for manifestamente intempestivo, incabível, improcedente; ou, ainda, quando contrário à súmula do respectivo tribunal, nas questões predominantemente de direito. Ressaltou-se que o Regimento Interno do STF dispõe no mesmo sentido. Ademais, entendeu-se que a Corte a quo, ao rescindir o julgado do tribunal de justiça local e proferir outro em sentido diverso, deveria fixar o quantum da pena em que reputara incurso o réu, uma vez que não identificara nulidade naquele acórdão. HC deferido para cassar a decisão monocrática e determinar que os autos retornem ao STJ, a fim de que se submeta o recurso especial ao julgamento do Colegiado.
HC 87163/MG, rel. Min. Carlos Britto, 13.6.2006. (HC-87163)

RMS e Art. 515, § 3º, do CPC - 3

Concluído julgamento de medida cautelar em ação cautelar na qual se pretendia a concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário interposto contra decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios que, por ilegitimidade ad causam, extinguira, sem julgamento de mérito, mandado de segurança impetrado pela ora requerida. No caso, fora interposto recurso ordinário em mandado de segurança perante o STJ, que reconhecera a legitimidade da impetrante e, com fundamento no art. 515, § 3º, do CPC ["Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento"], apreciara, desde logo, o mérito da causa, concedendo a segurança. Contra esta decisão, os autores interpuseram recurso extraordinário, não admitido pelo Tribunal a quo, resultando na apresentação de agravo de instrumento, que, apesar de protocolizado na origem, não chegara ao Supremo até o ajuizamento da presente cautelar. O Min. Marco Aurélio, relator, ad referendum da Turma, deferira a liminar para suspender os efeitos do acórdão proferido pelo STJ - v. Informativo 416.
AC 813 MC/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o acórdão Min. Cezar Peluso, 13.6.2006. (AC-813)

RMS e Art. 515, § 3º, do CPC - 4

A Turma, por maioria, negou referendo à decisão liminar por considerar ausente a plausibilidade jurídica do direito invocado pelos recorrentes. Inicialmente, afirmou-se não mais subsistirem os óbices mencionados pelo Min. Cezar Peluso quanto à subida do mencionado agravo de instrumento e à existência de litispendência. Em seguida, entendeu-se contra-indicado, à luz do princípio da instrumentalidade do processo, a suspensão da execução da ordem de mandado de segurança, haja vista a ausência de probabilidade de êxito da pretensão dos requerentes, porquanto o STF já decidira que, com a superveniência da Lei 6.750/79, estaria revogado o acúmulo de função de tabelião com a de oficial de protesto de título. Ademais, ressaltou-se que o recurso extraordinário versaria questões processuais e que o atual mandado de segurança alcançaria 16 anos. Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Eros Grau, que referendavam a liminar.
AC 813 MC/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ o acórdão Min. Cezar Peluso, 13.6.2006. (AC-813)
Expedição de Precatório e Art. 739 do CPC - 3

A Turma concluiu julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do TRF da 1ª Região que entendera que a expedição de precatório de parte incontroversa da dívida não viola o § 4º do art. 100 da CF, porquanto este dispositivo refere-se à proibição de fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução relativamente a requisitório de pequeno valor - v. Informativo 429. Negou-se provimento ao recurso da União por se entender que, no caso, não incide a vedação prevista no citado § 4º, já que se trata de hipótese diversa ("São vedados a expedição de precatório complementar ou suplementar de valor pago, bem como fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução, a fim de que seu pagamento não se faça, em parte, na forma estabelecida no § 3º deste artigo e, em parte, mediante expedição de precatório."). Ademais, asseverou-se que o regime de pagamento é definido pelo valor integral da obrigação.
RE 458110/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 13.6.2006. (RE-458110)

Reserva de Plenário e Juntada de Acórdão

A Turma manteve decisão monocrática do Min. Cezar Peluso, relator, que, por ausência, nos autos, do inteiro teor de precedente dos Juizados Especiais Federais do Estado do Rio de Janeiro que pronunciara a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei 9.494/97, negara seguimento a recurso extraordinário interposto contra acórdão de Turma Recursal que, com base no referido precedente, também declarara a inconstitucionalidade daquele dispositivo. A União pretendia, na espécie, o provimento de agravo regimental para que fosse afastada a exigência da juntada do precedente, ao fundamento de ser incabível a aplicação da cláusula de reserva de plenário em sede de juizado especial. Entendeu-se que, não obstante a inaplicabilidade, às turmas recursais de juizado especial, da regra prevista no art. 97 da CF, a exigência de juntada de cópia integral da decisão que declarara a inconstitucionalidade de norma objeto de recurso extraordinário apresentado com fundamento no art. 102, III, b, da CF seria condição objetiva necessária à cognição do recurso. Asseverou-se que se trata de peça essencial à solução da controvérsia suscitada no extraordinário, porquanto contém os fundamentos da declaração de inconstitucionalidade. Precedentes citados: RE 148837 AgR/SP (DJU de 25.3.94); RE 223891 AgR/SP (DJU de 22.2.2002); RE 369696 AgR/SP(DJU de 17.12.2004); AI 431863 AgR/MG (DJU de 29.8.2003).
RE 453744 AgR/RJ, rel. Min. Cezar Peluso, 13.6.2006. (RE-453744)



SEGUNDA TURMA


Depositário Infiel: Formalidade do Ato e Força Maior

Tendo em conta a peculiaridade do caso, a Turma deferiu habeas corpus impetrado contra determinação da justiça do trabalho que decretara a prisão civil da paciente por descumprimento do encargo de fiel depositária dos bens de empresa da qual era sócia, já que alienara patrimônio declarado indisponível. Entendeu-se que o decreto de prisão não obedecera à formalidade essencial à validade do ato (CPC, art. 904), porquanto não indicara, em dinheiro, o valor equivalente aos bens móveis. Ademais, considerou-se presente situação expressiva de força maior a afastar a responsabilidade da paciente pela mencionada alienação, haja vista a existência de informações, nos autos, de venda de máquinas para pagamento de salários de trabalhadores, bem como de furto de algumas máquinas, fato este devidamente registrado.
HC 86097/SP, rel. Min. Eros Grau, 13.6.2006. (HC-86097)

Inconstitucionalidade de Lei e Segurança Jurídica - 1

A Turma deu provimento a agravo regimental e, desde logo, a recurso extraordinário interposto por servidora pública estadual aposentada que tivera seus proventos reduzidos em decorrência da declaração de inconstitucionalidade, com efeitos ex tunc, da LC paulista 317/83, que promovia a transposição de cargos públicos. No caso, a recorrente exercia o cargo equiparado ao de "Chefe de Seção" que, por força da citada LC, fora equiparado ao de "Diretor de Divisão (Nível II)", no qual se aposentara em 1984. No ano seguinte, a Procuradoria-Geral da República ajuizara representação junto ao STF para que a aludida lei fosse declarada inconstitucional, o que ocorrera anteriormente ao advento da CF/88. Em novembro de 1988, o Estado de São Paulo instaurara procedimentos administrativos, a fim de identificar as situações funcionais atingidas por tal declaração. Em 1991, a recorrente e outros servidores foram notificados para apresentar manifestação no processo de revisão de suas aposentadorias e, no ano subseqüente, declarara-se a nulidade da alteração da denominação do cargo da recorrente e esta retornara ao antigo cargo de "Chefe de Seção".
RE 217141 AgR/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 13.6.2006. (RE-217141)

Inconstitucionalidade de Lei e Segurança Jurídica - 2

Em face do princípio da segurança jurídica, entendeu-se que o ato administrativo que homologara a transposição deveria ser mantido. Ressaltou-se que, a despeito de a ordem jurídica brasileira não possuir preceitos semelhantes aos da alemã, no sentido da intangibilidade dos atos não mais suscetíveis de impugnação, não se deveria supor que a declaração de nulidade afetasse todos os atos praticados com fundamento em lei inconstitucional. Nesse sentido, haver-se-ia de conceder proteção ao ato singular, em homenagem ao princípio da segurança jurídica, procedendo-se à diferenciação entre o efeito da decisão no plano normativo e no plano das fórmulas de preclusão. Concluiu-se, dessa forma, que os atos praticados com base na lei inconstitucional, que não mais se afigurem passíveis de revisão, não são atingidos pela declaração de inconstitucionalidade. Ademais, asseverou-se que transcorrera prazo superior a 5 anos entre o ato de concessão da aposentadoria e o início, para a recorrente, do procedimento administrativo tendente à sua revisão. Por fim, aduziu-se que a revisão in concreto de sua aposentadoria não se traduziria em efeito imediato da declaração de inconstitucionalidade do referido dispositivo.
RE 217141 AgR/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 13.6.2006. (RE-217141)

Transportador Autônomo: Alteração da Base de Cálculo e Princípio da Legalidade

A Turma, acolhendo proposta do Min. Eros Grau, relator, afetou ao Plenário o julgamento de recurso ordinário em mandado de segurança coletivo em que se discute se a Portaria 1.135/2001, editada pelo Ministro de Estado da Previdência e Assistência Social, ao modificar a redação do art. 201, § 4º, do Decreto 3.048/99, ofende o princípio da legalidade (CF, art. 150, I). Trata-se, na espécie, de recurso interposto pela Confederação Nacional de Transporte - CNT em que se pretende a declaração de ilegalidade da citada Portaria, sob a alegação de que tal ato normativo aumentou a base de cálculo da contribuição social incidente sobre as remunerações ou retribuições pagas ou creditadas a transportador autônomo pelo frete, carreto ou transporte de passageiros realizado por conta própria (Lei 8.212/91, art. 22, III).
RMS 25476/DF, rel. Min. Eros Grau, 13.6.2006. (RMS-25476)

Responsabilidade Civil do Estado e Servidor de Fato

A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do tribunal de justiça local que, reconhecendo a responsabilidade civil objetiva do Estado do Ceará, condenara-o a indenizar família de policial de fato morto em horário em que prestava serviço ao fundamento de que o Poder Público, ao permitir tal situação, assumira os riscos conseqüentes, não importando os motivos do crime. Sustenta-se, na espécie, ofensa ao art. 37, § 6º, da CF sob a alegação de ausência de responsabilidade do Estado-membro, uma vez que a conduta danosa fora praticado por terceiro, sem vínculo com a Fazenda Pública. O Min. Gilmar Mendes, relator, deu provimento ao recurso por considerar inexistente o nexo de causalidade entre a atividade de policial exercida pela vítima e sua morte, independentemente do fato daquela exercer a função de modo irregular. Asseverou que o agente causador do óbito era estranho aos quadros da Administração Pública e que cometera o delito motivado por interesse privado, decorrente de ciúme de sua ex-companheira. Após, o julgamento foi adiado em virtude do pedido de vista do Min. Eros Grau.
RE 341776/CE, rel. Min. Gilmar Mendes, 13.6.2006. (RE-341776)

SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno14.6.200612.6.200642
1ª Turma--13.6.2006735
2ª Turma--13.6.2006151



T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Decreto Expropriatório: Transmissão "Mortis Causa" e Partes Ideais (Transcrições)

MS 24573/DF*

RELATOR: MIN. EROS GRAU

Voto-vista: O impetrante pretende anular decreto do Presidente da República que declarou de interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural denominado "Engenho Canoa Rachada", Município de Água Preta (PE).
2. Inquietou-me o voto proferido pelo eminente Relator, Ministro Gilmar Mendes, em sentido diametralmente oposto ao meu pronunciamento nos autos do MS n. 24.924, ambos apregoados em sessão realizada no último dia 10 de março.
3. Conforme o voto de Sua Excelência, as frações ideais dos nove condôminos do Engenho Canoa Rachada consubstanciariam unidades autônomas em face do art. 46, § 6º, do Estatuto da Terra [Lei n. 4.504/64], embora não tenham sido individualizadas no Sistema Nacional de Cadastro Rural do INCRA, nem no respectivo Cartório de Registro de Imóveis. Daí, em se tratando as partes ideais de médias propriedades rurais, seriam insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária.
4. A jurisprudência desta Corte, em matéria de reforma agrária, é extremamente rica. Cumpre, porém, ao Tribunal, na interpretação das decisões pretéritas, considerar as circunstâncias do momento histórico no qual prolatados os acórdãos, trazidas essas mesmas circunstâncias ao instante em que se opere a uniformização de seu entendimento sobre a questão fundiária.
5. Acompanho o Ministro Relator, de início, no que tange à legitimidade do impetrante para a propositura do writ, à luz do que dispõe o art. 1º, § 2º, da Lei n. 1.533/51.
6. Permito-me divergir, no entanto, em relação à aplicação do § 6º do art. 46 do Estatuto da Terra. Faço-o reiterando os argumentos que contemplei no voto-vista proferido no MS n. 24.924. Adoto, neste passo, mediante a interpretação do todo que o ordenamento é, entendimento que me parece mais harmônico ao interesse social.
7. Leio o art. 46, § 6º, do Estatuto da Terra (Lei n. 4.504/64):

"§ 6º. No caso de imóvel rural em comum por força de herança, as partes ideais, para os fins desta Lei, serão consideradas como se divisão houvesse, devendo ser cadastrada a área que, na partilha, tocaria a cada herdeiro e admitidos os demais dados médios verificados na área total do imóvel rural."
8. Aprendi com von JHERING que toda norma jurídica deve sua razão de ser a uma determinada finalidade. A finalidade objetivada nesse preceito, na expressão "para os fins desta Lei", é a de instrumentar o cálculo do coeficiente de progressividade do Imposto Territorial Rural - ITR, a fim de evitar a solidariedade passiva dos condôminos no pagamento do tributo. Este aspecto foi adequadamente enfatizado pelos Ministros Nelson Jobim e Cezar Peluso, nos debates travados durante a sessão realizada em 10 de março último.
9. O ponto em questão é confirmado pelo texto do § 6º do art. 50, ainda do Estatuto da Terra, que trata do cálculo do coeficiente de progressividade para as propriedades em condomínio:

"§6º. No caso de propriedade em condomínio, o coeficiente de progressividade referido no parágrafo primeiro será calculado como média ponderada em que os coeficientes da tabela correspondentes à situação de cada condômino definida no corpo do mesmo parágrafo são multiplicados pela sua área ideal e ao final somados e dividida a soma pela área total da propriedade."

10. O art. 24 do decreto n. 55.891/65, de outra banda, ao disciplinar a elaboração dos cálculos, confirma esse mesmo entendimento. Respeita a modalidade de cadastramento prevista no § 6º do art. 46 do Estatuto da Terra:

"Art 24. Os conjuntos de imóveis rurais de um mesmo proprietário ou de propriedades em condomínio, de acôrdo com o previsto, respectivamente, nos §§ 1º e 6º do art. 50 do Estatuto da Terra, cadastrados como previsto nos §§ 3º e 6º do art. 46 do referido Estatuto, terão os respectivos módulos médios calculados de acôrdo com os seguintes critérios:
(...)
II - nos casos de propriedade em condomínio, inclusive por fôrça de sucessão causa-mortis, será considerada, para cada um dos condôminos, a dimensão da parte ideal ou já demarcada que lhe pertença;
III - nos casos de proprietários que possuam mais de um imóvel rural, sendo um ou mais dêstes em condomínio, o calculo do módulo, procedido na forma do inciso I levará em conta, para ponderação, a parte ideal ou já demarcada referida no inciso II e os módulos calculados para os respectivos imóveis em condomínio;
IV - para cada um dos condôminos o coeficiente de progressividade referido ao § 1º do art. 50 do Estatuto da Terra será obtido na forma do § 6º daquele dispositivo legal, pela média ponderada dos coeficientes que foram apurados, da forma do inciso I, para cada condômino. O coeficiente médio comum a todos os condôminos será obtido multiplicando-se os coeficientes relativos a cada condômino pela área que lhe cabe ao condomínio, e dividindo-se a soma dos resultados dessa multiplicação pela área total dos imóveis;" (grifamos)

11. Note-se bem que a legislação atinente à reforma agrária em nenhum momento faz menção a essa modalidade de cadastramento, de modo que o procedimento previsto no art. 46, § 6º, do Estatuto da Terra, está voltado exclusivamente a fins tributários. Não se presta a ser usado como parâmetro do dimensionamento de imóveis rurais destinados à reforma agrária, matéria afeta à Lei n. 8.629/93.
12. Leio, na doutrina do direito agrário, observações de LINHARES DE LACERDA: "as partes ideais serão cadastradas como partes ideais, não como partes certas, como a princípio poderia parecer em virtude da alusão à divisão. A divisão de imóvel em comum, ou existe, ou não existe e neste último caso, só se pode falar em parte ideal, pois, o condomínio concernente à herança: I- é considerado por lei uma universalidade; II- é objeto de direitos iguais entre todos os condôminos os quais podem nele usar livremente da coisa conforme seu destino e sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com a indivisão".
13. Veja-se que, no MS n. 24.999, Relator o Ministro Carlos Velloso [DJ de 4.2.05], o item III da ementa determina a aplicação do § 6º do art. 46 do Estatuto da Terra "para os fins da desapropriação", definindo de modo equivocado, no meu modo de ver, o alcance daquele preceito. Pois impõe-se, como creio ter demonstrado, a compreensão de cada texto normativo sempre em conjunto com os dos demais preceitos relativos à matéria, do que resultará a apreensão do sentido correto da expressão "para os fins desta Lei".
14. De resto, como bem lembrou o Ministro Nelson Jobim no início do julgamento do presente caso, se considerado divisível o imóvel rural, a aplicação do § 6º do art. 46 do Estatuto da Terra autorizaria o INCRA a realizar a vistoria de partes ideais eventualmente improdutivas, desapropriando-as em detrimento do todo que é o imóvel rural.
15. Permito-me chamar a atenção de Vossas Excelências para o teor do art. 1.784 do vigente Código Civil:

"Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários."

16. O preceito, ao consagrar o princípio da saisine, há de ser compreendido em conúbio com o disposto no art. 1.791 e seu parágrafo único:

"Art. 1.791. A herança defere-se como um todo unitário, ainda que vários sejam os herdeiros.
Parágrafo único. Até a partilha, o direito dos co-herdeiros, quanto à propriedade e posse da herança, será indivisível, e regular-se-á pelas normas relativas ao condomínio."

17. A saisine, como se vê claramente do texto do parágrafo único, torna múltipla apenas a titularidade do imóvel, que permanece sendo, do ponto de vista objetivo, até que sobrevenha a partilha, uma única propriedade. Observaram-no percucientemente a Ministra Ellen Gracie e o Ministro Cezar Peluso.
18. Juntou-se por linha, no caso, formal de partilha passado por ocasião da morte de José de Souza Leão, avô dos co-proprietários. Note-se, contudo, que não foi esta a forma de aquisição do imóvel objeto do presente mandado de segurança. O Engenho Canoa Rachada foi adquirido por escritura pública de doação feita por Estácio de Souza Leão, pai dos co-proprietários, nos termos da matrícula do imóvel [fls. 15/16].
19. Impossível, pois, como se vê, operar-se, no caso, um autêntico "salto" na cadeia sucessória. O formal de partilha não é instrumento hábil para a concretização da divisão do bem.
20. Coisa distinta da titularidade do imóvel é a sua integridade física como uma só unidade. Ainda que se admita a existência de condomínio sobre o bem, essa unidade não pode ser afastada ou superada quando da apuração da sua área para fins de reforma agrária. Não se pode tomar cada parte ideal como se consubstanciassem propriedades distintas.
21. Apenas o registro do imóvel no cartório competente prova, no que concerne à propriedade imobiliária, a titularidade do domínio. Leia-se o art. 252 da Lei n. 6.015/73, na redação a ele conferida pela Lei n. 6.216/75:

"Art. 252 - O registro, enquanto não cancelado, produz todos os efeitos legais ainda que, por outra maneira, se prove que o título está desfeito, anulado, extinto ou rescindido."

22. Protegido por presunção iuris tantum, qualquer modificação subjetiva ou objetiva referente ao imóvel há de ser, para que seja dotada de eficácia no mundo jurídico, averbada em sua matrícula. O registro imobiliário prevalece nos estritos termos de seu conteúdo.
23. Neste sentido a jurisprudência desta Corte. Destaco o MS n. 21.919, Relator o Ministro Celso de Mello [DJ de 6.6.97]:

"Demais disso, impende observar - até mesmo em função do que prescreve o art. 252 da Lei n. 6.015/73 - que o conteúdo do Registro Imobiliário, enquanto não for invalidado, reveste-se de presunção iuris tantum de veracidade. Vale dizer, o ato registral, enquanto subsistir, produzirá todos os seus efeitos legais, notadamente aqueles que se referem à designação formal do dominus e à identificação material do imóvel."

24. No mesmo sentido, o MS n. 24.503, Relator o Ministro Marco Aurélio [DJ de 5.9.2003]:

"A par da distinção entre imóvel rural e propriedade rural, tem-se que não lograram os impetrantes comprovar a existência de módulos diversos, assim constantes do registro de imóveis, relativamente à fazenda."

25. Tenho amplamente repetido neste Tribunal - faço-o à exaustão - que não se interpreta o direito em tiras, aos pedaços. Esta pauta de interpretação abrange também os precedentes, que deixam de consubstanciar norma, configurando texto, quando os consideramos.
26. O Ministro Gilmar Mendes toma como razão de decidir o precedente do MS n. 21.919, para determinar que as partes ideais dos condôminos, médias propriedades, não estão sujeitas à expropriação.
27. É, contudo, certo que o inteiro teor desse acórdão, pormenorizando a função do cadastro rural do INCRA, bem assim os efeitos do registro de imóveis, é absolutamente categórico, já na ementa, ao afirmar a necessidade do registro para que se opere a transformação das partes ideais do bem imóvel em propriedades distintas:

"Se, da divisão do imóvel, resultarem glebas que, objeto de matrícula e registros próprios, venham a qualificar-se como médias propriedades rurais, tornar-se-á impossível a desapropriação-sanção prevista no art. 184 da Carta Política." [grifei]

28. O mesmo entendimento é contemplado no MS n. 22.591, Relator o Ministro Moreira Alves [DJ de 14.11.2003], expressamente referido pelo Ministro Gilmar Mendes.
29. O procedimento de desapropriação, encerrando questão de direito real, demanda a existência de elementos objetivos que o instrumentalizem, pena de tornar-se vulnerável à maleabilidade dos elementos puramente subjetivos. Um desses elementos objetivos, indispensáveis ao correto dimensionamento do imóvel rural, diz com sua matrícula no cartório competente, dado que o cadastro efetuado pelo INCRA não é expressão de função notarial.
30. FERNANDO SODERO - um dos redatores do ante-projeto do Estatuto da Terra e Professor da Cadeira de Direito Agrário nas Arcadas do Largo de São Francisco - observa configurarem finalidades do cadastro previsto no Estatuto da Terra:
"i. o levantamento dos dados necessários à aplicação dos critérios de lançamentos fiscais atribuídos ao INCRA e à concessão das isenções a eles relativas e previstas na Constituição Federal e na legislação específica [...];
ii. o levantamento sistemático dos imóveis rurais, para conhecimento das condições vigentes na estrutura fundiária das várias regiões do País, com o objetivo de fornecer elementos de orientação da política agrícola a ser promovida pelos órgãos mencionados no art. 4º do Decreto n. 55.891, e à formulação dos Planos Nacional e Regionais de Reforma Agrária [...]" [grifos no original].

31. Ainda nas palavras de SODERO:

"[E]ste cadastro é classificado como "declaratório", pois as informações sobre o imóvel rural resultam de sua descrição, de sua extensão e localização, do tipo de exploração nele existente, da forma de utilização do solo, da administração direta ou indireta do seu proprietário ou detentor e, o mais importante, dados fornecidos ao Poder Público pela pessoa que detém a propriedade, a posse ou o domínio útil do imóvel objeto do cadastro.
Não devemos, pois, confundir este cadastro agrário com os que informam o registro predial do sistema francês e alemão [...], que cuidam, de forma diferente, de inscrição de direito real no referido registro. O que é objeto de disciplinação pelo Direito Agrário no Estatuto da Terra, é o declaratório.
Este não cuida, pois, das garantias da propriedade imobiliária, tratada de forma diferente nos dois países citados."

32. Impossível, destarte, a substituição dos termos do registro imobiliário, revestido de presunção iuris tantum, pelo conteúdo das fichas arquivadas no sistema do SNCR-INCRA, cuja razão de ser encontra-se em fundamentos precipuamente tributários, além das mencionadas pelo Ministro Celso de Mello em seu voto no MS n. 21.919 - mas que em nenhum momento prestam-se à mensuração dos prédios rurais.
33. Poderia parecer, em princípio, que o entendimento que ora estou a adotar ensejaria eventuais fraudes ao procedimento de desapropriação para fins de reforma agrária, na medida em que os co-proprietários inclinar-se-iam a registrar, em matrículas distintas, eventual divisão amigável, adiantamento de legítima ou mesmo a obviar a aceleração da partilha, permanecendo contudo a operar o imóvel rural como uma unidade econômica.
34. Recordo, no entanto, a jurisprudência desta Corte, absolutamente taxativa quanto à matéria: o art. 184 da Constituição do Brasil consigna a expressão "imóvel rural", cujo conceito encontra-se no art. 4º, I, do Estatuto da Terra, dele distanciando a noção de propriedade rural. A existência ou não de condomínio sobre o bem passa a ser pormenor inteiramente prescindível para torná-lo suscetível de desapropriação, pois o texto do Estatuto da Terra preza pela unidade da exploração econômica do prédio rústico.
35. É o que se extrai da ementa do MS n. 24.503, Relator o Ministro Marco Aurélio [DJ de 5.9.2003]:

"DESAPROPRIAÇÃO - REFORMA AGRÁRIA - OBJETO. A teor do disposto no artigo 184 da Constituição Federal, o alvo da reforma agrária é o "imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social", pouco importando a existência, sob o ângulo da propriedade, de condomínio." [grifei]

36. A alegação de fraude pelo poder expropriante esbarraria, ainda, na presunção de veracidade do registro imobiliário, além de não comportar dilação probatória em sede mandamental.
37. Lembre-se que o uso da terra e as atividades rurais devem ser disciplinadas com base na função social da propriedade, como preconizado na definição de direito agrário de SODERO, de modo que o seu descumprimento, aferido conforme os critérios definidos na Lei n. 8.629/93, autoriza a edição do decreto que declara o imóvel de interesse social para fins de reforma agrária.
38. Não há, no presente caso, qualquer elemento a permitir que o "Engenho Canoa Rachada" possa ser tomado como um conjunto de médias propriedades rurais, distintas e individualizadas. Os condôminos não efetuaram o registro da divisão amigável do imóvel no cartório competente, o que o Código Civil não só autoriza, mas recomenda e estimula, tendo em vista a prevenção de conflitos de interesses. Mais: os condôminos sequer procederam às alterações necessárias nos arquivos do SNCR-INCRA.
Ante o exposto, denego a ordem postulada no presente mandado de segurança para manter os efeitos do decreto do Presidente da República, de 25 de fevereiro de 2003.

* acórdão pendente de publicação




Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos
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Informativo STF - 431 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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