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segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Informativo STF 412 - Supremo Tribunal Federal

Informativo STF


Brasília, 5 a 9 de dezembro de 2005 - Nº 412.

Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.

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SUMÁRIO




Plenário
ADPF e Vinculação ao Salário-Mínimo - 1
ADPF e Vinculação ao Salário-Mínimo - 2
Perda de Mandato Parlamentar e Trânsito em Julgado
1ª Turma
Intimação Pessoal do Réu
Lei 10.826/2003: "Abolitio Criminis" Temporária e Porte de Arma de Fogo
Medida Sócio-Educativa de Internação e Divergências Técnicas
HC contra Ato de Membro do MPDFT: Competência
2ª Turma
Advogado e Falsidade Ideológica - 1
Advogado e Falsidade Ideológica - 2
Lei 10.826/2003.: "Abolitio Criminis" Temporária e Porte de Arma de Fogo
Tribunal do Júri: Revelia e Prisão por Pronúncia
Intervenção do Estado no Domínio Econômico e Responsabilidade Civil - 2
Autarquia e Execução por Precatório - 2
Pensão "Graciosa" e Direito Adquirido
Clipping do DJ
Transcrições
Indenização por Danos Decorrentes de Acidente do Trabalho: Competência (CC 7204/MG)


PLENÁRIO


ADPF e Vinculação ao Salário-Mínimo - 1

O Tribunal julgou procedente pedido formulado em argüição de descumprimento de preceito fundamental proposta pelo Governador do Estado do Pará para declarar, a partir da Constituição de 1988, sem se pronunciar sobre o período anterior, a ilegitimidade do Regulamento de Pessoal do Instituto de Desenvolvimento Econômico-Social do Pará - IDESP, adotado pela Resolução 8/86 do Conselho de Administração e aprovado pelo Decreto estadual 4.307/86, que, tratando da remuneração do pessoal da referida autarquia, extinta e sucedida pelo respectivo Estado-membro, vinculou o quadro de salários ao salário mínimo. Inicialmente, por maioria, o Tribunal conheceu da argüição, ficando vencido, em parte, o Min. Marco Aurélio, que dela não conhecia por falta de capacidade postulatória do argüente, facultando-lhe a regularização da representação processual. No mérito, tendo em conta a vedação constitucional de vinculação do salário mínimo para qualquer fim (CF/88, art. 7º, IV), entendeu-se que a norma de direito estadual é incompatível com a CF/88, uma vez que utiliza o salário mínimo como fator de reajuste automático de remuneração dos servidores. Além disso, afronta o princípio federativo (CF/88, arts. 1º e 18), porque retira do aludido Estado-membro a autonomia para decidir sobre esse reajuste, o qual fica vinculado ao índice fixado pelo Governo Federal. Precedentes citados: RE 140499/GO (DJU de 9.9.94); RE 229631/GO (DJU de 1º.7.99); RE 242740/GO (DJU de 18.5.2001).
ADPF 33/PA, rel. Min. Gilmar Mendes, 7.12.2005. (ADPF-33)

ADPF e Vinculação ao Salário-Mínimo - 2

Por vislumbrar aparente ofensa aos artigos 1º; 7º, IV; e 18, todos da CF/88, o Tribunal deferiu medida cautelar em argüição de descumprimento de preceito fundamental proposta pelo Governador do Pará para suspender o trâmite de todos os feitos em curso e dos efeitos de decisões judiciais ainda não transitadas em julgado, que versem sobre a aplicação do art. 2º do Decreto estadual 4.726/87, que cria Tabela Especial de Vencimentos e Salários destinada a remunerar os ocupantes de cargos e funções-de-emprego privativos de titulares de cursos superiores ou habilitação legal equivalente do extinto Departamento de Estradas e Rodagem do referido Estado-membro, estabelecendo que a mesma deve ser constituída por três níveis salariais correspondentes a múltiplos de salário-mínimo.
ADPF 47/PA, rel. Min. Eros Grau, 7.12.2005. (ADPF-47)

Perda de Mandato Parlamentar e Trânsito em Julgado

A declaração a que se refere o § 3º do art. 55 da CF independe do trânsito em julgado da decretação, pela Justiça Eleitoral, da perda de mandato parlamentar por prática de captação ilícita de sufrágio. Com base nesse entendimento, e ressaltando a pacífica jurisprudência do TSE no sentido de que a decisão, fundada no art. 41-A da Lei 9.504/97, deve ter cumprimento imediato, o Tribunal, por maioria, concedeu mandado de segurança para determinar que a Mesa da Câmara dos Deputados proceda à declaração da perda do mandato de deputado federal e da conseqüente posse pelo impetrante, primeiro suplente do parlamentar (Lei 9.504/97: "Art. 41-A. ... constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei,..., sob pena de ... cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990."; CF: "Art. 55. Perderá o mandato o Deputado ou Senador:... V - quando o decretar a Justiça Eleitoral, nos casos previstos nesta Constituição;... § 3º - Nos casos previstos nos incisos III a V, a perda será declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros, ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa."). Vencidos os Ministros Marco Aurélio e Eros Grau, que, fazendo distinção entre as hipóteses de cassação do registro e do diploma a que alude o art. 41-A da Lei 9.504/97, e, tendo em conta os artigos 15 e 22, XV, da Lei Complementar 64/90, que estabelecem, respectivamente, que a declaração de insubsistência do diploma ocorre somente com o trânsito em julgado da declaração de inelegibilidade do candidato, e que, se a representação for julgada procedente após a eleição do candidato, serão remetidas cópias do processo ao Ministério Público Eleitoral para os fins previstos no art. 14, §§ 10 e 11, da CF, e no art. 22, IV, do Código Eleitoral (ação de impugnação de mandato), denegavam a ordem por considerar incongruente conferir à Lei 9.504/97 alcance mais rigoroso do que o previsto na citada Lei Complementar.
MS 25458/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, rel. p/ acórdão Min. Carlos Velloso, 7.12.2005. (MS-25458)


PRIMEIRA TURMA


Intimação Pessoal do Réu

A Turma deu provimento a recurso ordinário em habeas corpus interposto em favor de dois condenados, cuja sentença absolutória fora reformada pelo TRF da 1ª Região, sem que realizada a intimação pessoal de ambos desse acórdão. No caso, os pacientes, na ação penal, não constituíram advogado, sendo-lhes atribuído defensor dativo, este, sim, intimado. Em interpretação sistemática dos artigos 261, 263 e 392 do CPP, asseverou-se que deve ser concedido ao último dispositivo alcance de modo a viabilizar o exercício do direito de defesa. Distinguindo a situação em que advogado constituído, da confiança do réu, vem acompanhando o processo, daquela em que a defesa ocorre por defensor dativo, que não integra o quadro da Defensoria Pública, surgindo o decreto condenatório apenas em segunda instância, entendeu-se pela necessidade de intimação pessoal dos pacientes. Ademais, como um dos réus fora citado por edital e, por força de lei, de igual modo deveria proceder-se em relação à intimação (CPP, art. 392, VI), seria razoável concluir-se pela necessidade de intimação do réu que, localizado, não constituíra defensor. RHC provido para tornar insubsistente a certidão de trânsito em julgado da decisão proferida, procedendo-se às intimações dos condenados.
RHC 86318/MG, rel. Min. Marco Aurélio, 6.12.2005. (RHC-86318)

Lei 10.826/2003: "Abolitio Criminis" Temporária e Porte de Arma de Fogo

A Turma negou provimento a recurso ordinário em habeas corpus em que se pretendia o trancamento de ação penal instaurada contra denunciado pela suposta prática do crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (Lei 10.826/2003, art. 14), sob a alegação de atipicidade da conduta, porquanto o paciente fora preso em flagrante durante o período de vacatio legis da citada Lei. Analisando os artigos 29, 30 e 32 da Lei 10.826/2003 e sucessivas alterações [Lei 10.826/2003: "Art. 29. As autorizações de porte de armas de fogo já concedidas expirar-se-ão 90 (noventa) dias após a publicação desta Lei. Parágrafo único. O detentor de autorização com prazo de validade superior a 90 (noventa) dias poderá renová-la, perante a Polícia Federal, nas condições dos arts. 4o, 6o e 10 desta Lei, no prazo de 90 (noventa) dias após sua publicação, sem ônus para o requerente. Art. 30. Os possuidores e proprietários de armas de fogo não registradas deverão, sob pena de responsabilidade penal, no prazo de 180 dias (cento e oitenta) dias após a publicação desta Lei, solicitar o seu registro apresentando nota fiscal de compra ou a comprovação da origem lícita da posse, pelos meios de prova em direito admitidos. Art. 32. Os possuidores e proprietários de armas de fogo não registradas poderão, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias após a publicação desta Lei, entregá-las à Polícia Federal, mediante recibo e, presumindo-se a boa-fé, poderão ser indenizados, nos termos do regulamento desta Lei."], entendeu-se que a aludida Lei não abolira temporariamente o crime de porte de arma de fogo, limitando-se a permitir, apenas, a regularização da sua autorização em determinado prazo. Ademais, asseverou-se que o recorrente não poderia ser incluído entre as pessoas e entidades para os quais a autorização para porte de arma é permitida, desde que satisfeitos certos requisitos. Por fim, salientou-se que, adotados os argumentos da impugnação, chegar-se-ia à conclusão de que qualquer pessoa poderia portar arma de fogo no período de vacância da lei, sem ser incomodada pelas autoridades.
RHC 86681/DF, rel. Min. Eros Grau, 6.12.2005. (RHC-86681)

Medida Sócio-Educativa de Internação e Divergências Técnicas

A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus impetrado em favor de menor submetido à medida sócio-educativa de internação por tempo indeterminado por haver praticado, com outros menores, ato infracional equivalente à tentativa de latrocínio. No caso concreto, existindo tanto laudos técnicos favoráveis à transferência do paciente para a medida de liberdade assistida quanto pronunciamentos sobre a necessidade da manutenção da medida de internação, o juiz optara pela medida mais gravosa, em virtude da indiferença do menor diante dos valores sociais. Pleiteava-se, na espécie, a transferência do paciente para a medida de liberdade assistida, com o conseqüente retorno ao convívio familiar, sob a alegação de ausência de motivação para a continuidade da medida aplicada, bem como de ofensa aos princípios constitucionais vetores das medidas sócio-educativas, quais sejam, da excepcionalidade e da brevidade (CF, art. 227, § 3º, V). Entendeu-se, pelas peculiaridades da hipótese, que as sucessivas decisões que mantiveram a internação do paciente não configuram ilegalidade ou abuso de poder. Tendo em conta que a situação do menor dividira as opiniões técnicas sobre a adequação ou não da continuidade da medida imputada, e que o juiz, em contato pessoal com os profissionais responsáveis pela periódica avaliação do internado e após a realização de audiências, decidira pela conservação da internação, considerou-se que o STF, distante dos fatos e em razão dos óbices decorrentes das limitações do habeas corpus, não poderia afastar as premissas da decisão do juízo de direito e escolher dentre um dos laudos. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia o writ para conceder a liberdade assistida, com base no ECA e nas manifestações favoráveis ao afastamento da internação, ressaltando que o adolescente encontra-se internado há quase 3 anos.
HC 86214/SP, rel. Min. Carlos Britto, 6.12.2005. (HC-86214)

HC contra Ato de Membro do MPDFT: Competência

Compete ao TRF da 1ª Região, com base no art. 108, I, a, da CF, processar e julgar, originariamente, os membros do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios que atuem em primeira instância. Com base nesse entendimento, a Turma reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios que afirmara a sua competência para processar e julgar habeas corpus em que a coação fora atribuída a membro do Ministério Público daquela unidade da federação. Inicialmente, salientou-se a orientação firmada pelo STF no sentido de que a competência para o julgamento de habeas corpus contra ato de autoridade, excetuado o Ministro de Estado, é do Tribunal a que couber a apreciação da ação penal contra essa mesma autoridade. Asseverou-se que o MPDFT está compreendido no MPU (CF, art. 128, I, d) e que a Constituição ressalva da competência do TRF somente os crimes atribuíveis à Justiça Eleitoral, não fazendo menção a determinado segmento do MPU, que pudesse afastar da regra específica de competência os membros do MPDFT. Rejeitou-se, portanto, a incidência da regra geral do inciso III do art. 96, da CF, com a conseqüente competência do Tribunal local para julgar o caso concreto. Ressaltando que, embora se reconheça a atuação dos Promotores de Justiça do DF perante a Justiça do mesmo ente federativo, em primeiro e segundo graus, similar à dos membros do MP perante os Estados-membros, concluiu-se que o MPDFT está vinculado ao MPU, a justificar, no ponto, tratamento diferenciado em relação aos membros do parquet estadual. RE provido para cassar o acórdão recorrido e determinar a remessa dos autos ao TRF da 1ª Região. Precedentes citados: RE 141209/SP (DJU de 10.2.92); HC 73801/MG (DJU de 27.6.97); RE 315010/DF (DJU de 31.5.2002); RE 352660/DF (DJU 23.6.2003); RE 340086/DF (DJU 1º.7.2002).
RE 418852/DF, rel. Min. Carlos Britto, 6.12.2005. (RE-418852)


SEGUNDA TURMA


Advogado e Falsidade Ideológica - 1

A Turma retomou julgamento de habeas corpus impetrado em favor de advogado acusado da suposta prática do crime de falsidade ideológica (CP, art. 299), consistente no fato de ter redigido e juntado, em autos de processo penal, declaração de conteúdo falso, assinada, a seu pedido, por testemunha de acusação, que presenciara delito de homicídio imputado a cliente do causídico. No caso concreto, a referida declaração, em que lançava dúvidas sobre a autoria do homicídio, fora anexada quando a testemunha já havia feito o reconhecimento visual do acusado de homicídio e prestado depoimento em juízo, sendo que, reinquirida posteriormente no Tribunal do Júri, afirmara que teria assinado a declaração porque o paciente lhe assegurara que o conteúdo do documento não modificaria o depoimento já prestado. Requer-se, na espécie, o trancamento da ação penal, sob alegação de atipicidade da conduta, já que a aludida declaração, registrada em cartório, não pode ser considerada documento para efeitos penais, uma vez que sujeita à verificação por parte do juízo.
HC 85064/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 6.12.2005. (HC-85064)

Advogado e Falsidade Ideológica - 2

Na sessão de 21.6.2005, o Min. Joaquim Barbosa, relator, afastando a similitude da hipótese com o precedente invocado (RHC 43396/RS, DJU de 22.8.66), indeferiu o writ, por entender que a atipicidade da conduta descrita não seria manifesta. Salientou, ademais, que, ainda que se concluísse pela inaplicabilidade do art. 299 do CP, competiria ao juízo ordinário a qualificação dos fatos narrados na denúncia, bem como a ocorrência ou não de dano. Em voto-vista, o Min. Gilmar Mendes, divergindo, deferiu o habeas corpus. Asseverou que, neste processo, a situação não poderia ser tida como absolutamente distinta da do precedente suscitado pelo simples fato de que o documento fora registrado em cartório. No ponto, considerou que a declaração seria inócua para o convencimento do magistrado acerca da autoria ou da materialidade delitiva, haja vista que a testemunha confirmara em juízo a versão inicial de seu depoimento, contrária ao que contido no documento. Assim, concluiu pela inexistência de dano relevante, entendendo que a declaração ofertada não pode ser considerada documento para os fins de reconhecimento do tipo penal previsto no art. 299 do CP. Após, o julgamento foi suspenso em face do pedido de vista do Min. Carlos Velloso.
HC 85064/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa, 6.12.2005. (HC-85064)

Lei 10.826/2003.: "Abolitio Criminis" Temporária e Porte de Arma de Fogo

A Turma iniciou julgamento de recurso ordinário em habeas corpus em que se pretende o trancamento de ação penal instaurada contra denunciado pela suposta prática do crime de porte ilegal de arma de fogo de uso permitido (Lei 10.826/2003, art. 14), sob a alegação de atipicidade da conduta, porquanto o paciente fora preso em flagrante durante o período de vacatio legis da citada Lei. O Min. Joaquim Barbosa, relator, negou provimento ao recurso por entender que os artigos 30 e 32 da Lei 10.826/2003 não descriminalizaram o porte ilegal de arma de fogo. Ressaltando que os aludidos artigos destinam-se aos possuidores de armas de fogo, asseverou que os portadores não foram incluídos na benesse. Aduziu, ainda, outras razões, à luz do sentido da Lei 10.826/2003: a) que seria paradoxal que uma lei que vise à contenção da criminalidade autorizasse, ainda que implicitamente, o porte de arma de fogo por ao menos 180 dias, já que poderia contribuir para a potencialização do cometimento de crimes; b) poder-se-ia concluir que a vacatio legis indireta decorreria da obrigação estabelecida pela Lei de entregar arma de fogo (art. 33), se não houvesse regulamentação sobre o procedimento dessa entrega (Instrução Normativa nº 001-DG/DPF/2004) e c) do ponto de vista de política criminal, tendo em conta as diversas ampliações dos prazos constantes nos artigos 30 e 32, não seria lógico extrair um sentido de que estas leis pretendiam aumentar o período de "anistia" para a posse da arma de fogo, uma vez que essas postergações ocorreram em face da necessidade de maior conscientização da existência da Lei 10.826/2003 ou de dificuldades burocráticas para a implementação dos aludidos artigos. Após, o julgamento foi suspenso em virtude do pedido de vista do Min. Gilmar Mendes.
RHC 86723/GO, rel. Min. Joaquim Barbosa, 6.12.2005. (RHC-86723)

Tribunal do Júri: Revelia e Prisão por Pronúncia

A revelia do acusado, desde o início do processo, justifica, por si só, a ordem de prisão contida na pronúncia, dada a necessidade de sua presença para que se realize o júri. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus impetrado em favor de pronunciados pela prática do crime de homicídio qualificado (CP, art. 121, § 2º, II e IV c/c art. 29) que, citados pessoalmente, optaram pela revelia, em face do não comparecimento aos interrogatórios marcados e aos demais atos instrutórios. Pretendia-se, na espécie, a revogação da prisão cautelar, sob a alegação de ausência de fundamentação. Aduzia-se a demora no julgamento pelo Tribunal do Júri e, ainda, a idade avançada dos pacientes, a primariedade e o fato de serem benquistos na região, residirem e trabalharem na zona rural do distrito da culpa, estarem filiados ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais, terem problemas de saúde e possuírem família constituída, residência fixa e profissão lícita. Entendeu-se cabível a custódia. Asseverou-se, ademais, que a primariedade e os bons antecedentes dos réus, por si sós, não afastam a possibilidade de decretação de prisão preventiva e que as demais circunstâncias referidas não são suficientes para motivar a concessão da ordem. Precedentes citados: HC 80794/RJ (DJU de 14.12.2001); HC 82704/PA (DJU de 13.6.2003); HC 82662/RS, (DJU de 11.4.2003).
HC 86751/CE, rel. Min. Gilmar Mendes, 6.12.2005. (HC-86751)

Intervenção do Estado no Domínio Econômico e Responsabilidade Civil - 2

Em conclusão de julgamento, a Turma, por maioria, deu provimento a recurso extraordinário interposto por destilaria contra acórdão do STJ que, em recurso especial, reformara decisão que condenara a União a indenizar os prejuízos advindos da intervenção do Poder Público no domínio econômico, a qual resultara na fixação de preços, no setor sucro-alcooleiro, abaixo dos valores apurados e propostos pelo Instituto Nacional do Açúcar e do Álcool. A recorrente alegava ofensa ao art. 37, § 6º, da CF, sustentando que, não obstante o referido ato tivesse decorrido de legítima atividade estatal, deveria ser indenizada pelo dano patrimonial por ela sofrido - v. Informativo 390. Entendeu-se que a intervenção estatal na economia possui limites no princípio constitucional da liberdade de iniciativa e a responsabilidade objetiva do Estado é decorrente da existência de dano atribuível à atuação deste. Nesse sentido, afirmou-se que a fixação, por parte do Estado, de preços a serem praticados pela recorrente em valores abaixo da realidade e em desconformidade com a legislação aplicável ao setor constitui-se em óbice ao livre exercício da atividade econômica, em desconsideração ao princípio da liberdade de iniciativa. Assim, não é possível ao Estado intervir no domínio econômico, com base na discricionariedade quanto à adequação das necessidades públicas ao seu contexto econômico, de modo a desrespeitar liberdades públicas e causar prejuízos aos particulares. Vencido, em parte, o Min. Joaquim Barbosa que dava parcial provimento ao recurso, para que a condenação somente recaísse sobre o período compreendido entre março de 1985 e maio de 1987.
RE 422941/DF, rel. Min. Carlos Velloso, 6.12.2005. (RE-422941)

Autarquia e Execução por Precatório - 2

Concluído julgamento de recurso extraordinário interposto pela Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina - APPA contra acórdão do TST que, aplicando a orientação jurisprudencial 87 dessa Corte, entendera que a recorrente, embora autarquia, não goza do privilégio de execução por precatório, uma vez que se sujeita ao regime próprio das empresas privadas por exercer atividade econômica - v. Informativo 410. Sustentava-se, na espécie, ofensa aos artigos 100 e 173, § 1º, da CF, sob a alegação de que a recorrente pode ser beneficiada pelo regime de pagamento de suas obrigações por precatório judicial em virtude de ser entidade autárquica que desenvolve atividade econômica, em regime de exclusividade. A Turma, por maioria, deu provimento ao recurso para determinar que a execução seja submetida ao regime de precatório. Tendo em conta precedentes do STF no sentido de não incidir a norma do § 1º do art. 173 nas sociedades de economia mista ou empresas públicas que, apesar de exercerem atividade econômica, gozam de exclusividade, e salientando o julgamento do RE 220906/RS (DJU de 14.11.2002), no qual se afirmou que a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT está submetida ao regime de precatório, concluiu-se que o referido dispositivo também não seria aplicável à recorrente. Asseverou-se que, no caso, trata-se de autarquia que presta serviço público e recebe recursos estaduais, conforme previsto no Regulamento da APPA (Decreto Estadual 7.447/90). Além disso, a EC19/98, ao alterar o art. 173, § 1º, da CF, teria reforçado o entendimento supra. Vencido o Min. Celso de Mello, que negava provimento ao recurso.
RE 356711/PR, rel. Min. Gilmar Mendes, 6.12.2005. (RE-356711)

Pensão "Graciosa" e Direito Adquirido

A Turma iniciou julgamento de recurso extraordinário interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais que entendera não haver direito adquirido aos critérios de cálculos relativos à pensão concedida, por lei, a viúva de deputado estadual, por se tratar de pensão "graciosa" que não tem natureza previdenciária. Na espécie, a recorrente, após o falecimento de seu cônjuge, em 1967, vinha recebendo a pensão com base na Lei estadual 8.393/83, até o advento da Lei estadual 9.886/89, que reduziu o valor percebido para 35% do subsídio mensal de deputado estadual. O Min. Carlos Velloso, relator, conheceu do recurso e a ele deu provimento. Considerou que a lei que rege as aposentadorias e as pensões é a vigente ao tempo em que a pensão é concedida, e que, ocorrido o fato qualificado nessa lei como jurígeno - no caso, o de ter o marido da pensionista exercido o mandato de deputado -, bem como não havendo previsão de nenhuma exceção, nem sendo ilegítima a concessão, há direito adquirido ao quantum da pensão concedida, o qual não pode ser reduzido por lei posterior. Após o voto do Min. Joaquim Barbosa, que acompanhava o relator, pediu vista dos autos o Min. Gilmar Mendes.
RE 460737/MG, rel. Min. Carlos Velloso, 6.12.2005. (RE-460737)

SessõesOrdináriasExtraordináriasJulgamentos
Pleno7.12.2005--5
1ª Turma6.12.2005--207
2ª Turma6.12.2005--189



C L I P P I N G   D O   D J

9 de dezembro de 2005

ADI N. 2.938-MG
RELATOR: MIN. EROS GRAU
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 13.454/00 DO ESTADO DE MINAS GERAIS. JUIZ DE PAZ. ELEIÇÃO E INVESTIDURA. SIMULTANEIDADE COM AS ELEIÇÕES MUNICIPAIS. PRINCÍPIO MAJORITÁRIO. PREVISÃO NO ART. 117, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE MINAS GERAIS. AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO. INVIABILIDADE DA AÇÃO DIRETA. 1. A viabilidade da ação direta reclama a impugnação conjunta dos preceitos que tratam da matéria, sob pena de inocuidade da própria declaração de inconstitucionalidade. 2. A ausência de impugnação do teor de preceitos constitucionais repetidos na lei impugnada impede o conhecimento da ação direta. Precedentes [ADI n. 2.132/MC, Relator o Ministro MOREIRA ALVES, DJ 05.04.2002; ADI n. 2.242, Relator o Ministro MOREIRA ALVES, DJ 19.12.2001 e ADI n. 2.215, Relator o Ministro CELSO DE MELLO, DJ 26.04.2001]. JUIZ DE PAZ. ELEIÇÃO E INVESTIDURA. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO CÓDIGO ELEITORAL E DA LEGISLAÇÃO FEDERAL ESPECÍFICA. INCONSTITUCIONALIDADE. NORMA COGENTE. 3. Não há falar-se, no que tange à legislação atinente à criação da justiça de paz, em aplicação subsidiária do Código Eleitoral [Lei n. 4.737/65], bem como da legislação federal específica, de observância obrigatória em todo território nacional.
JUIZ DE PAZ. ELEIÇÃO E INVESTIDURA. FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. OBRIGATORIEDADE. PROCEDIMENTOS NECESSÁRIOS À REALIZAÇÃO DAS ELEIÇÕES. CONSTITUCIONALIDADE. ART. 14, § 3º, E 98, II, DA CB/88. COMPETÊNCIA FEDERAL. 4. A obrigatoriedade de filiação partidária para os candidatos a juiz de paz [art. 14, § 3º, da CB/88] decorre do sistema eleitoral constitucionalmente definido. 5. Lei estadual que disciplina os procedimentos necessários à realização das eleições para implementação da justiça de paz [art. 98, II, da CB/88] não invade, em ofensa ao princípio federativo, a competência da União para legislar sobre direito eleitoral [art. 22, I, da CB/88].
JUIZ DE PAZ. ELEIÇÃO E INVESTIDURA. FIXAÇÃO DE CONDIÇÕES DE ELEGIBILIDADE PARA CONCORRER ÀS ELEIÇÕES. INCONSTITUCIONALIDADE. COMPETÊNCIA DA UNIÃO. ART. 14 E ART. 22, I, DA CB/88. 6. A fixação por lei estadual de condições de elegibilidade em relação aos candidatos a juiz de paz, além das constitucionalmente previstas no art. 14, § 3º, invade a competência da União para legislar sobre direito eleitoral, definida no art. 22, I, da Constituição do Brasil.
JUIZ DE PAZ. COMPETÊNCIAS FUNCIONAIS. ARRECADAR BENS DE AUSENTES OU VAGOS. FUNCIONAR COMO PERITO. NOMEAR ESCRIVÃO AD HOC. CONSTITUCIONALIDADE. MATÉRIA MERAMENTE ADMINISTRATIVA. COMPETÊNCIA FEDERAL. ART. 98, II, DA CB/88. 7. Lei estadual que define como competências funcionais dos juízes de paz a arrecadação provisória de bens de ausentes e vagos, nomeando escrivão ad hoc, e o funcionamento como perito em processos não invade, em ofensa ao princípio federativo, a competência da União para legislar sobre direito processual civil [art. 22, I, da CB/88].
JUIZ DE PAZ. COMPETÊNCIAS FUNCIONAIS. PROCESSAR AUTO DE CORPO DE DELITO. LAVRAR AUTO DE PRISÃO. RECUSA DA AUTORIDADE POLICIAL. INCONSTITUCIONALIDADE. PROCESSO PENAL. COMPETÊNCIA DA UNIÃO PARA LEGISLAR. ART. 22, I, DA CB/88. 8. Lei estadual que define como competências funcionais dos juízes de paz o processamento de auto de corpo de delito e a lavratura de auto de prisão, na hipótese de recusa da autoridade policial, invade a competência da União para legislar sobre direito processual penal [art. 22, I, da CB/88].
JUIZ DE PAZ. COMPETÊNCIAS FUNCIONAIS. PRESTAR ASSISTÊNCIA AO EMPREGADO NAS RESCISÕES DE CONTRATO DE TRABALHO. INEXISTÊNCIA DOS ÓRGÃOS PREVISTOS NO ART. 477 DA CLT. INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO DO TRABALHO. COMPETÊNCIA DA UNIÃO PARA LEGISLAR. ART. 22, I, DA CB/88. 9. Lei estadual que define como competências funcionais dos juízes de paz, na ausência dos órgãos previstos no art. 477 da CLT, a prestação de assistência ao empregado nas rescisões de contrato de trabalho, invade a competência da União para legislar sobre direito do trabalho [art. 22, I, da CB/88]. Função já assegurada pelo § 3º do mesmo preceito legal.
JUIZ DE PAZ. COMPETÊNCIAS FUNCIONAIS. ZELAR PELA OBSERVÂNCIA DAS NORMAS RELATIVAS À DEFESA DO MEIO AMBIENTE E VIGILÂNCIA ECOLÓGICA SOBRE AS MATAS. PROVIDÊNCIAS NECESSÁRIAS AO SEU CUMPRIMENTO. CONSTITUCIONALIDADE. ART. 225 E 98, II, DA CB/88. 10. Lei estadual que define como competência funcional do juiz de paz zelar, na área territorial de sua jurisdição, pela observância das normas concernentes à defesa do meio ambiente e à vigilância sobre as matas, rios e fontes, tomando as providências necessárias ao seu cumprimento, está em consonância com o art. 225 da Constituição do Brasil, desde que sua atuação não importe em restrição às competências municipal, estadual e da União.
JUIZ DE PAZ. PRERROGATIVAS. PRISÃO ESPECIAL. INCONSTITUCIONALIDADE. PROCESSO PENAL. COMPETÊNCIA DA UNIÃO PARA LEGISLAR. ART. 22, I, DA CB/88. DIREITO ASSEGURADO PELO ART. 112, § 2º, DA LOMAN [LC 35/75]. 11. Lei estadual que prevê em benefício dos juízes de paz o recolhimento a prisão especial invade a competência da União para legislar sobre direito processual penal [art. 22, I, da CB/88]. Direito já assegurado pelo art. 112, § 2º, da LOMAN [LC n. 35/75]. 12. Ação direta julgada parcialmente procedente.
* noticiado no Informativo 391

Acórdãos Publicados: 239



T R A N S C R I Ç Õ E S


Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.

Indenização por Danos Decorrentes de Acidente do Trabalho: Competência (Transcrições)

(v. Informativo 394)

CC 7204/MG*

RELATOR: MIN. CARLOS BRITTO


EMENTA: CONSTITUCIONAL. COMPETÊNCIA JUDICANTE EM RAZÃO DA MATÉRIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PATRIMONIAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DO TRABALHO, PROPOSTA PELO EMPREGADO EM FACE DE SEU (EX-)EMPREGADOR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. ART. 114 DA MAGNA CARTA. REDAÇÃO ANTERIOR E POSTERIOR À EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/04. EVOLUÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PROCESSOS EM CURSO NA JUSTIÇA COMUM DOS ESTADOS. IMPERATIVO DE POLÍTICA JUDICIÁRIA.
Numa primeira interpretação do inciso I do art. 109 da Carta de Outubro, o Supremo Tribunal Federal entendeu que as ações de indenização por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, ainda que movidas pelo empregado contra seu (ex-)empregador, eram da competência da Justiça comum dos Estados-Membros.
2. Revisando a matéria, porém, o Plenário concluiu que a Lei Republicana de 1988 conferiu tal competência à Justiça do Trabalho. Seja porque o art. 114, já em sua redação originária, assim deixava transparecer, seja porque aquela primeira interpretação do mencionado inciso I do art. 109 estava, em boa verdade, influenciada pela jurisprudência que se firmou na Corte sob a égide das Constituições anteriores.
3. Nada obstante, como imperativo de política judiciária - haja vista o significativo número de ações que já tramitaram e ainda tramitam nas instâncias ordinárias, bem como o relevante interesse social em causa -, o Plenário decidiu, por maioria, que o marco temporal da competência da Justiça trabalhista é o advento da EC 45/04. Emenda que explicitou a competência da Justiça Laboral na matéria em apreço.
4. A nova orientação alcança os processos em trâmite pela Justiça comum estadual, desde que pendentes de julgamento de mérito. É dizer: as ações que tramitam perante a Justiça comum dos Estados, com sentença de mérito anterior à promulgação da EC 45/04, lá continuam até o trânsito em julgado e correspondente execução. Quanto àquelas cujo mérito ainda não foi apreciado, hão de ser remetidas à Justiça do Trabalho, no estado em que se encontram, com total aproveitamento dos atos praticados até então. A medida se impõe, em razão das características que distinguem a Justiça comum estadual e a Justiça do Trabalho, cujos sistemas recursais, órgãos e instâncias não guardam exata correlação.
5. O Supremo Tribunal Federal, guardião-mor da Constituição Republicana, pode e deve, em prol da segurança jurídica, atribuir eficácia prospectiva às suas decisões, com a delimitação precisa dos respectivos efeitos, toda vez que proceder a revisões de jurisprudência definidora de competência ex ratione materiae. O escopo é preservar os jurisdicionados de alterações jurisprudenciais que ocorram sem mudança formal do Magno Texto.
6. Aplicação do precedente consubstanciado no julgamento do Inquérito 687, Sessão Plenária de 25.08.99, ocasião em que foi cancelada a Súmula 394 do STF, por incompatível com a Constituição de 1988, ressalvadas as decisões proferidas na vigência do verbete.
7. Conflito de competência que se resolve, no caso, com o retorno dos autos ao Tribunal Superior do Trabalho.

Relatório: Trata-se de conflito negativo de competência, suscitado pelo Tribunal Superior do Trabalho em face do recentemente extinto Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais.
2. Por meio dele, conflito, discute-se a competência para processar e julgar ação indenizatória por danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho, quando tal ação é proposta por empregado contra o seu empregador. Donde a controvérsia: competente é a Justiça comum estadual, ou a Justiça especializada do trabalho?
3. Pois bem, o fato é que Vicente Giacomini Peron ajuizou, na Justiça do Trabalho e contra o então Banco do Estado de Minas Gerais/BEMGE, ação de indenização por motivo de doença profissional. O que levou a Junta de Conciliação e Julgamento de Ubá/MG a se dar por incompetente e determinar a remessa dos autos a uma das Varas Cíveis daquela mesma Comarca. Pelo que a Justiça estadual julgou o pedido parcialmente procedente, resultando daí a interposição de recurso de apelação pelo Banco demandado.
4. Acontece que, ao apreciar o apelatório, o Tribunal de Alçada de Minas Gerais declinou de sua competência e determinou a devolução dos autos à Junta de Conciliação e Julgamento de Ubá/MG. Esta última, agora sim, aceitou o processamento da ação e, também ela, julgou parcialmente procedente o pedido do autor. Fato que ensejou a interposição de recurso ordinário - apenas parcialmente provido pelo TRT/3ª Região - e, posteriormente, recurso de revista.
5. Foi quando, na análise desta última impugnação, a 5a Turma do egrégio Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a incompetência da Justiça especial, de maneira a suscitar o presente conflito negativo de competência (tendo em vista a recusa anteriormente externada pelo Tribunal de Alçada de Minas Gerais).
6. Prossigo neste relato para consignar que o Ministério Público Federal opinou pela procedência da suscitação, em parecer assim ementado:

"CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. QUINTA TURMA DO TST E TRIBUNAL DE ALÇADA DE MINAS GERAIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS DECORRENTES DE ACIDENTE DE TRABALHO. ART. 109, INCISO I, DA CF, E ART. 114, DA CF, COM A NOVA REDAÇÃO DADA PELA EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004. REMANESCE A COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL PARA JULGAR AÇÃO INDENIZATÓRIA FUNDADA EM ACIDENTE DE TRABALHO. PRECEDENTES. PARECER PELO CONHECIMENTO DO CONFLITO, PARA QUE SE DECLARE COMPETENTE A JUSTIÇA COMUM ESTADUAL".

7. É o relatório, que submeto ao egrégio Plenário desta Casa (RI/STF, art. 6º, inciso I, "d").

Voto: Conforme visto, a questão que se põe neste conflito consiste em saber a quem compete processar e julgar as ações de reparação de danos morais e patrimoniais advindos do acidente do trabalho. Ações propostas pelo empregado em face de seu empregador, de sorte a provocar o seguinte questionamento: a competência é da Justiça comum estadual, segundo concluiu o órgão suscitante (TST), ou é da Justiça Obreira, como entendeu o suscitado (antigo Tribunal de Alçada de Minas Gerais)?
9. Começo por responder que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal proclama a competência da Justiça trabalhista para o conhecimento das ações indenizatórias por danos morais decorrentes da relação de emprego. Pouco importando se a controvérsia comporta resolução à luz do Direito Comum, e não do Direito do Trabalho. Todavia, desse entendimento o STF vem excluindo as ações reparadoras de danos morais, fundadas em acidente do trabalho (ainda que movidas pelo empregado contra seu empregador), para incluí-las na competência da Justiça comum dos Estados. Isso por conta do inciso I do art. 109 da Constituição Republicana. Foi o que o Tribunal Pleno decidiu, por maioria de votos, quando do julgamento do RE 438.639, sessão do dia 09/03/2005, na qual fiquei vencido, como Relator, na companhia do eminente Ministro Marco Aurélio.
10. Nada obstante, valendo-me do art. 6º do Regimento Interno da Casa, trago o presente conflito ao conhecimento deste colendo Plenário para rediscutir a matéria. É que, a meu sentir, a norma que se colhe do inciso I do art. 109 da Lei das Leis não autoriza concluir que a Justiça comum estadual detém competência para apreciar as ações que o empregado propõe contra o seu empregador, pleiteando reparação por danos morais ou patrimoniais decorrentes de acidente do trabalho. É dizer: quanto mais reflito sobre a questão, mais me convenço de que a primeira parte do dispositivo constitucional determina mesmo que compete aos juízes federais processar e julgar "as causas em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes...". Mas esta é apenas a regra geral, plasmada segundo o critério de distribuição de competência em razão da pessoa. Impõe-se atentar para a segunda parte do inciso, assim vocalizada: "...exceto as de falência, as de acidente de trabalho e as sujeitas à Justiça Eleitoral e à Justiça do Trabalho". E esta segunda parte, como exceção que é, deve ser compreendida no contexto significante daquela primeira, consubstanciadora de regra geral. Em discurso quiçá mais elucidativo: à luz da segunda parte do inciso I do art. 109 da Constituição Federal, tem-se que as causas de acidente do trabalho em que a União, entidade autárquica ou empresa pública federal forem interessadas, na condição de autora, ré, assistente ou oponente, não são da competência dos juízes federais.
11. Remarque-se, então, que as causas de acidente do trabalho, excepcionalmente excluídas da competência dos juízes federais, só podem ser as chamadas ações acidentárias. Ações, como sabido, movidas pelo segurado contra o INSS, a fim de discutir questão atinente a benefício previdenciário. Logo, feitos em que se faz presente interesse de uma autarquia federal, é certo, mas que, por exceção, se deslocam para a competência da Justiça comum dos Estados. Por que não repetir? Tais ações, expressamente excluídas da competência dos juízes federais, passam a caber à Justiça comum dos Estados, segundo o critério residual de distribuição de competência. Tudo conforme serena jurisprudência desta nossa Corte de Justiça, cristalizada no enunciado da Súmula 501.
12. Outra, porém, é a hipótese das ações reparadoras de danos oriundos de acidente do trabalho, quando ajuizadas pelo empregado contra o seu empregador. Não contra o INSS. É que, agora, não há interesse da União, nem de entidade autárquica ou de empresa pública federal, a menos, claro, que uma delas esteja na condição de empregadora. O interesse, reitere-se, apenas diz respeito ao empregado e seu empregador. Sendo desses dois únicos protagonistas a legitimidade processual para figurar nos pólos ativo e passivo da ação, respectivamente. Razão bastante para se perceber que a regra geral veiculada pela primeira parte do inciso I do art. 109 da Lei Maior - definidora de competência em razão da pessoa que integre a lide - não tem como ser erigida a norma de incidência, visto que ela não trata de relação jurídica entre empregados e empregadores. Já a parte final do inciso I do art. 109 da Magna Carta, segundo demonstrado, cuida é de outra coisa: excepcionar as hipóteses em que a competência seria da própria Justiça Federal.
13. Deveras, se a vontade objetiva do Magno Texto fosse excluir da competência da Justiça do Trabalho matéria ontologicamente afeita a ela, Justiça Obreira, certamente que o faria no próprio âmbito do art. 114. Jamais no contexto do art. 109, versante, este último, sobre competência de uma outra categoria de juízes.
14. Noutro modo de dizer as coisas, não se encaixando em nenhuma das duas partes do inciso I do art. 109 as ações reparadoras de danos resultantes de acidente do trabalho, em que locus da Constituição elas encontrariam sua específica norma de regência? Justamente no art. 114, que proclama a competência da Justiça especial aqui tantas vezes encarecida. Competência que de pronto se define pelo exclusivo fato de o litígio eclodir entre trabalhadores e empregadores, como figura logo no início do texto normativo em foco. E já me antecipando, ajuízo que a nova redação que a EC nº 45/04 conferiu a esse dispositivo, para abrir significativamente o leque das competências da Justiça Laboral em razão da matéria, só veio robustecer o entendimento aqui esposado.
15. Com efeito, estabelecia o caput do art. 114, em sua redação anterior, que era da Justiça do Trabalho a competência para conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, além de outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho. Ora, um acidente de trabalho é fato ínsito à interação trabalhador/empregador. A causa e seu efeito. Porque sem o vínculo trabalhista o infortúnio não se configuraria; ou seja, o acidente só é acidente de trabalho se ocorre no próprio âmago da relação laboral. A possibilitar a deflagração de efeitos morais e patrimoniais imputáveis à responsabilidade do empregador, em regra, ora por conduta comissiva, ora por comportamento omissivo.
16. Como de fácil percepção, para se aferir os próprios elementos do ilícito, sobretudo a culpa e o nexo causal, é imprescindível que se esteja mais próximo do dia-a-dia da complexa realidade laboral. Aspecto em que avulta a especialização mesma de que se revestem os órgãos judicantes de índole trabalhista. É como dizer: órgãos que se debruçam cotidianamente sobre os fatos atinentes à relação de emprego (muitas vezes quanto à própria existência dela) e que por isso mesmo detêm melhores condições para apreciar toda a trama dos delicados aspectos objetivos e subjetivos que permeiam a relação de emprego. Daí o conteúdo semântico da Súmula 736, deste Excelso Pretório, assim didaticamente legendada: "Compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores".
17. Em resumo, a relação de trabalho é a invariável matriz das controvérsias que se instauram entre trabalhadores e empregadores. Já a matéria genuinamente acidentária, voltada para o benefício previdenciário correspondente, é de ser discutida com o INSS, perante a Justiça comum dos Estados, por aplicação da norma residual que se extrai do inciso I do art. 109 da Carta de Outubro.
18. Nesse rumo de idéias, renove-se a proposição de que a nova redação do art. 114 da Lex Maxima só veio aclarar, expletivamente, a interpretação aqui perfilhada. Pois a Justiça do Trabalho, que já era competente para conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, além de outras controvérsias decorrentes da relação trabalhista, agora é confirmativamente competente para processar e julgar as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho (inciso VI do art. 114).
19. Acresce que a norma fundamental do inciso IV do art. 1o da Constituição Republicana ganha especificação trabalhista em vários dispositivos do art. 7o, como o que prevê a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança (inciso XXII), e o que impõe a obrigação do seguro contra acidente do trabalho, sem prejuízo, note-se, da indenização por motivo de conduta dolosa ou culposa do empregador (inciso XXVIII). Vale dizer, o direito à indenização em caso de acidente de trabalho, quando o empregador incorrer em dolo ou culpa, vem enumerado no art. 7o da Lei Maior como autêntico direito trabalhista. E como todo direito trabalhista, é de ser tutelado pela Justiça especial, até porque desfrutável às custas do empregador (nos expressos dizeres da Constituição).
20. Tudo comprova, portanto, que a longa enunciação dos direitos trabalhistas veiculados pelo art. 7o da Constituição parte de um pressuposto lógico: a hipossuficiência do trabalhador perante seu empregador. A exigir, assim, interpretação extensiva ou ampliativa, de sorte a autorizar o juízo de que, ante duas defensáveis exegeses do texto constitucional (art. 114, como penso, ou art. 109, I, como tem entendido esta Casa), deve-se optar pela que prestigia a competência especializada da Justiça do Trabalho.
21. Por todo o exposto, e forte no art. 114 da Lei Maior (redações anterior e posterior à EC 45/04), concluo que não se pode excluir da competência da Justiça Laboral as ações de reparação de danos morais e patrimoniais decorrentes de acidente de trabalho, propostas pelo empregado contra o empregador. Menos ainda para incluí-las na competência da Justiça comum estadual, com base no art. 109, inciso I, da Carta de Outubro.
22. No caso, pois, julgo improcedente este conflito de competência e determino o retorno dos autos ao egrégio Tribunal Superior do Trabalho, para que proceda ao julgamento do recurso de revista manejado pelo empregador.
É o meu voto.

*acórdão publicado no DJU de 9.12.2005


Assessora responsável pelo Informativo

Anna Daniela de A. M. dos Santos e Silva
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Informativo STF - 412 - Supremo Tribunal Federal

 



 

 

 

 

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