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terça-feira, 23 de junho de 2009

JURID - Ação indenizatória. Dano moral e estético. [23/06/09] - Jurisprudência


Ação indenizatória. Dano moral e estético. Autora que sofreu queda da própria altura, sendo internada no serviço de ortopedia do Hospital Estadual Albert Schweitzer.


Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro - TJRJ.

DÉCIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL

APELAÇÃO CÍVEL Nº 2004.001.03475

Apelante: ANTONIETA CASTRO BRAGA

Apelado: ESTADO DO RIO DE JANEIRO

RELATOR: DES. FERDINALDO NASCIMENTO

APELAÇÃO CÍVEL. Ação indenizatória. Dano moral e estético. Autora que sofreu queda da própria altura, sendo internada no serviço de ortopedia do Hospital Estadual Albert Schweitzer. Diagnóstico de fratura diafisária de fêmur. Necessidade de transferência imediata da paciente para unidade de grande porte com CTI e realização de cirurgia reparadora. Demora reconhecidamente causada em razão da superlotação dos hospitais estaduais, fato esse que agravou o quadro clínico da paciente (gangrena, necrose de calcâneo e isquemia), culminando na amputação da perna direita da mesma na altura do joelho. Sentença improcedente, fundada na irresponsabilidade do Estado. Apelo ofertado pela autora. Falecimento desta no curso da lide. Habilitação da filha no pólo ativo. Reforma do decisum. Reconhecimento da responsabilidade objetiva do Estado, fundada na teoria do risco administrativo. Irregularidade no funcionamento dos hospitais públicos. Fato que inviabilizou a transferência e pronto procedimento cirúrgico de que tanto necessitava a paciente. Dano moral fixado em R$ 40.000,00 julgando-se prejudicado o pedido de dano estético, face seu caráter personalíssimo e intransferível, bem como o pedido de fornecimento de prótese de MID, cadeira de rodas e cadeira higiênica, haja vista o falecimento da vítima no curso da demanda. Fixação da sucumbência recíproca das partes, na forma do art. 21, caput, do CPC. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelação Cível nº 2004.001.03475, em que é apelante ANTONIETA CASTRO BRAGA, sendo apelado ESTADO DO RIO DE JANEIRO.

ACORDAM os Desembargadores que compõem a Décima Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade, em dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do Desembargador Relator.

R E L A T Ó R I O

Trata-se de ação indenizatória, sob o rito ordinário, proposta por OSWALDINA CASTRO BRAGA em face do ESTADO DO RIO DE JANEIRO, através da qual pretende a condenação do réu ao pagamento de uma indenização por danos morais no valor equivalente a 1.000 salários mínimos vigentes no país à época do efetivo pagamento, bem como danos estéticos no importe de 300 salários mínimos, com a condenação do Estado ao pagamento de próteses, cadeira de rodas, cadeira higiênica e tudo que se fizer necessário para o bem estar da autora.

Alega, para tanto, em sua petição inicial que no dia 28/02/2001, ao levar um tombo e cair da própria altura a autora veio a ser internada no Hospital Estadual Albert Schweitzer, com diagnóstico de fratura no fêmur, necessitando ser transferida de imediato para outra unidade de maior porte com CTI para realização de cirurgia de emergência.

No entanto, depois daquele primeiro atendimento, o réu não logrou êxito na transferência da paciente em razão da superlotação dos demais hospitais públicos, fato esse que agravou o estado de saúde da paciente, culminando na amputação da perna direita da mesma na altura do joelho no dia 22/06/2001, devido ao quadro de necrose de calcâneo e isquemia que esta apresentava (gangrena).

A r. sentença monocrática lançada a fls. 111/113, julgou improcedente o pleito autoral ao fundamento de que a amputação da perna da autora não é de responsabilidade do Estado, mas tão somente uma conseqüência inevitável do acidente, já que seus agentes fizeram o possível para conseguir a transferência. Por fim, o douto sentenciante condenou a autora nas custas processuais e honorários advocatícios de sucumbência, estes fixados em 10% sobre o valor atribuído à causa.

Irresignada com o decisum que lhe foi amplamente desfavorável apela a autora, tempestivamente, a fls. 119/129, pugnando, preliminarmente, pela conversão do julgamento em diligência, para que seja realizada nova perícia, desta vez com a atuação de um médico ortopedista especialista na matéria, já que o laudo foi elaborado por dermatologista. No mérito, pugna pela reforma integral da sentença, julgando-se procedente o pleito inaugural e invertendo-se os consectários da sucumbência

Contra-razões do Estado a fls. 135/139, desprovimento do recurso, mantendo-se a integralidade da sentença de improcedência.

Parecer emitido pelo Parquet de primeiro grau a fls. 141 pela admissibilidade do recurso e, no mérito, pelo seu desprovimento.

A douta Procuradoria de Justiça se manifestou a fls. 147/147-verso, no sentido de que o julgamento seja convertido em diligência, requisitando-se ao Conselho Regional de medicina a informação necessária quanto a especialidade médica do ilustre expert do Juízo, Dr. João Paulo Conceição, CRM nº 52.13496-0.

Ofício emitido pelo CRM/RJ a fls. 167, informando que não consta registro de especialidade em nome do ilustre perito.

A fls. 175, decisão deste Relator que acolheu o parecer exarado pela douta Procuradoria de Justiça de fls. 171/174-verso, no sentido de converter o julgamento em diligência para a realização de nova perícia, desta vez, através do médico ortopedista nomeado (Dr. Antonio Carlos Nunes de Moraes), nomeação essa que não foi aceita conforme petição de fls. 176.

A fls. 177, foi nomeado o Dr. Roberto Fernandes como novo perito do juízo, na especialidade de ortopedia, o que foi aceito a fls. 178.

Na oportunidade, foi requerido honorários em valor equivalente a 8 salários mínimos e marcado o exame para 09/08/2006 na sala de perícias médicas do fórum da Capital.

Petição de fls. 180 encaminhada pela ilustre patrona da parte autora, comunicando o falecimento da demandante OSWALDINA CASTRO BRAGA no dia 10/05/2005 e acostando o atestado de óbito a fls. 181.

A fls. 187, decisão deste Relator deferindo a sucessão processual requerida em favor de ANTONIETA CASTRO BRAGA filha única da autora falecida OSWALDINA CASTRO BRAGA, oportunizando a respectiva anotação do nome da parte na capa dos autos.

A fls. 192 foi requerida pela parte autora a realização de perícia indireta, o que foi aceito por este Relator a fls. 193, ocasião em que foi concedido prazo comum de 5 dias para apresentação de quesitos pelos interessados.

Quesitos complementares da autora a fls. 194/195.

Juntada de laudo pericial indireto a fls. 219/223, com manifestação das partes a fls. 225/227.

Parecer da douta Procuradoria de Justiça a fls. 229/229-verso, pugnando pela complementação do laudo, haja vista que o mesmo não satisfez os quesitos formulados pelas partes, o que foi deferido a fls. 230.

Complementação do laudo pericial a fls. 231/234, com manifestação das partes a fls. 238/239 e 241.

Parecer final de mérito emitido pela douta Procuradoria de Justiça a fls. 243/249, no sentido de conhecer e prover parcialmente o presente aplo para condenar o Estado do Rio de Janeiro a indenizar a Apelante pelos danos morais sofridos em quantia não superior a R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Manifestação final do réu, a fls. 252/253, através da douta Procuradoria Geral do Estado, reconhecendo que a superlotação dos hospitais, evento crônico, foi a causa da não transferência da paciente, pugnando, ao final, pela mantença da r. sentença de primeiro grau que houve por bem julgar improcedente o pleito indenizatório.

Eis o relatório. Passo a decidir.

V O T O

Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal e sendo tempestivo, o apelo deve ser conhecido.

No mérito, a autora OSWALDINA CASTRO BRAGA pleiteou o recebimento de indenização por danos morais e estéticos, bem como cadeira de rodas, cadeira higiênica e a prótese para a perna amputada, alegando negligência do réu nos primeiros socorros oriundos de fratura femural ocorrida em 28/02/2001 e demora injustificada na sua transferência para nosocômio de grande porte com CTI para realização de cirurgia de emergência de que tanto necessitava, fato esse que agravou o seu quadro clínico, gerando necrose de calcâneo e gangrena da perna da paciente e conseqüente amputação de MID.

O douto Juízo da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca da Capital em sentença lançada em 08/10/2003, julgou improcedente o pleito autoral, ao argumento de que a fratura, por si só, foi causa suficiente para a amputação da perna da paciente, reconhecendo, ainda, a correta atuação dos médicos que a atenderam.

Todavia, o entendimento contido na sentença de primeiro grau não merece prosperar, pois, além de ultrapassado, contraria a prova dos autos, não traduzindo a mais justa solução, pelo que, está a merecer reforma para que seja aplicada a teoria da responsabilidade civil objetiva do Estado, a luz do disposto no art. 37, parágrafo 6º da Constituição Federal, segundo a qual:

"As pessoas Jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa."

Isso porque, a Constituição Federal entregou à Administração Pública Direta a missão peculiar de bem garantir a vida, a segurança e a saúde das pessoas, não podendo, portanto, a pretexto de superlotação de seus hospitais ou falta de políticas públicas eficientes, faltar com o dever que lhe é constitucionalmente imposto.

O cidadão machucado ou acidentado que ingressa num hospital público com fratura grave, necessitando de intervenção cirúrgica de emergência, deve ser atendido num prazo razoável, não podendo ficar durante meses, a toda evidência, a mercê de toda a sorte, mormente quando sua vida depende da presteza, agilidade e eficiência desses serviços médicos.

Restou clara e evidente, portanto, diante da farta prova dos autos, a violação de um princípio administrativo explícito, qual seja: o da eficiência (art. 37, caput, CRFB).

Assim, diante da manifesta inoperância do serviço público de saúde de responsabilidade do ente Estatal, que deixou sua paciente por mais de 4 meses a espera de uma cirurgia de emergência, não há como ratificar a sentença de improcedência, pois, como é cediço, predomina largamente em nosso ordenamento pátrio a utilização da teoria da responsabilidade objetiva do Estado, que impõe à Administração o dever de ressarcir os danos causados a terceiros, bastando estarem presentes para tanto a existência do nexo de causalidade entre o dano e o ato do agente público que deu ensejo à lesão.

Nesse sentido, segue a jurisprudência da Suprema Corte, conforme ementa abaixo colacionadas:

Recurso extraordinário. Indenização. Responsabilidade objetiva do Estado. 2. Acórdão que confirmou sentença de improcedência da ação, determinando que somente se admite o direito a indenização se ficar provada a culpa subjetiva do agente, e não a objetiva. 3. Alegação de ofensa ao art. 107, da EC n.º 01/69, atual art. 37, § 6º, da CF/88. 4. Aresto que situou a controvérsia no âmbito da responsabilidade subjetiva, não vendo configurado erro médico ou imperícia do profissional que praticou o ato cirúrgico. 5. Precedentes da Corte ao assentarem que "I - A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público, responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo, ocorre diante dos seguintes requisitos: a) do dano; b) da ação administrativa; c) e desde que haja nexo causal entre o dano e a ação administrativa. II - Essa responsabilidade objetiva, com base no risco administrativo, admite pesquisa em torno da culpa da vítima, para o fim de abrandar ou mesmo excluir a responsabilidade da pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público." RE n.º 178.086-RJ. 6. Inexiste, na espécie, qualquer elemento a indicar tenha a vítima concorrido para o evento danoso. 7. Recurso conhecido e provido para julgar procedente a ação. (RE 217389/SP - Relator: Min. NÉRI DA SILVEIRA Julgamento: 02/04/2002- Segunda Turma - STF).

Assim, uma vez comprovado que a necrose calcânea decorreu da demora injustificada de quase 4 meses de o réu proceder a cirurgia de fêmur de que tanto necessitava a autora, bem como do retardo injustificado de sua transferência para um nosocômio de grande porte com CTI, responde o Estado objetivamente pelos danos causados à mesma, não podendo o magistrado concluir que a amputação foi apenas uma conseqüência inevitável do tombo.

No mais, qualquer homem médio pode concluir que a espera de mais de 4 meses para uma transferência e cirurgia reparadora de fratura grave constitui um tempo deveras prolongado e irrazoável, razão pela qual, não há como o réu escapar da condenação pretendida pela autora. Ademais, mesmo tendo conhecimento de que a autora sentia fortes dores, necessitando de transferência urgente e cirurgia para restauração da fratura, o demandado não tomou as providências necessárias e urgentes, afirmando, apenas a fls. 252, que a "superlotação dos hospitais, evento crônico, com certeza foi a causa da não transferência da paciente".

Desta forma, tendo em vista que o amplo conjunto probatório revela a comprovação do fato constitutivo do direito invocado pela parte autora, nos termos do disposto no art. 333, I do CPC, inexistindo qualquer prova quanto a eventual causa excludente de responsabilidade, ou qualquer fato impeditivo, modificativo ou extintivo do postulado indenizatório autoral, merece a r. sentença recorrida ser reformada para que sejam reconhecidos os danos morais decorrentes da indigitada amputação, restando prejudicado, porém, o pedido de dano estético, por se tratar de bem personalíssimo, impassível de ser transferido aos herdeiros. Finalmente, julga-se prejudicado também o pedido quanto ao fornecimento de cadeira de rodas, cadeira higiênica e prótese de MID, haja vista a ocorrência do óbito da autora Oswaldina Castro Braga no curso da presente lide.

O dano moral é a dor, o vexame, o sofrimento ou a humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angustias e desequilíbrio em seu bem estar, o que ocorreu no presente caso, pois a autora, que era idosa, depois de sofrer uma simples queda da própria altura e fraturar o fêmur, teve sua perna amputada 4 meses depois, sem o necessário atendimento.

Sabe-se também que, a compensação eventualmente devida a quem foi atingido pela conduta ilícita de outrem não visa propiciar um enriquecimento ao lesado e sim restabelecer seu statu quo ante, motivo pelo qual o valor da indenização pelos danos morais deve ser fixado em R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) computando-se correção monetária a partir deste julgado, juros de 6% ao ano até a entrada em vigor do atual Código Civil, a partir de quando devem ser de 12% ao ano, conforme art. 406 daquele diploma legal e art. 161, §1º do Código Tribunal Nacional, desde a citação.

Por fim, tendo em vista que ambos os litigantes foram em parte, vencedores e vencidos, fixo a reciprocidade sucumbencial de que trata o art. 21, caput, do CPC.

Por tais razões, dá-se parcial provimento ao recurso nos termos antecitados.

Rio de Janeiro, 17 de junho de 2009.

Desembargador FERDINALDO NASCIMENTO
Relator

Publicado em 19/06/2009




JURID - Ação indenizatória. Dano moral e estético. [23/06/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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