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sexta-feira, 5 de junho de 2009

JURID - Posto de gasolina deve indenizar. [05/06/09] - Jurisprudência


Posto de gasolina condenado a pagar indenização.


PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUÍZO DE DIREITO DA 5ª VARA CÍVEL DA COMARCA DE NATAL

Processo nº 001.02.023998-0
Ação: Ação Civil Pública
Autor: Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte
Réu: CDP - Comercial de Derivados de Petróleo Ltda

SENTENÇA


O Ministério Público Estadual ajuizou a presente ação civil pública, com lastro em procedimentos fiscalizatórios da Agência Nacional do Petróleo (ANP), ao ser apurado que a empresa ré, CDP - COMERCIAL DE DERIVADOS DE PETRÓLEO LTDA, ostenta marca comercial da distribuidora Petrobrás, mas comercializa combustível da Total Distribuidora Ltda, violando o art. 11, §§ 2º e 3º, da Portaria nº 116/00 e os arts. 6º, III, 30 e 31 do Código de Defesa do Consumidor.

Em vista disso, pleiteou pela condenação da demandada, na forma da legislação aplicável à espécie, cominando-lhe uma multa no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a ser revertida para o Fundo Estadual de Defesa do Consumidor, criado pela Lei Estadual nº 6.972, de 08.1.1997, bem como postulou que fosse determinado à empresa demandada que se abstivesse da prática das condutas descritas, determinando prazo razoável a fim de adequar-se aos ditames regulamentares exigidos para o comércio de combustíveis.

Além disso, requereu a inversão do ônus processual, com base no art. 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor e a publicação de edital, possibilitando a intervenção de possíveis interessados, invocando o disposto no art. 94 da Lei nº 8.078/90.

Requereu, por fim, a fixação de multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em caso de descumprimento das determinações, cujo valor deve ser revertido ao Fundo Estadual de Defesa do Consumidor, nos termos do artigo 9º da Lei Estadual nº 6.972/97.

Com a Inicial, vieram os documentos de fls. 18/38.

Citada, a empresa demandada, por intermédio de seus advogados, contestou o feito (fls. 43/54), argumentando em suma que não praticou qualquer conduta ilícita capaz de ensejar a aplicação de multa demasiadamente elevada, nem tão pouco a suspensão das atividades por ela perpetradas. Alegou que enviou, em setembro de 2000, à Agência Nacional do Petróleo recadastramento, informando a mudança de sua bandeira para chamada "bandeira branca", o que desobriga da comercialização exclusiva de um distribuidor. Afirmou que ao comercializar combustível da Total ou de outra distribuidora identifica, rigorosamente, a sua procedência ao consumidor através de etiquetas coladas nas bombas.

Ressaltou, ainda, que os valores determinados às multas civil e diária são totalmente desprovidos de razoabilidade.

Ao final, pleiteou pela improcedência dos pedidos.

A defesa veio instruída com os documentos de fls. 55/63.

Em petição à fl. 66, o Ministério Público requereu o julgamento antecipado da lide, por ser a questão unicamente de direito.

É o que cumpre relatar. Decido.

Considerando que a questão de mérito é de fato e de direito, e as partes não demonstraram produzir outras provas, conheço diretamente o pedido, julgando antecipadamente a lide, nos termos do art. 330, inciso I, do Código de Processo Civil.

Antes de analisar os pleitos formulados na exordial, tenho que o manejo da presente ação se submete a presença dos requisitos e condições básicas, quais sejam: a) a possibilidade jurídica do pedido; b) interesse processual; c) legitimidade ad causam.

No presente caso, entendo serem plenamente aplicáveis as regras do Código de Defesa do Consumidor, eis que os interessados, substituídos processualmente pelo Órgão Ministerial, apresentam-se como destinatários finais de um produto (art. 2º, da Lei nº 8.078/90), enquanto que a empresa ré corresponde a figura do fornecedor de que trata o art. 3º, do referido dispositivo legal.

Nesse raciocínio, já que se está diante de uma relação de consumo, não há como fugir à aplicação das sobreditas normas, mormente as que vedam práticas abusivas por parte do fornecedor de produtos ou serviços, em detrimento aos interesses difusos dos consumidores.

Aliás, ao conceituar interesses difusos, Ada Pellegrini Grinover, anuncia que são aqueles que "não encontram apoio em uma relação-base bem definida, reduzindo-se o vínculo entre as pessoas e fatores conjunturais ou extremamente genéricos, a dados de fato freqüentemente acidentais e mutáveis: habitar a mesma região, consumir o mesmo produto, viver sob determinadas condições sócio-econômicas, sujeitar-se a determinados empreendimentos, etc. Trata-se de interesses espalhados e informais à tutela de necessidades, também coletivas, sinteticamente referidas à qualidade de vida... Decorre daí que suas notas essenciais podem ser destacadas, nesses interesses difusos. Uma, relativa à sua titularidade, pois pertencem a uma série indeterminada de sujeitos... Outra, relativa ao seu objeto, que é sempre um bem coletivo, insuscetível de divisão, sendo que a satisfação de um interessado implica necessariamente a satisfação de todos, ao mesmo tempo em que a lesão de um indica a lesão de toda a coletividade. Neste sentido, foi precisamente apontada, por Barbosa Moreira, a indivisibilidade, lato sensu, desse bem" (A tutela dos interesses difusos, 1984, pp. 30-31)

Aqui, apresenta-se como substituída processualmente a coletividade de consumidores de combustíveis automotivos, e em favor desses tutelados, ante a sua vulnerabilidade e hipossuficiência, associando-se à verossimilhança da alegação invocada na peça atrial, deve-se inverter o ônus probatório no que pertine à comprovação dos fatos lesivos, a teor do que dispõe o art. 6º, inciso VIII, do C.D.C.:

Art. 6º - São direitos básicos do consumidor: (...)

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiência.

No caso sub judice, a empresa ré, desincumbindo-se do ônus a si imposto pelos arts. 6º, VIIII, do Código de Defesa do Consumidor, e principalmente pelo 333, inciso II, do Código de Processo Civil, deixou de produzir prova de que tinha "Bandeira Branca", autorizada pela Agência Nacional de Petróleo, não bastando a alegação de ter solicitado o recadastramento junto a ANP, a fim de estar desobrigada de comercializar os produtos da Petrobrás Distribuidora em caráter exclusivo. Além disso, deixou de comprovar a alegação de que identificava a procedência do combustível comercializado, nas bombas do estabelecimento, com a aposição de etiquetas adesivas, quando o produto fosse diverso da marca Petrobrás.

Em verdade, nesse aspecto, descurou-se a ré de observar a regra do art. 11, § 2º e 3º, da Portaria ANP nº 116/2000, assim redigida:

Art. 11. O revendedor varejista deverá informar ao consumidor, de forma clara e ostensiva, a origem do combustível automotivo comercializado. (...)

§ 2º - Caso o revendedor varejista opte por exibir a marca comercial do distribuidor de combustíveis líquidos derivados de petróleo, álcool combustível e outros combustíveis automotivos, deverá vender somente combustíveis fornecidos pelo distribuidor detentor da marca comercial exibida.

§ 3º - Caso o revendedor varejista opte por não exibir a marca comercial do distribuidor de combustíveis líquidos derivados de petróleo, álcool combustível e outros combustíveis automotivos, deverá identificar, de forma destacada e de fácil visualização, em cada bomba abastecedora, o distribuidor de combustíveis líquidos derivados do petróleo, álcool combustível e outros combustíveis automotivos fornecedor do respectivo.

Aludida regra, que exige a exibição da marca comercial do distribuidor de combustível se mostra consoante ao dever de informação do fornecedor, inserido nos arts. 6º, inciso III, e 31, do Código de Defesa do Consumidor.

Por pertinente, confira-se a doutrina da Professora Cláudia Lima Marques, quando enfatiza que "o comprador não possui conhecimentos específicos sobre o objeto que está adquirindo e, portanto, é mais facilmente enganado quanto às características do bem ou quanto à sua utilidade". (Contratos no Código de Defesa do Consumidor, 1995, p. 105)

Nesse contexto, torna-se primordial a exibição da marca comercial do distribuidor de combustível, a quem possa o consumidor apresentar eventual denúncia, eis que se relaciona essa cautela à fiscalização do controle da qualidade dos combustíveis.

Em razão da conduta ilícita da demandada, qual seja, ostentar marca comercial da distribuidora Petrobrás, mas comercializar combustível da Total Distribuidora Ltda., instalou-se procedimento administrativo pela Agência Reguladora competente, a partir da lavratura do auto de infração nº 032.038, datado de 25/01/01 (fls. 18/21), e nele foram respeitados os princípios do contraditório e da ampla defesa, eis que à empresa ré foi oportunizada à apresentação de defesa, o que se verifica da documentação de fls. 24/28.

Analisando o documento de fiscalização de fl. 20, constata-se que a demandada estava comprando gasolina e álcool hidratado da Total Distribuidora Ltda., conforme notas fiscais acostadas aos autos (fls. 22/23), infringindo o art. 11, § 2º da Portaria nº 116/2000, da ANP.

Ainda, a fim de justificar a sua conduta, restringe-se a ré na contestação, que não cometera qualquer irregularidade, porquanto, após o advento da Portaria nº 116/2000, enviou, em setembro de 2000, à Agência Nacional de Petróleo recadastramento, informando a mudança de sua bandeira para a chamada "bandeira branca", o que a desobriga da comercialização exclusiva de um distribuidor, no caso, a Petrobrás.

O ato administrativo goza de presunção de veracidade, quanto aos fatos, e presunção de legitimidade quanto ao direito. A partir de tal premissa, exsurge que, provada a regularidade formal do procedimento administrativo que constatou que o referido usava uma bandeira BR e comercializava produto de outras bandeiras (fls. 18/38), inclusive com exercício do contraditório e ampla defesa no respectivo procedimento, a elisão da conduta infracional imputada ao requerido dependeria de prova a ser produzida pelo mesmo - o que não ocorreu!

Ora, não há como se admitir referida tese defensória, na medida que não houve por parte da ANP a autorização de modificação da bandeira da demanda, condição esta imprescindível para que se proceda a tal mudança.

Dessa forma, não há como se eximir a ré da penalidade civil, pela exibição da marca comercial do distribuidor de combustível Petrobrás diverso do comercializado, qual seja, Total Distribuidora Ltda., surgindo a sua responsabilidade do art. 11, §§ 2º e 3º da Portaria ANP nº 309, de 27.12.2001.

Além disso, evidenciada a inobservância às regras do art. 4º do CDC e do art. 1º, inciso III, da Lei nº 9.478, de 06.8.1997, que prevêem:

Art. 4º, do CDC - A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (...)

VI - coibição e repressão eficientes de todos os abusos praticados no mercado de consumo, inclusive a concorrência desleal e utilização indevida de inventos e criações industriais das marcas e nomes comerciais e signos distintivos, que possam causar prejuízos aos consumidores; (...) (grifos acrescidos)

Art. 1º, inciso III, da Lei nº 9.478/97 - as políticas nacionais para o aproveitamento racional das fontes de energia visarão aos seguintes objetivos: (...)

III -. proteger os interesses do consumidor quanto a preço, qualidade e oferta dos produtos.

Com efeito, referidas regras visam evitar prejuízos materiais aos destinatários finais dos combustíveis: os consumidores, que compra um produto pensando ser de uma distribuidora, quando na verdade é proveniente de outra.

Assim, louvável a atitude do Ministério Público Estadual em buscar a tutela do Estado-juiz, defendendo os interesses difusos dos consumidores, inclusive no que toca à pretensão indenizatória-compensatória pela ofensa a esses direitos.

Destarte, o pedido de indenização, tal como o de obrigação de fazer, também encontra amparo no art. 3º da Lei nº 7.347, de 24.7.1985, e nos arts. 12 e 18 do Código de Defesa do Consumidor.

No entanto, pelo que dos autos conta, não é possível constatar a efetiva lesão a direitos individuais dos consumidores, embora seja inegável, por incontroverso, o dano ao direito coletivo dos consumidores à informação clara e adequada sobre os diferentes produtos e serviços, garantido pelo art. 6º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor.

Ademais, não se fala em má qualidade do combustível comercializado pela demandada ou em defeitos nas bombas de combustíveis, que pudessem causar lesões graves e concretas aos consumidores dos produtos comercializados no estabelecimento comercial da demandada.

Em que pese a responsabilidade ser objetiva no caso em apreço, não há indício de que a demandada, ao omitir informações sobre a verdadeira marca do combustível comercializado, agiu de má-fé e com o intuito de aumentar a sua margem de lucro em detrimento de prejuízos efetivos causados aos consumidores no plano individual.

Desse modo, na quantificação do valor da compensação pecuniária, adoto a teoria do valor do desestímulo, levando-se em conta a extensão do dano, a necessidade de satisfação à coletividade, e, em contrapartida, inibir que o ofensor pratique novas condutas lesivas. Assim, entendo que o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) pleiteado pelo Ministério Público é demasiadamente alto, razão pela qual merece redução da compensação pecuniária ao valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) que atende aos padrões de razoabilidade e proporcionalidade que o caso requer, por entender ser adequada ao caso concreto, que será revertida para o fundo de que trata o art. 13 da Lei nº 7.347, de 24.7.1985, instituído, no âmbito Estadual, pela Lei nº 6.972/1997.

Por oportuno, confira-se o seguinte precedente do Tribunal de Justiça deste Estado do Rio Grande do Norte:

EMENTA: CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. VENDA DE COMBUSTÍVEL DE MARCA DIVERSA DA OSTENTADA PELO ESTABELECIMENTO. COMPENSAÇÃO PECUNIÁRIA POR DANOS A INTERESSES COLETIVOS DOS CONSUMIDORES. AUSÊNCIA DE RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. REDUÇÃO DO QUANTUM. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO APELO. REFORMA DA SENTENÇA.

(TJRN - Apelação Cível nº 2006.001450-2, Rel. Juíza Convocada Francimar Dias, d.j.19/06/08)

Ante o exposto, atenta ao que dispõe o art. 95, da Lei nº 8.078/90 (C.D.C.) e o art. 3º da Lei nº 7.347/1985, e com base no art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE a pretensão formulada na exordial, para:

A) compelir a demandada - CDP - COMERCIAL DE DERIVADOS DE PETRÓLEO LTDA., a se abster de exibir marca comercial diversa da comercializada, a ser cumprida em 5 (cinco) dias da intimação da sentença, como preconiza o art. 11, §§ 2º e 3º, da Portaria ANP nº 116/2000, sob pena de multa diária arbitrada em R$ 2.000,00 (dois mil reais) (art. 461, § 4º, CPC), em caso de descumprimento da medida, a ser revertida para o Fundo Estadual de Defesa do Consumidor, criado pela Lei Estadual nº 6.972/1997.

B) condenar a ré - CDP - COMERCIAL DE DERIVADOS DE PETRÓLEO LTDA. a pagar indenização pelos danos ocasionados aos interesses difusos dos consumidores, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), a ser revertida para o Fundo Estadual de Defesa do Consumidor criado pela Lei Estadual nº 6.972, de 08.1.1997, ao qual se acrescem juros de mora, contados desde a data do primeiro evento lesivo, representado na autuação pela ANP nº 032.038, datada de 25/01/01, no percentual de 1% (um por cento) ao mês contados da citação e correção monetária pela tabela da Justiça Federal, a partir do ajuizamento da ação.

Por analogia ao art. 94, do C.D.C., expeça-se edital para ampla publicidade do inteiro teor da presente sentença, inclusive por meio da imprensa oficial.

Em homenagem ao princípio da sucumbência (art. 20, C.P.C.), arcará a parte ré com o pagamento do valor das custas processuais.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Natal/RN, 18 de maio de 2009.

Airton Pinheiro
Juiz de Direito



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