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terça-feira, 2 de junho de 2009

JURID - Habeas corpus. Adulteração de sinal identificador de veículo [02/06/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Adulteração de sinal identificador de veículo automotor e receptação. Prisão em flagrante.

Tribunal de Justiça de Mato Grosso - TJMT.

PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

HABEAS CORPUS Nº 28323/2009 - CLASSE CNJ - 307 - COMARCA CAPITAL

(CONTINUAÇÃO DE JULGAMENTO)

IMPETRANTES: DR. PAULO FABRINNY MEDEIROS E OUTRO(s)

PACIENTE: MÁRCIO ZANCHI DE OLIVEIRA

Número do Protocolo: 28323/2009

Data de Julgamento: 05-05-2009

EMENTA

HABEAS CORPUS - ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO AUTOMOTOR E RECEPTAÇÃO - PRISÃO EM FLAGRANTE - RELAXAMENTO - IMPOSSIBILIDADE - CRIME PERMANENTE - LIBERDADE PROVISÓRIA - INDEFERIMENTO - REITERAÇÃO CRIMINOSA - NECESSIDADE DA SEGREGAÇÃO - GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA - CONSTRANGIMENTO INEXISTENTE - ORDEM DENEGADA.

Os delitos permanentes colocam os infratores em situação de flagrância, já que a consumação se protrai no tempo.

Constatado ser o Paciente inclinado a prática de crimes contra o patrimônio e contra a fé pública, a manutenção da sua prisão cautelar é recomendada como corolário lógico para garantia da ordem pública.

RELATÓRIO

EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA

Egrégia Câmara:

Os advogados Paulo Fabrinny Medeiros e Julierme Romero, impetram ordem constitucional de habeas corpus, com pedido de liminar, em favor de MÁRCIO ZANCHI DE OLIVEIRA, preso em flagrante delito e mantido nessa condição, por decisão do Juízo da 8ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá-MT - autoridade apontada coatora -, tendo em vista a prática, em tese, dos delitos capitulados nos artigos 180, § 1º e 311, caput, ambos do Código Penal.

Sustentam, em síntese, que a prisão está eivada por não ter ocorrido quaisquer das hipóteses de flagrante, constantes no art. 302, do Código de Processo Penal, portanto, a homologação da custódia configura patente constrangimento à liberdade ambulatorial do Paciente.

Alegam que não há elementos que demonstram a origem ilícita das mercadorias apreendidas na empresa do Paciente, bem como evidências de que este sabia tratar-se de produto de crime, pressupostos necessários à caracterização do delito de receptação. Afirmam que os diferenciais apreendidos não possuíam qualquer identificação no momento da diligência policial, conforme declarado pelos policiais responsáveis pela operação, o que obstaria consequentemente, saber que eram provenientes de crime anterior, porém, após a confecção do Auto de Prisão em Flagrante, surgiu um Laudo Preliminar de Exame em Diferencial, atestando que um dos diferenciais possuía numeração de série, correspondente a um diferencial de um veículo furtado em maio de 2008, notadamente, "produzido" para "legitimar" a prisão em flagrante. Desse modo, aduz que, a materialidade do crime não está plenamente comprovada e os indícios de autoria são absolutamente frágeis.

Por outro lado, argumentam que a decisão que indeferiu o pedido de relaxamento da prisão e/ou liberdade provisória carece de fundamentação, precipuamente porque "(...) calcou-se numa premissa equivocada, qual seja, numa condenação que nunca existiu (...)" (fls. 14), uma vez que no processo nº 78/2004, da 8ª Vara Criminal, citado na decisão, o Paciente foi absolvido. Mencionam, também, que o magistrado a quo esteou-se em "pseudo maus antecedentes" para indeferir as benesses da liberdade clausulada.

Ressaltam que o Paciente possui ocupação lícita e residência fixa. Pugnam, assim, pela concessão da ordem, em liminar, para que o Paciente aguarde o julgamento do writ em liberdade, assumindo, desde já, o compromisso de comparecer a todos os atos do processo; no mérito, requer o relaxamento do flagrante, anulando-o, ou, alternativamente, a concessão da liberdade provisória, para que o Paciente responda em liberdade do desfecho da ação penal (fls. 02-18).

Juntou documentos (fls. 20-136).

O pedido de liminar foi indeferido decisão de fls.139/140. A MMA. Juíza de Direito nominada coatora, instado a prestar informações, relatou o processo e noticiou que os autos estão aguardando o oferecimento da denuncia pelo representante do Ministério Público (fls147/148).

A Procuradoria-Geral de Justiça, por ser seu representante, Dr. Benedito X. S. Corbelino manifestou-se pela denegação da ordem, por entender a prisão em flagrante foi correta e que a decisão está fundamentada na ordem pública.

É o relatório.

PARECER (ORAL)

O SR. DR. JOSÉ DE MEDEIROS

Ratifico o parecer escrito.

VOTO

EXMO. SR. DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (RELATOR)

Egrégia Câmara:

Busca o Impetrante o restabelecimento da liberdade ambulatorial de MÁRCIO ZANCHI DE OLIVEIRA, alegando, em síntese, nulidade do auto de prisão em flagrante, bem como ausência dos requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal.

Ressalta-se, ab initio, que parte da matéria ventilada confunde-se com questões essencialmente ligadas ao mérito da ação penal em curso, cuja apreciação impõe minuciosa análise do conjunto probatório, procedimento incompatível com a via estreita do habeas corpus.

No que tange a concessão da ordem relaxando-se a prisão em flagrante, melhor sorte não assiste ao Impetrante, e digo por que.

Os delitos que ensejaram a prisão do Paciente foram os de receptação, crime de natureza permanente quando em suas modalidades de "ocultar", "ter em depósito" ou "expor a venda" e adulteração de sinal identificador de veiculo automotor, cuja consumação se prolonga no tempo, e mantendo o estado de flagracia do agente enquanto perdurar essa situação, a prisão é legal, máxime, quando a autoridade policial desencadearia operação especifica a contenção desta espécie de crime com crescimento em espiral, com desajuste da ordem pública.

Em situação análoga já se decidiu:

"O ato de ocultar coisa proveniente de crime configura, em tese, receptação dolosa, infração de natureza permanente e, enquanto não cessar a permanência, entende-se o agente em flagrante delito" (RT 620/345).

Assim, não há que se falar que não está caracterizada qualquer das hipóteses do artigo 302 do Código de Processo Penal, sendo o flagrante perfeitamente válido.

No tocante a concessão da liberdade provisória não visualizei razões fáticas e fundamentos jurídicos para alterar o sentimento do MM. Juiz a quo, isto é, por trazer a decisão indeferitória destacados os requisitos para prisão preventiva que pode ser para garantia da ordem pública, da ordem econômica, conveniência da instrução criminal ou aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria.

A decisão que indeferiu a liberdade provisória do Beneficiário 108/111 encontra-se justificada na notícia de possuir Márcio Zanchi de Oliveira antecedentes criminais, haja vista estar respondendo a diversas ações penais, conforme rol fornecido pelo Cartório Distribuidor da Comarca da Capital às fls. 60/61 e pelas informações de fls146/148. Tal fato, somado à comprovação da materialidade e à presença de indícios suficientes de autoria, mostra-se suficiente para manutenção da prisão provisória, como garantia da ordem pública, posto que demonstrada concretamente a necessidade da custódia cautelar em razão de apresentar personalidade voltada para o crime, evidenciado, pois, que caso mantido em liberdade, encontrará estímulo de permanência na prática delitiva.

Aplicável à espécie o ensinamento de Julio Fabbrini Mirabete, in verbis:

"Refere-se a lei, em primeiro lugar, às providências de segurança necessárias para evitar que o delinqüente pratique novos crimes contra a vítima e seus familiares ou qualquer outra pessoa, quer porque é acentuadamente propenso às práticas delituosas, quer porque em liberdade, encontrará os mesmos estímulos relacionados com a infração cometida." (Processo Penal, São Paulo: Atlas, 1.997, p. 382).

Nesse mesmo sentido leciona Guilherme de Souza Nucci:

"Reiteração na prática criminosa: É motivo suficiente para constituir gravame à ordem pública, justificador da prisão preventiva" (Código de Processo Penal Comentado, RT, 3ª edição, 2004, p.567).

Colhe-se da doutrina de Fernando Capez:

"A prisão cautelar é decretada com a finalidade de impedir que o agente, solto, continue a delinqüir, ou de acautelar o meio social, garantindo a credibilidade da Justiça". (Curso de Processo Penal, Saraiva, 10ª edição, 2003, p.230).

A jurisprudência é firme no sentido de que a reiteração da prática criminosa constitui gravame à ordem pública que justifica a prisão preventiva:

"CRIMINAL. HC. HOMICÍDIO. PRISÃO EM FLAGRANTE. PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA INDEFERIDO. PRISÃO PREVENTIVA. REITERAÇÃO DE PRÁTICAS ILÍCITAS. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. MOTIVAÇÃO IDÔNEA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. (...) ORDEM DENEGADA. I. Não se vislumbra ilegalidade na custódia cautelar do réu, tendo em vista que procedida em conformidade com as exigências legais, atendendo aos termos do art. 312 do Código de Processo Penal e da jurisprudência dominante. II. A reiteração de condutas ilícitas, o que denota ser a personalidade do réu voltada para a prática delitiva, obsta a revogação da medida constritiva. Precedentes (...). (HC 59.646/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, julgado em 19.09.2006, DJ 16.10.2006 p. 407).

"HABEAS CORPUS. PRISÃO EM FLAGRANTE. ARTS. 180, §1º, E 311, AMBOS DO CP. REITERAÇÃO. QUADRILHA. PERICULOSIDADE. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. DENEGAÇÃO DA ORDEM.

Custódia fundada na garantia da ordem pública, em razão da periculosidade ostentada pelo paciente, aferida da reiteração na prática de crimes contra o patrimônio e contra a fé pública, integrando quadrilha organizada.

A primariedade, os bons antecedentes, a ocupação lícita e a residência fixa no distrito da culpa não são garantidores de eventual direito à liberdade provisória, se a manutenção da custódia é recomendada por outros elementos dos autos.

Ordem denegada." (TJ/DF, Primeira Turma Criminal, HC nº 2006 00 2 014735-2, Relator Desembargador Mario Machado, julgado em 11.01.2007).

"Justifica-se a decretação da prisão preventiva do denunciado quando, recebida a inicial, persevera nas práticas delituosas porque está sendo processado, a fim de evitar que ocorram novas vítimas ou se agravem os danos das anteriores" (STF, in RT 549/399).

"A prisão preventiva é justificada quando há reiteração da prática criminosa e a manifesta possibilidade de perseverança no comportamento delituoso demonstram que a ordem pública está em perigo" (TJ/SP, Quarta Câmara Criminal, HC n. 348.114-3, Relator Hélio de Freitas, julgado em 29.05.2001).

Dessarte, evidenciada a periculosidade ostentada pelo Paciente, aferida pela reiteração criminosa, mormente em crimes contra o patrimônio, imperiosa a manutenção da prisão provisória como corolário lógico da garantia da ordem pública.

Pelo exposto, em consonância com o parecer ministerial, DENEGO A ORDEM de habeas corpus.

É como voto.

VOTO

EXMA. SRA. DRA. GRACIEMA R. DE CARAVELLAS (1ª VOGAL)

Egrégia Câmara:

Acompanho o voto do douto relator, denegando a ordem.

VOTO

EXMO. SR. DES. RUI RAMOS RIBEIRO (2º VOGAL)

Egrégia Câmara:

Peço vista dos autos para melhor exame da matéria.

EM 28 DE ABRIL DE 2009:

FOI ADIADA A CONCLUSÃO DO JULGAMENTO, DIANTE DO PEDIDO DE VISTA DO 2º VOGAL. O RELATOR DENEGOU A ORDEM, NO QUE FOI ACOMPANHADO PELA DOUTA 1º VOGAL. O PARECER É PELA DENEGAÇÃO.

VOTO

EXMO. SR. DES. RUI RAMOS RIBEIRO (2º VOGAL)

Egrégia Câmara:

É consabido que, em nosso ordenamento jurídico, a liberdade é a regra, a prisão a exceção, tanto que em seu art. 5º, LXI, a Constituição Federal proclama que "(...) ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei.

Sobre o assunto, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, já decidiu:

"HABEAS CORPUS. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. PRISÃO EM FLAGRANTE. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. ILEGALIDADE. ART. 93, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PLEITO DE RELAXAMENTO DA PRISÃO EM FLAGRANTE. ILEGALIDADE NÃO DEMONSTRADA. 1. Conquanto se admita a decretação da prisão provisória como efeito jurídico da sentença condenatória, tal providência condiciona-se, para ser considerada válida, ainda nos casos de mera manutenção da custódia cautelar, à devida fundamentação que justifique a necessidade da cautela. Inteligência do art. 93, inciso IX, da Constituição Federal. 2. In casu, em se verificando que a custódia cautelar decretada não se baseia em nenhum fato concreto, uma vez que fundamentada apenas na gravidade abstrata do delito, é de ser reputada inaceitável, mormente diante das condições pessoais favoráveis do acusado: primário, de bons antecedentes. 3. O simples fato de cuidar-se de crime insuscetível de liberdade provisória não constitui razão bastante para fundamentar o decreto prisional. Precedentes. 4. Uma vez evidenciada a regularidade da prisão em flagrante, que seguiu as formalidades legais, não há razão para o pretendido relaxamento da custódia. 5. Ordem parcialmente concedida para revogar a prisão cautelar, deferindo ao Paciente o direito de aguardar em liberdade o julgamento da apelação, com a conseqüente expedição do alvará de soltura, se por outro motivo não estiver preso, sem prejuízo de eventual decretação de custódia cautelar, devidamente fundamentada." (Processo HC 63367/PE; Habeas Corpus 2006/0161233-0; Rel. Min. Laurita Vaz; Quinta Turma; Julgamento 24-10-2006; DJ 20-11-2006; p. 354).

"HABEAS CORPUS. ESTELIONATO. PRISÃO EM FLAGRANTE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. LIBERDADE PROVISÓRIA. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. CONCESSÃO. A FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO PARA ENSEJAR A MANUTENÇÃO DA PRISÃO, IMPÕE A LIBERDADE DA PACIENTE, CONSOANTE MERAS CONJECTURAS LEVADAS A EFEITO PARA O INDEFERIMENTO DE SUA LIBERDADE PROVISÓRIA. (...). CONCEDEU-SE A ORDEM. UNÂNIME." (TJDFT, Habeas Corpus 20050020054620HBC DF; Julgamento: 18-8-2005; 2ª Turma Criminal; Rel. Vaz de Mello; Publicação no DJU: 09-11-2005; Pág.: 42).

Constata-se que a decisão que indeferiu o pedido de revogação de prisão preventiva carece de fundamentação adequada, afigurando-se mesmo desnecessária a medida. A decisão está vazada nos seguintes termos:

"Observo que o delito pelo qual foi efetivada a prisão do indiciado pode estar intimamente relacionado a outros crimes, tais como roubos e furtos de veículos, assim, para uma melhor elucidação dos fatos elencados na peça flagrancial é de suma importância a manutenção da prisão.

Outrossim, em havendo indícios da participação do investigado em outros delitos, visando a busca da verdade real e, salvaguardar a sociedade da prática destes ilícitos, garantindo assim a conveniência da instrução processual e a ordem pública, não há que se falar em concessão de liberdade provisória.

Em que pese a defesa alegue ausência de materialidade quanto ao crime de receptação, afirmando que não foram apreendidos objetos de ilícitos, às fls. 22/23, verifico que foi efetuada a apreensão de um diferencial pertencente a uma L200 subtraída em 10/05/2008. Ademais, existem indícios de autoria, eis que tais peças foram localizadas na empresa pertencente ao investigado.

Há que se destacar ainda que em consulta ao sistema Apolo verifico que o réu foi condenado nos autos nº 78/2004 junto a 8ª Vara Criminal desta Comarca pela prática do crime de receptação e ainda responde aos autos nº 29/2006 e nº 93/2005 naquela Vara, também pela prática de receptação. Responde também ao processo nº 120/2004 na 10ª Vara Criminal, que foi suspenso nos termos do artigo 366 do CPP, aos autos nº 92/2006 junto a 6ª Vara Criminal e aos autos nº 71/2007 na 4ª Vara Criminal desta Comarca, o que demonstra ter personalidade voltada à prática delitiva, sendo necessária sua segregação para garantia da ordem pública, visando salvaguardar a sociedade destas espécies de ilícitos.

Outrossim, em sendo a situação fática daquelas em que a prisão há de ser decretada para garantir a ordem pública ou por conveniência da instrução criminal ou, ainda, para assegurar a aplicação da lei penal, havendo prova da existência do crime e indícios suficientes de autoria, e não sendo a infração praticada daquelas em que o réu se livra solto, não terá o acusado direito à liberdade provisória, eis que o fato de possuir endereço fixo, profissão definida e família constituída, por si só, não são suficientes para a concessão do benefício quando presentes os requisitos da prisão preventiva." (fls. 108 a 111 TJ/MT).

Observa-se da decisão que indeferiu o pedido de relaxamento da prisão em flagrante ou liberdade provisória fundamentou-se na reiteração da prática delituosa, contudo da certidão de antecedentes criminais de fls. 60 e 61 TJ/MT constam vários inquéritos e denúncias contra o beneficiário por delito contra o patrimônio, porém nenhuma com o trânsito em julgado, inclusive abstrai-se que foi absolvido quanto a uma das ações penais condenatórias (fls. 60 TJ/MT).

Da atenta análise da decisão vergastada e dos documentos lastreados para os autos, afigura-me pertinente a alegação de que a decisão que mantém a prisão em flagrante não está devidamente motivada, pois se encontra baseada apenas nos maus antecedentes do paciente e da suposta condenação nos autos nº. 78/2004 junta aquela Vara Criminal.

Observa-se da documentação acostada (fls. 113 a 136 TJ/MT) extrato de acompanhamento processual dos autos 78/2004, da 8ª Vara Criminal da Comarca de Cuiabá/MT, que o beneficiário foi absolvido com base no artigo 386, inciso IV da Lei Processual Penal, não subsistindo o argumento da condenação anterior.

Infere-se ainda, dos autos que o fundamento da garantia da ordem pública invocado para o indeferimento da liberdade provisória é destituído de motivos concretos. Há apenas conjecturas para preservar a ordem pública, notadamente pelo fato de existirem outros processos em curso contra ele. Porém, não vislumbro tais razões suficientes ao sustento da cautela, razão pela qual constato a existência de gravame a ser reparado pela via mandamental.

A propósito, a existência de ações em curso, por si só, não constitui fundamentação idônea para respaldar a segregação cautelar, consoante jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

"CRIMINAL. HC. PORTE ILEGAL DE ARMA. PRISÃO EM FLAGRANTE. CONDENAÇÃO. NEGATIVA DE APELAR EM LIBERDADE. RÉU PRESO DURANTE TODA A INSTRUÇÃO. ILEGALIDADE DA CUSTÓDIA CAUTELAR. EXISTÊNCIA DE MAUS ANTECEDENTES. MOTIVAÇÃO INIDÔNEA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO. ORDEM CONCEDIDA.

Não prevalece o posicionamento desta Corte, no sentido da manutenção do acusado na prisão, após e sentença condenatória, se foi mantido preso durante toda a instrução processual com base no flagrante, sem qualquer fundamentação.

A existência de maus antecedentes, por si só, não constitui fundamentação idônea para respaldar a segregação. A Terceira Seção desta Corte pacificou o entendimento no sentido de que a suposta configuração de maus antecedentes, e até mesmo de reincidência, por si só, não basta para respaldar a decretação de prisão cautelar quando da prolação de sentença condenatória, já que é indispensável a presença de concreta fundamentação para o óbice ao direito de apelar em liberdade, com base nos pressupostos exigidos para a prisão preventiva.

Não havendo, no édito condenatório, qualquer elemento a justificar a prisão processual do paciente, torna-se ilegal a sua permanência no cárcere, enquanto aguarda o julgamento do recurso de apelação.

Deve ser cassado o acórdão impugnado, determinando-se a expedição de alvará de soltura em seu favor, para que aguarde em liberdade o julgamento do recurso de apelação, se por outro motivo não estiver preso. Ordem concedida, nos termos do voto do Relator." (STJ, HC 62.902/PR, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 10-10-2006, DJU 30-10-2006, p. 368).

É preciso ponderar, ainda, que o exame acerca da existência dos requisitos previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal exige motivação substancial.

Assim, não estando a decisão fulcrada em fundamentos sólidos do ponto de vista de comprometimento social (por violação da garantia da ordem pública) ou para assegurar eventual decisão a ser proferida no processo penal (aplicação da lei penal) e, ainda, para garantir o desenvolvimento regular do feito (conveniência da instrução criminal), não se justifica a restrição à liberdade do paciente, medida de caráter excepcionalíssimo, que não pode servir como uma antecipação de eventual pena que venha a ser imposta por sentença condenatória.

Com efeito, sem esses pressupostos, a custódia cautelar se constitui em intolerável antecipação de sua culpabilidade, atentando frontalmente contra o que dispõe o inciso LVII do artigo 5º da Constituição da República.

A propósito:

"A fundamentação das decisões do Poder Judiciário, tal como resulta da letra do inciso IX do artigo 93 da Constituição da República, é condição absoluta de sua validade e, portanto, pressuposto da sua eficácia, substanciandose na definição suficiente dos fatos e do direito que a sustentam, de modo a certificar a realização da hipótese de incidência da norma e os efeitos dela resultantes.

Tal fundamentação, para mais, deve ser deduzida em relação necessária com as questões de direito e de fato postas na pretensão e na sua resistência, dentro dos limites do pedido, não se confundindo, de modo algum, com a simples reprodução de expressões ou termos legais, postos em relação, não raramente, com fatos e juízos abstratos, inidôneos à incidência da norma invocada." (RT 819/537).

Na abalizada lição de JULIO FABBRINI MIRABETE:

"O despacho deve conter, aliás, uma exposição fundada em dados concretos, não sendo bastante para legitimar a custódia a genérica referência aos autos, vagas alusões ao acusado ou suposições negativas quanto ao seu caráter pessoal, ou, ainda, se reduzir a mera transcrição dos dizeres legais. É indispensável que se fundamente em dados concretos que lhe proporcionem fomento, e não em meras suposições. Dependem de fundamentação adequada, inclusive, o despacho de prisão preventiva concomitante ao relaxamento da prisão em flagrante, ou de substituição da prisão temporária." (CF. Processo Penal, 16ª edição, Ed. Atlas, 2004, pág. 423).

Dessa forma, sem embargo da responsabilização do paciente pelo delito que lhe é imputado, a prisão cautelar é medida extrema e excepcional, que implica sacrifício à liberdade individual, devendo, portanto, ser concretamente fundamentada com indicação do fato ou circunstância que justifiquem a cautela.

Neste vértice, imperioso destacar o seguinte julgado:

"A liberdade é a regra no Estado Democrático de Direito; a restrição à liberdade é a exceção, que deve ser excepcionalíssima, aliás. Ninguém é culpado de nada enquanto não transitar em julgado sentença penal condenatória; ou seja, ainda que condenado por sentença judicial, o acusado continuará presumidamente inocente até que se encerrem todas as possibilidades para o exercício do seu direito à ampla defesa. Assim, sem o trânsito em julgado, qualquer restrição à liberdade terá finalidade meramente cautelar. A lei define as hipóteses para essa exceção e a Constituição Federal nega validade ao que o juiz decidir sem fundamentação. O pressuposto de toda decisão é a motivação; logo, não pode haver fundamentação sem motivação. Ambas só poderão servir gerando na decisão a eficácia pretendida pelo Juiz se amalgamadas com suficientes razões." (RT 725/521-2).

Logo, em pese o zelo e acuidade da indigitada autoridade tida como coatora, inexiste fundamentação concreta a embasar a custódia do paciente, pois esta foi indeferida exclusivamente pelo fato do paciente responder a outras ações penais.

Ademais, a presunção aplicável ao caso do paciente não é a de risco à ordem pública, mas a de inocência, e de que se portará adequadamente durante a tramitação do processo.

Com a devida vênia ao Relator, concedo a Ordem liberatória a de Márcio Zanchi de Oliveira.

É como voto.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em epígrafe, a PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, sob a Presidência do DES. RUI RAMOS RIBEIRO, por meio da Câmara Julgadora, composta pelo DES. JUVENAL PEREIRA DA SILVA (relator), DRA. GRACIEMA R. DE CARAVELLAS (1ª vogal) e DES. RUI RAMOS RIBEIRO (2º vogal) proferiu a seguinte decisão: POR MAIORIA DE VOTOS, DENEGARAM A ORDEM LIBERATÓRIA, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR, VENCIDO O 2º VOGAL QUE A CONCEDEU. O PARECER É PELA DENEGAÇÃO.

Cuiabá, 05 de maio de 2009.

DESEMBARGADOR RUI RAMOS RIBEIRO - PRESIDENTE DA PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL

DESEMBARGADOR JUVENAL PEREIRA DA SILVA - RELATOR

PROCURADOR DE JUSTIÇA

Publicado em 21/05/09




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