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sexta-feira, 5 de junho de 2009

JURID - FGTS. Correção monetária. "Inflação real". [05/06/09] - Jurisprudência


FGTS. Correção monetária. Índices e periodicidade do creditamento. "Inflação real".


AÇÃO ORDINÁRIA

PROCESSO Nº 2008.84.00.013224-0

AUTOR(A)(ES): MARIA DO CARMO DE MELO, JOSÉ ANTONIO FIGUEIREDO, ELMANO MORAIS BARBOSA, TEREZINHA MARIA PINTO VARELLA E JURACI DE FIGUEIREDO

ADVOGADO(A)(S): DR(A)(S). MARIA DOLORES MONTE NUNES ARAÚJO e Dra. MARIA SUZETE MONTE NUNES DE OLIVEIRA

RÉ: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA

SENTENÇA

EMENTA: DIREITO CIVIL. FGTS. CORREÇÃO MONETÁRIA. ÍNDICES E PERIODICIDADE DO CREDITAMENTO. "INFLAÇÃO REAL". NATUREZA INSTITUCIONAL DO FUNDO. OBSERVÂNCIA AOS CRITÉRIOS OFICIAIS PREVISTOS NA LEGISLAÇÃO. CORREÇÃO DOS SALDOS DAS CONTAS VINCULADAS. ÍNDICES DE 42,72% DE JANEIRO DE 1989 (PLANO VERÃO) E DE 44,80% DE ABRIL DE 1990 (PLANO COLLOR I). DIREITO ADQUIRIDO. RECONHECIMENTO JURÍDICO MANIFESTADO PELA LC 110/2001. POSICIONAMENTO CRISTALIZADO NO EXCELSO PRETÓRIO. TERMO DE ADESÃO. COMPROVAÇÃO DE REALIZAÇÃO DE TRANSAÇÃO COM A CAIXA POR ALGUNS AUTORES. PROCEDÊNCIA PARCIAL DO PEDIDO.

- Cabe à lei estabelecer as diretrizes a serem consideradas para fins de correção monetária do FGTS, uma vez que este ostenta natureza institucional, sendo insuscetíveis de substituição os índices oficiais previstos na legislação para fins de atualização monetária, não comportando também alteração a periodicidade do creditamento da correção, a pretexto de reparar-se perdas provocadas por uma "inflação real".

- Só é devido o creditamento mensal da remuneração incidente sobre os saldos das contas vinculadas ao FGTS a partir do advento da Lei nº 7.839, de 12/10/1989, sendo vedada a retroação dessa sistemática para abranger os anos de 1978 a 1989.

- O Colendo Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE nº 226.855-RS, já teve oportunidade de consignar que a atualização dos saldos das contas vinculadas deve ser repassa em consonância com à legislação infraconstitucional, explicitando, o Ministro Ilmar Galvão, ao proferir o seu voto, que diante da natureza institucional do FGTS, é inafastável a aplicação dos critérios oficiais de correção monetária previstos em lei, inexistindo norma jurídica que imponha o dever de preservação do valor real dos saldos das referidas contas, garantia que não contempla sequer os salários.

- No que concerne aos expurgos decorrentes de sucessivos planos econômicos, a jurisprudência dos pretórios firmou-se, de maneira torrencial, no sentido de que apenas merece prosperar a tese da incidência dos índices de 42,72%, relativo a janeiro de 1989 (Plano Verão), e de 44,80%, atinente ao mês de abril de 1990 (Plano Collor I), sobre as contas fundiárias.

- In casu, a CAIXA comprovou que alguns autores firmaram transação para o recebimento das verbas relativas aos percentuais de atualização monetária do Plano Verão e Collor, com exceção da autora TEREZINHA MARIA PINTO VARELLA.

- Procedência parcial do pedido autoral.

Vistos etc.

I. RELATÓRIO

1. Cuida-se de ação ordinária, promovida por MARIA DO CARMO DE MELO, JOSÉ ANTONIO FIGUEIREDO, ELMANO MORAIS BARBOSA, TEREZINHA MARIA PINTO VARELLA E JURACI DE FIGUEIREDO, já devidamente qualificado(a)(s) na exordial, através de advogado(a)(s) constituído(a)(s), contra a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL-CAIXA, reivindicando a condenação da ré na reposição das perdas sentidas sobre os depósitos realizados em sua(s) conta(s) de FGTS no período de 1978 a 1989, em que a correção monetária era repassada trimestralmente; pugnando, ainda, pelo pagamento das diferenças apuradas entre os índices aplicados e os índices inflacionários apurados no reportado período; além de reivindicar o pagamento das diferenças de atualização decorrentes de percentuais expurgados por ocasião de sucessivos planos econômicos, calculadas com base nos percentuais divulgados para o IPC nos meses de junho/87, (26,06%), janeiro/89 (70,28%), março/90 (84,32%) e abril/90 (44,80%), com a determinação da juntada dos extratos e o pagamento imediato dos valores a serem apurados em liquidação, acrescidos de juros de mora.

2. Sustenta(m) que, no período de 1978 a 1989, o FGTS era corrigido trimestralmente, e que esse procedimento de retardar a remuneração teria causado grande prejuízo em virtude da inflação observada na época, aduzindo, em seguida, que a adoção de índices inferiores aos índices inflacionários, medida a inflação pelo IGP-DI, também acarretou perda real na valia do saldo de sua(s) conta(s) fundiária(s), havendo ainda, em diversos meses, percentuais de correção expurgados a serem repostos em consonância com a Súmula 252 do STJ.

3. Anexa(m) à inicial procuração e documentos, pugnando pela concessão dos benefícios da justiça gratuita, que foram deferidos à fl. 63.

4. Regularmente citada, a CAIXA apresenta peça defensória às fls. 65/89, suscitando, preliminarmente, a ausência de documentos indispensáveis à propositura da ação, bem como que a parte autora celebrou termo de adesão previsto na Lei Complementar nº 110/2001, que tratou do pagamento administrativo da correção monetária plena, incidente sobre as contas vinculadas do FGTS, razão pela qual, entende a demandada, deve o feito ser extinto, com homologação da transação firmada extrajudicialmente.

5. Pondera, em seguida, que o FGTS não é um investimento susceptível à atuação privada, estando sujeito, em virtude de sua natureza pública, aos critérios de remuneração previstos em lei, sendo inviável a escolha de qualquer outro índice diferente daqueles contemplados na legislação, a pretexto de repor a "inflação real" do país.

6. Ressalta, ainda, que a correção trimestral (ou anual) não acarretaria perda alguma aos fundistas, eis que, embora a remuneração dos depósitos ocorresse em período trimestral, abrangia a inflação dos três meses anteriores, acrescida da taxa de juros remuneratórios aplicável à espécie, sendo observada a mesma sistemática nas correções anuais.

7. Nega a existência de direito adquirido a novos índices e tece considerações a respeito dos Planos Bresser, Verão e Collor, salientando, ao fim, ser descabida a sua condenação no pagamento de custas e honorários, em virtude das alterações implementadas na Lei nº 8.036/90, através da MP nº 2.164-41/2001.

8. É o relatório do caso concreto. Passo a decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

9. Versam os autos sobre pedido de pagamento de diferenças de correção monetária apuradas sobre valores depositados em conta(s) de FGTS da parte demandante.

a) preliminar de ausência de documentos indispensáveis

10. Com efeito, merece realce o fato de que, ao contrário do que afirma a ré, os extratos da(s) conta(s) fundiária(s) não consistem em documentos essenciais à aferição de eventuais diferenças de correção monetária apuradas a partir do afastamento da periodicidade (trimestral/anual) adotada em lei para atualização do FGTS, bem como da substituição dos índices legalmente previstos, que foram efetivamente repassados aos depósitos, por índices inflacionários outros que se entende devidos.

11. Sem dúvida, tem-se que o cerne da questão gravita em torno de aspectos jurídicos, de modo que apenas numa posterior fase de execução seria imprescindível a apresentação dos referidos documentos.

12. Aliás, é bastante razoável aceitar que a parte autora não tenha mais em seu poder os extratos da(s) conta(s) vinculadas de FGTS relacionados a todo o período mencionado na exordial, mormente por estar em discussão a correção monetária repassada desde os idos de 1970. Além disso, não se pode olvidar que é incumbência da empresa pública disponibilizar, acaso venham a ser requisitados no momento oportuno, os dados alusivos às movimentações realizadas nas contas vinculadas do FGTS.

13. O seguinte aresto corrobora o posicionamento ora adotado por este juízo no que concerne à preliminar em exame:

"Ementa FGTS. CONTAS VINCULADAS. LEGITIMIDADE PASSIVA DA CEF. SÚMULA N. 249/STJ. PRESCRIÇÃO TRINTENÁRIA. SÚMULA N. 210/STJ. DESNECESSIDADE DE JUNTADA DE EXTRATOS. CORREÇÃO MONETÁRIA. ÍNDICES APLICÁVEIS. ÍNDICE DE FEVEREIRO/89. PERCENTUAL 10,14% (IPC). INCIDÊNCIA. MATÉRIA APRECIADA PELO COLENDO STF. SÚMULA N. 252/STJ. JUROS DE MORA DE 0,5% AO MÊS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. RECURSOS PARCIALMENTE PROVIDOS.

1. Consoante enunciado da Súmula n. 249/STJ, nas demandas que versam sobre a atualização monetária dos saldos de contas vinculadas do FGTS, a legitimidade passiva ad causam é exclusiva da Caixa Econômica Federal, com a exclusão da União e dos bancos depositários.

2. "A ação de cobrança das Contribuições para o FGTS prescreve em (30) trinta anos" (Súmula n. 210/STJ).

3. Os extratos das contas vinculadas não são documentos indispensáveis à propositura da ação, podendo sua ausência ser suprida por outras provas.(...)

7. Recursos especiais parcialmente providos."

(STJ, RESP nº 824266-SP, 2ª Turma, unânime, Relator(a) JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, j. 05/12/2006, DJU 06/02/2007, pág. 291)

14. Sob esse pórtico, não é digna de guarida a alegação de ausência de documentos essenciais à propositura da ação.

15. No mais, em se tratando de caso que cuida apenas de matéria exclusivamente de direito, impõe-se o julgamento antecipado da lide, com arrimo no art. 330, inciso I, do Diploma Processual Civil, tornando-se, portanto, desnecessária a produção de provas capazes de desvencilhar o julgamento da presente contenda.

b) fato extintivo do direito autoral (transação prevista na LC 110/2001)

16. A prefacial de realização de transação nos moldes da LC 110/01, que pressupõe verificação a respeito da realização de saques das verbas disponibilizadas para fins de reconhecimento e ou negativa do direito à aplicação de índices tidos como expurgados da remuneração das contas fundiárias da parte autora, confunde-se com o mérito da contenda, razão pela qual não há de ser apreciada em momento antecedente ao exame do objeto da lide.

c) periodicidade e índices de atualização do FGTS

17. No que concerne à periodicidade e aos índices de correção monetária do FGTS, é importante iniciar ilustrando que, ao longo dos anos, uma sucessão de leis, decretos e resoluções trataram de especificar como se daria a remuneração dos saldos dessas contas.

18. De acordo com a previsão contida na Lei nº 5.107/66, que criou o FGTS, a atualização a ser repassada aos respectivos depósitos se daria pelos mesmos critérios adotados no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, pressupondo, por isso, a aplicação da UPC, que foi adotada até 1975, com creditamento trimestral em face da dicção originária do Decreto nº 59.820/66, passando a atualização a ser aplicada anualmente, no mês de janeiro de cada ano, por força do Decreto nº 71.636/72.

19. De 1976 a 1986, o assunto foi regulado pelo Decreto 76.750/75, que determinou o repasse da variação da ORTN, recomendando também o retorno da sistemática de correção trimestral.

20. Com a implantação do Plano Cruzado, os Decretos-leis nºs 2.283/86 e 2.284/86 fizeram alusão ao IPC como índice oficial de correção do FGTS, sendo a redação deste último modificada pelo Decreto-lei nº 2.311/86, que passou a prever, para esse fim, a adoção da LBC ou de outro índice fixado pelo Conselho Monetário Nacional, o qual, desincumbindo-se desse mister de eleger o indexador aplicável, editou a Resolução nº 1.265/87, recomendando o repasse da OTN a partir do mês de março/87, a ser apurada segundo a variação do IPC ou da LBC, preferindo-se o índice de maior resultado.

21. Com a Resolução BACEN nº 1.338, de 15/07/87, a sistemática de apuração do percentual da OTN sofreu mudança. A OTN, no mês de julho/87, foi apurada com base na variação da LBC, passando a corresponder, a partir de agosto/87, ao percentual divulgado para o IPC.

22. Ao mesmo tempo em que modificou os critérios utilizados para delimitação da OTN, a referida Resolução nº 1.338/87 recomendou que os saldos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), a partir do mês de agosto de 1987, fossem atualizados em atenção à variação do valor nominal da OTN (atrelada ao IPC), ou, se maior, ao rendimento da LBC que excedesse o percentual fixo de 0,5% (meio por cento).

23. Assim é que a remuneração do FGTS, nos termos da lei, correspondeu, em julho/87, ao índice da LBC, acontecendo, a partir de agosto/87, com fulcro na variação da OTN (atrelada ao IPC) ou LBC subtraída de 0,5%, se um percentual maior fosse resultante desta subtração.

24. Com a MP nº 38, de 03/02/89, convertida na Lei nº 7.738/89, foram trazidas a lume normas complementares para execução da Lei nº 7.730/1989, que cuidou do Plano Verão, ficando, desde então, a correção do FGTS, expressamente atrelada à correção da poupança.

25. A expressa correlação entre os índices do FGTS e da poupança foi mantida no texto da Lei nº 7.839, de 12/10/1989, que finalmente revogou a Lei que instituiu o Fundo de Garantia (Lei nº 5.107/66), decorrendo, ainda, de seus ditames, a alteração no período de creditamento da atualização dos depósitos realizados em contas fundiárias, que passou a ser mensal, tal qual a poupança.

26. A correção da poupança, por seu turno, consoante prevista na MP 32, de 15/01/89, convertida na Lei nº 7.730/89, passou a ser efetuada da seguinte maneira:

"Art. 17. Os saldos das Cadernetas de Poupança serão atualizados:

I- No mês de fevereiro de 1989, com base no rendimento acumulado da Letra Financeira do Tesouro Nacional-LFT-verificado no mês de janeiro de 1989, deduzido o percentual fixo 0,5% (meio por cento);

II - nos meses de março e abril de 1989, com base no rendimento acumulado da Letra Financeira do Tesouro - LFT, deduzido o percentual fixo de 0,5% (meio por cento), ou da variação do IPC, verificados no mês anterior, prevalecendo o maior;

III - a partir de maio de 1989, com base na variação do IPC verificada no mês anterior."

27. O IPC do mês anterior, adotado para fins de atualização do FGTS e da poupança, a partir de maio/89, persistiu até março/90, ocasião em que foi editada a MP nº 168/90, convertida na Lei nº 8.024/90, recomendando, para esse fim, nos meses de abril e maio/90, a adoção do BTNF, que foi substituído, em seguida, por meio da MP nº 189/90, convertida na Lei nº 8.088, de 31/10/90, pelo BTN, cuja aplicação foi observada no interstício de junho a janeiro/91, vindo este índice a dar lugar, por derradeiro, à TR, mantida até hoje desde que fixada na MP nº 204, de 31/01/91, convertida na Lei nº 8.177, de 01/03/91.

28. Feitas essas digressões a respeito dos índices legalmente previstos e sobre a periodicidade a ser considerada para fins de correção monetária do FGTS, cumpre chamar atenção ao fato de que, em virtude da natureza institucional do Fundo, é inafastável a aplicação dos referidos critérios previstos na legislação que regulamenta a matéria, sendo por isso defesa a substituição dos índices oficiais e da periodicidade estabelecida em lei para a correção monetária dos valores depositados em favor dos trabalhadores, para que seja adotada qualquer outra sistemática que lhes aparente mais vantajosa.

29. Não há razão, portanto, para aplicação de correção monetária mensal no período de 1978 a 1989, tampouco há espaço para adoção do IGP-DI, utilizado pela parte demandante para confecção da planilha que compõe a causa de pedir exposta na exordial, índice este que jamais foi mencionado na legislação para fins de remuneração do FGTS.

30. A legislação não pode ser preterida a pretexto de sanar perdas provocadas pelos critérios de atualização nela fixados, seja no que diz respeito aos índices, seja quanto à periodicidade do seu creditamento.

31. O FGTS não pode ser equiparado a aplicações financeiras, nem sequer ostenta natureza contratual, como a poupança, implicando, exatamente, a sua natureza estatutária, a necessidade de ser gerido em obediência irrestrita à lei.

32. Nesse compasso, o FGTS e a poupança não podem deixar de ser diferenciados naqueles aspectos que a lei menciona, a exemplo do que ocorre quanto à periodicidade da remuneração que foi diferente para cada um deles por vários anos.

33. Em brilhante estudo, que tem servido de paradigma para inúmeros julgados no âmbito das Cortes Superiores, o Ministro Teori Albino Zavascki teve oportunidade de explicitar que:

"(...)Qualquer que seja, no entanto, a perspectiva a partir da qual se examine o FGTS, uma característica importante nele se identifica desde logo: a sua natureza institucional. Na verdade, o FGTS é uma instituição, da qual decorre um plexo de relações jurídicas com diferentes figurantes: há a relação jurídica que se estabelece entre o empregador e o Fundo, cuja prestação é uma contribuição mensal sobre os ganhos dos empregados; e há a relação jurídica que se estabelece entre o titular da conta vinculada (o empregado) e o Fundo, da qual nasce o dever de creditar rendimentos periódicos e, eventualmente, de entregar ao titular da conta o saldo disponível. Tais relações jurídicas nascem e se moldam em estrita observância de normas legais, gerais e abstratas, idênticas para todos os empregados e para todas as empresas. Até mesmo a opção pelo "regime instituído na presente lei" (observe-se que a lei fala em "regime"!), originalmente prevista no art. 1º da Lei nº 5.107, de 1966, até mesmo essa opção, único resquício de autonomia de vontade do empregado (e que se limitava a aderir ou não ao regime), já não mais existe. Hoje, a adesão ao regime do FGTS é imposta por lei a empresas e a trabalhadores, e é a lei que disciplina, de forma exaustiva, todo o conteúdo e todas as conseqüências de tal vinculação. Em suma, nada tem de contratual o regime do FGTS. Sua natureza é tipicamente institucional, estatutária, objetiva."

34. Nesse diapasão, infere-se que não há margem para tergiversações sobre os critérios de correção previstos em lei, restando, por isso, esvaziada a questão jurídica de fundo argüida pela parte demandante, que só demonstra, na verdade, o seu inconformismo com os critérios determinados na legislação de regência para recomposição dos depósitos do FGTS, supostamente inservíveis para reposição da corrosão dos depósitos fundiários acarretada pela "real inflação".

35. É de bom alvitre destacar que a inflação consiste na perda ou na corrosão do valor de mercado ou do poder de compra do dinheiro e seu fenômeno, que tanto abalou a economia brasileira durante tantos anos, e sempre foi aferida, dada a complexidade ínsita à variação de preços, por vários indexadores econômicos. É possível, na atualidade, apontar, dentre outros índices que aferem as oscilações no poder aquisitivo da moeda, o IGP (calculado pela Fundação Getúlio Vargas), o IPC (medido pela FIPE - Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), o INPC (medido pelo IBGE) e o IPCA (também calculado pelo IBGE). Aliás, há muito a economia se baseia em vários indexadores para calcular a inflação, sem que um tenha sucedido o outro, como, por exemplo, IGP-DI (1944), IPA (1947), IPCA (1980) e IGP-M (1989).

36. Essa multiplicidade de indexadores econômicos existentes simultaneamente resulta, como é de se esperar, em índices inflacionários diferenciados, porquanto adotados métodos distintos de cálculo para delimitação de cada um deles, o que torna, portanto, praticamente impossível sustentar a existência de um único critério que revele a verdadeira "inflação real". Qual dos indexadores deveria indicar com precisão a "inflação real"? Não há como definir. Daí porque se afigura estranha a idéia de existir uma "inflação real" a ser obrigatoriamente repassada às contas vinculadas de FGTS. É exatamente em face da existência de inúmeros índices diferentes, que os atos e negócios jurídicos reclamam seja expressamente realizada uma pré-definição do índice a que se submeterão para fins de correção monetária, escolhendo, dentre os vários disponíveis, o indexador econômico que promoverá a atualização monetária dos valores em jogo.

37. O mesmo ocorre com os percentuais aplicados na correção monetária das contas vinculadas do FGTS. A própria legislação que disciplina o FGTS proclama a que indexador econômico compete apurar o índice inflacionário, para fins de atualização monetária. A legislação já define qual o indexador econômico o órgão gestor do FGTS deve aplicar na correção monetária de suas contas vinculadas. Há de se atentar para os índices oficiais estabelecidos em legislação específica, não se exigindo, necessariamente, que reflitam a suposta "inflação real" do período.

38. Em outras palavras, o índice devido de correção monetária das contas vinculadas do FGTS, assim como a periodicidade de seu creditamento, dada a natureza institucional do Fundo, são previstos em lei específica, não podendo ser preteridos os critérios da lei, sendo descabida a sua comparação com os resultados de uma "inflação real".

39. A tese encampada na petição inicial, quanto à necessidade de preservação do "valor real" do capital depositado em conta(s) de FGTS, já mereceu, inclusive, reproche por parte do colendo Supremo Tribunal Federal.

40. No julgamento do RE nº 226.855-RS, relatado pelo Ministro Moreira Alves, acontecido em sessão plenária na data de 31/08/2000, ficou assentado o entendimento a respeito da natureza institucional do FGTS, da inexistência de direito adquirido a regime jurídico, bem assim no sentido da necessidade da submissão dos critérios adotados para sua remuneração aos termos da legislação infraconstitucional, aspectos que, inclusive, culminaram em reparos realizados no acórdão regional recorrido que havia condenado a CAIXA na aplicação dos índices tocantes aos Planos Bresser, Collor I (apenas quanto à atualização no mês de maio de 1990) e Collor II.

41. Dentre os demais votos que foram emitidos em sintonia com o posicionamento do Relator Ministro Moreira Alves, colhe-se o voto do Ministro Ilmar Galvão, que explanou, com maestria e objetividade, os seus argumentos sobre a natureza do FGTS e as implicações dela decorrentes, para fins de delimitação da recomposição dos saldos constantes nas contas a ele vinculadas.

42. Realmente, as ponderações do Ministro Ilmar Galvão, externadas no reportado julgamento, amoldam-se com perfeição ao caso dos autos, demonstrando o quão descabido é o intento da parte autora.

43. Ora, não consiste em manipulação ou violação ao direito patrimonial dos trabalhadores, a aplicação de índices legalmente fixados para correção do FGTS, embora os índices normatizados, eventualmente, não tenham sido os maiores índices inflacionários divulgados no país para o período.

d) Índices de atualização relacionados aos Planos Econômicos

44. Depois de assaz discussões a respeito de quais índices efetivamente faziam jus os titulares da contas vinculadas do FGTS, em razão da edição de sucessivos Planos Econômicos, a jurisprudência dos pretórios firmou-se, de maneira torrencial, após julgamento ocorrido em 31 de agosto de 2000, no Plenário do augusto Supremo Tribunal Federal, nos autos do RE 226.855-RS, cuja relatoria recaiu sobre o então Ministro na época Moreira Alves, no sentido de que apenas merecem prosperar a tese da incidência dos índices de 42,72%, relativo a janeiro de 1989 (Plano Verão), e de 44,80%, atinente ao mês de abril de 1990 (Plano Collor I), sobre as contas fundiárias.

45. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal assentou a natureza institucional do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS e a inexistência de direito adquirido a regime jurídico, discorrendo, com relação aos expurgos pleiteados em face dos Planos Econômicos, o seguinte:

"a) com relação ao Plano Bresser, a atualização dos saldos em 1º.07.87 para o mês de junho tem que ser feita pelo índice LBC de 18,02% e não pelo IPC (26,06%) como entendera o acórdão recorrido;

b)quanto ao plano verão, houve uma lacuna da lei relativamente à correção monetária de 1º.02.89 para o mês de janeiro e a circunstância de o acórdão recorrido ter preenchido essa lacuna com o índice 42,72%, referente ao valor do IPC, configura questão de natureza infraconstitucional (e não de direito intertemporal) que não dá margem a recurso extraordinário;

c)no tocante ao Plano Collor I, a atualização dos saldos da contas do FGTS feita em 1º.05.90 para o mês de abril (44,08%) também foi baseada na legislação infraconstitucional e não em face do direito adquirido, implicando, assim, violação indireta ou reflexa à CF, e a atualização feita em 1º.06.90 para o mês de maio deve ser utilizado o BTN (5,385) uma vez que a MP 189 entrou em vigor ainda durante o mês de maio de 90; e

d)no que se refere ao Plano Collor II, atualização feita em 1º.03.90 para o mês de fevereiro deve ser feita pela TR (7%) em face da MP 294, publicada no dia 1º de fevereiro, de aplicação imediata."

46. Na verdade, a Corte Suprema, por maioria, não "conheceu em parte do recurso extraordinário da Caixa Econômica Federal - CAIXA quanto ao Plano Verão (janeiro/89) e ao Plano Collor I (abril/90) e, na parte conhecida, deu provimento ao recurso para excluir da condenação as atualizações dos saldos do FGTS no tocante aos Planos Bresser (julho/87), Collor (apenas quanto à atualização do mês de maio/90) e Collor II (fevereiro /91). Vencido parcialmente o Min. Ilmar Galvão que, quanto ao Plano Collor I, conheça e provia o recurso relativamente aos saldos superiores a cinqüenta mil cruzados novos e vencidos, também, os ministros Marco Aurélio, Sepúlveda Pertence e Néri da Silveira, que não conheciam do recurso extraordinário da CEF na sua integridade, por entenderem que o afastamento dos índices de correção monetária correspondentes à inflação do período implicaria a erosão do FGTS." (in Informativo do STF n.º 200, de 28 de agosto a 1º de setembro de 2000).

47. Em face da jurisprudência tranqüila e remansosa edificada até então, filio-me a essa corrente, adotando os fundamentos petrificados nesses julgados como razões de decidir.

48. Demais disso, sob o pálio da Lei Complementar n.º110/2001, é de assinalar que houve, de certa forma, o reconhecimento implícito acerca da procedência do pedido na parte que diz respeito à correção devida nos meses de janeiro de 1989 e abril de 1990, sendo de assinalar que o percentual de março de 1990 já foi aplicado pela CAIXA.

e) Realização de Termo de adesão com base na LC 110/2001.

49. A despeito de o direito aos percentuais de atualização monetária terem sido reconhecidos pacificamente pela jurisprudência pátria, a CAIXA esclarece, em sua contestação, que alguns autores firmaram termo de adesão com fundamento na LC 110/01, tendo, inclusive, sacado os valores pertinentes às correções dos Planos Verão e Collor, juntando os termos de adesão às fls. 106/109.

50. A Lei Complementar nº 110/2001 estabelece que aquele trabalhador que firmar o termo de adesão nela previsto se declarará satisfeito com as condições de atualizações monetárias de sua conta vinculada do FGTS, comprometendo-se, de forma irretratável, a não renovar a discussão em sede judicial ou, caso já haja proposto a demanda, a encerrar o feito pela homologação da transação, cujo instrumento prevê expressamente a impossibilidade de cumulação entre os pagamentos efetuados na órbita administrativa e os pagamentos decorrentes de ordem judicial.

51. A esse propósito, veja-se o disposto nos arts. 4º, inciso I e 7ºda Lei Complementar nº 110/2001:

"Art. 4º Fica a Caixa Econômica Federal autorizada a creditar nas contas vinculadas do FGTS, a expensas do próprio Fundo, o complemento de atualização monetária resultante da aplicação, cumulativa, dos percentuais de dezesseis inteiros e sessenta e quatro centésimos por cento e de quarenta e quatro inteiros e oito décimos por cento, sobre os saldos das contas mantidas, respectivamente, no período de 1º de dezembro de 1988 a 28 de fevereiro de 1989 e durante o mês de abril de 1990, desde que:

I - o titular da conta vinculada firme o Termo de Adesão de que trata esta Lei Complementar;"

"Art. 7º Ao titular da conta vinculada que se encontre em litígio judicial visando ao pagamento dos complementos de atualização monetária relativos a junho de 1987, dezembro de 1988 a fevereiro de 1989, abril e maio de 1990 e fevereiro de 1991, é facultado receber, na forma do art. 4º, os créditos de que trata o art. 6º, firmando transação a ser homologada no juízo competente"

52. In casu, a CAIXA asseverou que alguns autores efetivaram transação, com base na LC 110/2001, já havendo, inclusive, efetuado o saque das verbas disponibilizadas, com exceção da autora TEREZINHA MARIA PINTO VARELLA.

53. Assim, restou demonstrado que alguns autores firmaram termo de adesão, referentes às correções do Plano Verão e Collor, antes mesmo do ajuizamento da presente demanda, não havendo como ser acolhido o pleito autoral, na medida em que caracterizaria o enriquecimento ilícito quando do recebimento em duplicidade dos valores buscados na presente feito.

54. Ademais, a parte autora não apresentou fundamentos capazes de afastar o fato extintivo do seu direito suscitado pela CAIXA, não restando outro caminho senão reconhecê-lo, face à inequívoca demonstração de realização de acordo com base na LC 110/2001.

55. Tendo a CAIXA comprovado que foi realizado termo de adesão para o recebimento dos valores concernentes a atualizações monetárias de sua conta vinculada do FGTS, não resta outro caminho a não ser julgar improcedente o pleito autoral, pois a LC 110/01 determina que a celebração do termo assinado pressupõe que o trabalhador encontra-se satisfeito com as condições de atualizações monetárias de sua conta vinculada do FGTS, não podendo ser renovada discussão em sede judicial, cujo instrumento prevê expressamente a impossibilidade de cumulação entre os pagamentos efetuados na órbita administrativa e os pagamentos decorrentes de ordem judicial.

III. PARTE DISPOSITIVA

56. Diante desse cenário, JULGO PROCEDENTE, EM PARTE, O PEDIDO o pedido formulado na inicial, para condenar a CAIXA a efetuar o pagamento corrigido, na conta vinculada de FGTS apenas da autora TEREZINHA MARIA PINTO VARELLA, nos percentuais de 42,72%, relativo a janeiro de 1989 (Plano Verão), e de 44,80%, atinente ao mês de abril de 1990 (Plano Collor I), descontadas as parcelas já adimplidas pela CAIXA.

57. Correção monetária, a partir do instante em que devida a aplicação dos respectivos percentuais, na forma do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, cap. III, item 3.

58. Juros de mora, à alíquota de 0,5%, contados desde a exigibilidade das prestações reclamadas (Súmula 54 - STJ), em virtude da natureza extracontratual do vínculo formado entre o correntista e o FGTS.

59. Sem condenação da CAIXA ao pagamento de honorários advocatícios, por força do disposto no art. 29-C da Lei nº 8.036/90, na redação dada pela MP nº 2.164-41/2001.

60. Condeno a demandante no pagamento da verba honorária advocatícia, no valor de R$ 600,00 (seiscentos reais), ressalvando que, na hipótese da ausência de recurso voluntário, por parte da requerente, este encargo passará a expressar a cifra de R$ 300,00 (trezentos reais), ficando suspensa a execução do referido encargo processual, em virtude de lhe terem sido concedidos os benefícios previstos na Lei nº 1.060/50.

61. PRIG.

Natal/RN, 03 de junho de 2009.

CARLOS WAGNER DIAS FERREIRA
Juiz Federal Substituto da 1ª Vara do Rio Grande do Norte



JURID - FGTS. Correção monetária. "Inflação real". [05/06/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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