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terça-feira, 16 de junho de 2009

JURID - Ação ordinária de ressarcimento por danos materiais e morais [16/06/09] - Jurisprudência


Ação ordinária de ressarcimento por danos materiais e morais. Telefonia. Ilegitimidade passiva da concessionária afastada. Legislação aplicável. Código de Defesa do Consumidor.


Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC.

Apelação Cível n. 2008.040506-0, de Joinville

Relator: Des. Pedro Manoel Abreu

Ação ordinária de ressarcimento por danos materiais e morais. Telefonia. Ilegitimidade passiva da concessionária afastada. Legislação aplicável. Código de Defesa do Consumidor. Clonagem de linha telefônica. Danos materiais. Débito automático em conta corrente de fatura telefônica. Devolução em dobro. Danos morais. Precariedade e demora na resolução do problema. Minoração do valor da indenização. Impossibilidade. Sentença mantida. Recurso desprovido.

A indenização por danos morais é fixada por eqüidade pelo magistrado, atendendo a dois objetivos: atenuação do dano causado ao lesado e reprimenda ao lesante pelo ilícito cometido. Importa observar o grau de culpabilidade e a condição econômica da parte a quem se vai impor a sanção, bem como o dano infligido à parte em favor de quem é imposta a indenização.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2008.040506-0, da comarca de Joinville (4ª Vara Cível), em que é apelante Brasil Telecom S/A, e apelado Ingo Herhardt e outro:

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Público, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Custas legais.

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação cível em ação ordinária de ressarcimento por danos materiais e morais, ajuizada por Ingo Erhardt e Érica Erhardt, contra Brasil Telecom S.A.

Buscaram os autores indenização por danos materiais e morais, em virtude de clonagem de linha telefônica e conseqüente constrangimento advindo dos prejuízos sofridos e do atendimento deficiente prestado pela empresa de telefonia.

Sentenciando, o magistrado a quo julgou procedente o pedido do primeiro autor, condenando a ré ao pagamento em dobro do valor debitado indevidamente da conta corrente daquele, assim como ao pagamento da importância de R$3.000,00 a título de indenização por danos morais, valores corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora. Quanto ao pedido da autora, julgou improcedente.

Irresignada com a decisão, apelou a ré, destacando a sua ilegitimidade passiva para figurar no feito. Salientou, no mérito, que a quantia estipulada a título de danos morais configura o enriquecimento ilícito e, por fim, que a cobrança dos valores a serem devolvidos foi feita de boa-fé. Requereu, ainda, a manifestação expressa desta Corte acerca da aplicabilidade dos arts. 4º e 5º da LICC, bem como dos arts. 186 e 944 do Código Civil, acerca da responsabilidade civil e fixação da indenização. Pugnou, assim, pela reforma do decisum, para que seja afastada da lide e pela revisão do quantum indenizatório.

Em contra-razões, a apelada salientou os danos morais sofridos, pleiteando a manutenção da sentença.

Em seguida, os autos ascenderam a esta instância.

VOTO

Efetivamente, nega-se provimento ao recurso.

1 Da legitimidade passiva

Aduz a apelante que não possui legitimidade passiva para figurar no feito, requerendo o seu afastamento da ação.

Afirma que, por terem sido utilizadas outras companhias telefônicas nas ligações cobradas, não seria a responsável pela compensação dos infortúnios enfrentados pelo apelado.

Porém, é descabida a alegação de isenção de culpa, eis que foi a apelante quem emitiu a fatura e atendeu o consumidor em todos os contatos feitos, comprometendo-se a solucionar o problema verificado.

Além disso, ainda que em uma parte das ligações tenham sido utilizadas outras operadoras, o maior número dos telefonemas cobrados foram realizados via Brasil Telecom, o que torna inafastável a sua legitimidade passiva.

As questões entre ela e as demais operadoras, salienta-se, caso haja interesse, deverão ser dirimidas em ação autônoma.

Dessa forma, afasta-se a preliminar aventada.

2 Da legislação aplicável

O presente feito rege-se pelo Código de Defesa do Consumidor, eis que à apelada, concessionária de serviço público, aplicam-se as referidas normas, conforme o seu art. 3o:

Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

Assim, a empresa, além de estar submetida à teoria do risco administrativo, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal, encontra-se também no âmbito de aplicação do Código de Defesa do Consumidor, naquilo que possa favorecer e proteger a parte que tenha sofrido o dano.

Desta forma, é assegurado ao consumidor o direito de ter ressarcido o prejuízo sofrido, seja qual for a sua natureza.

3 Dos danos materiais

Em sua insurgência, a apelante busca a reconsideração do pagamento em dobro dos danos materiais sofridos, ou seja, do ressarcimento do valor debitado automaticamente da conta do apelado, no primeiro mês após a clonagem da linha telefônica.

Alega que, por ter agido de boa-fé, tal cobrança não enseja a devolução em valor duplicado.

Acerca do tema, o Código de Defesa do Consumidor disciplina:

Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.

Referida norma prevê como uma única exceção ao caso de repetição do indébito em dobro a hipótese de engano justificável.

Porém, é preciso destacar que à empresa de telefonia é aplicada teoria do risco administrativo, nos moldes do art. 37, §6º, da Constituição Federal.

É da lição de Maria Sylvia Zanella Di Pietro:

É chamada teoria da responsabilidade objetiva, precisamente por prescindir da apreciação dos elementos subjetivos (culpa e dolo); e é também chamada teoria do risco, porque parte da idéia de que a atuação estatal envolve um risco de dano, que lhe é inerente. Causado o dano, o Estado responde como se fosse uma empresa de seguro em que os segurados seriam os contribuintes que, pagando tributos, contribuem para a formação de um patrimônio coletivo (cf. Cretella Júnior, 1970, v. 8:69-70) (In: Direito Administrativo, 18 ed., p. 565).

Nesta compreensão, somente demonstrando a culpa exclusiva ou concorrente do lesado no evento danoso é que seria afastada a responsabilidade do Estado, como explicou Hely Lopes Meirelles:

O risco administrativo não significa que a Administração deva indenizar sempre e em qualquer caso o dano suportado pelo particular; significa, apenas e tão-somente, que a vítima fica dispensada da prova da culpa da Administração, mas esta poderá demonstrar a culpa total ou parcial do lesado no evento danoso, caso em que a Fazenda Pública se eximirá integral ou parcialmente da indenização (In: Direito Administrativo Brasileiro, 28 ed., p. 624).

Ademais, cumpre salientar que a empresa deveria tomar as precauções necessárias para que tal infortúnio não ocorresse aos consumidores. Por certo, o caso em tela não é isolado, não havendo como sustentar a boa-fé da concessionária numa hipótese em que se mostrou negligente para com o consumidor, que foi quem verificou o problema e buscou a solução.

Assim sendo, não há o que se reparar na sentença neste ponto.

4 Dos danos morais

Aduziu o autor, na exordial, que sofreu abalo moral em razão dos inconvenientes experimentados após a clonagem de sua linha telefônica, obtendo na sentença a determinação de compensação por tais infortúnios.

A apelante, por sua vez, questionou a configuração dos danos morais, bem como o enriquecimento ilícito da parte, ante o valor arbitrado.

Acerca da configuração do dano moral, é importante destacar que este corresponde à lesão aos elementos individualizadores da pessoa como ser social, pensante e reagente, tais como a honra, a reputação e o prestígio, que se expressa por desequilíbrios no ânimo do lesado, causando-lhe reações desagradáveis, como o desconforto emocional. Abrange quer a repercussão negativa no meio social, quer a turbatio animi, isto é, a desestabilização psíquica ou somática do ofendido.

Conforme o art. 186, do Código Civil:

"Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito".

Carlos Alberto Bittar professa:

Qualificam-se como morais os danos em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se, portanto, como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos da personalidade humana (da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valoração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social) (Reparação civil por danos morais. Revista dos Tribunais, 1994, p. 41).

Sabe-se que em matéria de danos morais não cabe prova direta, e sim presuncional. Uma vez verificado o evento danoso, surge a necessidade de reparação, desde que estejam presentes os pressupostos de direito.

Na compreensão de Antônio Jeová Santos:

As características do bem afetado definirão sobre a necessidade da prova, porque em se tratando de lesão a sentimentos, o dano moral surge à luz da consideração dos fatos, in re ipsa. Pelas circunstâncias mesmo do fato, é dado presumir se ocorreu o dano moral. [...] A admissão da ocorrência do fato que embasa o pedido de indenização do dano moral faz com que a lesão surja imediatamente, em razão mesmo do fato ocorrido (Dano moral indenizável, 4 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 516).

No presente feito, além da clonagem ocorrida por negligência da apelante, que não apresentou qualquer defesa contra o fato, o apelado tentou, por quase dois meses, obter uma solução para o problema e não foi atendido.

Como bem salientou o magistrado: "É público e notório que existe uma grande dificuldade por parte dos consumidores na obtenção de soluções para seus impasses, quando o assunto envolve telefonia. Neste diapasão, não há como excluir a resposabilidade indenitária da Requerida, que assumiu esse risco quando deixou de investir na capacitação de seus atendentes, e quando optou por atender os clientes via telefone, demonstrando descaso na tratativa com os consumidores" (fls. 178).

Diante de tais fatos, inevitável constatar o abalo que sofreu, em virtude da demora e do descaso evidentes nos autos.

Acerca do quantum indenizatório, frisa-se que a indenização por danos morais é fixada por eqüidade pelo magistrado, atendendo a dois objetivos: atenuação do dano causado ao lesado e reprimenda ao lesante pelo ilícito cometido. Importa observar o grau de culpabilidade e a condição econômica da parte a quem se vai impor a sanção, bem como o dano infligido à parte em favor de quem é imposta a indenização.

Por sua vez, o art. 944 do Código Civil, determina que a indenização mede-se pela extensão do dano. Em seu parágrafo único, prevê que se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização.

Tal não é o caso do presente feito, em que o magistrado expôs com clareza a decisão sustentada na moderação e na razoabilidade, como se transcreve:

"O valor deve ser adequado para o fim colimado, de representar eqüitativa indenização para o ofendido e punição pedagógica ao ofensor, devendo ser realizado moderadamente e com razoabilidade" (fls. 182).

Neste sentido a doutrina de Carlos Alberto Bittar:

A responsabilização do agente é, nesse sentido, a resposta do Direito a ações lesivas, assentando-se, desse modo, a rejeição à idéia de dano injurioso. Inibem-se investidas outras da mesma natureza, ou estimulam-se a adoção de técnicas de elisão de acidentes e a formulação de mecanismos de prevenção de ou de reparação compatíveis, consoante a espécie de atividade compreendida no caso concreto, se perigosa, ou não, sob os condicionantes jurídicos próprios.

Observa-se, pois, que, sob o prisma do lesante, reveste-se a possibilidade por danos de caráter sancionatório, e não obstante diferentes posições detectadas na doutrina, a convergência em torno desse fator tem sido a tônica, de sorte a alçá-lo a condição de elemento nuclear em seu contexto. (Reparação civil por danos morais. 3.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, p.67)

A estipulação da verba reparatória do dano moral tem sido problema de árdua resolução, dada a dificuldade de estabelecer-se um pretium doloris. Assentada a reparabilidade desse tipo de dano, hoje com foro constitucional, longos embates doutrinários ainda se travam no afã de identificar os critérios para a estipulação das cifras devidas.

Em verdade, o sofrimento humano é insuscetível de ser avaliado por terceiros. Os fatos danosos repercutem no ânimo das pessoas em graus diferentes e, por óbvio, o dinheiro pouco supre a dor perpetrada. Na lição de Antônio Jeová Santos:

Apesar de imperfeita, essa maneira de indenizar o dano extrapatrimonial, porque as conseqüências do dano (menoscabo espiritual, vergonha, humilhação, perturbação anímica, perda de equilíbrio emocional), não desaparecerão por mais dinheiro que a vítima receba, em nome de uma pureza conceitual, não é possível emprestar ao vocábulo indenização uma acepção puramente econômica, em que somente deve ser medida em casos de lesões patrimoniais (Dano Moral Indenizável. 4 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003, p. 156).

Nessa circunstância, observando os critérios delineados para o arbitramento de danos morais, assim como o que dispõem os arts. 4º e 5º da LICC, razoável a condenação da empresa de telefonia à verba reparatória de R$3.000,00, arbitrada pelo magistrado, eis que a constatação de clonagem da linha telefônica e a posterior demora na solução do problema causaram-lhe significativo constragimento.

Outro não é o entendimento deste Tribunal:

APELAÇÃO CÍVEL - TELEFONIA MÓVEL - CLONAGEM DE LINHA - OPERADORA QUE NÃO TOMOU AS PROVIDÊNCIAS NECESSÁRIAS PARA SOLUCIONAR O PROBLEMA - CONTINUIDADE DAS COBRANÇAS INDEVIDAS - RESTITUIÇÃO DEVIDA - DANO MORAL COMPROVADO - QUANTUM INDENIZATÓRIO CONDIZENTE COM A REALIDADE DO CASO - SENTENÇA MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO.

"O valor da indenização ficará a cargo do juiz, que o fixará consoante seu prudente arbítrio, sopesando as peculiaridades do caso concreto e considerando a situação financeira daquele a quem incumbe o pagamento e a da vítima, de modo que não se torne fonte de enriquecimento, tampouco que seja inexpressiva a ponto de não atender aos fins a que se propõe". (AC Cível 98.015571-1 - Rel. Des. Sérgio Paladino)

Considerando as circunstâncias acima esposadas, o valor inicialmente fixado pelo juízo a quo com relação ao dano moral sofrido, mostra-se razoável ao caso, razão pela qual há de ser mantido em R$ 7.600,00 (sete mil e seiscentos reais), eis que condizente com a realidade dos fatos apresentados (Ap. Cív. n. 2008.011516-1, de Joinville. Rel.: Des. Cid Goulart. J. 19/11/2008).

E ainda:

Apelação cível. Ação de indenização. Responsabilidade civil. Danos morais. Clonagem de linha telefônica móvel. Operadora que, ao detectar o problema, deixou de tomar as providências administrativas necessárias para solucionar o caso. Permanência da cobrança dos valores provenientes das ligações fraudulentas. Ajuizamento de ação declaratória negativa de débito para o expurgo de tais verbas dos cadastros da requerida. Abalo moral comprovado. Ato ilícito configurado. Obrigação de indenizar. Critérios de fixação da verba reparatória. Razoabilidade e proporcionalidade. Manutenção do quantum. Recurso desprovido (Ap. Cív. n. 2008.025740-7, de Itajaí. Rel.: Des. Substituto Ronaldo Moritz Martins da Silva. J. 31/7/2008).

Desta forma, a sentença deve mantida, para que o valor restituído ao consumidor seja o dobro daquele debitado em sua conta corrente, acrescido de juros e correção monetária, bem como o pagamento de danos morais, arbitrados no valor de R$3.000,00.

DECISÃO

Ante o exposto, decide a Câmara, em votação unânime, negar provimento ao recurso.

O julgamento, realizado no dia 24 de março de 2009, foi presidido pelo signatário, com voto, e dele participaram os Desembargadores Luiz Cézar Medeiros e Rui Fortes.

Florianópolis, 31 de março de 2009.

Pedro Manoel Abreu
RELATOR

Publicado em 23/04/2009




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