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sexta-feira, 5 de junho de 2009

JURID - Ação civil pública. Reparação de danos ao erário. Sentença. [05/06/09] - Jurisprudência


Ação civil pública. Reparação de danos ao erário. Sentença de improcedência. Remessa necessária.

Superior Tribunal de Justiça - STJ.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.108.542 - SC (2008/0274228-9)

RELATOR: MINISTRO CASTRO MEIRA

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RECORRIDO: GERMANO JOÃO VIEIRA E OUTRO

ADVOGADO: WALTER ZIGELLI E OUTRO(S)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REPARAÇÃO DE DANOS AO ERÁRIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. REMESSA NECESSÁRIA. ART. 19 DA LEI Nº 4.717/64. APLICAÇÃO.

1. Por aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei nº 4.717/65, as sentenças de improcedência de ação civil pública sujeitam-se indistintamente ao reexame necessário. Doutrina.

2. Recurso especial provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Humberto Martins, Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques e Eliana Calmon votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 19 de maio de 2009(data do julgamento).

Ministro Castro Meira
Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.108.542 - SC (2008/0274228-9)

RELATOR: MINISTRO CASTRO MEIRA

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RECORRIDO: GERMANO JOÃO VIEIRA E OUTRO

ADVOGADO: WALTER ZIGELLI E OUTRO(S)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO MEIRA (Relator): Cuida-se de recurso especial interposto pela alínea "a" do permissivo constitucional contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, nestes termos ementado:

"Processual Civil. Reexame necessário. Ação civil pública. Valor inferior a 60 salários mínimos.

Não há ser conhecida a remessa obrigatória em caso de ação civil pública se a condenação resultar apenas em verba sucumbencial aquém de sessenta salários mínimos, consoante dispõe o estatuto de regência" (fl. 506).

Os subsequentes embargos de declaração foram rejeitados em aresto encartado às fls. 532-534.

De início, o recorrente aduz ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil-CPC sob o argumento de que, nada obstante a oportuna apresentação de embargos declaratórios, a Corte de origem deixou de manifestar-se sobre assuntos indispensáveis à resolução da lide, a saber, "a desconsideração do disposto no artigo 475, § 2º, do CPC, no que se refere à expressão 'direito controvertido', bem como à aplicação subsidiária do artigo 19, caput, da Lei n. 4.717" (fl. 541).

Quanto à matéria de fundo, reputa contrariados o art. 475, § 2º, do CPC e o art. 19, caput, da Lei nº 4.717/65.

O recorrente defende que o art. 19 da Lei nº 4.717/65 seria aplicável no caso vertente, asseverando que "o fato de tal dispositivo legal estar inserido na lei que rege as ações populares não impede sua aplicação no âmbito das ações civis públicos, pois tanto a Lei nº 4.717/65 quanto a Lei nº 7.347/85 compõem o chamado microssistema coletivo" (fl. 546).

Nesse raciocínio, conclui que é indispensável o reexame da sentença de improcedência da ação civil pública de reparação de danos ao erário independentemente do valor dado à causa ou mesmo da condenação nos consectários legais.

No mais, sustenta que o acórdão hostilizado infringiu o art. 475, § 2º, do CPC na medida em que não conheceu da remessa necessária da sentença proferida pelo juiz de primeira instância no bojo de ação civil pública de reparação de danos ao erário, ignorando a expressão "direito controvertido" constante do dispositivo legal em tela, cujo valor no caso concreto superaria 60 (sessenta) salários mínimos, impondo o reexame da controvérsia pelo Tribunal de Justiça.

Argumenta:

"Assim sendo, como no ajuizamento da demanda o valor do direito controvertido era de Cr$7.448.982.365,58 (sete bilhões quatrocentos e quarenta e oito milhões novecentos e oitenta e dois mil trezentos e sessenta e cinco cruzeiros e cinquenta e oito centavos), valor esse que, apenas corrigido monetariamente pelo INPC, chega a R$475.989,97 (quatrocentos e setenta e cinco mil novecentos e oitenta e nove reais e noventa e sete centavos) na data da prolação da sentença, evidentemente que o valor do direito controvertido está acima do valor de alçada estipulado no artigo 475, § 2º, do CPC, o que impunha o conhecimento do reexame necessário.

(...)

Portanto, eventual provimento do presente recurso especial e, posteriormente, do reexame necessário, trará aos cofres públicos benefício de valor econômico bem superior àquele previsto no artigo 475, § 2º, do CPC (sessenta salários mínimos), motivo pelo qual sustenta-se a aplicabilidade, neste caso, da alternativa prevista no próprio dispositivo legal, qual seja, a de que a necessidade do reexame obrigatório deva ser apurada de acordo com o 'direito controvertido': o valor do dano causado ao erário e indicado na petição inicial" (fl. 545).

Sem contra-razões, como certificado às fls. 551.

Admitido o apelo nobre, subiram os autos a esta Corte.

Em parecer firmado pelo Subprocurador-Geral da República Dr. José Eduardo de Santana, o Ministério Público Federal opina pelo acolhimento do especial (fls. 562-566).

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.108.542 - SC (2008/0274228-9)

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REPARAÇÃO DE DANOS AO ERÁRIO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. REMESSA NECESSÁRIA. ART. 19 DA LEI Nº 4.717/64. APLICAÇÃO.

1. Por aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei nº 4.717/65, as sentenças de improcedência de ação civil pública sujeitam-se indistintamente ao reexame necessário. Doutrina.

2. Recurso especial provido.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CASTRO MEIRA (Relator): De início, verifico que a questão envolvendo o art. 475, § 2º, do CPC e o art. 19 da Lei nº 4.717/65 foi devidamente abordada pelo Tribunal a quo, daí porque conheço do recurso especial neste particular, passando a apreciar o mérito da controvérsia.

A questão devolvida ao crivo deste Superior Tribunal de Justiça consiste em saber:

a) se o art. 19 da Lei nº 4.717/65, que rege o reexame necessário no âmbito da ação popular, pode ser aplicado também no que se refere à ação civil pública, levando ao reexame do Tribunal de Justiça qualquer sentença de improcedência proferida em ações desta natureza, independentemente do valor dado à causa;

b) se o valor mínimo de 60 (sessenta salários-mínimos) que o art. 475, § 2º, do CPC exige para submeter uma sentença à remessa necessária deve ser apurado de acordo com o "direito controvertido"- no caso concreto, o montante perseguido pelo Parquet por danos ao erário - ou deve ser averiguado simplesmente sob a luz da condenação imposta ao ente público, a saber, os honorários advocatícios.

A Corte de origem não conheceu da remessa necessária com base na seguinte motivação:

"A propósito do duplo grau de jurisdição obrigatório, convém anotar que a abundante interposição de recursos que exacerbam o Poder Judiciário tem conduzido o legislador brasileiro a edição de leis que buscam harmonizar a boa administração da Justiça, propiciando maior celeridade ao tramite processual, razão pela qual vários institutos vem passando por serias e salutares modificações.

Foi o que ocorreu com a alteração promovida no art. 475, pela Lei n. 10.352/01, restringindo as hipóteses do reexame necessário, dispensando-o 'sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução da divida ativa do mesmo valor' (§ 2°).

Trata-se, em verdade, de exceção a regra protetora dos interesses da Fazenda Pública, insculpida no caput daquele dispositivo, mais consentânea com os princípios constitucionais (igualdade e ampla defesa) e gerais (economia e celeridade) que visam afastar qualquer obstáculo a ordem jurídica justa e suavizam a desigualdade processual, naquelas causas de menor comprometimento financeiro e maior repercussão social.

No caso, o objeto da ação civil publica visava o ressarcimento dos prejuízos suportados pelo erário em virtude de possíveis irregularidades, envolvendo a construção de um ginásio de esportes, cometidas pelo Prefeito Municipal de São José, sendo que houve extinção do feito com resolução do mérito ante a ocorrência da prescrição e a condenação do Estado de Santa Catarina ao pagamento de honorários advocatícios, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), não atingindo os sessenta salários mínimos que obrigariam a remessa oficial.

Diante do exposto, com fulcro no art. 19 da lei n. 7.347/85 e na autorização legislativa do § 2º do art. 475 do CPC (acrescentado pela Lei n. 10.352/01), não se conhece do reexame necessário" (fl. 508).

Analiso, inicialmente, a tese exposta na letra "a", relativa ao art. 19 da Lei nº 4.717/65.

Assiste razão ao recorrente.

Isto porque a primeira parte do dispositivo legal em tela ("A sentença que concluir pela carência ou pela improcedência da ação está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal"), embora refira-se imediatamente à ação popular, tem seu âmbito de aplicação estendido às ações civis públicas diante das funções assemelhadas a que se destinam - proteção do patrimônio público em sentido lato - e do microssistema processual da tutela coletiva, de maneira que as sentenças de improcedência devem se sujeitar indistintamente à remessa necessária.

Neste diapasão, ensinam Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves:

"É de ressaltar que a sentença de improcedência, quando proposta a demanda pelo ente de direito público lesado, reclama a incidência do art. 475 do CPC, sujeitando-se ao duplo grau obrigatório de jurisdição. O mesmo ocorrerá quando proposta a ação pelo Ministério Público ou pelas associações, incidindo, agora, a regra do art. 19 da Lei da Ação Popular, uma vez que, por agirem os legitimados em defesa do patrimônio público, é possível entender que a sentença, na hipótese, foi proferida 'contra' a União, o Estado ou o Município, mesmo que tais entes tenham contestado o pedido inicial (art. 17, § 3º, da Lei nº 8.429/92 c.c. art. 6º, § 3º, da Lei nº 4.717/65" (Improbidade Administrativa. Editora Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2ª ed., 2004, p. 858).

Ademais, não pairam dúvidas acerca da possibilidade de utilização da lei de regência da ação popular (Lei nº 4.717/65) como fonte do microssistema processual de tutela coletiva, prevalecendo, inclusive, sobre disposições gerais do Código de Processo Civil, como vaticina Rodrigo Mazzei, professor da UFES:

"De acordo com nossa posição, apesar da grande importância do Código de Defesa do Consumidor e da Lei da Ação Civil Pública, os dispositivos da Lei de Ação Popular (e os constantes das demais normas com vocação coletiva) poderão ser aproveitados em todo o microssistema coletivo, naquilo que for útil à efetivação da tutela de massa.

Obviamente, deverá o intérprete aferir - em concreto - a eventual incompatibilidade e a especificidade de cada norma coletiva em relação aos demais diplomas, já que as leis que formam esse conjunto de regulação ímpar, sem exceção, interpenetram-se e subsidiam-se de forma harmônica, em especial no que concerne ao processo coletivo, em razão da dicção individual do Código de Processo Civil" (Ação Popular e o Microssistema da Tutela Coletiva. Tutela Jurisdicional Coletiva [org. Fredie Didier Jr. e José Henrique Mouta]. Salvador: Editora Jus Podivm, 2009, p. 384).

Portanto, dada a ausência de dispositivo na Lei da Ação Civil Pública (Lei nº 7.347/85) versando sobre a remessa oficial, deve-se, prioritariamente, buscar norma de integração dentro do microssistema processual da tutela coletiva, o que confirma como legítima a aplicação por analogia do art. 19 da Lei nº 4.717/65.

A título de reforço, excerto pinçado do parecer ministerial firmado pelo ilustre Subprocurador-Geral da República Dr. José Eduardo de Santana:

"Todavia, deve ser reformado o acórdão recorrido, a fim de que a remessa oficial seja apreciada. Com efeito, não há falar-se em aplicação do art. 475, § 2º, do CPC, no âmbito da ação civil pública. Ao revés, na ausência de regulamentação da matéria pela Lei nº 7.347/85, deve ser observado o disposto no art. 19, da Lei nº 4.717/65, que regula a ação popular, haja vista a semelhança entre as finalidades de ambas" (fl. 564).

Ficam, assim, prejudicadas as arguições de ofensa aos arts. 475, § 2º, e 535 do CPC.

Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEGUNDA TURMA

Número Registro: 2008/0274228-9

REsp 1108542 / SC

Números Origem: 20040003609 64930071984

PAUTA: 19/05/2009

JULGADO: 19/05/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro CASTRO MEIRA

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro CASTRO MEIRA

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ALCIDES MARTINS

Secretária
Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI

AUTUAÇÃO

RECORRENTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA

RECORRIDO: GERMANO JOÃO VIEIRA E OUTRO

ADVOGADO: WALTER ZIGELLI E OUTRO(S)

ASSUNTO: Administrativo - Ato - Improbidade Administrativa

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEGUNDA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)."

Os Srs. Ministros Humberto Martins, Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques e Eliana Calmon votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 19 de maio de 2009

VALÉRIA ALVIM DUSI
Secretária

Documento: 883602

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 29/05/2009




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