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sexta-feira, 5 de junho de 2009

JURID - Crime contra o meio ambiente. Poluição. Despejo de dejetos. [05/06/09] - Jurisprudência


Crime contra o meio ambiente. Poluição. Despejo de dejetos suínos no rio.

Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC.

Apelação Criminal n. 2008.019773-0, de Palmitos

Relatora: Desembargadora Marli Mosimann Vargas

APELAÇÃO CRIMINAL - CRIME CONTRA O MEIO AMBIENTE - POLUIÇÃO - ART. 54, § 2º, INCISO V E ART. 60, AMBOS DA LEI N. 9.605/98 - DESPEJO DE DEJETOS SUÍNOS NO RIO - FUNCIONAMENTO DE ATIVIDADE POTENCIALMENTE POLUIDORA AO DESABRIGO DE LICENÇA ADMINISTRATIVA VÁLIDA - AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE DEMONSTRADAS - PROVA DOCUMENTAL - TESTEMUNHOS POLICIAIS - CULPABILIDADE E DOLO DO AGENTE EVIDENCIADOS - ABSOLVIÇÃO POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS - INVIABILIDADE - DESCONHECIMENTO INESCUSÁVEL - CONDENAÇÃO MANTIDA.

Os recursos naturais, em especial as águas demandam proteção especial, uma vez que se trata de direito difuso a que faz jus toda a coletividade, não se afigurando coerente que nenhum indivíduo deles se apodere individualmente, de modo a comprometer o meio ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à sadia qualidade de vida das presentes e futuras gerações.

"Em se tratando de crimes ambientais, compete à Polícia Militar Ambiental determinar a realização de parecer técnico, a ser confeccionado por peritos ambientalistas, para atestar a ocorrência do ilícito e a potencialidade dos danos causados ao meio ambiente" (Ap. Crim. n. 2008.028076-7, de São Miguel do Oeste, Relatora Des. Salete Silva Sommariva).

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Criminal n. 2008.019773-0, da comarca de Palmitos, em que é apelante Ivanir José Viel e apelada A Justiça, por seu Promotor:

ACORDAM, em Primeira Câmara Criminal, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

RELATÓRIO

Ivanir José Viel foi denunciado pelo Dr. Promotor de Justiça, como infrator dos artigos 54, § 2º, inciso V e 60, ambos da Lei n. 9.605/98, porque em 1º de maio de 2006, por volta das 15 horas, em linha Planaltina interior do município de Caibi, o denunciado foi atuado por causar poluição hídrica que provocou a mortandade de animais. Ao agir, o denunciado, que produz suínos em sua propriedade rural, lançava os efluentes orgânicos da atividade (dejetos) no rio Sertão, através de uma mangueira ligada diretamente à esterqueira, causando a mortandade de peixes, especialmente das espécies jundiá e lambari, conforme "auto de exame do local do dano ambiental" de fls. 28/33. O denunciado provocou a poluição do rio Sertão através de lançamento de resíduos líquidos em absoluto desacordo com as exigências estabelecidas em lei ou regulamentos, mostrando a análise da água valores muito acima do permitido de coliformes totais e de coliformes fecais (fl. 26). Nas mesmas condições de tempo e lugar, o denunciado foi autuado por fazer funcionar estabelecimento potencialmente poluidor sem regular licença do órgão ambiental competente e em desacordo com as normas legais e regulamentares pertinentes. O denunciado desenvolvia atividade de suinucultura munido de uma autorização Ambiental vencida (fl. 24) e, como o depósito de dejetos orgânicos estava ligado por uma mangueira diretamente a um curso d'água, a atividade descumpria as normas do Decreto estadual n. 14.250, de 05.06.81.

A denúncia foi recebida (fl. 45), o réu foi citado (fl. 47, v) e interrogado (fls. 49/50).

Defesa prévia às fls. 51/53, momento em que se arrolou duas testemunhas, juntou os documentos de fls. 54/55 e requereu a concessão da suspensão condicional do processo.

Às fls. 56/57 o Ministério Público manifestou-se contrário ao pedido.

As testemunhas arroladas pela acusação foram ouvidas às fls. 80 e 89 e, as da defesa às fls. 69 e 70.

Alegações finais da acusação às fls. 92/99 e da defesa, fls. 100/101.

Cumprida a instrução criminal restou a denúncia, julgada parcialmente procedente para condenar Ivanir José Viel ao cumprimento das penas de 7 meses de detenção e 10 dias-multa, por infração aos artigos 54, § 1º e 60, da Lei 9.605/98. Substituída a pena privativa de liberdade por prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de 3 salários mínimos em favor de entidade pública ou privada com destinação social, a ser indicada na fase de execução (fls. 102/106).

Inconformado, apelou buscando a absolvição (fls. 110/112).

Com as contra-razões (fls. 114/121), os autos foram à douta Procuradoria Geral de Justiça que, em manifestação do Dr. Odil José Cota opinou pelo conhecimento e não provimento do recurso (fls. 127/131).

VOTO

A materialidade deste crime está sobejamente comprovada por meio do Boletim de Ocorrência Ambiental (fl. 8); Autorização Ambiental (fl. 24); Laudo de Análises Bacteriológicas de Água (fl. 26) e Auto de Exame do Local do Dano Ambiental (fls. 28/34) que confirmou a poluição no rio, pois as perícias indicaram um aumento na concentração de coliformes.

A autoria, também, acha-se indubitavelmente comprovada, não obstante seja negada pelo réu.

O artigo 54, caput, da Lei n. 9.605/98 traz em sua redação:

"Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativas da flora"

Pois bem, inquirido pela polícia militar ambiental, às fls. 12/13, o apelante respondeu que "(...) ocorreu um vazamento na tubulação (mangueira) que mantém ligada a esterqueira, a qual passa sobre o rio Sertão no domingo último (04.04.06) (...) que percebeu a mortalidade de peixes, principalmente lambaris e junidás, logo após a chegada da Guarnição Ambiental no dia 01.05.06 (segunda-feira).

Em juízo, por ocasião de seu interrogatório de fls. 49/50 negou que a mangueira estivesse direcionada para dentro do rio Sertão e atribuiu o crime a crianças desconhecidas. No entanto, quando inquirido pelo Ministério Público explicou que "... Há um registro na mangueira na esterqueira, e outro registro na lavoura; que para o produto da esterqueira saia pela mangueira os dois registros devem estar abertos; que no dia dos fatos esqueceu o registro da esterqueira aberto, sendo que em regra costuma fechar os dois registros".

O relato do policial militar Gilberto Pilla, que é corroborado pelo policial militar Alexandro Jersioski, elucidou que "(...) que receberam denúncia naquele dia de que um morador da Linha Planaltina havia notado uma mortandade acentuada de peixes no rio Sertão; que esta mesma pessoa disse estar notando um cheiro característico de dejetos suínos; que então foram até o local e até a propriedade de um dos moradores e viram que no local havia grande quantidade de peixes mortos; (...) foram no vizinho e chegaram na propriedade do acusado; que neste momento duas pessoas estavam numa parte nova da pocilga que estava sendo construída e uma destas pessoas saiu de forma suspeita e foi para o meio do milharal; que foram até o rio e o colega do depoente notou uma mangueira de tubulação que levava dejetos suínos até o rio; que quando o colega do depoente levantou a mangueira uma quantidade grande de dejetos caiu no rio; que estava mangueira estava jogada na margem do rio Sertão; que o acusado reconheceu que a pocilga era de sua propriedade e também a mangueira; que o acusado disse utilizar tal mangueira para levar dejetos para o outro lado do rio, mas que por um acidente ou por descuido, dejetos teriam sido levados até o rio; que fizeram uma constatação no local de que acima deste trecho não havia peixes mortos, mas a partir daí, onde se deu este acidente, sim, notaram uma quantidade significativa de peixes mortos" (fl. 89).

Aliado a estes depoimentos, observa-se que a Polícia Ambiental à fl. 25 informou que "no ato de fiscalização, ainda foi possível verificar o vazamento que escorria diretamente no manancial hídrico, causa possível de grande mortandade de peixes".

Ora, a responsabilidade e o dever de tomar as devidas precauções para evitar a contaminação do meio ambiente é do proprietário e responsável pela criação de porcos, no caso o réu, cabendo a ele arcar com as conseqüências do manuseio inadequado dos dejetos produzidos por sua criação.

Sendo assim, impossível acolher a alegação de que o apelante não sabia da poluição que estava ocorrendo.

Com relação à efetiva poluição do rio sabe-se que a mangueira estava vazando, daí porque foram despejadas os dejetos diretamente nele, sendo portanto desnecessário que na hora da constatação fossem efetivamente encontrados os dejetos ali. Essa conduta, por si só, em afetar a mencionada vala causa uma poluição da qual poderia resultar, como resultou, danos ao meio ambiente.

Vladimir Passos de Freitas ensina que a Lei n. 9.605/98 veio a consagrar a figura do crime de perigo, que se consuma com a simples possibilidade de dano. Segundo ele, "na maioria das vezes, o dano ambiental, uma vez consumado, afeta de tal forma o meio ambiente que, dificilmente, as suas características primativas poderão ser recuperadas. Daí, a necessidade de evitá-lo o quanto possível" (Crimes Contra a Natureza, 6ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 37).

Isso significa que não é necessário para a sua tipificação que o dano ambiental venha efetivamente a sobrevir, não se exige a produção do resultado, tendo em vista, aliás, que o caput do artigo dispõe "que resultem ou possam resultar em danos".

Portanto, mesmo que o dano efetivo não possa hoje ser constatado, a prática do delito fica consumada com a exposição dos resíduos poluidores no rio, sendo que a ocorrência do dano seria apenas o exaurimento do crime, isto é, este já teria sido consumado e as condutas posteriores seriam conseqüências mais lesivas, agravando-o.

Isso posto, comprovadas a materialidade e a autoria delitivas, bem como demonstrada a conduta dolosa do apelante, sua condenação nas sanções cominadas para a prática do delito é medida que se impõe.

Igualmente, no tocante ao delito descrito no artigo 60 da citada lei, uma vez que fez funcionar estabelecimento potencialmente poluidor em sua propriedade, sem licença do órgão ambiental.

Observando-se a autorização ambiental de fl. 24, comprova-se que havia uma autorização com validade de seis (06) meses, no período de 14.10.2005 à 14.04.2006, em data anterior aos fatos descritos na denúncia. Sendo que, quando da fiscalização em 01 de maio de 2006, tal autorização já estava vencida.

DECISÃO

Nos termos do voto da relatora, esta Primeira Câmara Criminal, à unanimidade de votos, resolveu conhecer do recurso e negar-lhe provimento.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Sr. Des. Amaral e Silva, com voto, e dele participaram a Exma. Sra. Desa. Marli Mosimann Vargas - relatora e o Exmo. Sr. Des. Hilton Cunha Júnior.

Pela douta Procuradoria-Geral de Justiça participou a Exmo. Sr. Procurador Humberto Francisco Scharf Vieira.

Florianópolis, 07 de abril de 2009.

Marli Mosimann Vargas
RELATORA

Publicado 20/05/09




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