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terça-feira, 3 de novembro de 2009

JURID - Habeas corpus. Processo penal. Prisão preventiva. [03/11/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Processo penal. Prisão preventiva. Art. 33 e art. 35 da Lei nº 11.343/06.


Superior Tribunal de Justiça - STJ.

HABEAS CORPUS Nº 128.820 - MG (2009/0028511-0)

RELATOR: MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP)

IMPETRANTE: LUCIANO CAETANO ALVES

ADVOGADO: LEONARDO CARVALHO CARREIRA - DEFENSOR PÚBLICO

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

PACIENTE: LUCIANO CAETANO ALVES (PRESO)

EMENTA

HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. PRISÃO PREVENTIVA. ART. 33 e ART. 35 DA LEI Nº 11.343/06. SUPERVENIÊNCIA DA SENTENÇA CONDENATÓRIA. INEXISTÊNCIA DE ÓBICE AO CONHECIMENTO DO WRIT. MEDIDA CONSTRITIVA FUNDAMENTADA NA TRAFICÂNCIA DE DROGAS. GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO. MOTIVAÇÃO INIDÔNEA. ORDEM CONCEDIDA.

1. A prolação de sentença condenatória não obsta o conhecimento do presente writ, porquanto o juízo sentenciante não explicitou fundamento algum para a manutenção da medida constritiva, de tal sorte que a prisão preventiva pauta-se, ainda, no decisum proferido em primeira instância.

2. A medida constritiva não está fundada em dados concretos, pois determina o encarceramento do paciente sob o fundamento de que era traficante de drogas, o que equivale a dizer que todo réu ao qual se imputa tal conduta delituosa deve responder à ação penal preso preventivamente. O raciocínio leva à equívoca conclusão de que a prisão cautelar de suposto traficante de droga é a regra e sua liberdade a exceção, tese que não se coaduna com o princípio constitucional da não-culpablidade.

3. Incabível a manutenção do paciente no cárcere sob o argumento de que o paciente solto voltará a delinqüir, porque a afirmação constitui mera conjectura.

4. Inidôneo o argumento do acórdão hostilizado no sentido de que a concessão da liberdade provisória ao paciente é obstada pelo art. 44 da Lei nº 11.343/06. A 6ª Turma desta Corte tem firmado o entendimento segundo o qual, ainda que se trate de delito de tráfico, a Lei nº 11.464/2007, ao suprimir a vedação à liberdade provisória nos crimes hediondos do artigo 2º, II, da Lei nº 8.072/1990, adequou a lei infraconstitucional ao texto da Carta Política de 1988, sendo inadmissível a manutenção do acusado no cárcere, quando não demonstrados os requisitos autorizadores de sua prisão preventiva.

5. Ordem concedida para determinar a expedição de alvará de soltura clausulado em favor do paciente, concedendo-lhe o direito de responder a ação penal em liberdade.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento após o voto-vista da Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, acompanhando o voto do Sr. Ministro Relator, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, conceder a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Vencido o Sr. Ministro Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), que a denegava.

Os Srs. Ministros Nilson Naves e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Og Fernandes.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 15 de setembro de 2009(Data do Julgamento)

MINISTRO CELSO LIMONGI
(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP)
Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) (RELATOR): Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, substitutivo de recurso ordinário, impetrado em favor de LUCIANO CAETANO ALVES, denunciado e preso preventivamente, em 23/8/2006, por violação ao art. 33, caput; e art. 35; da Lei nº 11.343/06, contra acórdão denegatório do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que manteve a custódia cautelar do paciente.

Alega o impetrante, em síntese, que o decreto constritivo está desvinculado de fatos concretos e se funda, de forma inidônea, na gravidade abstrata do crime. Informa, ainda, que superveniente sentença condenatória negou ao paciente o direito de recorrer em liberdade, persistindo, assim, no seu entender, a ilegalidade do decreto de segregação cautelar.

Requer, em liminar e no mérito, a revogação da prisão preventiva imposta ao paciente.

A medida liminar foi indeferida, a fls. 65/67.

A autoridade impetrada prestou informações a fls. 71.

O Ministério Público Federal ofereceu parecer, a fls.79/90, opinando pela denegação da ordem.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP) (RELATOR): A questão posta a desate cinge-se à legalidade ou não da prisão preventiva do paciente que, nos termos da denúncia, iria receber do corréu 100g (cem gramas) de cocaína, conseguindo, contudo, se desvencilhar do flagrante.

O decisum de primeiro grau foi fundamentado nos seguintes termos, in verbis:

"À f. 74 o Dr. Delegado de Polícia representou pela prisão preventiva do indiciado, ora denunciado, Luciano Caetano Alves sob a justificativa que, ele solto, continuará traficando substâncias entorpecentes na cidade de Monte Alegre de Minas/MG.

(...)

As provas até aqui apresentadas, produzidas em sede de inquérito policial, falam em desfavor do representado, ora denunciado, Luciano Caetano Alves, indicando-o como fornecedor de substâncias entorpecentes ao consumo por usuários de drogas.

(...)

No que se refere às justificativas para sua decretação, tenho que é de se considerar como a mais importante a garantia da ordem pública, diante de sua evidência na espécie.

Pelas características do crime, a prisão do representado garante a ordem pública na medida em que os indícios indicam sua participação para o serviço do tráfico instalado nesta comunidade.

(...)

Como se vê dos autos, o representado, ora denunciado Luciano Caetano Alves, resguardará a sociedade do risco de que em liberdade possa contribuir para o fomento de tal prática delituosa, causadora de tantos malefícios.

(...)

Ademais, conforme se vê dos autos, o representado, ora denunciado Luciano Caetano Alves é conhecido como traficante da cidade de Monte Alegre de Minas/MG, e já vinha sendo investigado pela autoridade policial por envolvimento no tráfico ilícito de drogas na comarca.

Tem-se que a repercussão social e, a periculosidade do representado, ora denunciado Luciano Caetano Alves, facilmente verificadas na espécie, provoca protestos e, consternação da sociedade, denotando, assim, a necessidade de sua custódia cautelar, para resguardar a ordem pública.

Desta forma, não se pode tolerar atitudes envolvendo o derramamento de drogas entre habitantes da cidade de Monte Alegre de Minas/MG, na sua maioria jovens, notadamente porque a sociedade tem diante de si, bem visível, a enormidade dos malefícios que esse comércio e as atitudes irresponsáveis dos que com ele se envolvem, representa em danos sociais.

(...)

Desta forma, ainda que seja o representado primário, de bons antecedentes e domicílio certo, não têm tais requisitos pela sua própria existência, o condão de impossibilitar a prisão cautelar, principalmente, se se levar em conta o delito de que teria participado.

(...)

Portanto, o pedido de prisão preventiva do denunciado Luciano Caetano Alves, e o parecer ministerial estão muito bem feito, mostrando a existência de indícios suficientes de autoria e materialidade dos fatos, apresentando-se a prisão cautelar como necessária para a garantia da ordem pública.

Fundamenta-se, pois, a prisão preventiva de Luciano Caetano Alves."

O relator do acórdão manteve a medida constritiva tecendo as seguintes considerações a seguir transcritas:

Não há constrangimento ilegal no caso dos autos.

Conforme se depreende da decisão que decretou a prisão preventiva do paciente, denunciado nas iras dos artigos 33 e 35, ambos da Lei nº 11.343/06, esta se encontra devidamente fundamentada, salientando que há indícios de que o acusado é contumaz no envolvimento de drogas e, em liberdade, continuaria insistir na mercancia ilícita de entorpecentes. Existem depoimentos o apontando como travicante na Comarca de Monte Alegre de Minas, e já vinha sendo investigado pelas autoridades locais por esta conduta ilícita (fls. 148/152)

(...)

Necessário realçar que, em matéria de custódia cautelar, ao juiz há de creditar-se discricionariedade quanto à oportunidade da medida, cabendo-lhe analisar a personalidade e condição pessoal dos agentes, as situações em que deliqüiram e a repercussão do cume na comunidade. A culta Autoridade, indicada coatora, mais próxima dos fatos e das partes envolvidas, julgou conveniente a prisão, não se vislumbrando a pranteada ausência/insuficiência de fundamentação.

E ainda que não estivesse satisfatoriamente fundamentado o r. decisum, já decidiu o augusto STJ que "a decisão que decreta a prisão preventiva, nos casos de apuração de crimes de tráfico de drogas, prescinde de maiores digressões" (HC 85.261/SP, julgado em 11 de março de 2008 pela Quinta Turma). Afinal, trata-se de crime equiparado a hediondo, insuscetível constitucionalmente de liberdade provisória, até porque referido benefício é expressamente vedado pelo art. 44 da lei nº 11.343/06. Mas, repita-se, a r. Decisão preventiva está fincada em dados objetivos do processo, sendo que, outrossim, supostos e eventuais atributos ostentados pelo paciente, não constituem fatores decisivos e suficientes para a revogação da medida."(fls. 23/24).

O ora paciente LUCIANO CAETANO ALVES, por sentença proferida em 26/01/2008, foi condenado em primeiro grau a cumprir pena de 05 (cinco) anos de reclusão e ao pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, no valor mínimo legal, pela prática do crime de tráfico de substância entorpecente. Foi condenado, ainda, por associação para o tráfico de drogas, tendo sido a pena por este crime fixada em 3 (três) anos de reclusão e 700 (setecentos) dias-multa, no patamar mínimo. (fls. 58/60)

No que diz respeito à custódia cautelar, o juízo sentenciante, à míngua de fundamentação, limitou-se a afirmar que: "Aguardará o réu, o resultado de eventual recurso, encarcerado no estabelecimento penal em que se encontra". (fl. 69 - grifos originais)

Primeiramente, consigno que a prolação de sentença condenatória não obsta o conhecimento do presente writ, porquanto o juízo sentenciante não explicitou fundamento algum para a manutenção da medida constritiva, de tal sorte que a prisão preventiva se pauta, ainda, no decisum proferido em primeira instância por ocasião do recebimento da denúncia.

A propósito confiram-se os seguintes precedentes:

PENAL PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. 1. LIBERDADE PROVISÓRIA. INDEFERIMENTO. GRAVIDADE DO CRIME. FALTA DE INDICAÇÃO DE ELEMENTOS CONCRETOS A JUSTIFICAR A MEDIDA. MOTIVAÇÃO INIDÔNEA. OCORRÊNCIA. ALTERAÇÃO TRAZIDA PELA LEI 11.464/07. NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. 2. SENTENÇA SUPERVENIENTE. RENOVAÇÃO DO FUNDAMENTO DA PRISÃO CAUTELAR. PERPETUAÇÃO DO CONSTRANGIMENTO ILEGAL. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. INOCORRÊNCIA. 3. ORDEM CONCEDIDA.

1. Ilegal é a prisão mantida por força de decisão que se funda apenas na gravidade abstrata do crime, sem indicar elementos concretos a justificar a medida. Com a alteração trazida à Lei dos Crimes Hediondos pela Lei 11.464/07, indispensável se torna a motivação concreta da necessidade da manutenção do prisão em flagrante pela autoridade judicial, em consonância com as garantias constitucionais da motivação das decisões judiciais e da presunção de inocência.

2. Sobrevinda a sentença condenatória, se esta não traz novos elementos para justificar a manutenção da prisão, limitando-se a renovar os mesmos argumentos da decisão anterior, perpetua-se o constrangimento ilegal, possibilitando a análise por esta Corte sem receio de indevida supressão de instância.

3. Ordem concedida. (HC 76324/RS, 6ª Turma, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJe de 29/09/2008).

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO. DECRETO DE PRISÃO PREVENTIVA CARENTE DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. AUSÊNCIA DE DADOS CONCRETOS A EMBASAR A CUSTÓDIA CAUTELAR. CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO. SUPERVENIENTE SENTENÇA CONDENATÓRIA QUE MANTÉM A PRISÃO PELAS MESMAS RAZÕES. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO DO WRIT. ORDEM CONCEDIDA.

1. "A superveniência da sentença condenatória não supre a ilegalidade, vez que o r. decisum não trouxe qualquer fundamentação adicional concreta que pudesse justificar, à luz do art. 312 do CPP, a manutenção, sob novo título, da custódia do paciente, que, antes do trânsito em julgado da condenação, permanece sob o cunho da cautelaridade e da excepcionalidade" (HC 56.137/SP, Rel. Min. FELIX FISCHER, Quinta Turma, DJ 18/12/06).

2. A prisão preventiva é medida excepcional e deve ser decretada apenas quando devidamente amparada em fatos concretos que demonstrem a presença dos requisitos legais, em observância ao princípio constitucional da presunção de inocência, sob pena de antecipar reprimenda a ser cumprida no caso de eventual condenação.

3. A decisão que decreta a prisão cautelar do acusado deve estar devidamente fundamentada em fatos concretos, que demonstrem a presença, na hipótese, dos requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal.

4. De fato, não se presta para justificar a prisão preventiva apenas a existência de indícios de autoria e a prova de materialidade, nem mesmo o juízo valorativo sobre a gravidade do delito imputado ao acusado. Tais aspectos não são suficientes para respaldar a segregação cautelar quando não se demonstra concretamente a sua necessidade.

5. A mera alusão à boa condição financeira do agente não implica presunção de descumprimento de possível sanção penal, não sendo suficiente para a manutenção da custódia cautelar fundada na hipótese de se assegurar a aplicação da lei penal.

6. Ordem concedida para revogar a prisão preventiva do paciente, determinado-se a imediata expedição de alvará de soltura em seu favor, se por outro motivo não estiver preso, mediante condições a serem estabelecidas pelo Juízo processante, sem prejuízo de que venha a ser decretada novamente a custódia cautelar, com demonstração inequívoca de sua necessidade.

Quanto ao mérito, a ordem deve ser concedida.

Da leitura do decreto prisional e do acórdão vergastado verifica-se que a medida constritiva não está fundada em dados concretos, como afirmam as instâncias ordinárias. Ao contrário, determina o encarceramento do paciente sob o fundamento de que era traficante de drogas, o que equivale dizer que todo réu ao qual se imputa referida conduta delituosa deve responder à ação penal preso preventivamente. O raciocínio leva à equívoca conclusão de que a prisão cautelar de suposto traficante de droga é a regra e sua liberdade a exceção, tese que não se coaduna com o princípio constitucional da não-culpablidade. Ademais, é incabível a manutenção do paciente no cárcere sob o argumento de que solto voltará a delinqüir, porque a afirmação constitui mera conjectura.

Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados deste Superior Tribunal de Justiça:

HABEAS CORPUS. ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE ENTORPECENTES. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. FUNDAMENTAÇÃO GENÉRICA. GRAVIDADE ABSTRATA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS CONCRETOS. ORDEM CONCEDIDA.

1 - A prisão cautelar, assim entendida aquela que antecede a condenação transitada em julgado, só pode ser imposta se evidenciada, com explícita fundamentação, a necessidade da rigorosa providência.

2 - Sendo decretada a prisão preventiva com base na gravidade abstrata do delito, ao único fundamento de que o paciente integra "uma grande e complexa organização criminosa", dissociado de elementos concretos e individualizadores da sua conduta, fica evidenciado o constrangimento ilegal.

3 - Habeas corpus concedido. (HC 113871/RJ, 6ª Turma, Rel. Min. PAULO GALLOTTI, DJe 22/06/2009)

HABEAS CORPUS. PRISÃO EM FLAGRANTE. TRÁFICO DE ENTORPECENTES E PORTE DE ARMA. GRAVIDADE GENÉRICA. REQUISITOS NÃO DEMONSTRADOS IN CONCRETO. CUSTÓDIA DESARRAZOADA.

A prisão processual deve ser configurada no caso de situações extremas, em meio a dados sopesados da experiência concreta, porquanto o instrumento posto a cargo da jurisdição reclama, antes de tudo, o respeito à liberdade.

Em razão disso, não se justifica a manutenção em cárcere daquele que pratica crime somente porque de tráfico de drogas ou de porte de arma, ou mesmo porque, genericamente, se possa extrair, a suposta gravidade da conduta.

Ordem concedida para que o acusado responda o processo em liberdade. (HC 97082/SC, 6ª Turma, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJe 29/09/2008)

AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. DIREITO PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA. DECRETAÇÃO FUNDAMENTADA EM MERAS CONJECTURAS E NA GRAVIDADE DO DELITO. NECESSIDADE DA CUSTÓDIA CAUTELAR NÃO DEMONSTRADA. PRECEDENTES. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Reiteradas vezes este Tribunal tem entendido que não se justifica a prisão ante a simples menção à periculosidade do agente pela prática de um crime considerado grave, porquanto a gravidade abstrata do delito, por si só, não pode afastar a presunção de não-culpabilidade considerada pelo legislador constituinte em favor de todo e qualquer réu, até que transite em julgado eventual decisão condenatória. Precedentes.

2. A sentença condenatória somente constitui novo título judicial se oferecer novos fundamentos à manutenção da prisão cautelar do paciente.

3. Agravo a que se nega provimento.(AgRg no HC 105004/RS, 6ª Turma, Rel. Desembargadora Convoacada do TJ/MG JANE SILVA, DJe 13/10/2008)

Justamente por tais motivos também é inidôneo o argumento do acórdão hostilizado no sentido de que a concessão da liberdade provisória ao paciente é obstada pelo teor do art. 44 da Lei nº 11.343/06. A 6ª Turma desta Corte tem firmado o entendimento segundo o qual, ainda que se trate de delito de tráfico, a Lei nº 11.464/2007, ao suprimir a vedação à liberdade provisória nos crimes hediondos do artigo 2º, II, da Lei nº 8.072/1990, adequou a lei infraconstitucional ao texto da Carta Política de 1988, sendo inadmissível a manutenção do acusado no cárcere, quando não demonstrados os requisitos autorizadores de sua prisão preventiva.

Sobre o tema, citam-se os seguintes julgados assim ementados, in verbis:

PROCESSUAL PENAL - HABEAS CORPUS - TRÁFICO DE ENTORPECENTES - LIBERDADE PROVISÓRIA - GRAVIDADE ABSTRATA DO CRIME E VEDAÇÃO CONSTANTE DO ART. 44 DA LEI Nº 11.343/06 - ARGUMENTAÇÃO INIDÔNEA - NECESSIDADE DE FUNDAMENTAÇÃO EM DADOS CONCRETOS E DEMONSTRAÇÃO DOS REQUISITOS DA PREVENTIVA. SUPERVENIÊNCIA DE SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA - INEXISTÊNCIA DE MOTIVAÇÃO EM DADO CONCRETO - AUSÊNCIA DE PREJUÍZO DO WRIT - NEGATIVA DE RECORRER EM LIBERDADE - NATUREZA DO DELITO QUE, POR SI SÓ, NÃO É APTA A EMBASÁ-LO - RÉ AGRACIADA COM A REDUÇÃO DO ART. 33, §4º DA LEI 11.343/2006 - PRIMARIEDADE E BONS ANTECEDENTES RECONHECIDOS - POSSIBILIDADE DE RECORRER EM LIBERDADE (ART. 59 DA LEI Nº 11.343/06) - ACUSADA QUE PERMANECEU SEGREGADA DURANTE TODO O DECORRER DO PROCESSO - FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA - ORDEM CONCEDIDA.

1. A gravidade abstrata do delito, bem com a vedação de liberdade provisória constante da Lei nº 11.343/06, sem a demonstração de fator concreto, não constituem fundamentação idônea para a segregação cautelar da paciente.

2. A superveniência de sentença penal condenatória não impede o conhecimento do habeas corpus quando ausente a demonstração de dados suficientes a justificarem a adoção da medida extrema.

3. Mostrando-se a paciente primária e possuidora de bons antecedentes, merecedora, inclusive, da minorante prevista no artigo 33, §4º da Lei 11.343/2006, não há nenhuma vedação legal ao apelo em liberdade, pois o artigo 59 do mencionado diploma legal é claro ao assim dispor.

4. O simples fato de a ré ter respondido à ação penal provisoriamente constrita não enseja automaticamente à vedação de recorrer em liberdade, sob pena de afronta à garantia constitucional da presunção de não-culpabilidade, devendo a medida constritiva ser justificada com base nos requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal.

5. Ordem concedida. (HC 124757/SP, 6ª Turma, Rel. Desembargador Convoacado do TJ/SP CELSO LIMONGI, DJe 25/05/2009)

PROCESSUAL PENAL - RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS - TRÁFICO DE DROGAS - PRISÃO EM FLAGRANTE DELITO - LIBERDADE PROVISÓRIA - RESGUARDO DA ORDEM PÚBLICA - GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO - REPERCUSSÃO SOCIAL - ANTECIPAÇÃO DO CUMPRIMENTO DA REPRIMENDA - AFRONTA À GARANTIA CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE NÃO-CULPABILIDADE - PEQUENA QUANTIDADE DE DROGAS - TRINTA E UM INVÓLUCROS DE MACONHA - IMPOSSIBILIDADE DE COMPARAÇÃO COM OS GRANDES TRAFICANTES QUE ASSOLAM O PAÍS - VEDAÇÃO LEGAL - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO PROVIDO.

1. A gravidade abstrata do delito atribuído ao agente é insuficiente para a manutenção de sua prisão provisória, sob pena de afronta à garantia constitucional de presunção de não-culpabilidade. Precedentes.

2. Da mesma forma, a invocação da repercussão social do delito não se presta para a justificação da constrição cautelar, sob pena de antecipação do cumprimento da reprimenda, vedada pelo ordenamento jurídico pátrio, notadamente quando a quantidade de drogas encontrada em poder dos agentes não se mostra expressiva. Precedentes.

3. Unicamente a vedação legal contida no artigo 44 da Lei 11.343/2006 é insuficiente para o indeferimento da liberdade provisória, notadamente em face da edição da Lei 11.464/2007, posterior e geral em relação a todo e qualquer crime hediondo e/ou assemelhado. Precedentes.

4. Dado provimento ao recurso para deferir ao recorrente os benefícios da liberdade provisória. (RHC 24349/MG, 6ª Turma, Rel. Desembargadora Convoacada do TJ/MG JANE SILVA, DJe 25/05/2009).

Posto isso, diante do decreto prisional que se pauta na gravidade abstrata do delito, de forma dissociada dos dados concretos dos autos, concedo a ordem para determinar a expedição de alvará de soltura clausulado em favor do paciente, concedendo-lhe o direito de responder a ação penal em liberdade.

É como voto.

VOTO-VENCIDO

O SENHOR MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE): Senhor Presidente, peço vênia ao Sr. Ministro Relator para discrepar do seu voto, tendo em vista que o meu entendimento já foi externado. Penso que o óbice à concessão da liberdade provisória para os acusados da prática dos delitos de tráfico de drogas presos em flagrante, previsto no artigo 44 da Lei nº 11.343/2006, é motivo bastante para o indeferimento da benesse, sendo irrelevante, portanto, eventual discussão acerca da existência ou não de fundamentação da decisão a esse respeito.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEXTA TURMA

Número Registro: 2009/0028511-0 HC 128820 / MG

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 10000084819234 428080108882

EM MESA JULGADO: 20/08/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP)

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NILSON NAVES

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. JOÃO FRANCISCO SOBRINHO

Secretário
Bel. RONALDO FRANCHE AMORIM (em substituição)

AUTUAÇÃO

IMPETRANTE: LUCIANO CAETANO ALVES

ADVOGADO: LEONARDO CARVALHO CARREIRA - DEFENSOR PÚBLICO

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

PACIENTE: LUCIANO CAETANO ALVES (PRESO)

ASSUNTO: Penal - Leis Extravagantes - Crimes de Tráfico e Uso de Entorpecentes - Tráfico

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEXTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"Após o voto do Sr. Ministro Relator concedendo a ordem, no que foi acompanhado pelo Sr. Ministro Nilson Naves, e do voto do Sr. Mininistro Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE) denegando-a, pediu vista a Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Aguarda o Sr. Ministro Og Fernandes."

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 20 de agosto de 2009

RONALDO FRANCHE AMORIM (em substituição)
Secretário

VOTO-VISTA

MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA:

Pretende-se, no presente habeas corpus, a revogação da prisão preventiva imposta ao paciente, condenado por tráfico de drogas (100 g de cocaína) e associação para o tráfico, afirmando que a decisão carece da necessária fundamentação.

O relator, Ministro Celso Limongi, concede a ordem, sendo acompanhado pelo Ministro Nilson Naves. O Ministro Haroldo Rodrigues divergiu, denegando a ordem.

Pedi vista dos autos para uma análise mais detida.

Constou do decreto prisional (fls. 15/20):

Pelas características do crime, a prisão do representado garante a ordem pública na medida em que os indícios indicam sua participação para o serviço do tráfico instalado nesta comunidade.

(...)

Conforme se vê dos autos, o representado, ora denunciado Luciano Caetano Alves, é traficante na cidade de Monte Alegre de Minas/MG.

Assim, a custódia cautelar do representado, ora denunciado Luciano Caetano Alves, resguardará a sociedade do risco de que em liberdade possa contribuir para o fomento de tal prática delituosa, causadora de tantos malefícios.

(...)

Ademais, conforme se vê dos autos, o representado, ora denunciado Luciano Caetano Alves, é conhecido como traficante na cidade de Monte Alegre de Minas/MG, e já vinha sendo investigado pela autoridade policial por envolvimento no tráfico ilícito de drogas na comarca.

Tem-se que a repercussão social e a periculosidade do representado, ora denunciado Luciano Caetano Alves, facilmente verificadas na espécie, provoca protestos e consternação da sociedade, denotando, assim, a necessidade de sua custódia cautelar, para resguardar a ordem pública.

Desta forma, não se pode tolerar atitudes envolvendo o derramamento de drogas entre habitantes na cidade de Monte Alegre de Minas/MG, na sua maioria jovens, notadamente porque a sociedade tem diante de si, bem visível, a enormidade dos malefícios que esse comércio e as atitudes irresponsáveis dos que com ele se envolvem representa em danos sociais.

Fora isso, observa-se que o pedido de prisão preventiva do representado Luciano Caetano Alves está revestido de legalidade, e que ainda está amparado no parecer do Ministério Público.

Dessa forma, ainda que seja o representando primário, de bons antecedentes e domicílio certo, não têm tais requisitos, pela sua própria existência, o condão de impossibilitar a prisão cautelar, principalmente se se levar em conta o delito de que teria participado. (...)

Portanto, o pedido de prisão preventiva do denunciado Luciano Caetano Alves e o parecer ministerial estão muito bem feitos, mostrando a existência de indícios suficientes de autoria e materialidade dos fatos, apresentando-se a prisão cautelar como necessária para a garantia da ordem pública.

Fundamenta-se, pois, a prisão preventiva, nos termos dos artigos 311 e 312 do Código de Processo Penal, para garantir a ordem pública.

O paciente foi condenado a 8 anos de reclusão (5 anos pelo tráfico e 3 anos pela associação), fixadas as penas-bases no mínimo legal, sendo reconhecida sua primariedade. Foi negado a ele o direito de recorrer em liberdade sem qualquer fundamentação. A sentença foi proferida em janeiro do ano em curso e apelação ainda não foi julgada.

Os fundamentos utilizados pelo magistrado a quo no decreto prisional, como visto, são genéricos e resumem-se basicamente à afirmação de que o paciente "é traficante". Ressalta o Juiz, de forma geral, os malefícios e a repercussão do delito de tráfico, sem apontar qualquer circunstância concreta que demonstre a presença dos requisitos previstos no art. 312 do Código de Processo Penal.

Assim, por entender evidenciado o constrangimento ilegal, acompanho o relator e concedo o habeas corpus.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEXTA TURMA

Número Registro: 2009/0028511-0 HC 128820 / MG

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 10000084819234 428080108882

EM MESA JULGADO: 15/09/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP)

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NILSON NAVES

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. EITEL SANTIAGO DE BRITO PEREIRA

Secretário
Bel. ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA

AUTUAÇÃO

IMPETRANTE: LUCIANO CAETANO ALVES

ADVOGADO: LEONARDO CARVALHO CARREIRA - DEFENSOR PÚBLICO

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

PACIENTE: LUCIANO CAETANO ALVES (PRESO)

ASSUNTO: Penal - Leis Extravagantes - Crimes de Tráfico e Uso de Entorpecentes - Tráfico

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEXTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"Prosseguindo no julgamento após o voto-vista da Sra. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, acompanhando o voto do Sr. Ministro Relator, A Turma, por maioria, concedeu a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Vencido o Sr. Ministro Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), que a denegava."

Os Srs. Ministros Nilson Naves e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Og Fernandes.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 15 de setembro de 2009

ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA
Secretário

Documento: 906206

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 26/10/2009




JURID - Habeas corpus. Processo penal. Prisão preventiva. [03/11/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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