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terça-feira, 10 de novembro de 2009

JURID - Tentativa de homicídio qualificado. Motivo torpe. Pronúncia. [10/11/09] - Jurisprudência


Tentativa de homicídio qualificado. Motivo torpe. Pronúncia. Recurso em sentido estrito.
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Tribunal de Justiça do Distrito Federal e seus Territórios - TJDFT.

Órgão 1ª Turma Criminal

Recurso em Sentido Estrito 20070310082662RSE

Recorrente(s) ANTÔNIA CELMA DE OLIVEIRA LIMA

Recorrido(s) MINISTÉRIO PÚBLICO DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS

Relator Desembargador EDSON ALFREDO SMANIOTTO

Acórdão Nº 382.660

E M E N T A

PENAL E PROCESSUAL PENAL. TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO. MOTIVO TORPE. PRONÚNCIA. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. AUSÊNCIA DE ANIMUS NECANDI. DÚVIDA QUE COMPETE AO JÚRI RESOLVER. EXCLUSÃO DE QUALIFICADORA NÃO ABSOLUTAMENTE DESCABIDA. NÃO PROVIMENTO.

1. Havendo dúvida quanto ao elemento subjetivo que animava a ré, que abandonou filho recém nascido no lixo, cumpre aos jurados decidir, ficando dependentes dessa decisão as teses de atipicidade, erro de tipo, homicídio culposo e infanticídio tentado.

2. Cabe aos jurados decidir se a vergonha sentida pela mulher por ter engravidado enquanto solteira, ou o medo de perder o namorado pela descoberta da gravidez, denotam a torpeza vislumbrada pelo Ministério Público na denúncia.

3. Recurso não provido.

A C Ó R D Ã O

Acordam os Senhores Desembargadores da 1ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, EDSON ALFREDO SMANIOTTO - Relator, GEORGE LOPES LEITE - Vogal, SANDRA DE SANTIS - Vogal, sob a Presidência da Senhora Desembargadora SANDRA DE SANTIS, em proferir a seguinte decisão: DESPROVER. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 10 de setembro de 2009

Certificado nº: 43 BF EC 29 00 04 00 00 0B 83

09/10/2009 - 16:13

Desembargador EDSON ALFREDO SMANIOTTO
Relator

R E L A T Ó R I O

ANTÔNIA CELMA DE OLIVEIRA LIMA, devidamente qualificada nos autos, foi denunciada pelo Ministério Público como incursa nas penas do art. 121, § 2°, I, c/c art. 14, II, do Código Penal, asseverando a denúncia e o respectivo aditamento o seguinte:

"No dia 02 de abril de 2007, por volta das 20 horas, na QNN 21, Conjunto L, em frente à casa 28, Ceilândia/DF, a denunciada, de forma livre e consciente, com intenção de matar, colocou sua filha recém-nascida em um saco plástico, acondicionou-o dentro de um saco de lixo e o colocou em uma lixeira localizada em frente ao lote em que reside, somente não consumando seu intento homicida por circunstâncias alheias à sua vontade.

Conforme consta do procedimento investigatório em anexo, na manhã do dia do crime a denunciada, sozinha no interior de sua residência, entrou em trabalho de parto e deu a luz à criança do sexo feminino referida nos relatórios médicos de fls. 35/37.

Por volta das 20 horas a denunciada colocou a criança dentro de um saco plástico e este dentro de um saco de lixo maior, e em seguida o deixou em uma lixeira localizada em frente ao lote em que reside, saindo do local em seguida.

Assim agindo, a denunciada iniciou a execução de um crime de homicídio que somente não se consumou por circunstâncias alheias à sua vontade, pois um vizinho ouviu o choro da criança e abriu os sacos plásticos em que ela se encontrava, o que permitiu que ela recebesse eficiente socorro médico..."

(...).

"O crime foi praticado por motivo torpe, porque a denunciada pretendia esconder a gravidez dos pais, como esconder do namorado que o filho que esperava era de um relacionamento anterior.

O crime foi praticado contra menor de 14 anos e ainda contra descendente".

Após regular trâmite, sobreveio a decisão de fls. 194/201, que pronunciou a ré nos termos da exordial, determinando que seja submetida a Júri Popular.

Irresignada, a ré interpõe o presente recurso em sentido estrito (fls. 202/215), no qual alega, alternativamente, o seguinte: que a sua conduta é atípica e, portanto, cabível a absolvição sumária, pois acreditava sinceramente que a criança já estava morta quando a abandonou; que, pela mesma razão, incorreu em erro de tipo, daí ser cabível ao menos a desclassificação para homicídio culposo; que cabe invocar também a desclassificação para tentativa de infanticídio, pois presentes as suas elementares, ainda que ausente o laudo acerca do estado puerperal, pois este é presumido nas circunstâncias do fato; que ao menos deve ser expungida da pronúncia a qualificadora do motivo torpe.

O Ministério Público apresentou contra-razões às fls. 217/222, prestigiando a r. decisão recorrida.

Pela decisão de fls. 225/229, a pronúncia foi mantida por seus próprios fundamentos.

Às fls. 241/243, determinei a instauração de incidente de insanidade mental (autos em apenso).

A d. Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e não provimento do recurso (fls. 264/269).

É o relatório.

V O T O S

O Senhor Desembargador EDSON ALFREDO SMANIOTTO - Relator

Conheço do recurso.

Cuida-se de recurso em sentido estrito interposto pela Defesa contra decisão proferida às 194/201 pelo Dr. Gilmar Rodrigues da Silva, MM. Juiz de Direito do Tribunal do Júri da Circunscrição Judiciária de Ceilândia/DF, consistente em pronunciar ANTÔNIA CELMA DE OLIVEIRA LIMA nas penas do artigo 121, § 2º, I, do Código Penal (tentativa de homicídio qualificado por motivo torpe).

Esclareço desde logo que o laudo pericial em apenso concluiu que a recorrente, à época dos fatos, não apresentava nenhum transtorno mental que afetasse sua capacidade de entendimento ou de determinação (fl. 86).

Não há controvérsia quanto à materialidade do delito, a qual vem confirmada por diversos laudos periciais (v.g., fls. 26, 27, 88/109 e 133). A autoria, por sua vez, é admitida pela recorrente, com a ressalva de que acreditava que a infante nascera morta.

Duvidosa a alegação da ré de que acreditava sinceramente que a criança já estava morta quando a abandonou no lixo, e que, portanto, não agiu imbuída de animus necandi. Sendo a questão duvidosa, somente poderá ser deslindada pelo Tribunal competente, que no caso é o júri.

Excluída por ora essa assertiva - de que a ré tinha certeza que a criança já estava morta - ficam prejudicados os três primeiros pedidos do requisitório defensivo.

Portanto, hei por bem rejeitá-los também, valendo-me para tanto dos argumentos monocráticos, que peço vênia para adotar e transcrever ipsis litteris:

"Vejamos. A ré aduziu, em juízo, que '... por volta de onze horas a interrogando deu a luz a criança; que desde que nasceu a criança não deu qualquer sinal de vida... que ao anoitecer a interroganda acondicionou a criança num saco plástico e a colocou em uma calçada em frente à sua casa...' (fls. 68).

A testemunha IRAN CAVALCANTI DE ARAÚJO MONTEIRO esclareceu que '... a princípio a acusada não admitiu a prática do fato; que depois, diante das evidências acabou admitindo o ocorrido...' (fls. 121).

BARTOLOMEU PINHEIRO DE SOUZA, às fls. 123, informou que ...a princípio a acusada negou o fato, mas depois acabou admitindo a prática do ato...'.

As demais provas carreadas aos autos não infirmam os indícios de autoria.

Verifico, dessa forma, a presença dos requisitos necessários para a sentença de pronúncia, quais sejam, certeza da existência de crime e indícios suficientes de autoria.

Por outro lado, as teses articuladas pela Defesa não foram inequivocamente comprovadas, restando impossibilitada a sua admissão pelo juiz da pronúncia.

Considerando que a presente fase processual norteia-se pelo princípio segundo o qual qualquer dúvida existente deve ser interpretada a favor da sociedade, não prevalecendo o brocardo in dubio pro reo, impende remeter os autos para apreciação por parte do Conselho de Sentença, a quem incumbirá, após a amplitude dos debates e o aprofundado exame da prova, dirimir as dúvidas que permeiam o presente caso, apreciando as teses levantadas pela nobre Defesa.

A alegação de que a ré acreditava que sua filha estava morta deve ser submetida aos senhores jurados, eis que a recém-nascida foi encontrada com inequívocos sinais vitais, havendo, assim, duas versões sobre esse ponto.

O mesmo se diga com relação à tese de infanticídio, haja vista que a prova não foi uníssona no sentido de que a ré agiu em estado puerperal.

Nesse ponto, é importante ressaltar que a Defesa, em nenhum momento, se manifestou pela realização de prova pericial objetivando o reconhecimento do estado puerperal da acusada, de modo que não cabe, agora, querer responsabilizar o Estado pela ausência dessa prova.

Não é demais registrar que, com relação ao acolhimento, pelo juiz singular, na fase da pronúncia, das teses apresentadas pela Defesa, a orientação jurisprudencial é que somente pode ocorrer se estiverem comprovadas às escâncaras, não pairando sobre elas qualquer dúvida. Caso contrário, devem as mesmas ser analisadas pelo Tribunal do Júri."

Em suma, as teses de atipicidade, erro de tipo, homicídio culposo e infanticídio tentado dependem, todas elas, do esclarecimento acerca do elemento subjetivo que animava a ré no momento dos fatos, cabendo aos jurados, por força constitucional, esclarecer essa dúvida.

Quanto ao tema da manutenção da qualificadora prevista no inciso I do § 2º do art. 121 do Código Penal, melhor sorte não socorre a Defesa.

A princípio, entendo que, em tese, a pronúncia é momento processual apto a talhar eventual excesso de acusação.

Assevera a decisão recorrida que o crime se caracteriza pelo motivo torpe, em tese, pois os depoimentos de fls. 69, 121/122 e 123/124 dão conta de que a ré fez o que fez porque temia que André, seu namorado, descobrisse que o infante não era filho dele (fl. 69); que estava com vergonha da família, pois já tinha vindo grávida do Maranhão (fls. 121/122); e, finalmente, que tinha medo de perder o namorado (fls. 123/124).

Ora, somente os jurados poderão dizer se tais motivos denotam torpeza, isto é, aquele motivo abjeto, imoral, que revela a extraordinária vileza de seu autor, a ponto de situá-lo no nível mais baixo da escala repulsiva.

Não se deve confundir o ato criminoso em si com os motivos que levam o agente a cometê-lo. O ato de abandonar no lixo um filho recém-nascido é, ele sim, torpe, mas o motivo que leva uma mãe a fazer isso pode ou não ser torpe, cabendo ao júri deliberar.

In casu, só os jurados têm competência para decidir se algum dos motivos elencados pelo MP são torpes.

Assim, desde que a qualificadora não se revele de todo descabida, hei por bem mantê-la na pronúncia.

Com essas considerações, nego parcialmente ao recurso.

É o voto.

O Senhor Desembargador GEORGE LOPES LEITE - Vogal

Com o Relator.

A Senhora Desembargadora SANDRA DE SANTIS - Vogal

Com o Relator.

D E C I S Ã O

DESPROVER. UNÂNIME.

Publicado em 27/10/09




JURID - Tentativa de homicídio qualificado. Motivo torpe. Pronúncia. [10/11/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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