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terça-feira, 3 de novembro de 2009

JURID - Habeas corpus. Transporte de matéria-prima. [03/11/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Transporte de matéria-prima destinada ao aumento de quantidade e volume de drogas (lidocaína e cafeína).


Superior Tribunal de Justiça - STJ.

HABEAS CORPUS Nº 45.003 - SP (2005/0100081-5)

RELATOR: MINISTRO OG FERNANDES

IMPETRANTE: JOÃO MANOEL ARMÔA

IMPETRADO: OITAVA CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE: ANTÔNIO NASCIMENTO ALVES

EMENTA

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. TRANSPORTE DE MATÉRIA-PRIMA DESTINADA AO AUMENTO DE QUANTIDADE E VOLUME DE DROGAS (LIDOCAÍNA E CAFEÍNA). ART. 12, § 1º, LEI Nº 6.368/76. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. IMPOSSIBILIDADE. ATIPICIDADE DA CONDUTA. DESCABIMENTO. SUPERVENIÊNCIA DE DECISÃO CONDENATÓRIA TRANSITADA EM JULGADO. REVOLVIMENTO DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE.

1.Para os fins do inciso I do § 1º do art. 12 da Lei nº 6.368/76, a expressão "matéria-prima" abrange não só as substâncias destinadas exclusivamente à preparação de drogas, mas também aquelas que, eventualmente, se prestam a esse objetivo. Precedentes.

2.Não há falar em trancamento da ação penal por atipicidade da conduta se o paciente foi preso, em flagrante, ao trazer consigo lidocaína e cafeína, matérias-primas comumente destinadas ao aumento de quantidade e volume de substância entorpecente, conforme o previsto pelo art. 12, § 1º, da Lei nº 6.368/76 (revogada pela Lei nº 11.343/06).

3.A possibilidade de as substâncias apreendidas se destinarem, ou não, ao preparo de entorpecente é matéria que exigiria um aprofundado exame da prova, o que é vedado nos contornos estreitos do habeas corpus, ainda mais se já houve o trânsito em julgado da sentença condenatória superveniente, contra a qual a defesa não se insurgiu.

4.Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), concedendo em parte a ordem de habeas corpus, sendo acompanhado pelo Sr. Ministro Nilson Naves e dos votos dos Srs. Ministros Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE) e Maria Thereza de Assis Moura, acompanhando o voto do Sr. Ministro Relator, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, denegar a ordem de habeas corpus nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, vencidos os Srs. Ministros Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP) e Nilson Naves. Os Srs. Ministros Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE) e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 17 de setembro de 2009 (data do julgamento).

MINISTRO OG FERNANDES
Relator

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO OG FERNANDES: Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, com pedido de liminar, impetrado em favor de Antônio Nascimento Alves contra acórdão proferido pela Oitava Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que denegou outra ordem ali impetrada.

Consta dos autos que o paciente, juntamente com outras pessoas, foi denunciado pela suposta prática dos crimes previstos nos arts. 12, § 1º, e 14, ambos da Lei nº 6.368/76.

Alega o impetrante, em síntese, que não foi apreendido com o paciente nenhum entorpecente, pleiteando, ao final, o trancamento da ação penal.

Às fls. 263/264, a liminar foi indeferida pelo então Relator, Ministro Hamilton Carvalhido.

O Subprocurador-Geral da República Brasilino Pereira dos Santos opinou pela denegação da ordem, em parecer assim ementado:

HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. PEDIDO DE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. ALEGAÇÃO DE ATIPICIDADE DA CONDUTA. PACIENTE DENUNCIADO COMO INCURSO NOS ARTS. 12, § 1º, I E 14, AMBOS DA LEI Nº 6.368/76. OS LAUDOS PERICIAIS CONCLUÍRAM QUE AS SUBSTÂNCIAS TRAZIDAS PELO ACUSADO NÃO ERAM COCAÍNA, MAS SIM CAFEÍNA E LIDOCAÍNA, QUE SÃO DESTINADAS À PREPARAÇÃO DE SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE, CONDUTA TIPIFICADA NO ART. 12, § 1º, I DA LEI Nº 6.368/76. PARECER PELA DENEGAÇÃO DA ORDEM (FL. 318).

Atribuído o feito em 10/7/08, vieram-me conclusos os autos.

Segundo informações prestadas pela Vara Criminal da Comarca de Caieiras/SP, sobreveio sentença, em 20/6/07, que absolveu o paciente da acusação de associação para o tráfico e o condenou, pela prática do crime previsto no art. 12, § 1º, da Lei nº 6.368/76, à pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, a ser cumprida inicialmente no regime fechado, somada ao pagamento de 58 (cinquenta e oito) dias-multa.

Também informou aquele Juízo, em Certidão de Objeto e Pé encaminhada a esta Corte via fac-símile, que, verbis:

Situação processual: autos em cartório aguardando a prisão do sentenciado, sendo que o mesmo foi condenado às penas de 03 anos e 06 meses de reclusão em regime fechado e ao pagamento de 58 dias-multa, no valor de 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos.

Ressalto que o sentenciado foi preso em flagrante aos 12/07/2004 e, por decisão proferida em 17 de maio de 2005, pelo E. Tribunal de Justiça de São Paulo foi-lhe concedida a ordem de Habeas Corpus.

O sentenciado foi intimado da sentença proferida por edital e, com o trânsito em julgado, foi expedido mandado de prisão para cumprimento da pena.

Em 21/5/2008, ocorreu o trânsito em julgado para a defesa.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO OG FERNANDES (Relator): O acórdão impugnado assim se fundamentou para denegar a ordem ali impetrada, verbis:

(...) Pretende o impetrante o trancamento da ação penal intentada contra o paciente Antonio Nascimento Alves sustentando atipicidade de sua conduta, tendo em vista que nenhuma substância proibida foi apreendida com o mesmo. O laudo químico-toxicológico foi taxativo. Não se tratando de entorpecentes a conduta do paciente é atípica.

Contudo, a matéria enfocada na impetração não é tão simples quanto o enfoque dado pelo ilustre Advogado impetrante.

É típica a conduta não só de realizar as ações físicas descritas no caput do art. 12 da Lei nº 6.368/76, envolvendo matéria prima destinada à preparação das mesmas substâncias entorpecentes ou que determinem dependência.

A hipótese dos autos é a última ventilada, daí porque, necessariamente, a substância apreendida não poderia ser mesmo entorpecente, que seria a primeira hipótese.

Na hipótese em exame o laudo de constatação de fls. 31, já oferecia resultado negativo para cocaína para o item "a". Tal resultado foi confirmado pelo exame químico-toxicológico de fls. 130.

Por outro lado, em diligência, os peritos que elaboraram o laudo definitivo esclareceram às fls. 133 que as substâncias apreendidas com o acusado (cafeína e lidocaína) são normalmente detectadas nas análises realizadas para constatação de substância entorpecente, especificamente cocaína.

Superficialmente não se pode dizer que a conduta do paciente em trazer consigo lidocaína e cafeína seja atípica de molde a justificar o trancamento da ação penal.

A ação penal deve prosseguir para a apuração e análise aprofundada dos fatos.

CONHECE-SE PARCIALMENTE DA IMPETRAÇÃO E DENEGA-SE A ORDEM (fls. 246/247).

Verifica-se, de início, que a acusação que pesa sobre o ora paciente não é a de tráfico de drogas - conduta prevista no caput do art. 12, da Lei nº 6.368/76, mas aquela trazida pelo § 1º do mesmo dispositivo, segundo a qual:

Art. 12. Importar ou exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda ou oferecer, fornecer ainda que gratuitamente, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar ou entregar, de qualquer forma, a consumo substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:

Pena - reclusão, de 3 (três) a 15 (quinze) anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 360 (trezentos e sessenta) dias-multa.

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem, indevidamente:

I - importa ou exporta, remete, produz, fábrica, adquire, vende, expõe à venda ou oferece, fornece ainda que gratuitamente, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda matéria-prima destinada a preparação de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica;

II - semeia, cultiva ou faz a colheita de plantas destinadas à preparação de entorpecente ou de substância que determine dependência física ou psíquica (com destaques).

As substâncias apreendidas com o paciente - lidocaína e cafeína -, conforme se depreende da análise dos autos, são utilizadas para aumentar a quantidade e volume da cocaína.

O tema deste writ gira em torno de ser tal apreensão apta a embasar a acusação, aliada às demais provas dos autos - que incluem escutas telefônicas autorizadas judicialmente e depoimento de testemunhas.

Vale lembrar que sobreveio sentença, cuja cópia foi encaminhada a esta Corte pela Juízo de origem, e que tal decisão já transitou em julgado. Nela se consignou o seguinte:

Assim, o conjunto probatório é firme no sentido de que os réus guardavam e traziam com eles grande quantidade de matéria-prima destinada ao preparo de cocaína, preenchendo o núcleo do tipo legal do parágrafo primeiro do artigo 12 da Lei 6.368/76.

A convicção quanto à destinação das substâncias encontradas com os réus é gerada pelas degravações das conversas telefônicas existentes nos autos. Os diálogos captados fazem expressa referência ao tráfico de drogas, ao mencionarem os termos 'rocha', 'mercadoria' e 'biqueira' (fls. 125/132).

Saliente-se que as escutas telefônicas foram feitas de maneira lícita, tendo sido seu conteúdo confirmado pelas testemunhas em juízo.

Doutra parte, não prospera a tese defensiva segundo a qual o delito é inexistente, vez que os acusados não portavam nem vendiam qualquer tipo de droga listada na portaria do Serviço de Vigilância Sanitária. Isso porque, consoante aditamento da denúncia, os réus estão sendo processados pela Lei 6.368/76, e não pelo seu caput. E a diferença entre os tipos legais do caput e do parágrafo primeiro reside justamente na circunstância de que no segundo caso é punível a posse e guarda e matéria-prima destinada à preparação de substância entorpecente. À evidência, matéria-prima não se confunde com a própria substância.

Nesse sentido, lecionam Alexandre de Moraes e Gianpaollo Smanio:

(...) Matéria-prima é a substância de que podem ser extraídos ou produzidos entorpecentes ou drogas que causem dependência física ou psíquica, independentemente de terem os efeitos farmacológicos das substâncias a serem produzidas. Dessa forma, conforme salienta o Supremo Tribunal Federal, é inócua a indagação de estarem não o éter ou a acetona incluídos na lista de substâncias entorpecentes, pois a tipificação do delito se dá por ter o agente utilizado tais substâncias para o refino de cocaína, e não por serem elas substâncias entorpecentes. Saliente-se, ainda, que para os efeitos da Lei n.º 6.368/76, serão consideradas como matéria-prima, tanto as substâncias destinadas exclusivamente à preparação de drogas quanto as substâncias que, apesar de terem outras finalidades, eventualmente estejam sendo utilizadas com esse intuito ilícito. Obviamente, em relação às substâncias eventualmente utilizadas como matéria-prima destinada à preparação de substância entorpecente, há a necessidade de comprovação de sua destinação criminosa, como, por exemplo, a apreensão de grande quantidade aliada a ausência de prova de sua procedência e inexistência de indicação quanto a sua destinação (...).

No caso em tela, incontroverso que as substâncias encontradas com os réus não eram consideradas entorpecentes, tanto assim que a denúncia foi aditada após o resultado negativo do laudo pericial. Assim, de nada aproveitou aos réus arrolar como testemunha médico veterinário, pois ele apenas veio asseverar ponto indiscutível nos autos.

Assim, embora as substâncias encontradas com os réus possam ter outras finalidades, certo é que também se prestam ao 'batismo' de entorpecentes, consoante indicado no laudo de fls. 314. Na hipótese, os réus não apresentaram qualquer justificativa para portarem e guardarem tão grande quantidade daquelas substâncias. Não apontaram a destinação delas, e sequer alegaram exercer qualquer tipo de trabalho no qual sejam utilizadas as substâncias.

Portanto, a posse injustificada das substâncias, aliada ao conteúdo das conversas telefônicas atinentes ao tráfico de drogas, é suficiente para que se possa concluir pela destinação das substâncias à preparação de drogas, completando-se o tipo penal do parágrafo primeiro do artigo 12 da Lei 6.368/76 (destaques).

Convém salientar que o paciente foi preso em flagrante, juntamente com outras duas corrés, acusados de infração ao art. 12, § 1º, inciso I, e art. 14, ambos da Lei nº 6.368/76, tendo assim se discorrido a denúncia (fls. 14/ 17):

Consta dos autos do incluso Inquérito Policial que, no dia 12 de julho de 2.004, por volta das 9 horas, na Avenida Olindo Dártora, nesta cidade, ANTÔNIO NASCIMENTO ALVES, qualificados a fls. 18, trazia consigo 993,8 g (novecentos e noventa e três gramas e oito decigramas) de pó branco, acondicionado em plástico incolor (v. auto de exibição e apreensão a fls. 15), devidamente constatado a fls. 17, matéria-prima destinada à preparação de substâncias entorpecentes, que determinam dependência física e psíquica, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar.

Consta, ainda, que, na mesma data, alguns minutos depois, no bairro do Jaraguá, cidade de São Paulo, LILIAN MATEUS FERREIRA e MÁRCIA APARECIDA GOMES DO ARAÚJO, qualificadas, respectivamente a fls. 38 e 44, guardavam e tinham em depósito para fins de comércio, 1999 g (mil novecentos e noventa e nove gramas), embalados em dois sacos plásticos incolores da substância entorpecente vulgarmente conhecida como "cocaína" (v. auto de exibição e apreensão a fls. 15), devidamente constatada a fls. 17, que determina dependência física e psíquica, sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar.

Consta, ainda, que, em abril de 2.004, Antônio, Lilian e Márcia associaram-se para o fim de praticar, reiteradamente, os delitos acima descritos.

É dos autos que policiais civis iniciaram investigações mediante interceptações telefônicas devidamente autorizadas (autos nº 050.04.024162-9), nas quais puderam constatar a existência de associação entre Antônio, Lilian e Márcia com a finalidade de comercializar entorpecentes. Antônio negociava a venda de drogas com terceiras pessoas e Lilian e Márcia eram as encarregadas de entregar as substâncias compradas e receber a quantia ajustada.

Na data dos fatos, policiais civis lograram localizar o lugar onde Antônio se encontrava e o abordaram. Em busca pela mochila roxa e verde que o acusado portava, foi encontrado saco plástico contendo pó branco utilizado para o "batismo" de substância entorpecente a ser comercializada.

Questionado, o acusado declarou que haveria droga na residência de Lilian e Márcia. Os policiais civis, então, dirigiram-se até o bairro do Jaraguá, na Capital, e em busca pela residência das acusadas, lograram encontrar dentro de uma sacola de nylon verde dois sacos plásticos incolores contendo a substância entorpecente vulgarmente conhecida por "cocaína".

Por todo o exposto, DENUNCIO à Vossa Excelência ANTÔNIO NASCIMENTO ALVES como incurso no artigo 12, § 1º, inciso I (trazer consigo) e artigo 14, ambos da Lei 6.368/76 - Lei Antitóxico, em concurso material e LILIAN MATEUS FERREIRA e MÁRCIA APARECIDA GOMES DO ARAÚJO como incursas no artigo 12, caput (guardar e ter em depósito) e artigo 14, ambos da Lei 6.368/76 - Lei Antitóxico, em concurso material (...) (com destaques).

Nesta impetração, sustenta-se a tese de atipicidade da conduta e impossibilidade de consumação do delito, uma vez que o resultado do laudo pericial foi negativo, pleiteando-se o trancamento da ação penal.

Do cotejo dos documentos acostados aos autos, especialmente o exame químico-toxicológico de fl. 132, verifica-se que as substâncias apreendidas - lidocaína e cafeína -, não causam, de fato, de per si, dependência física e/ou psíquica, não integrando o rol constante da Portaria nº 344/1998 SVS/MS (RDC 249/2002).

Todavia, em exame complementar, o perito, ao responder a requisição formulada pelo Juízo sobre se a substância apreendida com o acusado poderia ser usada como matéria prima para o "batismo" de drogas, esclareceu que:

Esclarece o Perito Relator do laudo vestibular que as substâncias apreendidas com o acusado foram detectadas como sendo "Item A: Cafeína" e "Item B: Lidocaína (e não cocaína como constou no laudo de constatação), substâncias estas que, dentre outras, são normalmente detectadas nas análises realizadas para constatação de substância entorpecente, especialmente cocaína (fl. 139, com destaques).

Como se pode constatar, com relação ao delito de posse de insumo para o preparo de entorpecentes - no caso, a lidocaína e a cafeína -, não merece acolhida a alegação de falta de justa causa necessária à persecução penal, sob o fundamento de inexistência de materialidade do delito.

O tipo penal inserto no § 1º do art. 12 da Lei nº 6.368/76 especifica a matéria-prima destinada à preparação de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, embora não se refira a substância proibida, propriamente dita.

Note-se que a expressão penal abrange, portanto, no dizer de Damásio E. de Jesus, não só as substâncias destinadas exclusivamente à preparação da droga, como as que, eventualmente, prestam-se a essa finalidade (in Lei Antitóxicos Anotada, 1995, Saraiva, pp. 37/38, com destaques).

Ademais, não se deve olvidar que a questão posta - a destinação da matéria-prima apreendida com o paciente - envolve pormenorizado reexame de prova, o que escapa aos delimitados contornos do habeas corpus, ainda mais quando já transitada em julgado, como na hipótese em análise.

Nesse sentido, leia-se, muito similar ao tema, o seguinte precedente desta Corte:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS substitutivo de recurso ordinário. Art. 12, § 1º, inciso I da Lei nº 6.368/76. Questões não deduzidas no egrégio Tribunal a quo.

I - "Matéria-prima", para efeito do inciso I, do § 1º do art. 12 da Lei nº 6.368/76 abrange não só as substâncias destinadas exclusivamente à preparação de drogas como, igualmente, aquelas que, eventualmente, se prestam a esse objetivo.

II - Se o material apreendido se destinava, ou não, ao preparo de entorpecente, isto exigiria um aprofundado exame da prova, o que é vedado nos estreitos limites do writ.

III - Tópicos não apreciados no e. Tribunal a quo desmerecem ser, diretamente, conhecidos.

Writ parcialmente conhecido e, nesta parte, indeferido.

(HC 5.699/RO, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 12/05/1997, DJ 01/09/1997 p. 40852, com destaques).

Também o Supremo Tribunal Federal assim decidiu sobre o tema:

ENTORPECENTES - COCAÍNA - MATÉRIA-PRIMA - ART. 12, PARAGRAFO 1., I, DA LEI 6368/76 - ETER SULFÚRICO E ACETONA, SUBSTANCIAS QUE, RECONHECIDAMENTE , SERVEM PARA O REFINO DA COCAÍNA. A EXPRESSÃO MATÉRIA-PRIMA CONSTANTE DO INCISO I DO PARAGRAFO L. DO ART. 12 DA LEI 6368/76 COMPREENDE NÃO SÓ AS SUBSTANCIAS DESTINADAS EXCLUSIVAMENTE A PREPARAÇÃO DA DROGA, COMO AS QUE, EVENTUALMENTE, SE PRESTEM A ESSA FINALIDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO, MAS IMPROVIDO.

(RE 108726, Relator(a): Min. OSCAR CORRÊA, Primeira Turma, julgado em 26/08/1986, DJ 26-09-1986 PP-17721 EMENT VOL-01434-02 PP-00429 RTJ VOL-00119-01 PP-00397, com destaques).

Ante o exposto, denego a ordem.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEXTA TURMA

Número Registro: 2005/0100081-5 HC 45003 / SP

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 1012004 1060120040023820 3982004 5171167

EM MESA JULGADO: 25/08/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro OG FERNANDES

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NILSON NAVES

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. EITEL SANTIAGO DE BRITO PEREIRA

Secretário
Bel. ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA

AUTUAÇÃO

IMPETRANTE: JOÃO MANOEL ARMÔA

IMPETRADO: OITAVA CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE: ANTÔNIO NASCIMENTO ALVES

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Previstos na Legislação Extravagante - Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas - Tráfico de Drogas e Condutas Afins

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEXTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"Após o voto do Sr. Ministro Relator denegando a ordem, pediu vista o Sr. Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP). Aguardam os Srs. Ministros Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Nilson Naves e Maria Thereza de Assis Moura."

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 25 de agosto de 2009

ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA
Secretário

VOTO-VISTA

O EXMO. SR. MINISTRO CELSO LIMONGI (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SP): O artigo 12, § 1°, da Lei 6368/76, realmente criminaliza a guarda de matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas. O paciente guardava cafeína e lidocaína, razão pela qual foi condenado como incurso nesse artigo e parágrafo da antiga Lei de Drogas.

Reclama agora contra essa condenação, sob o fundamento de que tais drogas não servem para a preparação de cocaína.

E, se possível for a este E. Superior Tribunal de Justiça analisar o acerto da decisão ora hostilizada, com nova interpretação da prova, tenho que os peritos não afirmaram peremptoriamente que tais drogas, a cafeína e a lidocaína, fossem componentes obrigatórios da cocaína.

De feito, apenas afirmaram os peritos que "...substâncias estas que, dentre outras, são normalmente detectadas nas análises realizadas para constatação de substância entorpecente, especialmente cocaína" (fls. 139).

Saliente-se que a lidocaína e a cafeína não causam dependência física ou psíquica e, por isso, não estão arroladas na Portaria n° 344/98 SVS/MS (RDC 249/2002.

Soa estranho que, não sendo sequer componentes obrigatórios para a fabricação de cocaína, sua guarda ou depósito signifique conduta tipificada pelo artigo 12, § 1°, da Lei n° 6368/76. E, segundo o perito, tais substâncias serviriam apenas para aumentar o volume da cocaína, tudo dito superficialmente, ao passo que, para um juízo de condenação, necessária e obrigatória seria a prova indiscutível da materialidade do crime, isto é, um laudo completo e fundamentado, de cuja ausência se ressentem os autos da ação penal originária.

Em consequência, meu voto, possível superar a questão relativa à reavaliação da prova, concederia em parte a ordem, para arredar apenas a condenação pelo artigo 12, § 1°, da Lei n° 6768/76, mantida a condenação pelo artigo 14 dessa lei. Tudo, com a devida vênia do eminente Relator.

Se a E. Turma considerar inviável a reavaliação da prova, meu voto acompanha o do eminente Relator.

VOTO

O SENHOR MINISTRO HAROLDO RODRIGUES (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/CE): Senhor Presidente, segundo o inciso I do art. nº 33 da Lei nº 11.343/06, define como crime de tráfico de entorpecentes também quem:

"importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto químico destinado à preparação de drogas".

No caso, segundo voto do eminente Ministro Celso Limongi, S. Exa. apenas diz que as drogas, segundo o laudo, não são alucinógenas, mas elas, segundo o Sr. Ministro Relator, foram utilizadas para a preparação de drogas alucinógenas. Assim, entendo que se trata de matéria prima, insumo, e, como tal, peço vênia ao Sr. Ministro Celso Limongi para acostar-me ao voto do Sr. Ministro Relator, tendo em vista o que dispõe, literalmente, esse inciso que acabei de ler.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

SEXTA TURMA

Número Registro: 2005/0100081-5 HC 45003 / SP

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 1012004 1060120040023820 3982004 5171167

EM MESA JULGADO: 17/09/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro OG FERNANDES

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NILSON NAVES

Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. MARIA ELIANE MENEZES DE FARIAS

Secretário
Bel. ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA

AUTUAÇÃO

IMPETRANTE: JOÃO MANOEL ARMÔA

IMPETRADO: OITAVA CÂMARA CRIMINAL DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

PACIENTE: ANTÔNIO NASCIMENTO ALVES

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Previstos na Legislação Extravagante - Crimes de Tráfico Ilícito e Uso Indevido de Drogas - Tráfico de Drogas e Condutas Afins

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia SEXTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP), concedendo em parte a ordem de habeas corpus, sendo acompanhado pelo Sr. Ministro Nilson Naves e dos votos dos Srs. Ministros Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE) e Maria Thereza de Assis Moura, acompanhando o voto do Sr. Ministro Relator, a Turma, por maioria, denegou a ordem de habeas corpus nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Vencidos os Srs. Ministros Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ/SP) e Nilson Naves."

Os Srs. Ministros Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE) e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nilson Naves.

Brasília, 17 de setembro de 2009

ELISEU AUGUSTO NUNES DE SANTANA
Secretário

Documento: 907365

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 26/10/2009




JURID - Habeas corpus. Transporte de matéria-prima. [03/11/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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