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domingo, 8 de novembro de 2009

JURID - Vítima ganha indenização. [05/11/09] - Jurisprudência


Vítima de bala perdida ganha indenização.
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PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE

JUÍZO DE DIREITO DA 4ª VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE NATAL

Processo nº 001.03.004460-0

Ação: Indenizatória

Autor: Paulo Roberto de Oliveira

Advogado: Francisco Eloilson Saldanha de Paiva

Réu: Estado do Rio Grande do Norte

Procurador:José Fernandes Diniz Júnior

S E N T E N Ç A

I - RELATÓRIO

Paulo Roberto de Oliveira
aforou ação de indenização contra o Estado do Rio Grande do Norte, objetivando condenação do demandado a reparar danos morais e materiais sofridos pelo autor em razão de bala perdida que atingiu sua cabeça em tiroteio na perseguição de policiais a bandidos.

Inicialmente, aduz que no dia 04 de dezembro de 2002, por volta das 11:00h, estava na rua São Geraldo, no bairro das Quintas, quando presenciou uma perseguição de policias a bandidos. Neste situação, acabou por levar um tiro na cabeça, ocasião em que foi socorrido de imediato pelas pessoas que se encontravam no local e foi levado para o Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel.

Alega o autor que, desde então, sua vida passou por sérios transtornos, posto não ter mais uma vida normal e a cada dia seu estado de saúde vem piorando, já que a bala não pode ser retirada de sua cabeça sem maiores comprometimentos de sua saúde, encontrando o projétil, desta forma, ainda alojado.

Esclarece o autor que tem mulher e uma filha de dois anos que tem sofrido muito, pois os gastos com medicamento aumentaram muito e com isto sua família encontra-se desesperada em razão da situação financeira, pois o autor está caminhando para uma interdição judicial por se encontrar com o raciocínio comprometido.

Fundamenta sua pretensão na jurisprudência, no Código Civil e na Constituição Federal. Requereu a condenação do demandado por danos materiais em razão das perdas diárias e futuras com o tratamento e dano moral na ordem de R$300.000,00.

Acostou documentos de fls. 06/22.

Devidamente citado, o demandado alegou, em sede de preliminar, a ilegitimidade ativa do autor para pleitear indenização para sua esposa, e, no mérito, aduziu que não há responsabilidade civil do Estado em razão do autor não ter provado que o tiro partiu da arma de algum policial.

Intimado a se manifestar sobre a contestação e preliminar, o autor refutou os argumentos de defesa e reiterou os pedidos iniciais.

O Ministério público requereu designação de audiência para oitiva das testemunhas.

Foi designada audiência para oitiva das testemunhas.

As fls. 57/59, foram juntados laudo de exame de corpo de delito e boletim de informação médico-hospitalar do ITEP.

As partes apresentaram alegações finais.

O Ministério Público emitiu parecer pela improcedência dos pedidos iniciais por ausência de nexo causal.

É o que importa relatar. Segue a decisão.

II - FUNDAMENTOS

Primeiramente, examino a preliminar de ilegitimidade ativa. O Estado do RN aduz que o autor não poderia pleitear em nome próprio direito alheio, posto aduzir que o autor busca indenização para beneficiar sua esposa. Ocorre que o autor não busca indenização para sua esposa e sim para si, tanto que pede em seu nome e não em nome da esposa a reparação. Sucede que tão somente o autor afirma, à título de argumentação, que a indenização servirá para que seus familiares e sua esposa possam amenizar o sofrimento diário que passam com toda esta situação, tendo em vista os gastos com seu tratamento, uma vez que o autor não mais trabalha e são seus familiares e esposa que custeiam o seu tratamento. Diante disto, rejeito a preliminar.

O cerne meritório da demanda está em analisar se houve comportamento danoso do Estado e se há nexo de causalidade entre o evento danoso e o dano sofrido pelo autor, diante da circunstância de bala perdida em tiroteio entre policiais e bandidos numa perseguição em via pública.

Examinando os documentos e depoimentos das testemunhas constata-se que, na verdade, houve perseguição de policiais aos bandidos e troca de tiros entre eles, não se sabendo, ao certo, se o tiro que atingiu o autor veio de armas de policiais ou dos bandidos.

Neste cenário, verifico assistir razão ao autor. A jurisprudência é pacífica, inclusive no STJ, no sentido de que nestes casos a responsabilidade do Estado é objetiva e o nexo de causalidade está no fato de que o Estado, nos casos de perseguição policial a bandidos, com troca de tiros em via pública, cria uma situação de risco (comportamento danoso) que se relaciona diretamente com o dano causado a terceiros inocentes atingidos por balas perdidas advindas deste evento, ainda que não se tenha certeza se o tiro que atingiu a vítima tenha saido de armas de policiais ou bandidos, posto que o Estado, na verdade, incrementou uma situação de risco.

O Estado-réu não pode invocar a possível licitude da conduta de seus agentes, baseando-se, principalmente, no dever de combate a criminalidade, para se desobrigar de qualquer indenização. Não se trata de um salvo-conduto para o poder público. Se a conduta comissiva do agente do Estado engendrou de forma direta ou indireta ou concorrente o resultado danoso e injusto a terceiro inocente, como no fato - espécie de bala perdida, a conduta ativa dos agentes policiais na troca de tiros com bandidos evidencia neste próprio fato o nexo de causalidade necessário à imposição da responsabilidade civil objetiva do Estado (art. 37,§ 6º da CR/88).

Ora, o que o Estado pretende é que a força se sobreponha ao direito, que os fins justifiquem os meios e que as falhas nas tarefas que lhe são próprias sejam legitimadas, sob alegações de combate a criminalidade ou estado de necessidade ou mesmo exercício de um direito ou ainda estrito cumprimento de um dever legal. Fatos que em si mesmos implicaram em sérios sofrimentos aptos a abalar não só o psiqué do autor como também de sua esposa, filha e toda família, pessoas pobres e humildes, vítimas da desigualdade em nosso País, bem como a sua honorabilidade, gerando inafastável dever de indenizar, máxime porque a Carta Federal garante a proteção da dignidade humana (art. 1º, III da CRFB/88).

Ainda que sustente que a ação policial foi lícita, esta veio a causar dano ao autor ao criar ou incrementar uma situação de risco em via pública em perseguição policial a bandidos com troca de tiros vindo a vitimar o autor, terceiro inocente, posto que, em nosso ordenamento jurídico, o ato lícito causador de dano também pode ensejar reparação. Portanto, o dano material e moral sofrido pelo autor, nestas hipóteses, é indenizável.

A jurisprudência caminha neste sentido:

RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. MENOR FERIDO POR BALA PERDIDA EM OPERAÇÃO POLICIAL. INDENIZAÇÃO DO DANO. AÇÃO DE REGRESSO CONTRA O POLICIAL FEDERAL. NÃO COMPROVAÇÃO DA AUTORIA DO DISPARO DA ARMA E DA CULPA. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. 1. O autor, menor impúbere, foi alvejado por erro no braço esquerdo por projétil disparado por arma de fogo, em favela de Belo Horizonte, local denominado Alto do Minério, durante operação ali realizada pela Polícia Federal. 2. O laudo do perito-médico do juízo constata no autor perda de função do polegar esquerdo, o qual é muito importante na função da mão, pois mão sem pinça tem pouca função. 3. A obrigação do Estado de indenizar o dano surge do ato lesivo e injusto causado ao autor. Não se exige qualquer falta do serviço público, nem culpa de seus agentes. Basta a lesão, sem o concurso da vítima. 4. Provado, no caso, o nexo de causalidade entre o fato gerador e o dano, impõe-se o ressarcimento pelo Estado desse dano. 5. Dadas as circunstâncias econômicas do autor, razoável a indenização no valor de um salário mínimo mensal, da data do evento danoso, 07/02/84, até a maioridade aos vinte e um anos, 14/08/98. 6. Litisdenunciação. O litisdenunciado não agiu com culpa (latu sensu) pois na operação policial, enquanto corria ao encalce do suspeito, foi atacado por um cão e repeliu o animal com um disparo. O projétil atingiu o menor que se encontrava perto do animal. 7. Os fatos ocorreram de forma rápida e inesperada, estando o litisdenunciado no estrito cumprimento do dever legal. 8. Não tendo havido culpa do policial, não há que indenizar a denunciante na ação de regresso. 9. Mesmo que, em hipótese, restasse comprovada a culpa do agente policial, não existe prova da autoria do disparo que, por erro, atingiu a criança. 1. Honorários de advogado devidos ao autor e ao denunciado no percentual de 10% (para cada), calculado para o primeiro sobre o valor da condenação (soma das parcelas vencidas e doze parcelas vincendas), e, para o segundo, sobre o valor da causa. 11. Remessa improvida.(TRF 1ª REGIÃO - REO 9201173474 REO - REMESSA EX OFFICIO - 9201173474)

AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANO MORAL. REDUÇÃO DO VALOR FIXADO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ NA HIPÓTESE. PRECEDENTES. ESTABELECIMENTO ESCOLAR. ALUNO. FALECIMENTO. MENOR ATINGIDA POR BALA PERDIDA. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO ESTADO. OMISSÃO. DEVER DE VIGILÂNCIA. NEXO CAUSAL PRESENTE.

I - Incide, na hipótese, o óbice sumular 7/STJ no tocante ao pedido de revisão do valor fixado pela instância ordinária a título de danos morais: 200.000,00 (duzentos mil reais) relativo ao falecimento da menor atingida por bala perdida no pátio da escola, pois, na hipótese, o mesmo não se caracteriza como ínfimo ou excessivo a possibilitar a intervenção deste eg. STJ. Precedentes: REsp n.º 681.482/MG, Rel. p/ acórdão Min. LUIZ FUX, DJ de 30/05/2005; EDcl no REsp nº 537.687/MA, Rel. Min. JORGE SCARTEZZINI, DJ de 18/09/2006; AgRg no Ag nº 727.357/RJ, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJ de 11/05/2006.

II - O nexo causal, in casu, se verifica porque o município tem o dever de guarda e vigilância, sendo responsável pelo estabelecimento escolar que, por sua vez, deve velar por seus alunos: "..o Poder Público, ao receber o menor estudante em qualquer dos estabelecimentos da rede oficial de ensino, assume o grave compromisso de velar pela preservação de sua integridade física..." (RE nº 109.615-2/RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJ de 02/08/96).

III - Presentes os pressupostos da responsabilidade subjetiva do Estado. Precedente análogo: REsp nº 819789/RS, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, DJ de 25/05/2006.

IV - Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido. (REsp 893441 / RJ)

PROCESSUAL CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. DANOS MATERIAIS E MORAIS. AÇÃO POLICIAL. PERSEGUIÇÃO EM VIA PÚBLICA. VÍTIMA ATINGIDA POR PROJÉTIL DE ARMA DE FOGO. "BALA PERDIDA". INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CONFIGURAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. SÚMULA 07. PRESCRIÇÃO. DECRETO LEGISLATIVO 20.910/32. APLICAÇÃO. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DOS ATOS LESIVOS. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. TEORIA DA CAUSA MADURA. CAUSA PETENDI. PRINCÍPIO NARRA MIHI FACTUM, DABO TIBI JUS. OFENSA À LEI REVOGADA. PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM. REVISÃO DO QUANTUM ARBITRADO PELA INSTÂNCIA A QUO. SÚMULA 07. IMPOSSIBILIDADE IN CASU. VIOLAÇÃO DO ART. 535, II, CPC. INOCORRÊNCIA.

1. Ação de indenização em face do Estado, ajuizada por vítima de disparo de arma de fogo, efetuada por policial militar, em razão de perseguição policial, objetivando indenização por danos físicos, psicológicos e estéticos.

2. O termo a quo do prazo prescricional para o ajuizamento de ação de indenização contra ato do Estado, por dano moral e material, conta-se da ciência inequívoca dos efeitos decorrentes do ato lesivo. É que a prescrição da ação indenizatória, in casu, teve como lastro inicial o momento da constatação das lesões sofridas e de suas consequências. Precedentes: (Resp. n.º 700/716/MS, DJ. 17.04.2006, REsp 742.500/RS, DJ 10.04.2006, Resp n.º 673/576/RJ, DJ. 21.03.2005, REsp 735.377/RJ, DJ 27.06.2005).

3. A pendência da incerteza acerca do reconhecimento do ato lesivo praticado pela Administração Pública impede aduzir-se à prescrição, posto instituto vinculado à inação.

4. É assente em doutrina que: "Não é toda causa de impossibilidade de agir que impede a prescrição, como faz presumir essa máxima, mas somente aquelas causas que se fundam em motivo de ordem jurídica, porque o direito não pode contrapor-se ao direito, dando e tirando ao mesmo tempo." (Câmara Leal in "Da Prescrição e da Decadência", 1978, Forense, Rio de Janeiro, p. 155)

5. In casu, tendo a recorrida ajuizado a ação de indenização em 13.01.2004, objetivando a indenização por lesões decorrentes do disparo de arma de fogo, em perseguição policial, revela-se inocorrente a prescrição, porquanto o completo delineamento das lesões sofridas e suas consequências se deu no ano de 2002.(fls.161).

6. O art. 515, § 1º do CPC permite que o Tribunal avance no julgamento de mérito, sem que isso importe em supressão de instância. Precedentes: RESP 274.736/DF, Corte Especial, DJ 01.09.2003; REsp 722410 / SP, DJ de 15/08/2005; REsp 719462 / SP, DJ de 07/11/2005).

7. A causa petendi não é integrada pela qualificação jurídica do fato, por isso que resta indiferente se a parte alude à responsabilidade estatal em face da omissão do Estado e o Tribunal entende pela conduta comissiva do Estado e a conseqüente responsabilidade objetiva estatal, por força da máxima implícita ao ordenamento jurídico de que: "narra mihi factum, dabo tibi jus." O Tribunal a quo analisou os fatos narrados: A perseguição policial e a troca de tiros relatada pela Autora, em sua petição inicial, e corroborada pelos documentos juntados aos autos, não foram negadas pelo Réu, tratando-se, pois, de fato incontroverso nos autos. Entendo, ademais, que, na hipótese em berlinda, houve importante falha no planejamento da ação policial, com severo comprometimento da integridade física de terceiro inocente. (fls. 163) E considerou a responsabilidade objetiva, em face da conduta comissiva: O ponto central de controvérsia nos autos se concentra na existência ou não de responsabilidade civil do Estado quando agentes públicos (policiais militares), empreendendo perseguição a bandidos, com estes trocam tiros em via pública de alto tráfego de veículos e pedestres, resultando, desse tiroteio, lesões de natureza grave em terceiro, vítima inocente.(...) A responsabilidade civil do Estado, pelos danos causados a terceiros, decorrentes da atuação dos agentes públicos, nessa qualidade, é objetiva. (fls. 163).

8. Neste sentido já me posicionei: Forçoso repisar quanto à causa de pedir, que norma jurídica aplicável à espécie e a categorização jurídica dos fatos que compõem a razão do pedido não a integram. Assim, eventual modificação do dispositivo legal aplicável ou a mudança de categorização jurídica do fato base pedido não incidem sobre o veto do art. 264 do CPC. (Luiz Fux in "Curso de Direito Processual Civil - Processo de Conhecimento", 2008, Forense, Rio de Janeiro, p. 399).

9. A adoção do princípio tempus regit actum, pelo art. 1.211 do CPC, impõe obediência à lei em vigor regula os recursos cabíveis quando da prolação do ato decisório.

10. In casu, o acórdão recorrido que examinou a controvérsia foi proferido em 24.08.2006, portanto, posteriormente, à revogação dos artigos 603 e 611, ambos do Código de Processo Civil, indicados como violados.

11. O Recurso Especial não é servil ao exame de questões que demandam o revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, em face do óbice contido na Súmula 07/STJ.

12. A análise da existência de ofensa ao art. 333, inc. I, do Código de Processo Civil implica o revolvimento de matéria fática-probatória, o que é interditado a esta Corte Superior.

13. In casu, consoante assentado pelo acórdão recorrido: "A tese de que o projétil de arma de fogo que causou as lesões referidas pela Autora não teria sido disparado por policiais militares não está comprovada nos autos, ônus esse que competiria ao Estado. Há notícias, porém não a certeza, de que a vítima teria sido atingida por um disparo de AR-15. Segundo matéria publicada nos jornais da época, anexadas aos autos pela Autora, a única certeza de que tinham os peritos do Instituto de Criminalística Carlos Éboli é que o projétil que perfurou a lataria do veículo em que se encontrava a vítima não era proveniente de um revólver, calibre 38 - única arma apreendida com os bandidos(...) (fls. 164).

14. A responsabilidade estatal restou comprovada pelo Tribunal a quo, com base nas provas dos autos, bem como escorreita a imputação da indenização fixada a título de danos materiais e morais. A análise da existência do fato danoso, e o necessário nexo causal entre a suposta conduta e os prejuízos decorrentes da mesma implica em análise fático-probatória, razão pela qual descabe a esta Corte Superior referida apreciação em sede de recurso especial, porquanto é-lhe vedado atuar como Tribunal de Apelação reiterada ou Terceira Instância revisora, ante a ratio essendi da Súmula n.º 07/STJ. Precedentes: (AgRg no REsp 723893/RS DJ 28.11.2005; AgRg no Ag 556897/RS DJ 09.05.2005; REsp 351764/RJ DJ 28.10.2002.)

15. Isto porque o Tribunal asseverou que: "Na hipótese destes autos, o conjunto probatório aponta - por exclusão e diante da ausência de elementos de convicção em sentido contrário - para a falta cometida, justamente pelos agentes públicos - policiais militares - incumbidos de zelar pela segurança da população. Com os bandidos foi apreendido um único revólver, calibre 38 - arma que não produziria o furo encontrado na lataria do veículo em que se encontrava a vítima, segundo afirmação dos peritos do ICCE.(...)Os elementos de convicção já existentes nos autos permitem configurar o fato administrativo ( a perseguição policial e o tiroteio em via pública), o dano (lesões sofridas pela vítima) e o nexo causal (que tais lesões decorreram de errôneo planejamento de ação policial, com veementes indícios de que o projétil de arma de fogo que atingiu a Autora teria sido disparado de armamento utilizado pelos policiais militares). (fls. 165/166).

16. Descabe ao STJ examinar questão de natureza constitucional, qual seja a alegação de ofensa ao art. 37, par. 6º, da Constituição Federal, postulando a redução da fixação do quantum fixado à título de danos morais, porquanto enfrentá-la significaria usurpar competência que, por expressa determinação da Carta Maior, pertence ao colendo STF. A competência traçada para este Tribunal, em sede de recurso especial, restringe-se tão-somente à uniformização da legislação infraconstitucional.

17. Os embargos de declaração que enfrentam explicitamente a questão embargada não ensejam recurso especial pela violação do artigo 535, II, do CPC, tanto mais que, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.

18. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido.

(REsp 1056605 / RJ.)

AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 1.200.809 - RO (2009/0102887-0)

RELATOR: MINISTRO BENEDITO GONÇALVES

AGRAVANTE: ESTADO DE RONDÔNIA

PROCURADOR: EVANIR ANTÔNIO DE BORBA E OUTRO(S)

AGRAVADO: INÊS CARVALHO SANTOS

ADVOGADO: NÁDIA ALVES DA SILVA E OUTRO(S)

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. VÍTIMA ATINGIDA POR PROJÉTIL DE ARMA DE FOGO. "BALA PERDIDA". NEXO CAUSAL. DISCUSSÃO QUE DEMANDA REVOLVIMENTO DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. DECISÃO

Cuida-se de agravo de instrumento interposto pelo Estado de Rondônia contra decisão que não admitiu recurso especial ao argumento de que a discussão acerca do mérito demanda reexame de provas, sendo aplicável a Súmula 7/STJ. O recurso especial obstado enfrenta acórdão com a seguinte ementa (fl. 106):

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SEGURANÇA. DEVER DO ESTADO. BALA PERDIDA. POLICIAMENTO. OMISSÃO. CULPA. DANO. REPARAÇÃO.

Incumbe ao Estado por dever constitucional promover políticas que assegurem segurança do cidadão. Constitui omissão a negligência do Estado em deixar de prover bairro periférico da segurança mínima necessária a inibir atos de violência extrema, e, na medida em que, da omissão, resulta dano, impõe-se a reparação. No recurso especial interposto, com fundamento no art. 105, III, alíneas "a" e "c" da Constituição Federal (fls. 112-125), o recorrente aponta, além de dissídio jurisprudencial, violação ao art. 186 do Código Civil de 2002, ao argumento de que inexiste nexo de causalidade entre o dano e qualquer ato ou omissão do Estado de Rondônia. Sustenta, em suma, que não se pode, com base unicamente na competência genérica de garantidor da segurança pública, atribuir ao Estado a responsabilidade pela bala perdida que vitimou o filho da recorrida. Foram oferecidas contrarrazões às fls. 180-185. Nas razões do agravo, além de se reiterarem os argumentos do apelo especial, alega-se, em síntese, que não é necessário o reexame de provas para verificar a violação ao dispositivo de lei invocado, visto que é clara e evidente a falta de nexo de causalidade entre o dano e qualquer ação ou omissão do agravante, razão por que deve ser afastado o óbice da Súmula 7/STJ. É o relatório. Passo a decidir. O recurso em apreço não merece prosperar. Cuida-se, na espécie, de ação de indenização ajuizada por Inês Carvalho Santos, em razão dos danos morais e materiais que suportou em decorrência da morte de seu filho de sete meses de idade, atingido na cabeça por uma bala perdida. O Tribunal de origem, ao apreciar a questão, se manifestou nos seguintes termos (fls. 108-109): Infere-se, pois, ser responsabilidade do Estado prover o necessário a promover segurança pública eficiente, sobremodo em locais de perigo acentuado, como, no caso em questão, bairro periférico, tido como violento e perigoso, dispondo de contingente suficiente a controlar situações que põem em risco a incolumidade das pessoas. Na medida em que não se desincumbe desse ônus, a inação constitui omissão, que importa, inclusive, dano social, por violar bem jurídico da coletividade, dignidade da pessoa humana, daí a necessidade de ser reparado como meio de compelir o Estado a promover políticas públicas capazes de conter o caos social que se instalou, com a proliferação do crime. No caso, o fato ocorreu em bairro periférico, desprovido de policiamento, por isso mesmo ainda mais perigoso, e, nessas condições, não há como negar que a omissão estatal em deixar de dar implemento à segurança do bairro proporcionou ao crime condições de se proliferar, a ponto de se promover tiroteios, sem que a polícia estivesse presente para conter a situação, diminuindo os riscos à população. Tanto isso é verdade que o Estado cuidou de prover o local com um posto policial, após a criança ser vitimada com a bala perdida, mas não o fez antes, conquanto o clamor popular. Com efeito, é incontroversa a culpa do Estado, por negligência, ao deixar de oferecer proteção mínima aos moradores do bairro em questão, em especial, à família da autora. É notório que a sociedade passou a se ver hodiernamente em situação de risco iminente, à mercê da criminalidade desmedida, incapaz de ser contida pelo aparato de segurança pública oferecido pelo Estado. Ora, o Estado, de regra, presta serviços de segurança pública sem eficiência, e, em muitas regiões, ele é totalmente ausente, por isso precisa responder pelos danos decorrentes de sua omissão. Como se observa, a Corte estadual decidiu a questão com base nos fatos da causa, desse modo, "o julgamento da pretensão recursal - seja para entender inexistente o ato ilícito, seja para afastar a configuração do nexo causal e, assim, julgar improcedente a pretensão condenatória - pressupõe, necessariamente, o reexame dos aspectos fáticos da lide, atividade cognitiva vedada na via do recurso especial, nos termos da Súmula 7/STJ" (REsp 890.804/RR, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJe 12/11/2008). Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento. Publique-se. Intimem-se.

Brasília/DF, 03 de outubro de 2009.

MINISTRO BENEDITO GONÇALVES
Relator

(STJ - Ag 1200809)

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. OPERAÇÃO POLICIAL. BALA PERDIDA. VÍTIMA. FALECIMENTO POSTERIOR. NEXO DE CAUSALIDADE. INVIABILIDADE DE EXAME. SÚMULA 7/STJ. PRESCRIÇÃO. NÃO-OCORRÊNCIA. TRANSMISSIBILIDADE DO DIREITO DE AÇÃO PARA PLEITEAR DANO MORAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MANUTENÇÃO. SEGUIMENTO NEGADO.

1. Trata-se de recurso especial interposto pela FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO com fundamento no art. 105, III, a, da Constituição Federal, contra acórdão, proferido pelo Tribunal de Justiça daquele Estado, sintetizado na seguinte ementa: "Responsabilidade Civil - Operação policial mal sucedida - Bala perdida - Vítima atingida que sofre seqüelas e, posteriormente, vem a falecer - Condenação do Estado - Reconhecimento da legitimidade da sucessora da vítima - Prescrição afastada - Arquivamento do inquérito como termo inicial - Preliminares rejeitadas e apelo provido." (fl. 484)

Nas razões de recurso especial, a ora recorrente alega, em síntese, que o aresto recorrido incorreu em ofensa aos arts.: (a) 1º do Decreto 20.910/32, na medida em que o prazo prescricional deve ser computado a partir do evento danoso, e não aguardar o transcurso do processo criminal, de maneira que, na hipótese, implementou-se a prescrição, considerando que "o fato deu-se em 8 de abril de 1996 e a distribuição do feito ocorreu em dezembro de 2002. Houve, portanto, um lapso de seis anos entre o fato e o aforamento da ação" (fl. 503); (b) 333, I, do CPC, sob o argumento de que não foi devidamente comprovado o nexo de causalidade "entre eventual conduta do agente público e os alegados danos experimentados pela vítima (...). Não foi comprovada falha no serviço, ou desvio de conduta, quer omissão, imperícia ou negligência (...). As investigações policiais não apontaram qualquer responsabilidade dos policiais em relação aos fatos trazidos na inicial. Somente houve alegações desprovidas de constatação, quer na esfera criminal, quer na esfera cível" (fls. 503/504); (c) 11 do Código Civil, por entender que o direito à reparação do dano moral causado à vítima não é transmissível para seus herdeiros, por se tratar de direito personalíssimo; (d) 20 § 4º, do CPC, sustentando que a condenação em honorários advocatícios pode ser fixada em fixada em patamares inferiores aos previstos no § 3º do art. 20 do Código de Processo Civil, devendo, portanto, ser reduzida a verba honorária fixada nas instâncias ordinárias.

Contrarrazões apresentadas às fls. 515/526.

Não tendo sido admitido o recurso na origem, subiram os autos por força do provimento de agravo de instrumento (fls. 536/537).

É o relatório.

2. Não assiste razão à recorrente. (a) Inicialmente, o Superior Tribunal de Justiça consagra a orientação de que a prescrição da pretensão indenizatória decorrente de ilícito penal só tem início a partir do trânsito em julgado da sentença criminal, devendo ser afastada, por conseguinte, como termo inicial, a data do ato ou fato lesivo. Com efeito, "o prazo prescricional da ação de indenização proposta contra pessoa jurídica de direito público é de cinco anos (art. 1º do Decreto n. 20.910/32). O termo inicial do qüinqüênio, na hipótese de ajuizamento de ação penal, será o trânsito em julgado da sentença nesta ação, e não a data do evento danoso, já que seu resultado poderá interferir na reparação civil do dano, caso constatada a inexistência do fato ou a negativa de sua autoria" (REsp 351.867/SP, 2ª Turma, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 13.2.2006, grifou-se).

Ademais, mesmo em se tratando de ação de indenização ajuizada contra o Estado, em decorrência de ilícito praticado por agentes públicos sob sua responsabilidade, no caso, policiais militares, não se pode afastar, como termo inicial para a contagem da prescrição, o trânsito em julgado da sentença penal condenatória (AgRg nos EREsp 302.165/MS, 1ª Seção, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 10.6.2002; AgRg no Ag 627.408/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 10.10.2005; REsp 618.934/SC, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 13.12.2004; REsp 137.942/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ de 2.3.1998).

Na hipótese dos autos, conforme se constata da fundamentação do acórdão recorrido (fls. 486487), não houve propositura de ação penal, porquanto o inquérito policial foi arquivado, de maneira que o termo inicial da prescrição deve ser a data do referido arquivamento.

Em demanda similar à dos presentes autos, a Primeira Turma, à unanimidade de votos, consagrou entendimento no sentido de que, em se tratando de ação indenizatória, em caso de não-ajuizamento de ação penal, o termo inicial de contagem da prescrição é a data do arquivamento do inquérito policial militar, conforme ementa a seguir transcrita:

"ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. POLICIAL MILITAR MORTO EM SERVIÇO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL.

1. A coisa julgada na instância penal constitui o termo inicial da contagem do prazo de prescrição da ação de indenização em face do Estado.

2. Precedentes da Corte: AERESP nº 302.165/MS, Primeira Seção, Rel. Min. Peçanha Martins, DJ 10/06/2002; AGA 441.273/RJ, 2ª T., Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ 19/04/2004; REsp 254.167/PI, 2ª T., Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 1/02/2002; REsp 442.285/RS, 2ª T., Rel. Min. Franciulli Netto, DJ 04/08/2003; AGREsp 347.918/MA, 1ª T., Rel. Min. Francisco Falcão, DJ 21/10/2002.

3. A regra nesses casos é a de que o termo a quo seja o trânsito em julgado da sentença condenatória penal, porquanto a reparação do dano ex delicto é conseqüente. Enquanto pende a incerteza quanto à condenação, não se pode aduzir à prescrição, posto instituto vinculado à inação, inocorrente quando em curso inquérito policial militar para apurar responsabilidade de militar pela morte de outro colega de corporação.

4. Aliás, é precedente da Corte que 'se o ato ou fato danoso está sendo apurado na esfera criminal, com ilícito, em nome da segurança jurídica aconselha-se a finalização, para só então ter partida o prazo prescricional, pelo princípio da actio nata.' (Resp 254.167/PI).

5. In casu, versa hipótese em que a questão estava sendo discutida na esfera criminal, mas não chegou a ser ajuizada a competente ação penal, motivo pelo qual o termo a quo da prescrição da ação indenizatória é a data do arquivamento do inquérito policial militar.

6. Recurso especial a que se nega provimento." (REsp 591.419/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 25.10.2004)

Destarte, não se configurou a prescrição, na medida em que o arquivamento do inquérito policial deu-se em 3 de fevereiro de 1999 e o ajuizamento da ação de reparação de danos, em 26 de dezembro de 2002. Portanto, dentro do lapso prescricional previsto no art. 1º do Decreto 20.910/32.

(b) Relativamente à caracterização do nexo de causalidade, o Tribunal de origem, com base na interpretação dos fatos e das provas constantes dos autos, concluiu que foram demonstrados o ato ilícito, o dano e o nexo causal entre ambos, a caracterizar a responsabilidade civil da Administração Pública. Convém transcrever trecho do acórdão recorrido: "5.1. A prova trazida aos autos indica que os Policiais Militares ingressaram em uma favela, afirmando estarem perseguindo marginais, e houve troca de tiros (fls. 26) Este fato deve ser aceito como veraz, pois cuida-se de informação prestada pelos servidores públicos perante Autoridade Policial. 5.2. Observo que esta comunicação foi realizada no dia 09 de abril, ou seja, horas após o fato, e, mais, como alude o Oficial encarregado do Inquérito Policial Militar, sequer houve comunicação ao Copom. Por isso, acreditando haver indícios de crime militar, remeteu ele os autos à Justiça Militar Estadual 5.3. Apurou-se, também, que Policiais Militares que estavam participando daquela operação são proprietários de armas de calibre igual à utilizada no ferimento que causou a morte da vítima. A perícia realizada não pôde afirmar que o projétil que atingiu a vítima era proveniente desta arma. 5.3.1. Ao ser ouvido, o Policial que teria efetuado o disparo negou o fato, porém, não pôde explicar as coincidências dos estojos.

5.3.4. Por derradeiro, recorda-se a conclusão do Dr Promotor de Justiça 'segundo consta, por ocasião dos fatos, em diligência pelo local, onde teria ocorrido troca de tiros entre Policiais Militares e civis, a vítima acabou sendo atingida, sofrendo ferimentos'. Mais adiante, ressalta: 'pelo laudo de fls. 111/114 que o indigitado efetivamente disparou no local com arma particular que portava, o projétil que atingiu a vítima não saiu de sua arma.'

(...) 5.3.5 Ao meu juízo, existe, para efeitos meramente civis, prova apta a indicar a procedência da ação. São circunstâncias sérias. A primeira delas é que o comportamento dos Policiais não foi correto. Ingressaram em local inseguro onde existem marginais e efetuaram troca de tiros utilizando armamento particular e sem sequer efetuarem a comunicação ao Copom 5.3.6 Fica claramente demonstrado que agiram de forma errada. Não é possível expor pessoas, uma vez que se trata de local densamente povoado, a risco sem que se tome um mínimo de cautela. Eles comunicaram os seus superiores e efetuaram Boletim de Ocorrência horas após o fato. (...) 5.3.8. É, ao meu juízo, a hipótese dos autos. O serviço foi mal prestado Operação policial em local perigoso não se efetua da maneira totalmente equivocada como o foi e sem que os superiores dela tivessem conhecimento e autorizado-a. 6. Poder-se-ia argumentar que a prova balística comprovou que o projétil não saíra da arma do policial. Esta afirmativa perde sua eficácia ao se constatar que a arma foi apresentada dias após o evento e, portanto, pode ter sido alterada e, como indicou a apelante, esta operação pode ser efetuada de maneira rápida e sem deixar vestígios.

7. Em suma, estou convencido de que os fatos indicam a responsabilidade do Estado. Firmada esta premissa, é de ser imposta a condenação que, em face de sua diversidade, deve ser analisada isoladamente." (fls. 488/491)

Nesse contexto, o julgamento da pretensão recursal - seja para reconhecer a inexistência de prova do ato ilícito, seja para entender não-configurado o nexo causal e, assim, julgar improcedente a pretensão condenatória - pressupõe, necessariamente, o reexame dos aspectos fáticos da lide, atividade cognitiva vedada na via do recurso especial (Súmula 7/STJ).

A propósito: "PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ART. 535 DO CPC. VIOLAÇÃO. INOCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. NECESSIDADE DE REEXAME DE PROVA. SÚMULA 7/STJ. ALÍNEA 'C'. AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO. 1. Não há cerceamento de defesa ou omissão quanto ao exame de pontos levantados pelas partes, pois ao juiz cabe apreciar a lide de acordo com o seu livre convencimento, não estando obrigado a analisar todos os pontos suscitados.

2. Conclusão distinta da perfilhada na instância a quo - sobre existir ou não nexo de causalidade, dano e culpa do recorrido - demandaria revolver o suporte fático-probatório dos autos, providência vedada nesta instância especial, ante o teor da Súmula 7/STJ: 'A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial'. (...) 4. Recurso especial conhecido em parte e improvido." (Resp 592.665/MS, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 27.3.2006) "CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANOS MATERIAL, MORAL E ESTÉTICO. PRESSUPOSTOS FÁTICOS. RECURSO ESPECIAL. AUSENTE VIOLAÇÃO AOS ARTS. 165 E 458 DO CPC. SÚMULA 7-STJ. QUANTUM. RAZOABILIDADE. (...) 2. Aferir a existência de provas suficientes para embasar condenação por danos material, moral e estético demanda revolvimento do material fático-probatório, o que é vedado em sede especial, ut súmula 7-STJ. 3. Não é cabível a redução do quantum indenizatório, quando se mostra razoável, como sucede na espécie. 4. Recurso especial não conhecido." (REsp 715.712/RJ, 4ª Turma, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de 13.6.2005)

(c) No que tange ao argumento de que o direito à reparação do dano moral causado à vítima não é transmissível a seus herdeiros, cumpre salientar que esta Corte de Justiça possui orientação consolidada acerca do direito dos herdeiros em prosseguir em ação de reparação de danos morais ajuizada pelo próprio lesado, o qual, no curso do processo, vem a óbito. A propósito:

"DANO MORAL. Morte da vítima. Transmissibilidade do direito. O direito de prosseguir na ação de indenização por ofensa à honra transmite-se aos herdeiros. Recurso não conhecido." (REsp 440.626/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 19.12.2002)

"RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INEXISTÊNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MORAIS. HERDEIRO DA VÍTIMA. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. VALOR. CRITÉRIOS PARA FIXAÇÃO. (...)

II - Na ação de reparação por danos morais, podem os herdeiros da vítima prosseguirem no pólo ativo da demanda por ele proposta. Precedentes.

(...) Recurso especial não conhecido." (REsp 577.787/RJ, 3ª Turma Rel. Min. Castro Filho, DJ de 20.9.2004)

"AGRAVO REGIMENTAL - PLANO DE SAÚDE - STENTS - INADIMPLEMENTO CONTRATUAL - DANO MORAL - IMPOSSIBILIDADE DE INOVAÇÃO DAS TESES RECURSAIS NESTA FASE PROCESSUAL - LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESPÓLIO - PRECEDENTES - INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 83/STJ - QUANTUM INDENIZATÓRIO - ENTENDIMENTO OBTIDO DA ANÁLISE DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO - IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME NESTA INSTÂNCIA ESPECIAL - INTELIGÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ - JUROS DE MORA - DIES A QUO - ALEGAÇÃO DE DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL - ARTS. 541, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC, E 255, § 2º, DO RISTJ - AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA DIVERGÊNCIA SUSCITADA - RECURSO IMPROVIDO. (...)

2. O espólio tem legitimidade para suceder o autor em ação em que busca indenização por danos morais. Precedentes. (...)

5. Recurso improvido." (AgRg no Ag 987.594/SC, 3ª Turma, Rel. Min. Massami Uyeda, DJe de 1º.8.2008)

"CIVIL. INDENIZAÇÃO. PLANO DE SAÚDE. CIRURGIA. AUTORIZAÇÃO. AUSÊNCIA. LEGITIMIDADE. ESPÓLIO. DANOS MORAIS. CONFIGURAÇÃO. QUANTUM. DISSÍDIO. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO E COMPROVAÇÃO. 1. 'O espólio detém legitimidade para suceder o autor em ação de indenização por danos morais' (REsp 648.191/RS, Rel. Min. JORGE SCARTEZZINI, DJ 06.12.2004). (...)5. Agravo regimental desprovido." (AgRg no Ag 797.325/SC, 4ª Turma Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJe de 15.9.2008) "PROCESSUAL CIVIL. DIREITO CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. HERDEIROS. LEGITIMIDADE.

1. Os pais estão legitimados, por terem interesse jurídico, para acionarem o Estado na busca de indenização por danos morais, sofridos por seu filho, em razão de atos administrativos praticados por agentes públicos que deram publicidade ao fato de a vítima ser portadora do vírus HIV.

2. Os autores, no caso, são herdeiros da vítima, pelo que exigem indenização pela dor (dano moral) sofrida, em vida, pelo filho já falecido, em virtude de publicação de edital, pelos agentes do Estado réu, referente à sua condição de portador do vírus HIV.

3. O direito que, na situação analisada, poderia ser reconhecido ao falecido, transmite-se, induvidosamente, aos seus pais.

4. A regra, em nossa ordem jurídica, impõe a transmissibilidade dos direitos não personalíssimos, salvo expressão legal.

5. O direito de ação por dano moral é de natureza patrimonial e, como tal, transmite-se aos sucessores da vítima (RSTJ, vol. 71/183).

6. A perda de pessoa querida pode provocar duas espécies de dano: o material e o moral.

7. 'O herdeiro não sucede no sofrimento da vítima. Não seria razoável admitir-se que o sofrimento do ofendido se prolongasse ou se entendesse (deve ser estendesse) ao herdeiro e este, fazendo sua a dor do morto, demandasse o responsável, a fim de ser indenizado da dor alheia. Mas é irrecusável que o herdeiro sucede no direito de ação que o morto, quando ainda vivo, tinha contra o autor do dano. Se o sofrimento é algo entranhadamente pessoal, o direito de ação de indenização do dano moral é de natureza patrimonial e, como tal, transmite-se aos sucessores' (Leon Mazeaud, em magistério publicado no Recueil Critique Dalloz, 1943, pg. 46, citado por Mário Moacyr Porto, conforme referido no acórdão recorrido).

8. Recurso improvido." (REsp 324.886/PR, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJ de 3.9.2001, grifou-se) A respeito do tema, o art. 1.526 do Código Civil de 1916 estabelecia que "o direito de exigir reparação, e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança, exceto nos casos que este Código excluir". De outro lado, o atual Código Civil, dispõe:

"Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária." "Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.

Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau." "Art. 943. O direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança." Interpretando-se sistematicamente os referidos dispositivos legais, infere-se que o direito à indenização, ou seja, o direito de se exigir a reparação de dano, tanto de ordem material como moral, foi assegurado pelo Código Civil aos sucessores do lesado, transmitindo-se com a herança. Isso, porque o direito que se sucede é o de ação, que possui natureza patrimonial, e não o direito moral em si, que é personalíssimo e, portanto, intransmissível.

Nesse contexto, o dano moral, decorrente de violação de direito de personalidade, enseja o direito do lesado à indenização, conforme previsão constitucional (art. 5º, X). Este direito, por sua vez, de acionar o Judiciário para obter a reparação econômica da ofensa moral assume caráter patrimonial, podendo, por conseguinte, ser objeto de sucessão hereditária, nos termos dos arts. 12, parágrafo único, e 943 do Código Civil (antigo art. 1526 do Código Civil de 1916). É uma verdadeira sucessão de direito de crédito e não de direito de personalidade, razão por que não lhe é aplicável o disposto no art. 11 do mesmo diploma legal.

No tocante à transmissibilidade do direito à reparação do dano moral, cabe salientar a lição de Sérgio Cavalieri Filho (Programa de Responsabilidade Civil. 7ª ed., revista e ampliada, São Paulo: Atlas, 2007, pp.85/88): "No que diz respeito a transmissibilidade do dano moral, por direito hereditário, doutrina e jurisprudência distinguem duas situações. Se a vítima do dano moral falece no curso da ação indenizatória, é irrecusável que o herdeiro suceda o morto no processo, por se tratar de ação de natureza patrimonial. Exercido o direito de ação pela vítima, o conteúdo econômico da reparação do dano moral fica configurado, e, como tal, transmite-se aos sucessores. Esse entendimento é predominante no Superior Tribunal de Justiça (REsp 11.735-0-PR, rel. Min. Eduardo Ribeiro). Outra, entretanto, será a situação se a vítima do dano moral falecer antes de intentar a ação indenizatória. (...)

A corrente que sustenta a intransmissibilidade do dano moral parte, data venia, de uma premissa equivocada. Na realidade, não é o dano moral que se transmite, mas sim a correspondente indenização. O ponto de partida para uma correta visão do problema é o que segue. Uma coisa é o dano moral sofrido pela vítima, e outra coisa e o direito a indenização, daí resultante. O dano moral, que sempre decorre de uma agressão a bens integrantes da personalidade (honra, imagem, bom nome, dignidade etc.), só a vitima pode sofrer, e enquanto viva, porque a personalidade, não há dúvida, extingue-se com a morte. Mas o que se extingue - repita-se - é a personalidade, e não o dano consumado, nem o direito à indenização. Perpetrado o dano (moral ou material, não importa) contra a vítima quando ainda viva, o direito à indenização correspondente não se extingue com sua morte. E assim é porque a obrigação de indenizar o dano moral nasce no mesmo momento em que nasce a obrigação de indenizar o dano patrimonial - no momento em que o agente inicia a prática do ato ilícito e o bem juridicamente tutelado sofre a lesão. Neste aspecto não há distinção o alguma entre o dano moral e patrimonial. Nesse mesmo momento, também, o correlativo direito à indenização, que tem natureza patrimonial, passa a integrar o patrimônio da vítima e, assim, se transmite aos herdeiros dos titulares da indenização. O art. 943 do Código Civil atual prevê expressamente: '0 direito de exigir reparação e a obrigação de prestá-la transmitem-se com a herança.' A morte da vítima seria um prêmio para o causador do dano se o exonerasse da obrigação de indenizar. Vê-se, por esse ângulo da questão, que é possível a transmissão do direito à indenização por dano moral, e não do próprio dano moral. O problema se resume em saber se houve ou não dano moral, se a vítima, antes de morrer, foi ou não atingida em sua dignidade. Se foi, não há por que não transmitir aos herdeiros o direito à indenização, mormente em face de texto expresso de lei. (...) O art. 11 do Código Civil e expresso quanto a intransmissibilidade dos direitos da personalidade; a regra do para.grafo único do art. 20, que confere legitimidade ao cônjuge, aos ascendentes e descendentes para postularem a proteção da imagem do morto, ou indenização pela ofensa à sua boa fama e respeitabilidade, alcança aquelas agressões que ocorrerem após o falecimento, caso em que os parentes virão a juízo por direito próprio. Não se confunde, portanto, com a situação em que a postulação é feita em razão daquele sentimento próprio do ofendido já morto. No primeiro caso, o que confere titularidade é o direito dos herdeiros à proteção da imagem do morto; no segundo, cuida-se da incorporação ao patrimônio dos herdeiros daquele direito que nasceu e foi reconhecido pela própria vítima, a qual, contudo, não teve oportunidade de iniciar a ação. Pensamos que esse é o critério que deve prevalecer." (grifou-se) Com essas considerações doutrinárias e jurisprudenciais, pode-se concluir que, embora o dano moral seja intransmissível, o direito à indenização correspondente transmite-se causa mortis, na medida em que integra o patrimônio da vítima. Não se olvida que os herdeiros não sucedem na dor, no sofrimento, na angústia e no aborrecimento suportados pelo ofendido, tendo em vista que os sentimentos não constituem um "bem" capaz de integrar o patrimônio do de cujus.

Contudo, é devida a transmissão do direito patrimonial de exigir a reparação daí decorrente, nos termos do art. 1526 do Código Civil de 1916 e 943 do atual Código Civil. (d) Por fim, quanto aos honorários advocatícios, ressalte-se que o Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que a remissão contida no art. 20, § 4º, do CPC, relativa aos parâmetros a serem considerados, na "apreciação eqüitativa do juiz", para a fixação dos honorários advocatícios, refere-se às alíneas do art. 20, § 3º, e não ao seu caput. Desse modo, "nas causas de pequeno valor, nas de valor inestimável, naquelas em que não houver condenação ou for vencida a Fazenda Pública, e nas execuções, embargadas ou não, os honorários serão fixados consoante apreciação eqüitativa do juiz", sem vinculação aos limites de 10% e 20% "sobre o valor da condenação", previstos no referido caput do § 3º do art. 20 do Código de Processo Civil (AgRg no Ag 763.392/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 24.8.2006; REsp 579.268/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 5.12.2005; AgRg no REsp 642.514/RS, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 22.11.2004; AgRg no Ag 446.072/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 26.5.2003; AgRg no REsp 442.541/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 5.5.2003).

Todavia, embora o julgador não esteja vinculado aos parâmetros percentuais estabelecidos pelo § 3º do art. 20 do CPC, não quer dizer que, considerando a equidade, não possa condenar a parte ao pagamento de honorários advocatícios no montante de dez por cento (10%), conforme ocorreu na hipótese dos autos.

Além disso, não há como revisar, em sede de recurso especial, os critérios e o percentual em que os honorários advocatícios foram fixados no juízo de origem, na medida em que tal revisão resulta em reexame de matéria fático-probatória, encontrando óbice, portanto, na Súmula 7/STJ: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial."

Nesse sentido:

"PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REVISÃO DO VALOR ARBITRADO. MAJORAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 07/STJ. (...)

2. A reapreciação do percentual fixado a título de verba honorária encontra-se vedada na via especial, por envolver reexame de matéria fática. Inteligência da Súmula 07/STJ.

3. In casu, não se verifica hipótese que se enquadre na expressão 'valor irrisório' e que, nos termos da jurisprudência desta Corte, poderia redundar em uma majoração.

4. Recurso especial a que se nega seguimento." (REsp 799.167/PR, Rel. Min. José Delgado, DJ de 3.4.2006)

"PROCESSUAL CIVIL. VERBA HONORÁRIA. ART. 20, § 4º, DO CPC. VALOR IRRISÓRIO. INOCORRÊNCIA. MAJORAÇÃO. SÚMULA 07/STJ. DISSÍDIO PRETORIANO. INEXISTÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA.

1. Nas causas em que for vencida a Fazenda Pública, os honorários advocatícios devem ser fixados de acordo com o artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil.

2. A jurisprudência desta Corte adotou o entendimento de que os honorários advocatícios são passíveis de modificação na instância especial tão-somente quando se mostrarem irrisórios ou exorbitantes.

3. Não sendo desarrazoada a verba honorária, sua majoração importa, necessariamente, no revolvimento dos aspectos fáticos do caso, o que é defeso no âmbito do apelo nobre, a teor da Súmula 07/STJ. (...)

5. Agravo regimental improvido." (AgRg no Ag 733.313/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 20.3.2006).

Desse modo, pacificada a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não caberia, em sede de recurso especial, rever critérios adotados pelo julgador na fixação dos honorários advocatícios, por importar o reexame de matéria fático-probatória.

É certo que há entendimento nesta Corte que flexibiliza essa orientação, qual seja quando o valor fixado a título de honorários for exorbitante ou irrisório cabe reexame em sede de recurso especial. Todavia, o caso dos autos não se enquadra nessas hipóteses.

3. Diante do exposto, com fundamento no art. 557, caput, do Código de Processo Civil, nego seguimento ao recurso especial.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília (DF), 16 de junho de 2009.

MINISTRA DENISE ARRUDA
Relatora

(REsp 1114515)

ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. BALA PERDIDA. DANOS MORAIS. PENSÃO VITALÍCIA. CABIMENTO. HONORÁRIOS DE ADVOGADO. MONTANTE DEVIDO. - O Autor, atingido por munição disparada por soldado do 3º Batalhão de Infantaria de Fuzileiros Navais, durante a denominada "Operação Alvorada", faz jus ao pensionamento vitalício e aos danos morais reconhecidos pela sentença de primeiro grau. Inexistência nos autos de elemento capaz de romper o nexo de causalidade, vale dizer, de situação apta a excluir a responsabilidade estatal (fato exclusivo da vítima ou de terceiro, caso fortuito ou força maior). - Dano moral devido diante da dor experimentada pela parte autora, muito distante de um mero dissabor cotidiano. Neste ponto, cumpre afastar qualquer tarifamento do valor reparatório através da utilização de diplomas legais sem qualquer pertinência quanto à pretensão deduzida em juízo. Indenização fixada em atenção ao princípio da razoabilidade, estabelecendo-se valor compatível com a lesão sofrida e o grau de reprovabilidade da conduta estatal. - O fato de o Autor ser segurado obrigatório da Previdência Social não exclui o reconhecimento nem atenua a respectiva fixação de pensão vitalícia, diante da absoluta incomunicabilidade das situações jurídicas (Precedentes do E. STJ). Determinação do valor do pensionamento e condenação à prestação de assistência médica assentados em harmonia com o art. 1.539 do Código Civil. Justa a fixação dos honorários advocatícios em 5% sobre o valor dos danos morais e das parcelas atrasadas da pensão, compatível com o grau de zelo do causídico, o trabalho realizado neste feito, bem como a natureza da causa. - Remessa Necessária e apelo improvidos. (TRF 2ª REGIÃO - AC 9702347521)

Ademais, o autor comprovou a situação violadora de seu direito da personalidade e causadora de dano moral e material, consistente no comportamento danoso do Estado com criação ou incremento de uma situação de risco concernente a perseguição policial a bandidos em via pública com troca de tiros entre eles e, assim, vitimando terceiro inocente. Isto está, sobejamente, comprovado nos autos.

Por outro lado, o demandado não comprovou suas alegações de que a bala não teria saido da arma de seus policiais ou qualquer outro fato excludente da responsabilidade civil, como, por exemplo, culpa exclusiva da vítima. Aplica-se ao caso o princípio da razoabilidade e proporcionalidade, tendo em vista que se não há certeza de que a bala que atingiu o autor teria saido da arma de um policial, por outro lado, há probabilidade de, pelo menos cinquenta por cento, que isto tenha ocorrido, pois há somente duas possibilidades neste situação: ou foram os policiais ou foram os bandidos que atingiram a cabeça do autor com um tiro neste tiroteio entre policiais e bandidos, e esta probabilidade, em razão do cenário de incerteza, deve ser levada em consideração para equitativamente reduzir o valor da indenização por dano moral. Também não se pode afirma que o tiro que vitimou o autor não tenha saído da arma de um dos policiais, posto que, em verdade, de qualquer forma a ação policial contribuiu diretamente para o evento danoso e isto não se pode negar, é irrefutável.

Desta maneira, a responsabilidade civil objetiva caracteriza-se com a demonstração destes três requisitos: conduta ilícita, dano e nexo de causalidade, não sendo exigido, portanto, a demonstração da culpa do agente.

Verifico, pois, estarem presentes todos os elementos ensejadores da responsabilidade civil objetiva, consistindo a conduta danosa do Estado a ação policial que concorreu e corroborou para a ocorrência do evento danoso, criando ou incrementando uma situação de risco concernente a perseguição policial a bandidos em via pública com troca de tiros entre eles e, com isto, vitimando terceiro inocente, o autor. Esta evento tem nexo causal direto com o dano sofrido pelo autor que levou um tiro na cabeça em razão desta troca de tiros entre policiais e bandidos, o que decorre deste fato os danos os morais insítos e inerentes a toda esta situação de sofrimento e o dano material próprio com as despesas ínsitas aos danos a saúde do autor.

Neste quadro, no que tange aos danos materiais alegados, verifico assistir razão ao autor posto que, mesmo sem especificar o montante geral das despesas com o tratamento, pois pede reparação material pelas "perdas diárias e futuras", sendo possível, nestes caso, o pedido genérico, o autor logrou êxito em comprovar, através de documentos, os gasto que aduz ter havido com seu tratamento, (fls.09/13) devendo este dispêndio ser especificado e quantificado na fase de execução de sentença, caracterizando o dano emergente.

Quanto aos danos materiais que o autor poderá a vir a ter no futuro, entendendo isto como decorrentes ainda do tratamento e lucros cessantes em razão do mesmo evento danoso, aplico o princípio NARRA MIHI FACTUM, DABO TIBI JUS. Neste pórtico, este pedido merece procedência, sendo que estes gastos deverão ser comprovados em liquidação por artigos com laudos ou prescrições médicas que indiquem o estado de saúde do autor e que ele necessita permanentemente de certos tratamentos ou medicamentos, especificando os elementos necessários para isto, devendo ainda o laudo dizer se da ofensa a saúde do autor resultou defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, tudo isto para que se possa determinar o pensionamento nos termos dos arts. 949 e 950 do CC. Tal pensão, em razão das normas constitucionais e previdenciárias, não poderá ser inferior a um salário mínimo. O autor, ao menos com uma periodicidade de dois anos, deverá se submeter a nova avaliação médica para verificação de cura, regressão ou agravamento de sua debilidade.

No que concerne aos danos morais, este pedido merece acolhimento parcial pelas razões dantes expostas. Da análise dos documentos e depoimentos dos autos, restou induvidoso foi que o autor foi vítima inocente de uma ação policial do Estado que diretamente contribuiu para o evento danoso. Diante disto, pede o autor indenização por dano moral na ordem de R$300.000,00. Nos documentos trazidos aos autos extrai-se que o autor em razão do tiro sofrido foi hospitalizado no Walfredo Gurgel, ficou em coma e teve perda de massa encefálica, tendo como consequência seqüelas que se apresentarão com o decorrer do tempo. A inicial já narra seqüelas no autor que vem definhado, pernas trôpegas, como perda da memória, aliado ao fato da bala ainda estar alojada em sua cabeça, posto não poder ser retirada sem maiores agravamentos de suas funções cerebrais e motoras, inclusive tendo confusão de raciocínio e debilidades motoras. E isto certamente abate e abala, não só o autor, mas toda a família que sofre e isto novamente se reflete sobre o autor. De tudo isto se presumem o dano moral e psicológico.

Os danos morais são presumidos e inerentes a própria circunstância narrada na inicial de danos a saúde, muito sofrimento, dor do autor e de sua família. Dito isto, constato merecer procedência a pretensão quanto a existência do dano moral, porém, não nos valores pelo autor requeridos no montante de R$300.000,00, devendo ser a menor esta reparação, pelos motivos narrados antes, eis que, o que resta de certo, é que a ação policial concorreu e corroborou diretamente para a ocorrência do evento danoso. Porém, este evento danoso, para o qual os bandidos também concorreram, com dantes observado, ocorreu em cenário de probabilidade e incerteza quanto ao fato de que o tiro que atingiu o autor veio de arma de algum policial, e este cenário de incerteza não é razão para excluir a responsabilidade do Estado mas deve ser levada em consideração para equitativamente reduzir o valor da indenização por dano moral.

O Código Civil disciplina em seus artigos que:

Art. 944. A indenização mede-se pela extensão do dano.

Parágrafo único. Se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, eqüitativamente, a indenização.

Art. 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.

Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido.

Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.

Parágrafo único. O prejudicado, se preferir, poderá exigir que a indenização seja arbitrada e paga de uma só vez.

Art. 951. O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.

Portanto, nos termos dos arts.944, parágrafo único do Código Civil, diante dos fatos comprovados nos autos e das ponderações exposta, em observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, verifica-se razoável a quantia de R$100.000,00, à título de dano moral.

III - DISPOSITIVO

Diante do exposto, julgo procedente o pedido contido na inicial para condenar o Estado Rio Grande do Norte a pagar ao autor os danos materiais emergentes a serem especificados e quantificados na fase de execução de sentença, sobre os quais devem incidir correção monetária desde o evento danoso nos moldes da súmula nº43 do STJ.

Julgo procedente o pedido de dano material futuro e condeno o Estado do RN, nos termos dos arts. 949, 950 e 951 do CC, a pagar ao autor pensão mensal, cujo valor será especificado após liquidação de sentença na modalidade por artigos, não podendo ser o pensionamento inferior ao salário mínimo vigente.

Julgo parcialmente procedente o pedido de dano moral e condeno o demandado a pagar ao autor o valor de R$100.000,00(cem mil reais), a incidir correção monetária nos termos da súmula nº362 do STJ.

O cálculo da correção monetária deve ser elaborado conforme tabela modelo 01 da Justiça Federal e sobre todos os valores deverão incidir juros moratórios a fluir desde o evento danoso conforme súmula nº54 do STJ.

O demandado arcará com ônus sucumbenciais cujos honorários advocatícios arbitro em 10% sobre o valor da execução. Da mesma forma, em razão da sucumbência recíproca, condeno o autor a arca com ônus sucumbenciais cujos honorários advocatícios arbitro em 10% sobre R$200.000,00, valor resultante da diferença entre o pedido de dano moral de R$300.000,00 e o valor da condenação de R$100.000,00, sendo que esta obrigação ficará suspensão em razão do autor ser beneficiário da justiça gratuita, nos termos da lei nº1060/50.

Sentença sujeita ao reexame necessário. Transcorrido o prazo para recurso voluntário, remetam-se os autos ao Tribunal de Justiça.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Natal/RN, 29 de outubro de 2009.

Cícero Martins de Macedo Filho
Juiz de Direito



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