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quinta-feira, 12 de novembro de 2009

JURID - Lesão corporal. Natureza grave. Laudo de exame complementar. [12/11/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Lesão corporal. Natureza grave. Laudo de exame complementar.


Superior Tribunal de Justiça - STJ.

HABEAS CORPUS Nº 117.417 - MS (2008/0219141-8)

RELATOR: MINISTRO JORGE MUSSI

IMPETRANTE: DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL

ADVOGADO: FÁTIMA MARIA DE OLIVEIRA - DEFENSORA PÚBLICA

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL

PACIENTE: ANDERSON DA SILVA ALMEIDA

PACIENTE: VALDINEI FERNANDES MATOS

EMENTA

HABEAS CORPUS. LESÃO CORPORAL. NATUREZA GRAVE. LAUDO DE EXAME COMPLEMENTAR. AUSÊNCIA. IMPRESCINDIBILIDADE. COAÇÃO ILEGAL EVIDENCIADA. DESCLASSIFICAÇÃO OPERADA. REPRIMENDA REDIMENSIONADA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. MODALIDADE RETROATIVA. DECLARAÇÃO DE OFÍCIO.

1. Para a qualificação da lesão corporal como grave pela incidência do previsto no inciso I do § 1º do art. 129 do CP, necessária a submissão da vítima a exame complementar a fim de confirmar a incapacidade para as ocupações habituais pelo prazo de trinta dias.

2. O exame inicial não pode pretender comprovar circunstância que somente deverá ser aferida após passados trinta dias da lesão sofrida pela vítima, até porque a recuperação nesse prazo dependerá sempre de diversos fatores não controláveis cientificamente.

3. Embora possível (art. 163, § 3º, do CPP), a prova testemunhal coletada não é capaz, no caso, de suprir a omissão, pois dos depoimentos colhidos não se extrai que as lesões sofridas pelo ofendido ensejaram sua incapacidade para as ocupações habituais por mais de trinta dias.

4. Ordem concedida para desclassificar o delito para o do art. 129, caput, do CP, redimensionando-se a reprimenda de ambos os pacientes, que resta definitiva em 9 meses e 10 dias de reclusão para ANDERSON DA SILVA ALMEIDA e em 8 meses de reclusão para VALDINEI FERNANDES MATOS, declarando-se de ofício extinta as suas punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva do Estado, na modalidade retroativa.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conceder a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Felix Fischer, Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 29 de setembro de 2009. (Data do Julgamento).

MINISTRO JORGE MUSSI
Relator

RELATÓRIO

O SENHOR MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Trata-se de habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública em favor de ANDERSON DA SILVA ALMEIDA e VALDINEI FERNANDES MATOS contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso que, julgando apelação criminal lá ajuizada pela defesa, negou-lhe provimento, mantendo na íntegra a sentença que condenou os pacientes, respectivamente, ao cumprimento de 3 anos e 6 meses de reclusão e de 3 anos de reclusão, ambos em regime inicialmente fechado, por infração ao art. 129, § 1º, I, do Código Penal (Apelação Criminal n. 2008.002068-0/0000-00).

Sustenta a ocorrência de constrangimento ilegal, ao argumento de que a pena-base imposta aos pacientes teria sido exasperada com base em elementares do tipo penal violado, não havendo fundamentação concreta das razões que justificaram a elevação acima do mínimo.

Alega, outrossim, a necessidade de exame pericial complementar, inexistente no caso, a fim de comprovar as lesões corporais de natureza grave, salientando que "o mero prognóstico dos peritos quando do primeiro exame é insuficiente para a caracterização da lesão grave", sendo mister, por isso, a desclassificação para o delito do art. 129, caput, do CP.

Requer, assim, a concessão da ordem, para que seja corrigida a pena-base e, alternativamente, a desclassificação da conduta para lesões corporais de natureza leve.

Estando os autos devidamente instruídos, dispensou-se a solicitação de informações à autoridade impetrada.

Instado, o Ministério Público Federal manifestou-se pela concessão parcial da ordem, tão-somente para ajustar a reprimenda imposta aos pacientes na primeira fase da dosimetria.

É o relatório.

VOTO

O SENHOR MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Dos elementos que instruem os autos, infere-se que os pacientes foram condenados por violação ao art. 129, § 1º, I, do CP porquanto em 16-7-2003, no interior de cela do Distrito Policial de Aquidauana/MS, onde se encontravam encarcerados, ao descobrirem que Acácio Pereira Mendes, lá também segregado, estava sendo acusado da prática de estupro, desferiram contra ele socos e pontapés, lesionando-o gravemente.

Pretende agora, a impetrante, a redução da pena-base imposta aos pacientes, sob o argumento da carência de fundamentação idônea a justificar a elevação, bem como a desclassificação da conduta criminosa para aquela prevista no art. 129, caput, do CP.

Inicialmente, quanto à pretendida desclassificação do delito, constata-se que a sentença, considerando presentes provas da materialidade delitiva, de acordo com o laudo de corpo de delito de fls. 8-10 dos autos principais, e da autoria delitiva imputada aos acusados, julgou procedente a ação penal contra eles deflagrada, dando-os como incursos no art. 129, § 1º, I, do Estatuto Penal.

Irresignada, a defesa ingressou com apelo perante a Corte originária, pretendendo, dentre outras coisas, a desclassificação do delito para aquele do art. 129, caput, do CP, tendo o órgão colegiado afastado a pretensão, sob os seguintes argumentos:

Alternativamente, pugnam os apelantes pela desclassificação para o crime de lesão corporal leve, porquanto não foi "elaborado exame de corpo de delito complementar a fim de demonstrar a natureza grave das lesões, conforme exige o art. 168, § 2º, do CPP".

A pretensão não merece amparo.

O art. 168, § 2º, do Código de Processo Penal, dispõe ser necessária a elaboração de exame de corpo de delito complementar a fim de precisar a classificação do delito de lesão corporal grave, pois, "o exame de lesões corporais visa identificar a natureza e a gravidade das lesões eventualmente infligidas à vítima. Em face da possibilidade de que as lesões sejam transeuntes, desaparecendo com o tempo, é fundamental que se proceda ao exame tão logo seja possível." [3]

No entanto, somente se torna necessária a elaboração da perícia complementar quando, no laudo confeccionado logo após a infração, não for possível constatar a gravidade da lesão.

Ou seja, é dispensável a confecção de laudo complementar quando evidenciada a gravidade por meio do primeiro exame, o que por certo não se dá no caso em apreço porquanto o laudo de exame de corpo de delito (fls. 08/09) esclareceu firmemente que a vítima ACÁCIO sofreu lesões de natureza grave que lhe resultaram em incapacidade para ocupações habituais por mais de 30 (trinta) dias.

Nesse sentido, remansosa a jurisprudência deste Sodalício:

"LESÃO CORPORAL - EXAME COMPLEMENTAR DESNECESSÁRIO - EFICIÊNCIA DO PRIMEIRO - ART. 168 DO CPP

Só é necessária a realização de exame complementar quando o primeiro apresentar deficiência ou for necessário retificação." [4]

"APELAÇÃO CRIMINAL - (...) - LESÃO CORPORAL DE NATUREZA GRAVE - EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA - FALTA DE EXAME COMPLEMENTAR - DESNECESSIDADE - EXAME DE CORPO DE DELITO CONSTATANDO A GRAVIDADE - REDUÇÃO DA PENA-BASE AO MÍNIMO LEGAL - IMPOSSIBILIDADE - DECISÃO MANTIDA - IMPROVIDA.

(...)

Não há falar em exclusão da qualificadora, pelo fato de não ter sido feito o exame complementar, se foi suprido pelo laudo de exame de corpo de delito, efetuado logo após o crime, que demonstrou a existência do perigo de morte." [5]

Assim, não há falar em desclassificação do delito. (fls. 258 e 259)

De acordo com o previsto no art. 168, § 2º, do CPP: "Em casos de lesões corporais, se o primeiro exame pericial tiver sido incompleto, proceder-se-á a exame complementar por determinação da autoridade policial ou judiciária, de ofício, ou a requerimento do Ministério Público, do ofendido ou do acusado, ou de seu defensor". prescrevendo o § 2º do citado dispositivo que: "Se o exame tiver por fim precisar a classificação do delito no art. 129, § 1º, I, do Código Penal, deverá ser feito logo que decorra o prazo de 30 (trinta) dias contado da data do crime".

Como já decidiu esse Superior Tribunal: "Da lição de Nelson Hungria (RHC n.° 32.303/SP), depreende-se que o laudo complementar para a averiguação da incapacidade de que trata o inciso I, do § 1.° do art. 129, somente pode ser dispensado quando a lesão provocada submete a vítima a risco de vida e, ainda assim, quando o exame de corpo de delito for absolutamente conclusivo" (REsp 229.422/MS, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 4-12-2001).

No caso, constata-se que os peritos verificaram a ocorrência de edema traumático na região do ombro direito, sinais de fraturas de 3 costelas do arco costal direito, hematoma na face externa do braço esquerdo, edema traumático na região do cotovelo esquerdo e ainda de hematomas na região do flanco esquerdo e do flanco direito do ofendido, sendo firmes ao responder ao quesito n. 3 - se a lesão resultou ou resultará em incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias - afirmando que sim (fls. 22 destes autos). Em resposta ao quesito n. 4 - se resultou perigo de vida - responderam que não (fls. 22).

Ocorre que não houve a submissão da vítima a exame complementar, a fim de atestar a gravidade das lesões sofridas e, não obstante a assertiva dos peritos no tocante à incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias efetuada no laudo primitivo, imprescindível se mostra o exame complementar, após passados 30 dias da lesão, a fim de confirmar as referidas afirmações. E isso porquanto o exame inicial não pode pretender comprovar circunstância que somente poderá ser aferida após passados 30 dias da lesão sofrida pela vítima, até porque a recuperação nesse prazo dependerá sempre de diversos fatores não controláveis cientificamente.

Por outro lado, embora possível, nos termos do art. 168, § 3º, do CPP, a prova testemunhal coletada também não é capaz de suprir a omissão, já que da leitura dos depoimentos colhidos não se extrai que as lesões sofridas pelo ofendido ensejaram sua incapacidade para as ocupações habituais por mais de 30 dias.

Julgando questão semelhante, o Supremo Tribunal Federal assim decidiu:

LESÕES CORPORAIS DE NATUREZA LEVE. E OBRIGATÓRIO O EXAME COMPLEMENTAR PARA PRECISAR A CLASSIFICAÇÃO DA LESÃO CORPORAL NO ART. 129, PAR. 1, N I, DO C. PENAL. NÃO EFETUADO O EXAME COMPLEMENTAR, A LEI PROCESSUAL ADMITE SEJA ELE SUPRIMIDO MEDIANTE PROVA TESTEMUNHAL (CPP, ART. 168,PAR. 2 E 3). AUSÊNCIA, NO CASO, QUER DE EXAME COMPLEMENTAR, QUER DE PROVA TESTEMUNHAL, COMPROBATÓRIOS DE TER OCORRIDO INCAPACIDADE DA VÍTIMA PARA AS SUAS OCUPAÇÕES HABITUAIS, POR MAIS DE TRINTA DIAS. OMISSÃO NÃO SUPRIDA PELO PROGNOSTICO DO LAUDO DE EXAME DE CORPO DE DELITO, EFETUADO LOGO APÓS O CRIME. IMPROCEDÊNCIA DA CLASSIFICAÇÃO DE DELITO COMO LESÃO CORPORAL GRAVE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÕES CORPORAIS LEVES. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO. (RE 86398, Relator(a): Min. LEITÃO DE ABREU, SEGUNDA TURMA, julgado em 27-9-1977).

De nosso Tribunal, em igual direção, tem-se o precedente já citado:

CRIMINAL. RECURSO ESPECIAL. LESÃO CORPORAL. IMPRESCINDIBILIDADE DO LAUDO COMPLEMENTAR, PARA A CARACTERIZAÇÃO DA GRAVIDADE DA LESÃO. RECURSO PROVIDO. SENTENÇA MONOCRÁTICA RESTABELECIDA. RECONHECIMENTO DA EXTINÇÃO DE PUNIBILIDADE.

I - Para a caracterização da lesão corporal de natureza grave, é imprescindível a realização do laudo de exame complementar.

Precedentes do STF.

II - Restabelecida a sentença monocrática, reconhece-se a prescrição da pena de multa, exclusivamente aplicada ao recorrente, eis que transcorrido o prazo bienal previsto no art. 114, inc. I, do Código Penal.

III - Recurso provido para, cassando o acórdão recorrido, restabelecer-se a sentença de primeiro grau, e declarar-se a extinção da punibilidade do recorrente pela prescrição. (REsp 229.422/MS, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 4-12-2001).

Assim, de ser desclassificada a conduta criminosa para aquela do caput do art. 129 do CP, passando-se à aplicação da pena.

Consideradas as circunstâncias judiciais já devidamente sopesadas quando da condenação, na sua maioria desfavoráveis aos pacientes, e levando-se em conta ainda o grau das lesões sofridas pela vítima (consequências do delito), bem atestadas no laudo acostado a fls. 21 e 22, fixa-se a sanção básica para ambos em 8 meses de reclusão.

Em face da reincidência de ANDERSON, reconhecida na sentença, eleva-se a reprimenda deste paciente em 1/6, tal qual procedido no édito condenatório, restando sua sanção definitiva em 9 meses e 10 dias de reclusão, mantida a de VALDINEI em 8 meses de reclusão, diante da inexistência de outras causas modificativas.

Estabelecida a reprimenda, definitivamente, em 9 meses e 10 dias de reclusão e Em 8 meses de reclusão para cada paciente respectivamente, constata-se ter ocorrido a prescrição da pretensão punitiva, pois o prazo prescricional, considerada a pena in concreto aqui fixada, passa a ser de 2 (dois) anos, nos termos do art. 109, VI, do CP.

E, transcorridos mais de 2 (dois) anos entre a data do recebimento da denúncia - 14-3-2005 (fls. 112) - e a da publicação da sentença - 3-10-2007 (fls. 207) - impõe-se o reconhecimento da extinção da punibilidade do paciente, pela prescrição da pretensão punitiva do Estado, na modalidade retroativa, matéria de ordem pública que merece declarada assim que reconhecida, nos precisos termos do art. 61 do CPP.

Diante do exposto, evidenciado o constrangimento ilegal a que vêm sendo submetidos os pacientes, concede-se a ordem para desclassificar o delito para o do art. 129, caput, do CP, redimensionando-se a reprimenda de ambos, que resta definitiva em 9 meses e 10 dias de reclusão para ANDERSON DA SILVA ALMEIDA e em 8 meses de reclusão para VALDINEI FERNANDES MATOS, declarando-se de ofício extinta as suas punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva do Estado, na modalidade retroativa, em obediência aos comandos dos arts. 107, IV, c/c 109, VI e 110, § 1º e § 2º, todos do Código Penal, observado ainda o previsto no art. 61 do CPP.

É o voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO

QUINTA TURMA

Número Registro: 2008/0219141-8 HC 117417 / MS

MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 200300000114 200300000743 20080020680 5030046925

EM MESA JULGADO: 29/09/2009

Relator
Exmo. Sr. Ministro JORGE MUSSI

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO

Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. BRASILINO PEREIRA DOS SANTOS

Secretário
Bel. LAURO ROCHA REIS

AUTUAÇÃO

IMPETRANTE: DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL

ADVOGADO: FÁTIMA MARIA DE OLIVEIRA - DEFENSORA PÚBLICA

IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL

PACIENTE: ANDERSON DA SILVA ALMEIDA

PACIENTE: VALDINEI FERNANDES MATOS

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Lesões Corporais - Grave

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, concedeu a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."

Os Srs. Ministros Felix Fischer, Laurita Vaz, Arnaldo Esteves Lima e Napoleão Nunes Maia Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 29 de setembro de 2009

LAURO ROCHA REIS
Secretário

Documento: 915638

Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 09/11/2009




JURID - Lesão corporal. Natureza grave. Laudo de exame complementar. [12/11/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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