Habeas corpus. Penal. Concussão. Coautoria. Possibilidade.
Superior Tribunal de Justiça - STJ.
HABEAS CORPUS Nº 93.352 - SC (2007/0253339-6)
RELATORA: MINISTRA LAURITA VAZ
IMPETRANTE: CLÁUDIO GASTÃO DA ROSA FILHO E OUTRO
IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
PACIENTE: JACKSON JACOB DUARTE DE MEDEIROS
EMENTA
HABEAS CORPUS. PENAL. CONCUSSÃO. COAUTORIA. POSSIBILIDADE. ACÓRDÃO DE APELAÇÃO CONDENATÓRIO. RECONHECIMENTO DA INOCÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE ANÁLISE DE PROVAS. VIA ELEITA INADEQUADA.
1. Não é possível, na via exígua do habeas corpus, proceder amplo reexame dos fatos e das provas para declarar se o caso é de absolvição ou não, sobretudo se a instância a quo, soberana na análise fática dos autos, restou convicta quanto à materialidade do crime e a certeza da autoria.
2. Embora o sujeito ativo do crime de concussão seja sempre o funcionário público, em razão do cargo, inexiste óbice à condenação como coautor de quem não possui esta condição.
3. Ordem denegada.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da QUINTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, denegar a ordem. Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima e Jorge Mussi votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Felix Fischer e Napoleão Nunes Maia Filho.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Jorge Mussi.
Brasília (DF), 15 de outubro de 2009 (Data do Julgamento)
MINISTRA LAURITA VAZ
Relatora
RELATÓRIO
A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ:
Trata-se habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor de JACKSON JACOB DUARTE DE MEDEIROS, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina que, dando provimento ao recurso de apelação do Ministério Público, condenou o ora Paciente à pena de 02 anos de reclusão, em regime aberto, substituída por pena restritiva de direitos, como incurso no crime de concussão.
Informa a denúncia que o Paciente, estagiário em um escritório de advocacia, fazendo-se passar por advogado, juntamente com membro da Polícia Civil, exigiu vantagem indevida para que pessoa presa em flagrante delito, pela prática de tráfico ilícito de entorpecentes, fosse liberada ou autuado, apenas, como usuário de drogas.
Sustenta o Impetrante, em suma, "a atipicidade da conduta increpada ao paciente, pois o reconhecimento do crime de concussão, pressupõe seu cometimento por pessoa competente para prática do ato, o que não se verificou in casu" (fl. 13), uma vez que a lavratura do flagrante competia ao Delegado de Polícia, não possuindo o Paciente ou o corréu atribuição para o ato administrativo.
Requer assim, liminarmente, que seja suspensa a execução da pena e, no mérito, o reconhecimento da atipicidade da conduta.
O pedido liminar foi indeferido nos termos da decisão de fls. 54/55.
As judiciosas informações foram prestadas às fls. 60/92, com a juntada de peças processuais pertinentes à instrução do feito.
O Ministério Público Federal manifestou-se às fls. 94/99, opinando pela denegação da ordem, "considerando que a matéria aqui argüída já foi objeto de análise no HC n.º 79909/SC".
É o relatório.
VOTO
A EXMA. SRA. MINISTRA LAURITA VAZ (RELATORA):
A ordem não merece concessão.
De início, cumpre ressaltar que por duas vezes a Defesa do ora Paciente buscou a anulação do acórdão impugnado nesta Corte Superior de Justiça, afirmando que a prova produzida durante a instrução criminal não foi suficiente para lastrear o acórdão condenatório prolatado pelo Tribunal catarinense. Em um primeiro momento, nos autos do Resp 888437/SC, não conhecido a teor da Súmula n.º 7 do Superior Tribunal de Justiça, e, posteriormente, no HC n.º 79909/SC, onde a ordem foi denegada à unanimidade pela Quinta Turma, uma vez que descabida na via eleita ampla dilação probatória.
Não há, todavia, reiteração de pedido.
No presente writ, o Impetrante sustenta a atipicidade da conduta porque o Paciente não ocupa função pública "não sendo viável interpretar-se o tipo legal extensivamente para abarcar caso como o dos autos, onde não há ligação exata entre a função exercida e o ato objeto da exigência" (fl. 09).
Pois bem, o Paciente foi denunciado pela prática do crime de concussão porque, nos termos da denúncia:
"Segundo consta das investigações policiais realizadas, encartadas no inquérito policial que a esta serve de fundamentação, no dia 06.06.99, por volta de 01h10min, Gerson Weiss foi abordado por policiais militares quando conduzia uma uma motocicleta pela Rua Libéria, nesta cidade e Comarca, tendo sido encontrados em seu poder três papelotes da substância entorpecente conhecida como crack.
Encaminhado à Delegacia de Polícia da Comarca, foi colocado em uma cela pelo denunciado Guilherme, que exercia, naquele momento, a sua função pública de Polícia Civil, nela permanecendo por cerca de duas (02) horas.
Consta que na data referida, por volta de 04:00 horas, Gerson foi retirado da cela pelo denunciado Guilherme e pelo também denunciado Jackson Jacob, tendo este se apresentado como sendo "advogado", momento em que ambos exigiram de Gerson a quantia de R$2.000,00 (dois mil reais) para que fosse liberado, sem ser autuado em flagrante delito, ou para ser autuado tão somente como usuário de drogas estupefacientes." (fl. 19)
A sentença de primeiro grau absolveu o Paciente e seu corréu porque entendeu que "o aduzido pelo Ministério Público, em bela peça jurídica, diga-se de passagem, não traz em seu bojo, argumentos e provas suficientes e portanto, não merece acolhimento, eis que não há nos autos prova suficiente que autorize a condenação, ensejando, assim, a absolvição pela aplicação do princípio in dúbio pro reo, com base no artigo 386, inciso VI, do Estatuto Adjetivo Penal" (fl. 48).
O acórdão condenatório, por sua vez reconheceu que embora "haja, in casu, o peso de contradições no conjunto das declarações dos participantes - ativa e passivamente - essas divergências são de tal sorte contudo irrelevantes que não chegam a desvirtuar a conclusão a que se chega: - De haverem os denunciados cometido a prática do delito pelo qual foram denunciados" (fl. 91).
Não é possível, na via exígua do habeas corpus, proceder amplo reexame dos fatos e das provas para declarar se o caso é de absolvição ou não, sobretudo se a instância a quo, soberana na análise fática dos autos, restou convicta quanto à materialidade do crimes e a certeza da autoria.
Com efeito, verifica-se que o Impetrante pretende demonstrar o desacerto do acórdão condenatório, tão-somente porque a análise das provas pelo Tribunal a quo foi equivocada. Entretanto, verificar a procedência de sua alegação demanda reexame da matéria fático-probatória constante dos autos, impossível na via estreita do habeas corpus.
De outro lado, ao contrário do que afirma o Impetrante, embora o sujeito ativo do crime de concussão seja sempre o funcionário público, em razão de sua função, é cediço que inexiste óbice à condenação de quem não possui essa condição como coautor.
Confira-se o seguinte precedente, que trata de situação semelhante:
"RECURSO DE HABEAS CORPUS - CONCUSSÃO - PARTICIPAÇÃO DE PARTICULAR - INÉPCIA DA DENUNCIA - PROVA ILÍCITA - NULIDADE DO INTERROGATÓRIO.
1. NADA IMPEDE QUE UM PARTICULAR SEJA CO-AUTOR DO CRIME DE CONCUSSÃO, JUNTAMENTE COM SERVIDORES PÚBLICOS.
2. NÃO E INEPTA A DENUNCIA QUE DESCREVE, RAZOAVELMENTE, OS FATOS REPUTADOS COMO DELITUOSOS, CALCADOS EM INDÍCIOS SUFICIENTES DE AUTORIA.
3. DESARRAZOADO ACOLHER, DE PLANO, AINDA MAIS NA VIA ESTREITA DO "MANDAMUS", A ALEGAÇÃO DE INOCENCIA DO PACIENTE, O QUE MELHOR SERA APRECIADO NO DECORRER DA FASE INSTRUTÓRIA.
4. SE O FATO VEM DEMONSTRADO POR PROVAS BASTANTES, POR SI SO, DA ATIVIDADE CRIMINOSA, NÃO HA RELEVÂNCIA SE, ALEM DESSAS, OUTRAS, CONSIDERADAS ILÍCITAS, EXISTAM, SEM QUE CONTAMINEM TODO O CONJUNTO PROBATÓRIO.
5. TAMBÉM NÃO TEM MAIOR SIGNIFICADO, A ALEGAÇÃO DE QUE NÃO SE ASSEGUROU AO ACUSADO A GARANTIA CONSTITUCIONAL DE FICAR CALADO, CIRCUNSTANCIA DE QUE SE TEM PROVA EM SENTIDO CONTRARIO E QUE PERDE FORÇA EM SE TRATANDO DE UM ADVOGADO, COM NOÇÃO NECESSARIA PARA SABER SE DEVERIA, OU NÃO, CALAR-SE.
6. RECURSO IMPROVIDO." (RHC 5.779/SP, Rel. Min. ANSELMO SANTIAGO, SEXTA TURMA, DJ de 01/12/1997 - grifei.)
Ante o exposto, DENEGO a ordem.
É o voto.
MINISTRA LAURITA VAZ
Relatora
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUINTA TURMA
Número Registro: 2007/0253339-6 HC 93352 / SC
MATÉRIA CRIMINAL
Números Origem: 20020036218 20070148617 5040194366 5990115369
EM MESA JULGADO: 15/10/2009
Relatora
Exma. Sra. Ministra LAURITA VAZ
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro JORGE MUSSI
Subprocuradora-Geral da República
Exma. Sra. Dra. LINDÔRA MARIA ARAÚJO
Secretário
Bel. LAURO ROCHA REIS
AUTUAÇÃO
IMPETRANTE: CLÁUDIO GASTÃO DA ROSA FILHO E OUTRO
IMPETRADO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA
PACIENTE: JACKSON JACOB DUARTE DE MEDEIROS
ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes Praticados por Funcionários Públicos Contra a Administração em Ge - Concussão
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
"A Turma, por unanimidade, denegou a ordem."
Os Srs. Ministros Arnaldo Esteves Lima e Jorge Mussi votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Felix Fischer e Napoleão Nunes Maia Filho.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Jorge Mussi.
Brasília, 15 de outubro de 2009
LAURO ROCHA REIS
Secretário
Documento: 921252
Inteiro Teor do Acórdão - DJ: 09/11/2009
JURID - Habeas corpus. Penal. Concussão. Coautoria. Possibilidade. [11/11/09] - Jurisprudência
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