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quinta-feira, 5 de novembro de 2009

JURID - Contrato de seguro. Artigos 47 e 54, § 4º. [05/11/09] - Jurisprudência


Contrato de seguro. Artigos 47 e 54, § 4º. Interpretação mais favorável ao segurado.


Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG.

Número do processo: 1.0701.08.227301-5/001(1)

Relator: PEDRO BERNARDES

Relator do Acórdão: TARCISIO MARTINS COSTA

Data do Julgamento: 06/10/2009

Data da Publicação: 03/11/2009

Inteiro Teor:

EMENTA: EMENTA: CONTRATO DE SEGURO - ARTIGOS 47 e 54, § 4º - INTERPRETAÇÃO MAIS FAVORÁVEL AO SEGURADO - ASSASSINATO DO SEGURADO PELO PRÓPRIO FILHO - DIREITO DO CÔNJUGE À INDENIZAÇÃO - INTELIGÊNCIA DO ART. 762 DO CÓDIGO CIVIL. - O contrato de seguro se insere entre as atividades protegidas pelo CDC, conforme, expressamente, estabelecido em seu art. 3º, § 2º. Assim, suas cláusulas, ex vi dos artigos 47 e 54, § 4º, são interpretadas mais favoravelmente ao consumidor, precipuamente aquelas que implicarem na limitação de direitos. - Se há dois ou mais beneficiários do seguro e somente o filho foi o responsável pelo ato doloso, afasta-se a obrigação em relação a ele, a teor do art. 762 do diploma civil. Tal exclusão, entretanto, não se estende aos demais beneficiários inocentes, no caso o cônjuge da infelicitada vítima e mãe do assassino/beneficiário que arquitetou a morte do próprio pai, dura e duplamente atingida pelo infortúnio.

V.V.

SEGURO DE VIDA - COBRANÇA DE INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA - HOMICÍDIO COMETIDO POR UM DOS BENEFICIÁRIOS - RISCO EXPRESSAMENTE EXCLUÍDO PELO CONTRATO - IMPROCEDÊNCIA.- A seguradora pode limitar os riscos cobertos pelo seguro, sem que este fato configure abuso.- Se a indenização pleiteada refere-se a risco expressamente excluído do contrato de seguro, a seguradora não está obrigada a realizar o seu pagamento.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0701.08.227301-5/001 - COMARCA DE UBERABA - APELANTE(S): BRADESCO VIDA PREVIDENCIA S/A - APELADO(A)(S): MARIA ANGELA PINHEIRO DE FREITAS - RELATOR: EXMO. SR. DES. PEDRO BERNARDES - RELATOR PARA O ACÓRDÃO: EXMO SR. DES. TARCISIO MARTINS COSTA

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 9ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, EM NEGAR PROVIMENTO, VENCIDO O RELATOR.

Belo Horizonte, 06 de outubro de 2009.

DES. TARCISIO MARTINS COSTA - Relator para o acórdão.

DES. PEDRO BERNARDES - Relator vencido.

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08/09/2009

9ª CÂMARA CÍVEL

ADIADO

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0701.08.227301-5/001 - COMARCA DE UBERABA - APELANTE(S): BRADESCO VIDA PREVIDENCIA S/A - APELADO(A)(S): MARIA ANGELA PINHEIRO DE FREITAS - RELATOR: EXMO. SR. DES. PEDRO BERNARDES

Produziu sustentação oral, pelo apela-

do, a Dra. Erika Resende Bilharinho.

O SR. DES. PEDRO BERNARDES:

VOTO

Peço vista.

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15/09/2009

9ª CÂMARA CÍVEL

ADIADO

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0701.08.227301-5/001 - COMARCA DE UBERABA - APELANTE(S): BRADESCO VIDA PREVIDENCIA S/A - APELADO(A)(S): MARIA ANGELA PINHEIRO DE FREITAS - RELATOR: EXMO. SR. DES. PEDRO BERNARDES

O SR. DES. PRESIDENTE:

VOTO

Este feito veio adiado da sessão de 9/9/2009, a pedido do Desembargador Relator, após a sustentação oral.

O SR. DES. PEDRO BERNARDES:

VOTO

Trata-se de ação de cobrança proposta por Maria Ângela Pinheiro de Freitas em face de Seguro Vida e Prev. S.A., em que o MM. Juiz da causa (ff. 102/104) julgou procedente o pedido inicial.

Inconformada com a r. sentença, apela a ré (ff. 109/118), alegando que as circunstâncias que causaram o falecimento do segurado não permitem que haja eficácia da garantia de pagamento; que o segurado faleceu vítima de ato ilícito do beneficiário, filho da autora; que o segurador responde pela obrigação avençada; que o art. 762, do CC, sustenta a nulidade do seguro quando o risco se filiar a ato ilícito do segurado ou do beneficiário; que, nos termos do art. 169, do CC, o negócio jurídico não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo; que, se o risco decorre de ato ilícito dos beneficiários, a lei declara a nulidade deste contrato; que nenhum dos beneficiários pode lucrar com o sinistro derivado de ilícito.

Contra-razões às ff. 128/139, alegando que a beneficiária "fora vítima de tentativa de homicídio, em nada colaborou para o evento danoso, havendo desta forma o total rompimento do nexo de causalidade, pois em nada contribuiu para ser penalizada com o não pagamento do seguro"; que, nos termos da Res. 302/2005, o inquérito policial é dispensável à regulação do sinistro; que o contrato não foi juntado pela ré; que a doutrina e jurisprudência vêm entendendo que, se há dois ou mais beneficiários e somente um foi responsável pelo homicídio, o outro faz jus ao recebimento da prestação.

Preparo à f. 119.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, CONHEÇO DO APELO.

Não havendo preliminares a serem analisadas, passo ao exame do mérito.

Mérito.

Compulsando os autos, verifica-se que a demandada, ora apelante, sustenta a nulidade do contrato em razão de um dos beneficiários ser o mentor intelectual do homicídio do segurado.

De seu turno, a autora, co-beneficiária e esposa da vítima, alega a regularidade do contrato e seu direito à 50% do capital segurado, pois não teve nenhuma responsabilidade pelo envolvimento no evento morte da vítima.

A sentença julgou procedente o pedido formulado, afastando a nulidade do contrato em relação à autora.

A prova documental carreada aos autos, especialmente os documentos acostados com a impugnação à contestação (ff. 72/93), que se constituem em peças do inquérito policial e ação criminal para apuração e penalização do responsável pela morte da vitima, Dásio Nunes de Freitas, cujo principal responsável, assim considerado conforme a denúncia do Ministério Público e conseqüente decisão de pronúncia, é o seu filho adotivo, co-beneficiário do seguro, Gustavo Pinheiro de Freitas.

Entretanto, ao contrário do que alega a seguradora, não há nulidade nos termos do art. 762, do CC, pois não houve vício na origem da contratação do seguro. Os fatos ocorridos são causa de ineficácia do contrato de seguro.

A negativa de pagamento se funda basicamente no fato do contrato não garantir a cobertura quando houver ato ilícito praticado pelo beneficiário.

Analisando as condições gerais do contrato (f. 53) observa-se a presença das seguintes cláusulas:

III. Riscos Excluídos

Cláusula 7ª. Configuram-se riscos excluídos da cobertura de morte acidental e por isso não geram ao beneficiário direito à indenização:

II - ato ilícito doloso praticado pelo segurado, pelo beneficiário ou representante legal de um ou de outro;

Ora, de acordo com a previsão contratual, não é possível ao apelante efetuar o pagamento da indenização quando há prova de que o sinistro decorreu de homicídio levado a cabo por um dos beneficiários.

Desta forma, diante da previsão contratual no sentido de que não há cobertura quando o sinistro decorre de ato ilícito, torna-se impossível o acolhimento do pedido inicial.

Observa-se que a apelada argumenta que não teve participação no crime, sendo vítima também.

Entretanto, entendo que a causa de exclusão está prevista no contrato e atinge o contrato de seguro como um todo. Ademais, a seguradora tem liberdade de estabelecer as circunstâncias nas quais não garante o pagamento da indenização, sem que isso represente conduta abusiva. Não pode ser obrigada a cobrir risco se o contrato por ela elaborado expressamente o exclui.

Mutatis mutandis:

"2. SEGURADA VÍTIMA DE HOMICÍDIO DOLOSO PERPETRADO PELO BENEFICIÁRIO, SEU MARIDO. FRAUDE CONTRATUAL CABALMENTE COMPROVADA NOS AUTOS. NULIDADE DO CONTRATO CELEBRADO. INTELIGÊNCIA DO ART. 1.436 DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. EFEITOS QUE ALCANÇAM O SEGUNDO BENEFICIÁRIO INSTITUÍDO. VÍCIO QUE ATINGE O CONTRATO DESDE SUA ORIGEM. Constatado que o beneficiário foi o causador da morte da segurada, não poderá ele receber a soma do capital estipulado, sob pena de admitir-se seu direito fundado em crime que dolosamente cometeu.

A nulidade que afeta o pacto, no caso, atinge o contrato em sua essência, viciando o direito de eventuais beneficiários constantes da apólice celebrada.

(TJPR - APELO DESPROVIDO. APELAÇÃO CÍVEL N.º 193.024-1, DE CURITIBA - 17ª. VARA CÍVEL RELATOR: JUIZ CONV. ABRAHAM LINCOLN CALIXTO).

"COBRANÇA - SEGURO DE VIDA - SEGURADORAS - SOLIDARIEDADE - SEGURADO - DOENÇA PREEXISTENTE - PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA - INFRINGÊNCIA - AGRAVAMENTO DO RISCO - PAGAMENTO DE COBERTURA SECURITÁRIA - IMPOSSIBILIDADE

Se o comportamento do segurado implica em agravamento do risco (artigo 1454 do Código Civil de 1916), não há como ser feito o pagamento da cobertura securitária contratada com a seguradora, que só deve pagar por risco efetivamente assumido." (Apelação Cível Nº 459.792-2 da Comarca de SÃO JOÃO DEL REI, Nona Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais MÁRCIA DE PAOLI BALBINO (Relatora) 30/09/2004).

"AÇÃO DE COBRANÇA - SEGURO DE VIDA - DOENÇA PRÉ-EXISTENTE - RISCO EXCLUÍDO - PERDA DO DIREITO À INDENIZAÇÃO - PROVIMENTO DA APELAÇÃO. Encontrando-se a segurada falecida, ao tempo da contratação do seguro de vida, em tratamento de câncer de mama, doença que a vitimou fatalmente, e deixando ela de informar tal condição à seguradora, fato que certamente influenciaria na aceitação da proposta e na taxa do prêmio, perde o beneficiário o direito à indenização, nos termos dos artigos 1.443 e 1.444, do CC/1916." (APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.03.188699-7/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - RELATOR: EXMO. SR. DES. BATISTA DE ABREU 16ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais).

"INDENIZAÇÃO - SEGURO DE VIDA EM GRUPO - CLÁUSULA QUE RESTRINGE O DIREITO DO SEGURADO INSERIDA NA APÓLICE - LEGALIDADE - ART. 1460 DO CC DE 1916 E 757 DO CC VIGENTE

Sabendo-se que o contrato de seguro é regido pelos termos da apólice, na qual podem, licitamente, ser inseridas cláusulas que restrinjam o direito do segurado, não há como se impor à seguradora o dever de efetuar o pagamento de prêmio em razão de risco expressamente excluído do âmbito de cobertura do seguro, porquanto, de acordo com o artigo 1.460, do Código Civil de 1916 (norma essa repetida pelo art. 757, do Código Civil vigente), uma vez limitados os riscos, o segurador por outros não responde. (TJMG. Apel. 1.0313.05.158257-2/001. Rel. Osmando Almeida. 30/06/07.).

Diante da inexistência de cobertura, deve ser dado provimento ao apelo, para julgar improcedentes os pedidos iniciais.

Nestas condições, é o caso de reforma da sentença para que o pedido inicial seja julgado improcedente.

Deverá a recorrida ser condenada ao pagamento das custas processuais e recursais, e em honorários advocatícios no valor de R$900,00, ficando suspensa a exigibilidade de pagamento em razão da gratuidade da justiça.

Assim, DOU PROVIMENTO ao apelo, reformo a sentença, e julgo improcedentes os pedidos iniciais.

Condeno a recorrida ao pagamento das custas processuais e recursais, e em honorários advocatícios que fixo em R$900,00 (novecentos reais), ficando suspensa a exigibilidade de pagamento em razão da gratuidade da justiça.

Em síntese, para efeito de publicação (art. 506, III, do C.P.C.):

- Conheceram do recurso;

- Deram provimento para julgar improcedente o pedido inicial.

- Condenaram a apelada ao pagamento das custas processuais e recursais, e em honorários em valor de R$ 900,00, suspensa a exigibilidade, nos termos da Lei 1.060/50.

O SR. DES. TARCISIO MARTINS COSTA:

VOTO

Peço vista.

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06/10/2009

9ª CÂMARA CÍVEL

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NOTAS TAQUIGRÁFICAS

Assistiu ao julgamento, pelo ape-

lado, o Dr. Mário Penido Campos.

O SR. DES. OSMANDO ALMEIDA, PRESIDENTE:

VOTO

O julgamento deste feito foi adiado na sessão de 15/9/2009, a pedido do Desembargador Revisor, quando, então, o Desembargador Relator dava provimento.

O SR. DES. TARCISIO MARTINS COSTA:

VOTO

Cuida-se de recursos de apelação manejado por BRADESCO VIDA E PREVIDÊNCIA S/A contra a r. sentença da lavra do digno Juiz da 1ª Vara Cível da Comarca de Uberaba, que julgou procedente a ação de cobrança intentada por MARIA ÂNGELA PINHEIRO DE FREITAS, em face do apelante, para condenar a seguradora requerida a pagar autora/beneficiária, 50% (cinquenta por cento), da cobertura contratada, no importe de R$ 268.259,49 (duzentos e sessenta e oito mil, duzentos e cinqüenta e oito reais e quarenta e nove centavos), atualizada e acrescida de juros moratórios de 1%, ao mês, a partir da data do ajuizamento, além das custas processuais e honorários advocatícios, estes fixados, em 10% do valor da condenação (f. 102-104).

Sustenta a apelante, em resumo, com esteio no art. 762 do Código Civil, nulidade do seguro contratado quando o risco for "proveniente de ato doloso do segurado, do beneficiário ou de representante legal de um ou de outro".

Argumenta que não pode a apelada lucrar com o evento ou tirar proveito do ato praticado pelo filho, beneficiário dos outros 50% do capital contratado (R$ 449.025), que, visando receber o seguro, mandou assassinar o próprio pai (f.109-118).

O Em Relator, forte na cláusula 7ª, das condições gerais do contrato (f. 53), que, no inciso II, reproduz o dispositivo legal em evidência, acolheu a pretensão recursal, para julgar improcedente o pedido autoral.

De plano, resulta que a seguradora não negou o contrato, escusando-se, contudo, do pagamento da cobertura securitária, escudada no art. 762 do Código Civil, que afastaria sua responsabilidade, pelo fato incontroverso de que a morte do segurado contou com a participação do filho, para receber a indenização securitária como beneficiário.

Inicialmente, cumpre anotar que o contrato de seguro é, por definição legal, aquele pelo qual uma das partes se obriga para com a outra, mediante pagamento de um prêmio, a indenizá-la pelo prejuízo resultante de riscos futuros, previstos no contrato (Código Civil 1916, art. 1.432), ou, segundo o art. 757 do NCCB, uma das partes se obriga "a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou coisa, contra riscos predeterminados". Conclui-se que tal contrato se constitui a partir da promessa condicional de indenização de um valor contratado, na hipótese de ocorrência do sinistro, aleatório, porque se vincula a evento futuro e incerto, causador do prejuízo.

Não se desconhece, que o segurador não se obriga pela cobertura de eventos que não tenham sido particularizados pela apólice ou que foram por ela expressamente excluídos e, ainda, em face da nulidade do contrato para a garantia do risco, em virtude de ato ilícito praticado, quer pelo segurado, quer pelo beneficiário, ou seus representantes legais, consoante preceitua o prefalado art. 762.

Sem dúvida, a limitação se constitui em um dos cânones fundamentais dessa espécie de contrato, sendo a responsabilidade do segurador limitada ao risco assumido, que se afasta, também, pelo princípio universal de Direito, segundo o qual ninguém pode se beneficiar de sua própria torpeza. Especificamente, em tratando de contrato de seguro, ninguém pode lucrar com o evento danoso ou tirar proveito de um sinistro.

Todavia, analisando a cláusula sétima, em consonância com o disposto no art. 762 do diploma civil, tem-se que se refere a ato ilícito praticado pelo "beneficiário".

Ora, sendo mais de um beneficiário e, não tendo o outro qualquer responsabilidade pelo ilícito, mas, pelo contrário, sendo dura e duplamente atingindo, como é o caso da apelada, que perdeu o marido vítima de homicídio arquitetado por um filho, a ponto de mudar os próprios rumos de sua vida, a mim não me parecer razoável que seja ainda penalizada com a exclusão do recebimento de sua quota parte na cobertura contratada, também, pela vítima, em seu favor.

Tal alcance, permissa venia, se me afigura suma injustiça.

Não se pode esquecer, ainda, que o segurado, ao contratar um seguro de vida, busca a mais ampla proteção de seus entes mais próximos, assumindo a seguradora, onerosamente, o risco.

Segundo anota magistralmente ARNOLD WALD:

"Ocorrendo o sinistro, entendido como acontecimento eventual economicamente desvantajoso, as necessidades econômicas conseqüentes são atendidas pelo segurador e não pelo segurado. Explica-se, pois, a função do segurador, na feliz expressão dos autores franceses anteriores ao Código Napoleão, como um verdadeiro 'marchand de securité', ou seja, um 'vendedor de segurança', que assumindo, onerosamente, os riscos alheios, corrige os efeitos negativos do acaso" (Obrigações e Contratos, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1994, 11ª ed., p. 425).

Como já enfatizado, tenho que tal risco se configura excluído da cobertura contratada, em relação, tão somente, ao beneficiário autor do ato doloso, não lhe gerando direito algum à indenização, não só por falta de causa moral para a obrigação, como também porque a condição dolosamente provocada se reputa não verificada (CC, art. 120) e, aqui, a morte é condição de seu vencimento.

Tal exclusão, entretanto, não se estende aos demais beneficiários inocentes, no caso o cônjuge da infelicitada vítima e mãe do beneficiário assassino, que arquitetou a morte do próprio pai para se beneficiar do recebimento do seguro.

Não se deve, ainda, perder de vista que o contrato de seguro, ora em discussão, se insere entre as atividades protegidas pelo CDC, conforme, expressamente, estabelecido em seu art. 3º, § 2º. Nesse caso, suas cláusulas, ex vi dos artigos 47 e 54, § 4º, são interpretadas mais favoravelmente ao consumidor, principalmente no que tange àquelas que implicarem na limitação de direitos ou restritivas. Em outras palavras, o contrato há de ser interpretado de modo a proteger a parte mais fraca, no caso, o beneficiário inocente. Admite-se, então, que, em havendo dúvida, esta seja resolvida contra o segurador, como ensina Pedro Alvim.

Com efeito, "interpreta-se a favor do segurado a avença em casos de dúvidas e omissões" (RF, 197/102).

Em suma, em meu modesto modo de pensar, claro está, da análise dos autos, que a interpretação emprestada pela apelante fere o princípio da razoabilidade e que a apelada tem direito a receber sua parte no seguro, inexistindo motivos que possam autorizar a reforma da conclusão vertida na r. sentença.

No tema, tomo de empréstimo os valiosos ensinamentos de SÉRGIO CAVALIERI FILHO, ao tratar de "Outros atos ilícitos do segurado ou do beneficiado pelo seguro", em sua consagrada obra Programa de Responsabilidade Civil, Rio de Janeiro: Malheiros Editora, 5ª ed. p. 432 e 433), que bem se aplica ao caso sub judice:

"O art. 762 do Novo Código Civil (art. 1.436 do Código revogado) reputa nulo 'o contrato para garantia de risco proveniente de ato doloso do segurado, do beneficiado pelo seguro, ou do representante de um ou de outro'. A norma praticamente expressa aquilo que tivemos a oportunidade de demonstrar: as causas de exclusão de responsabilidade do segurador estão fundadas em dolo ou má fé do segurado, do beneficiário do seguro, ou de seus respectivos prepostos.

Um dos exemplos mais constantes da conduta vedada pela norma em exame é o caso do beneficiário do seguro de vida que assassina ou manda assassinar o segurado para receber a correspondente indenização. Como bem observa o insigne Caio Mário, 'o beneficiário que seja autor do homicídio do segurado não tem direito ao seguro, não só por falta de causa moral para a obrigação (nemo de improbitate sua consequitur acttinem), como também porque a morte é condição do seu vencimento, e reputa-se não verificada (Código Civil, art. 120), a condição maliciosamente provocada por aquele a quem aproveita' (Instituições de Direito Civil, v. III, Forense, Edição Universitária, 1991, p. 338). Se assim não fosse, haveria prêmio para a própria torpeza".

E, logo adiante, prossegue:

"Pode haver, entretanto, mais de um beneficiário do seguro e apenas um deles ser o responsável pelo ato ilícito. Nesse caso, indica o bom senso que o contrato não se nulifica, devendo a exclusão do benefício do seguro cingir-se tão somente ao autor do ato criminoso, garantida a indenização aos beneficiários inocentes. Nesse sentido a lição de Pontes de Miranda: 'Advirta-se, porém, em que o beneficiário que se há de afastar sem que o segurador fique obrigado a prestar o seguro é o beneficiário nomeado e único. Se há dois ou mais beneficiários e só um foi responsável pelo assassínio, o outro nomeado ou outros nomeados recebem a prestação' (Tratado de Direito Privado - Parte Especial, 2º ed., t. XLVI/26, Borsói, 1964)" (grifamos).

Finalmente,colaciona decisão do Colendo STJ, que, julgando caso, em que o marido havia assassinado a mulher, confirmou a decisão do Eg, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que reconheceu aos filhos do casal o direito à percepção da indenização securitária contratada.

O aresto ficou, assim, ementado:

"Seguro - Assassinato da segurada pelo próprio marido - Direito dos filhos à indenização - Art. 1.436 do Código Civil. Se há dois ou mais beneficiários do seguro e somente um foi o responsável pelo assassinato, o outro nomeado ou outros nomeados fazem jus ao recebimento da prestação" (4º T., AI 69.537-RS, rel. Min. Barros Monteiro, RSTJ93/308)".

Destarte, outra não poderia ter sido a r. decisão monocrática.

Com tais razões de decidir, sempre com respeitosa vênia, NEGO PROVIMENTO ao recurso, mantendo incólume a respeitável sentença de primeiro grau, por seus e por estes fundamentos.

Custas recursais, pela apelante.

O SR. DES. JOSÉ ANTÔNIO BRAGA:

VOTO

Acompanho, integralmente, o voto do Revisor..

SÚMULA: NEGARAM PROVIMENTO, VENCIDO O RELATOR.




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