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quarta-feira, 4 de novembro de 2009

JURID - Apelação criminal. Preliminar. Lei nº 11.719/08. [04/11/09] - Jurisprudência


Apelação criminal. Preliminar. Lei nº 11.719/08. Interrogatório do acusado ao término da instrução criminal.
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Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG.

Inteiro Teor:

EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. PRELIMINAR. LEI Nº 11.719/08. INTERROGATÓRIO DO ACUSADO AO TÉRMINO DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. NÃO-REALIZAÇÃO. NULIDADE. APLICAÇÃO DA LEI PROCESSUAL PENAL NO TEMPO. ARTIGO 2º DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. 'TEMPUS REGIT ACTUM'. REDISTRIBUIÇÃO DOS AUTOS EM VIRTUDE DA RESOLUÇÃO 561/2008 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. INOCORRÊNCIA. SENTENÇA CONDENATÓRIA. INTIMAÇÃO DO ACUSADO DEVIDAMENTE FORMALIZADA. HOMICÍDIO CULPOSO. ABSOLVIÇÃO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. INOCORRÊNCIA. REDUÇÃO DA PENA. ADMISSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS FAVORÁVEIS. AGRAVANTE PREVISTA NO ARTIGO 61, INCISO II, ALÍNEA 'H', DO CÓDIGO PENAL. INCOMPATIBILIDADE COM O CRIME CULPOSO. SUSPENSÃO DA HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR. PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE. PENALIDADE REDUZIDA. - De acordo com o artigo 2º do Código de Processo Penal, a lei processual nova não atinge aqueles atos processuais já praticados, nem seus efeitos, de forma que os interrogatórios realizados antes da entrada em vigor da Lei nº 11.719/08 ficam preservados, respeitando-se, assim, a sua eficácia. - Em que pese à sentença condenatória não ter sido proferida pelo mesmo juiz que presidiu a instrução probatória, não há se falar em violação ao princípio da identidade física do Juiz, porquanto a Lei nº 11.719/08 somente entrou em vigor depois de publicada resolução pela Corte deste Tribunal, modificando a competência das varas criminais da Capital.- Tendo sido o recorrente pessoalmente intimado do teor da sentença condenatória, consoante certidão acostada aos autos, não há se falar em violação ao princípio da ampla defesa.- Comprovadas a autoria, a materialidade do delito e a culpa do acusado, na modalidade imprudência, a imposição de pena é obrigatória, sendo certo que eventual contribuição da vítima para o acidente não enseja o decreto absolutório, porquanto o Direito Penal não alberga a possibilidade da compensação de culpas.- Se os motivos e as conseqüências, por equívoco, foram considerados desfavoráveis ao acusado e o comportamento da vítima contribuiu para o resultado danoso, a pena-base deve ser estabelecida no mínimo legal.- Tratando-se de crime culposo, descabe cogitar da agravante genérica prevista no artigo 61, inciso II, alínea 'h', do Código Penal. - A pena de proibição de se obter permissão ou de suspensão da habilitação para dirigir veículo automotor também deve obedecer ao critério trifásico, guardando proporcionalidade com a reprimenda corporal.

APELAÇÃO CRIMINAL N° 1.0024.05.842629-7/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): WAGNER WELINGTON PEREIRA - APELADO(A)(S): MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADO MINAS GERAIS - RELATOR: EXMO. SR. DES. RENATO MARTINS JACOB

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 2ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM REJEITAR AS PRELIMINARES E DAR PROVIMENTO PARCIAL.

Belo Horizonte, 03 de setembro de 2009.

DES. RENATO MARTINS JACOB - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

Proferiu sustentação oral, pelo apelante, o Dr. Anderson Marques Martins Gomes Pereira.

O SR. DES. RENATO MARTINS JACOB:

VOTO

Trata-se de recurso de apelação interposto por WAGNER WELINGTON PEREIRA contra a r. sentença de fls. 123/129, que julgou procedente a pretensão punitiva deduzida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS, para condená-lo como incurso nas penas do artigo 302, caput da Lei 9.503/97, aplicando-lhe a pena de três anos e seis meses de detenção, em regime aberto, substituída por prestação de serviços à comunidade, e suspensão da habilitação para dirigir pelo prazo de um ano, dentro do qual deverá ser submetido a curso de reciclagem.

Nas razões de fls. 133/147, a douta defesa suscita preliminar de nulidade do processo por ofensa ao princípio da identidade física do juiz, alegando, ainda, que não houve aplicação imediata do novo procedimento previsto na Lei nº 11.719/08.

Aduz, em seguida, que o acusado não foi devidamente intimado acerca da sentença condenatória.

No mérito, sustenta que a vítima foi a única responsável pelo acidente, pois, além de possuir doença mental, era totalmente surda e quase cega, sem condições, portanto, de sair sozinha na rua.

Prossegue afirmando que a pena deveria ser aplicada em seu grau mínimo, já que o acusado é primário e de bons antecedentes.

Ao final, pugna pelo acolhimento da preliminar para que seja reconhecida a nulidade do feito. Caso assim não proceda, pleiteia o provimento do apelo, absolvendo-o do crime que lhe foi atribuído. Subsidiariamente, busca a fixação da reprimenda no mínimo legal.

Devidamente intimado, o Órgão Ministerial apresentou contra-razões às fls. 149/152, pugnando pela rejeição das preliminares, bem como pela redução da pena-base.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça, no parecer de fls. 157/165, opinou pelo acolhimento da preliminar de violação do princípio da identidade física, buscando, assim, a cassação da sentença a fim de que outra fosse proferida pelo Juiz da 1ª Vara Criminal.

Na seqüência, manifestou-se pela rejeição das demais preliminares e, no mérito, pela absolvição do apelante, não obstante tenha constatado a concorrência de culpas para o evento criminoso.

A denúncia foi recebida em 15/05/07 (decisão de fl. 67), tendo a sentença sido publicada em 31/10/08 (certidão de fl. 130).

Conheço do apelo, eis que presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de sua admissibilidade.

DAS PRELIMINARES

a) Da inobservância do rito previsto na Lei nº 11.719/08.

Argúi o acusado a nulidade do feito, ao fundamento de que, não obstante o advento da Lei nº 11.719/08, o interrogatório não foi realizado ao término da instrução criminal.

De início, cumpre destacar que referido ato processual foi realizado em 11/12/07 (fl. 83), sendo certo que a instrução criminal, ou melhor, a audiência para oitiva das testemunhas ocorreu em 04/06/08 (ata de audiência de fl. 101), isto é, antes da vigência da Lei nº 11.719/08 (em vigor a partir de 20/08/08), quando ainda não havia a inversão do rito.

Como sabido, o artigo 2º do Código de Processo Penal (dispositivo norteador da aplicação da lei processual no tempo) adota o sistema do isolamento dos atos processuais, de forma que a lei nova não atinge aqueles já realizados, nem seus efeitos, e será aplicável aos atos processuais que ainda não foram praticados, e que puderem ser perfeitamente isolados dos anteriores.

Noutras palavras, vigente a nova lei processual, aplica-se imediatamente a todos os processos em andamento, bem como aos que se iniciem, em consonância com o princípio tempus regit actum, tendo como referência a prática do ato processual.

E, por conseguinte, os atos processuais já realizados, ficam preservados, respeitando-se, assim a sua eficácia.

Com a percuciência de sempre, Cândido Rangel Dinamarco esclarece a questão atinente à aplicabilidade da lei processual no tempo:

"(...) a lei nova, encontrando um processo em curso, respeita a eficácia dos atos processuais já realizados e portanto as situações já estabelecidas, disciplinando os atos de todos os sujeitos processuais e as situações da partes somente a partir da vigência (Amaral Santos).

Por este critério, que é de aceitação geral na doutrina moderna, não se aplica a lei nova aos atos já realizados nem a situações já consumadas a cada passo do procedimento". (in: Instituições de Direito Processual Civil. São Paulo: Malheiros, 2004, v. I, 4.ed., p. 100).

Dentro dessa premissa, não havia mesmo como se exigir que o interrogatório fosse realizado ao cabo da instrução criminal, pois aludida fase processual encerrou-se antes mesmo da publicação da novel legislação.

De qualquer modo, a Defesa, mesmo em sede de alegações finais, não requereu fosse o acusado submetido a novo interrogatório, sendo certo, por outro lado, que o Magistrado não vislumbrou a necessidade de reprisar o referido ato processual.

Sob tais fundamentos, rejeito a preliminar eriçada.

O SR. DES. HERCULANO RODRIGUES:

VOTO

Acompanho o eminente Relator, pois a Lei nº 11.719 entrou em vigor em 2008, quando já ultimados os atos processuais. O procedimento é meio, não é fim; e se fosse de renovar todos os atos processuais, face à nova lei, a justiça não ficaria emperrada, mas impossibilitada de ser exercitada.

A SRª DESª BEATRIZ PINHEIRO CAIRES:

VOTO

Acompanho, também, o Relator, por entender que o ato processual havia se encerrado antes da publicação da nova legislação.

Rejeito.

O SR. DES. RENATO MARTINS JACOB:

VOTO

b) Da violação ao princípio da identidade física do juiz.

Sustenta a ilustrada Defesa violação ao princípio da identidade física do juiz, porquanto, embora a instrução criminal tenha sido presidida pelo Juiz da 1ª Vara Criminal, a sentença não foi por ele prolatada.

Permissa venia, mas melhor sorte não socorre ao apelante neste aspecto.

Atendendo às disposições e à finalidade da Lei Maria da Penha, a Resolução 561/2008 deste Tribunal de Justiça, além de criar mais uma Vara Criminal na Comarca de Belo Horizonte, estabeleceu que a 1ª e 14ª Varas Criminais teriam competência cível e criminal para julgar e conhecer das causas decorrentes da prática de violência contra mulher.

Por conseqüência, determinou a redistribuição dos autos existentes nas duas varas criminais, cuja matéria não envolvesse violência doméstica, entre as demais varas criminais, motivo pelo qual o presente feito foi remetido à 11ª Vara Criminal em 26/06/08.
Tal providência, entretanto, não implica infringência ao princípio da identidade física do Juiz.

Isso porque que, além de a mencionada Resolução ter entrado em vigor em 19/06/2008 e os autos terem sido enviados à 11ª Vara Criminal em 26/06/08 (fl. 112), a instrução probatória foi concluída em 04/06/08, isto é, antes da vigência da Lei nº 11.719/08, quando não se exigia a observância do aludido princípio no processo penal.

Noutras palavras, quando da entrada em vigor da Lei nº 11.719/08, o Juiz da 11ª Vara Criminal detinha sim competência para proferir sentença.

Neste sentido, aliás, foi o posicionamento adotado por esta Câmara Julgadora em situação muito semelhante:

"CONFLITO NEGATIVO DE JURISDIÇÃO. ALTERAÇÃO DA COMPETÊNCIA POR RESOLUÇÃO DO TJMG ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO NO FEITO. IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. LEI Nº 11.719/08. ALTERAÇÃO QUE NÃO ERA VIGENTE AO TEMPO DA MODIFICAÇÃO DA COMPETÊNCIA.- Tendo sido os autos distribuídos em obediência a Resolução desta Corte, e tendo a Identidade Física do Juiz ingressado no ordenamento em momento posterior, não há falar na sua aplicação, remanescendo a competência do Juízo suscitante" (Habeas Corpus nº1.0000.08.486838-9/000; Rel. Des. Herculano Rodrigues; DJ 31/03/09).

Destarte, inocorrendo nulidade processual, não há que se falar em reabertura da fase instrutória.

O SR. DES. HERCULANO RODRIGUES:

VOTO

Com o Relator.

A SRª DESª BEATRIZ PINHEIRO CAIRES:

VOTO

Com o Relator.

O SR. DES. RENATO MARTINS JACOB:

VOTO

c) Da ausência de intimação do acusado.

Também não vislumbro a ocorrência de qualquer nulidade neste tópico.

Primeiro, porque, consoante se constata da certidão de fl. 153-v, o acusado foi pessoalmente intimado do teor da sentença condenatória em 16/02/09, tendo exarado, inclusive, sua assinatura à fl. 153.

Ainda que assim não fosse, o artigo 392, inciso II, do Estatuto Processual Penal permite que a intimação seja feita apenas ao advogado constituído, no caso de infração afiançável, consoante se verifica na espécie.

Enfim, sob todos os ângulos que examine, não há qualquer nulidade a ser declarada.

Rechaçadas as prefaciais, passo a enfrentar o mérito recursal.

O SR. DES. HERCULANO RODRIGUES:

VOTO

Srª Presidente.

Acompanho o eminente Relator, pois, às fls. 153 e 153v., demonstrado está que o Acusado foi pessoalmente intimado.

A SRª DESª BEATRIZ PINHEIRO CAIRES:

VOTO

Também rejeito a preliminar.

O SR. DES. RENATO MARTINS JACOB:

VOTO

DO MÉRITO

O acusado foi denunciado e, posteriormente, condenado por infração ao disposto no artigo 302, caput, da Lei nº 9.503/97, porque, no dia 29.09.05, por volta das 14h, na rua João Gualberto Filho, próximo ao nº 670, Bairro Sagrada Família, nesta Capital, na condução de seu veículo, atropelou Geny das Dores, provocando-lhe as lesões descritas no auto de corpo de delito de fls. 30/31, as quais foram a causa de sua morte.

De acordo com exordial acusatória, a vítima iniciava a travessia pela mencionada rua, do lado esquerdo para o direito (sentido de trânsito do condutor), quando veio a ser atingida pelo veículo do apelante, o qual imprimia velocidade excessiva, incompatível com circunstâncias da via.

A materialidade delitiva está positivada no laudo pericial de fls. 43/51, na certidão de óbito de fl. 34 e relatório de necropsia de fls. 30/31, segundo o qual a vítima veio a falecer em razão de traumatismo crânio-encefálico causado por instrumento contudente.

Em todas as oportunidades em que foi ouvido, o réu admitiu estar na condução do veículo, quando atingiu a vítima Geny das Dores, confirmando, em juízo, que "conduzia o veículo Fiat Pálio, placa HAY5950, de propriedade do interrogado, pela rua João Gualberto, Bairro Sagrada Família, sentido Bairro/Centro, ocupando a faixa da direita da pista (...) que a vítima foi colhida pela parte dianteira esquerda do veículo; que após ser colhida, a vítima ficou caída no chão à frente do veículo, a uns 02 ou 03 metros" (fl. 84).

Passo, assim, ao exame da tese defensiva, que se limita, basicamente, à alegação de que o fatídico evento ocorreu por culpa exclusiva da vítima, não agindo este com culpa para tal fatalidade.

Como de notória sabença, ao contrário do que ocorre na esfera cível, no âmbito penal não é possível a chamada "compensação de culpas", porque não se trata de responsabilização por uma simples dívida civil, mas, sim, da prática de um delito, de forma que somente se afasta a responsabilidade do agente quando estiver devidamente comprovada a culpa exclusiva da vítima.

É o que explica JÚLIO FABRINI MIRABETE, em comentário ao artigo 18 do Estatuto Repressivo:

"Ao contrário do que ocorre no Direito Civil, as culpas não se compensam na área penal. Havendo culpa do agente e da vítima, aquele não se escusa da responsabilidade pelo resultado lesivo causado a esta. Só se exclui a responsabilidade do causador do evento quando há culpa exclusiva da vítima. Em caso de condenação, porém, o comportamento da vítima, bem como o grau da culpa, devem ser levados em conta fixação da pena base (ar. 59)" (Código Penal Interpretado. São Paulo: Atlas, 1999, p. 174).

Em se tratando da figura descrita no artigo 302 do Código de Trânsito Brasileiro, a caracterização da "culpa exclusiva da vítima", depende de não haver nenhum vínculo objetivo entre o atropelamento e a inobservância das regras de trânsito por parte do condutor, o qual tem o dever de, a todo o momento, manter o domínio do veículo, dirigindo-o com atenção e cuidados indispensáveis à segurança do trânsito, conforme exegese do artigo 28 da Lei 9.503/97.

De fato, a experiência nos revela que, quase como regra, os motoristas que se envolvem em atropelamentos fatais de pedestres imputam à infeliz vítima a responsabilidade pelo acontecimento, ora alegando que ela caminhava distraída, ora que ela se atirou inesperadamente sobre o veículo, ou, ainda, de que ela poderia estar sob efeito de álcool ou qualquer outra substância entorpecente.

Em não raros casos, tais alegações não servem de escusa ao motorista, mas, ao revés, indicam que ele conduzia o veículo sem a devida atenção, não se apercebendo sequer da aproximação do pedestre. Portanto, afirmações desse jaez devem sempre ser recebidas com cautela, não apenas porque já não é mais possível à infeliz vítima apresentar sua versão dos fatos, mas, também, porque o motorista é pessoa diretamente interessada no feito, narrando o ocorrido como bem lhe aprouver.

Por tais razões, examinando situações semelhantes, a jurisprudência refuta a responsabilidade do condutor do veículo apenas quando este se desincumbe de comprovar o álibi alegado, nos moldes do artigo 156 do Código de Processo Penal, e, lado outro, quando o Parquet não logra êxito em demonstrar qualquer conduta culposa do réu.

Adentrando o caso concreto, não vejo como afastar a culpa do apelante na produção do resultado danoso, havendo nítido nexo de causalidade entre sua conduta imprudente e o resultado morte, que, dentro do contexto fático delineado nos autos, era previsível.

Conforme indicado pelo laudo pericial de fls. 43/51, tratava-se de um trecho em reta e declive acentuado, dotado de mão dupla direcional, com boa visibilidade e piso asfáltico.

No quarteirão anterior ao local do acidente, havia placa sinalizadora, indicando que a velocidade máxima permitida para o local era de 40(quarenta)Km/h.

As fotografias demonstram, ainda, que a rua está situada em uma área residencial, tanto que a vítima morava em frente ao local do acidente.

Some-se, ainda, a conclusão da prova técnica no sentido de que veículo do apelante, no momento da colisão, imprimia velocidade mínima de 49,2Km/hora, pois a energia dissipada com deformações da lataria, calor, som, malgrado não mensuráveis naquela oportunidade, implicam acréscimo na velocidade.

Noutro giro, verifica-se que a vítima, embora em local impróprio, já havia iniciado a travessia da rua pelo lado esquerdo (tanto que foi atingida em seu lado direito, cf. relatório de necropsia de fls. 30/31), oposto, portanto, ao do veículo do apelante. O acusado pôde ver a vítima atravessar a rua, tendo, inclusive, jogado o carro para o lado esquerdo, mas acreditou que uma buzinada poderia evitar o resultado danoso.

Ora, se a vítima não tivesse iniciado a travessia, não haveria razão para o apelante jogar seu veículo para o lado esquerdo.

Em outras palavras, o recorrente desconsiderou a placa indicativa de velocidade e o declive da via (o que demanda maior tempo para frenagem), denotando, com isso, ter agido de forma imprudente.

A propósito, valho-me dos ensinamentos de Guilherme de Souza Nucci:

"Conceito de imprudência: é a forma ativa de culpa, significando um comportamento sem cautela, realizado com precipitação ou com insensatez. Ex.: a pessoa que dirige em alta velocidade dentro da cidade, onde há passantes por todos os lados, age com nítida imprudência" (in: Código Penal Comentado. São Paulo: RT, 2003, 4.ed., p. 145).

Traçado todo esse panorama, não há se falar em culpa exclusiva da vítima, devendo, pois, ser mantido o édito condenatório.

Contudo, entendo merecer guarida o inconformismo do apelante no tocante à redução da pena.

Verifico que os motivos, as circunstâncias, as conseqüências e o comportamento da vítima foram considerados desfavoráveis ao acusado, ensejando a elevação da pena-base para três anos de detenção.

Contudo, nada há nos autos a demonstrar que os motivos possam ser sopesados em seu desfavor.

As conseqüências apontadas como danosas são inerentes ao tipo penal do homicídio culposo, isto é, não transcedem ao resultado típico morte.

Não obstante as circunstâncias sejam desfavoráveis, pois praticado em via com boas condições, devidamente sinalizada, com boa visibilidade, localizada em região residencial, constato que o comportamento da vítima tende a beneficiar o acusado, recomendando a fixação da pena-base do mínimo legal.

De fato, a prova testemunhal (fls. 104/105) revela que a vítima, idosa (68 anos), apresentava transtorno mental, mas não se submetia a tratamento médico e não enxergava do olho esquerdo e visão do olho, havendo relato, ainda, de que era deficiente auditiva.

Enfim, existem fortes indícios de que a vítima não deveria andar sozinha na rua e, portanto, suas dificuldades pessoais contribuíram sim para o acidente, o que enseja a redução da pena-base para o mínimo legal, isto é, para dois anos, que se torna definitiva, à míngua de agravantes, atenuantes, causas de aumento e de diminuição.

Nesse ponto, necessário ressaltar que, em sede de crimes culposos, salvo a reincidência, incabível a incidência das agravantes previstas no artigo 61, inciso II, Código Penal, pois, se trata de um resultado involuntário, não há como agravar a pena do agente em razão de uma circunstância por ele não prevista e não desejada.

A propósito, explica Guilherme de Souza Nucci:

"33. rol dos inciso II para crimes dolosos: entende-se, majoritariamente, serem aplicáveis as circunstâncias agravantes previstas no inciso II somente aos crimes dolosos, por absoluta incompatibilidade com o delito culposo, cujo resultado é involuntário. Como se poderia chamar de fútil o crime culposo, cujo resultado é involuntário, se o agente não trabalhou diretamente pelo resultado? Como se poderia dizer ter havido homicídio culposo cruel, se o autor nada fez para torná-lo mais sofrido à vitima" (in: Código Penal Comentado. São Paulo: RT, 2004, p. 270).

Com muito acerto, também já proclamou o Supremo Tribunal Federal:

"Tratando-se de delito culposo, ainda que no plano da chamada culpa consciente, o fato de ser velho o ofendido não cabe no campo da previsão do infrator, atendo-se este na confiança de não causar o resultado. Não cabe, portanto, tal circunstância para agravar-lhe a pena" (RT 592/412).

Mantenho, também, o regime aberto (artigo 33, § 2º, alínea 'c', do Código Penal), esclarecendo, ainda, que, no tocante à substituição por penas restritivas de direitos, o acusado acabou sendo beneficiado, porquanto, para penas superiores a um ano, são cabíveis duas penas substitutivas, contudo, o Magistrado fixou tão-somente a prestação de serviços à comunidade.

Por outro lado, se a pena privativa de liberdade foi fixada próxima ao mínimo legal, reconhecendo que quase todas as circunstâncias do artigo 59 do Código Penal são favoráveis ao réu, não há motivos para que a suspensão da habilitação seja fixada além da pena-base, que é de 02 (dois) meses.

Mutatis mutandis, colhe-se da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

"Em respeito ao princípio da proporcionalidade, reconhecidas como favoráveis as circunstâncias do art. 59 do Código Penal, tanto que a pena pelo crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor foi fixada no piso legal, a pena de suspensão de habilitação para dirigir veículo automotor deve, também, ser fixada em seu mínimo. Precedentes do STJ". (REsp 824234/DF, rel. Ministra LAURITA VAZ, DJ 02/10/2006 p. 311).

Assim, ausentes atenuantes, agravantes, causas de aumento ou de diminuição, fixo a penalidade de suspensão da habilitação para dirigir veículo em 02 (dois) meses.

POSTO ISSO, pedindo vênia à douta Procuradoria-Geral de Justiça, rejeito as preliminares e dou parcial provimento ao recurso de apelação apenas para reduzir a reprimenda corporal para 02 (dois) anos de detenção, e reduzir a duração da penalidade de suspensão da habilitação para dirigir veículo para 02 (dois) meses, mantida, quanto ao mais, a r. sentença.

Custas recursais, ex lege.

O SR. DES. HERCULANO RODRIGUES:

VOTO

Com o Relator.

A SRª. DESª. BEATRIZ PINHEIRO CAIRES:

VOTO

Com o Relator.

SÚMULA: REJEITARAM AS PRELIMINARES E DERAM PROVIMENTO PARCIAL.

Data da Publicação: 21/10/2009




JURID - Apelação criminal. Preliminar. Lei nº 11.719/08. [04/11/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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