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segunda-feira, 9 de novembro de 2009

JURID - Apelação criminal. Embargos infringentes. [09/11/09] - Jurisprudência


Apelação criminal. Embargos infringentes. Reconsideração de voto. Alteração do julgamento da apelação. Impossibilidade. Julgamentos diversos.


Supremo Tribunal Federal - STF.

DJe nº 195 Divulgação 15/10/2009 Publicação 16/10/2009 Ementário nº 2378 - 2

SEGUNDA TURMA

HABEAS CORPUS 93.857-4 RIO GRANDE DO SUL

RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO

PACIENTE(S): MARCELO FERRIGO

IMPETRANTE(S): NEREU LIMA E OUTRO(A/S)

COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

1. APELAÇÃO CRIMINAL. Embargos infringentes. Reconsideração de voto. Alteração do julgamento da apelação. Impossibilidade. Julgamentos diversos. A interposição de embargos infringentes devolve ao tribunal a apreciação da matéria, de modo que os novos votos não produzem efeitos no julgamento anterior.

2. AÇÃO PENAL. Crime. Indícios da existência do delito. Absolvição, em habeas corpus. Inadmissibilidade. Alegação que exigiria cognição completa do conjunto de provas. Providência inviável em pedido de habeas corpus. Precedentes. A absolvição por ausência de provas do delito requer o exame da matéria fático-probatória, providência inviável em habeas corpus.

3. AÇÃO PENAL. Condenação. Sentença condenatória.Capítulo decisório. Pena base. Fixação acima do mínimo legal, sem razão idônea. Inadmissibilidade. Redução da pena. HC concedido para esse fim. Precedentes. artigo 5º, XLVI, e 93, IX, da CF. A exigência constitucional da individualização da pena implica a necessidade de explicitação dos fatos que justificam a exasperação da sanção penal.

4. SENTENÇA PENAL. Condenação. Tráfico de entorpecente. Crime hediondo. Pena privativa de liberdade. Substituição por restritiva de direitos. Admissibilidade. Previsão legal de cumprimento em regime integralmente fechado. Irrelevância. Distinção entre aplicação e cumprimento de pena. HC deferido para restabelecimento da sentença de primeiro grau. Interpretação dos artigos 12 e 44 do CP, e das Leis nºs 6.36886, 8.072/90 e 9.714/98. Precedentes. A previsão legal de regime integralmente fechado, em caso de crime hediondo, para cumprimento de pena privativa de liberdade, não impede seja esta substituída por restritiva de direito, caso presentes os demais requisitos legais.

5. AÇÃO PENAL. Condenação. Pena privativa de liberdade. Pendência de recurso. Execução provisória. Inadmissibilidade. Inexistência de efeito suspensivo dos recursos especial e extraordinário. Irrelevância. Ofensa ao artigo 5º, incs. LIV e LVII, da CF. Ofende a Constituição da República (artigo 5º, LIV e LVII), a execução - provisória - de sentença penal condenatória sujeita a recurso.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência da Senhora Ministra ELLEN GRACIE, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em deferir, em parte, o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Senhores Ministros JOAQUIM BARBOSA e EROS GRAU.

Brasília, 25 de agosto de 2009.

Ministro CEZAR PELUSO - Relator

RELATóRIO

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - (Relator): Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de MARCELO FERRIGO, contra decisão do Superior Tribunal de Justiça que, ao julgar o HC 64.900, o indeferiu.

O paciente foi condenado à pena de 5 (cinco) anos de reclusão, em regime integralmente fechado, e ao pagamento de multa, como incurso no artigo 12 da Lei nº 6.368/76 (fls. 276-283, em apenso). A sentença condenatória decretou a prisão como condicionante de recurso. O decreto prisional foi revogado pelo próprio Juízo de primeiro grau, que reconheceu o direito do paciente, o qual respondeu solto ao processo, a apelar em liberdade (fl. 493, em apenso).

A defesa apelou da sentença ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que, por maioria, negou provimento ao recurso (fls. 207-226). Opuseram-se embargos infringentes, em cujo julgamento um dos desembargadores que haviam votado pela condenação do réu acompanhou o voto vencido. Ainda assim, os embargos foram rejeitados (fls. 227-263). Em decorrência, foi novamente decretada a prisão do paciente (fl. 613, em apenso).

A defesa opôs, em seguida, embargos de declaração, que foram parcialmente acolhidos, e, de ofício, a Corte a quo estabeleceu regime de cumprimento inicial fechado (fl. 672, em apenso).

Contra a decisão dos embargos de declaração, a defesa, simultaneamente, interpôs recurso especial e impetrou habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça, além de recurso extraordinário perante esta Corte. A ordem de habeas corpus foi denegada, em decisão tida pelo impetrante como configuradora de constrangimento ilegal. São estes seus termos:

"ILÍCITO DE ENTORPECENTES. ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE NA VIA ELEITA. DOSIMETRIA DA PENA. MAJORAÇÃO DA PENA BASE POUCO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. QUANTIDADE DA DROGA APREENDIDA E PARTICIPAÇÃO INTENSA DO AGENTE NA PRÁTICA DO DELITO. PRECEDENTES DO STJ.

1. Não é possível, na via exígua do habeas corpus, proceder a amplo reexame dos fatos e das provas para absolver o ora Paciente, sobretudo se a instância ordinária, soberana na análise fático-probatória, nos autos do processo-crime, do recurso defensivo de apelação e dos embargos infringentes, vislumbrou elementos probatórios coerentes e válidos a ensejar a condenação.

2. Nada impede que o Desembargador-vogal do acórdão proferido por maioria, em sede de recurso de apelação, ao participar do julgamento dos embargos infringentes, melhor analisando a matéria, modifique o seu entendimento. A condenação de primeiro grau foi mantida com apoio no material probatório colhido na instrução processual e em observância ao Princípio do Livre Convencimento Motivado.

3. Ao majorar a pena-base, o juízo sentenciante considerou as peculiaridades concretas do delito de tráfico de drogas em questão, tais como a quantidade da droga apreendida e a intensa culpabilidade do Paciente, que praticava o crime de tráfico em larga escala, tanto que chegou a alugar um sítio para armazenagem da substância entorpecente.

4. Tem-se, portanto, satisfatoriamente fundamentada a exasperação da reprimenda inicial, pois tais argumentos não são inerentes ao tipo penal e justificam a fixação da pena-base em 05 (cinco) anos, o que não se mostra desproporcional ou injustificado, pois a sanção cominada in abstrato para o crime é de 03 (três) a 15 (quinze) anos de reclusão.

5. A sentença condenatória impôs regime prisional mais gravoso valendo-se da interpretação conjunta dos artigos 59 e 33, parágrafo segundo, ambos do Código Penal, o que afasta a alegação de qualquer ilegalidade.

6. Fixada a pena-base acima, do mínimo legal, em razão do reconhecimento judicial expresso e fundamentado de serem desfavoráveis algumas das circunstâncias judiciais, não há como conceder ao Paciente o benefício da substituição da pena privativa de liberdade pela restritiva de direitos, á luz do disposto no artigo 44, inciso III, do Código Penal.

7. Os recursos especial e extraordinário, se interpostos e admitidos, não possuem efeito suspensivo capaz de impedir o regular curso da execução da decisão condenatória. A custódia do sentenciado em cárcere, decorrente de sua condenação na instância ordinária, em sede de recurso de apelação, é providência compatível com o sistema processual vigente.

8. Precedentes do Pretório Excelso e desta Corte Superior de Justiça.

9. Ordem denegada" (f Is. 164-165).

Alega o impetrante: (i) que é nulo o acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que manteve a condenação do réu, uma vez que, no julgamento dos embargos infringentes, um dos Desembargadores modificou o seu entendimento e absolveu o acusado, nos termos do voto vencido. Argumenta que a mudança de posicionamento significa modificação do acórdão proferido na apelação, considerando-se que a maioria se posicionou a favor do apelante; (ii) que não há provas suficientes para a condenação; (iii) que não há fundamento para a aplicação da pena acima do mínimo legal; e (iv) que a expedição de mandado de prisão pelo Tribunal a quo não está devidamente fundamentada.

Requer, verbis:

"1) A anulação do Acórdão que julgou a apelação, par que seja come atado favoravelmente ao réu o Voto do Desembargador Manuel José Martinez Lucas, firmando-se a absolvição daquele;

2) Caso não seja aceita a anulação, ad argumentandum fanfam, requer-se a absolvição do Paciente em decorrência da completa ausência de provas da autoria do delito;

3) Alternativamente, apenas a titulo de argumentação, requer-se a redução da pena corporal para o mínimo legal, e, consequentemente, a sua substituição por pena restritiva de direitos;

4) A revogação definitiva do decreto de prisão do Paciente até o trânsito em julgado de sua condenação" (fls. 52).

Diante da notícia de execução provisória da pena, concedi a liminar, para determinar que o paciente aguardasse solto o julgamento definitivo desde habeas ou o trânsito em julgado de eventual condenação (fls. 266-268).

O Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem (fls. 301-308).

É o relatório.

VOTO

O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - (Relator): 1. A ordem deve ser parcialmente concedida.

Requer a defesa, inicialmente, anulação do julgamento da apelação pelo Tribunal local, diante da mudança de posição de um dos julgadores nos embargos infringentes. Segundo a defesa, o fato de um dos desembargadores que haviam votado pela condenação haver reconsiderado o voto para absolver o réu significa que, se esta última posição tivesse sido adotada desde o início, o julgamento da apelação culminaria na absolvição do paciente.

Mas o argumento não colhe.

É que a interposição dos embargos infringentes devolveu ao tribunal a apreciação da matéria objeto de divergência. Em se tratando de novo julgamento, a nova decisão - composta pela síntese das opiniões de todos os componentes do órgão, os juízes que já haviam participado do primeiro julgamento, mais aqueles que ainda não se haviam manifestado - não pode ser cindida, nem produzir efeitos no julgamento anterior.

Entendimento diverso levaria a aporia processual: se o novo voto proferido pelo desembargador revisor nos embargos infringentes, absolvendo o réu, pudesse ser aproveitado no julgamento da apelação, a consequente decisão favorável ao réu no primeiro julgamento levaria à inadmissibilidade dos embargos infringentes, e, assim, a segunda decisão - precisamente a que levou à absolvição - teria sido proferida em julgamento inexistente!

Mas não é caso de tamanha incoerência, pois o julgamento dos embargos infringentes não se confunde com o julgamento prévio da apelação. Trata-se de outro ato decisório, de modo que não há nulidade alguma na decisão do Tribunal local que negou provimento à apelação.

2. Requer, ainda, a absolvição do paciente, "por completa ausência de provas da autoria do delito".

Mas, como se vê da longa descrição dos fatos de que se socorre a inicial para fundamentar o pedido, o acolhimento da pretensão exigiria exame aprofundado das provas. Não se trata, aqui, de simples exame de prova pré-constituída: afirmam os impetrantes, após relatar inconsistências nos depoimentos das testemunhas, que "tais dúvidas fortalecem o depoimento do paciente e a tese de ilicitude probatória. Condenação sem prova, baseada em suposições, já que até mesmo os indícios apontam para a inocência do Paciente" (fl. 22).

O raciocínio já demonstra, pois, o contraste entre a pretensão e a jurisprudência aturada desta Corte, no sentido do que o reexame da prova é inviável em sede de habeas corpus (cf. HC nº 82.625, Rel. Min. GILMAR MENDES; HC nº 82.782, 82.493, 82.517, 82.246, Rel. Min. ELLEN GRACIE; HC nº 82.191, Rel. Min. MAURÍCIO CORRÊA; HC nº 82.128, 82.377, 82.839, 82.394, Rel. Min. CARLOS VELLOSO).

3. Como pedido subsidiário, os impetrantes requerem a fixação da pena no mínimo legal, diante da inidoneidade da fundamentação adotada pelo juízo de primeiro grau para aumentar a pena-base e estabelecer regime inicialmente fechado.

Neste ponto, assiste razão à defesa. Transcrevo trecho da sentença condenatória, na parte em que fixou a pena:

"O réu é primário, personalidade sem elementos para avaliar, conduta anti-social pela natureza do delito, que ameaça a ordem pública, embora abonada a conduta por testemunhas; culpabilidade elevada, tendo plena consciência da ilicitude do fato, principalmente por estar cursando a faculdade de Direito; motivos voltados ao ganho ilícito; circunstâncias como relatadas nos autos, havendo indícios de que o réu tenha locada [sic] o imóvel, no interior de sitio em Gravataí, para guardar a grande quantidade de droga que acabou sendo apreendida por policiais; conseqüências sempre graves, pois o tóxico acarreta danos á saúde pública, especialmente aos jovens, por isso, fixo a pena-base em cinco anos de reclusão, que torno definitiva por ausência de outras causas modificadoras (fl. 282, apenso 2).

O juízo de primeiro grau, ao fixar a pena-base acima do mínimo legal, fez referência a elementos que compõem a descrição mesma do injusto penal - natureza do delito, consciência da ilicitude, motivos voltados ao ganho ilícito, conseqüências nocivas do tráfico de drogas in abstrato. Mas a fixação da pena-base acima do mínimo legal exige motivação específica, não bastando a mera alusão às circunstâncias já valoradas na escala abstrata da pena (RHC nº 83.482, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE; DJ 19/12/2003).

Há, é verdade, menções concretas às circunstâncias judiciais do paciente, que dizem respeito à personalidade do agente - "sem elementos para avalia' -, ao local do crime - "sítio em Gravataí para guardar a grande quantidade de droga" -, e à sua culpabilidade exacerbada por estar "cursando a faculdade de Direito'. Nenhuma delas, no entanto, parece idônea a justificar agravamento da pena-base e, muito menos, o aumento em dois terços, como se deu no caso.

Cito, a propósito, outra decisão da lavra do Min. SEPÚLVEDA PERTENCE:

"[A] exigência de motivação da individualização da pena - hoje, garantia constitucional do condenado (CF, artigos 5º, XLVI, e 93, IX) -, não se satisfaz com a existência na sentença de frases ou palavras quaisquer, a pretexto de cumpri-la: a fundamentação há de explicitar a sua base empírica e essa, de sua vez, há de guardar relação de pertinência, legalmente adequada, com a exasperação da sanção penal, que visou a justificar" (HC 69.419, DJ 28/08/1992).

Tenho que, no caso, exasperação da pena-base não está devidamente justificada. Diante da ausência de outros elementos agravantes ou atenuantes, a pena deve ater-se ao mínimo legal, em regime inicial fechado.

Quanto à substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, é certo que a Corte já assentou sua admissibilidade em casos análogos (HC nº 84.928, Rel. Min. CEZAR PELUSO, RT 844/507; HC nº 85.894, Plenário, Rel. Min. GILMAR MENDES, DJ 28/09/2007; HC nº 84.715, Rei. Min. JOAQUIM BARBOSA, DJ 29/06/2007; HC nº 85.945, Rel. Min. CELSO DE MELLO, j. 09/10/2007; HC nº 96.112, Rel. p/ ac. Min. CEZAR PELUSO, DJe 07/08/2009).

Não há nos autos, no entanto, elementos suficientes a demonstrar que o paciente preenche as condições objetivas de concessão do benefício, cabendo tal análise ao juízo de primeiro grau.

4. Finalmente, mantenho o entendimento exposto em sede liminar, para garantir ao paciente o direito de aguardar em liberdade o trânsito em julgado da sentença condenatória, especialmente diante do recente julgamento do HC nº 84.078 (Rel. Min. EROS GRAU, j. 05/02/2009), em que se proclamou a incompatibilidade da execução provisória de sentença penal condenatória com o disposto no artigo 5º, LIV e LVII, da Constituição da República.

5. Ante o exposto, concedo parcialmente a ordem, para, confirmando a liminar, determinar que o paciente aguarde em liberdade o trânsito em julgado de eventual sentença condenatória, bem como para fixar-lhe a pena em três anos de reclusão, em regime fechado, mantidas, no mais, as condições determinadas pelo juízo de primeiro grau, que deverá apurar se o paciente preenche os requisitos objetivos para eventual substituição da pena privativa de liberdade, nos termos do artigo 44 do Código Penal.

Ministro CEZAR PELUSO - Relator

EXTRATO DE ATA

HABEAS CORPUS 93.857-4

PROCED.: RIO GRANDE DO SUL

RELATOR: MIN. CEZAR PELUSO

PACTE.(S): MARCELO FERRIGO

IMPTE.(S): NEREU LIMA E OUTRO (A/S)

COATOR(A/S)(ES): SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

Decisão: A Turma, à unanimidade, deferiu, em parte, o pedido de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, neste julgamento, os Senhores Ministros Joaquim Barbosa e Eros Grau. 2ª Turma, 25.08.2009.

Presidência da Senhora Ministra Ellen Gracie. Presentes à sessão os Senhores Ministros Celso de Mello e Cezar Peluso. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Joaquim Barbosa e Eros Grau.

Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco Adalberto Nóbrega.

Carlos Alberto Cantanhede - Coordenador




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