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quinta-feira, 7 de maio de 2009

JURID - Ação ordinária. Direitos de vizinhança. Lote de terreno. [07/05/09] - Jurisprudência


Ação ordinária. Direitos de vizinhança. Lote de terreno. Desmoronamento. Danos morais.

Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG.

EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. DIREITOS DE VIZINHANÇA. LOTE DE TERRENO. DESMORONAMENTO. DANOS MORAIS. PROVA. CRITÉRIO DE FIXAÇÃO. Não é permitida a execução de qualquer obra ou serviço suscetível de provocar desmoronamento ou deslocação de terra, ou que comprometa a segurança do prédio vizinho, senão após haverem sido feitas as obras acautelatórias, sendo certo que o proprietário do prédio vizinho tem direito a ressarcimento pelos prejuízos que sofrer, não obstante haverem sido realizadas as obras acautelatórias. Dentro das circunstâncias de cada caso, é pacífico que o dano moral se mostra intuitivo e, portanto, insuscetível de demonstração material, falando-se então que o dano moral se prova por si mesmo ou "in re ipsa". O conceito de ressarcimento, em se tratando de dano moral, abrange dois critérios, um de caráter pedagógico, objetivando repreender o causador do dano pela ofensa que praticou; outro de caráter compensatório, que proporcionará à vítima algum bem em contrapartida ao mal sofrido.

APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0133.05.024709-6/001 - COMARCA DE CARANGOLA - APELANTE(S): VASCO ANTÔNIO DE SOUZA E SUA MULHER - APELADO(A)(S): MARCOS ALEXANDRE DE SOUZA E OUTRO(A)(S) - RELATOR: EXMO. SR. DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 12ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO

Belo Horizonte, 15 de abril de 2009.

DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA:

VOTO

Cuida-se de recurso de apelação interposto por VASCO ANTÔNIO DE SOUZA e EDNÉIA AGUIAR TINTE nos autos de ação ordinária ajuizada por MARCOS ALEXANDRE DE SOUZA e CILÉZIA BORGES DA SILVA, contra a sentença de f. 162/168, proferida pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Cível, Criminal e da Infância e Juventude da Comarca de Carangola, que concluiu:

"[...] julgo parcialmente procedente o pedido dos autores, deixando de condenar os requeridos ao pagamento de indenização por danos materiais, na quantia de R$ 2.700,00 [...], nos termos da inicial, mas condenando-os ao pagamento de indenização por danos morais, aos autores, na quantia total de R$ 5.400,00 [...], devidamente corrigida monetariamente, com base na tabela da Corregedoria de Justiça do Estado de Minas Gerais e juros moratórios de 1% [...] ao mês, contados da data da publicação da presente decisão.

Condeno os réus ao pagamento das custas e despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios, em 15% [...] sobre o valor da condenação, tendo em vista o médio grau de complexidade da causa e o trabalho despendido pela advogada, a teor do artigo 20, § 3º do Código de Processo Civil. Todavia, determino a suspensão da cobrança, por um lustro, em razão da assistência judiciária deferida" (f. 167/168)

MARCOS ALEXANDRE DE SOUZA e CILÉZIA BORGES DA SILVA, ora apelados, ajuizaram esta ação buscando indenização por danos morais e materiais, apresentando como causa de pedir o desmoronamento de grande parte do seu lote de terreno descrito na petição inicial, "decorrente de falhas e imperícias ocasionadas pela construção e escavação feita pelos confrontantes vizinhos dos fundos" (f. 04).

Inconformados com a condenação ao pagamento de indenização por danos morais, os apelantes VASCO ANTÔNIO DE SOUZA e EDNÉIA AGUIAR TINTE sustentam que "observa-se que o fator para a queda do 'barranco' foi unicamente devido à grande quantidade de chuva que ocorreu no município de Carangola/MG" (f. 173).

Dizem que "restou devidamente comprovado que os recorrentes realizaram toda a construção dentro das normas solicitadas" e que "consoante se observa das fotografias juntadas aos autos pelos recorridos, o lote por eles possuído encontrava-se, no período chuvoso, devidamente limpo, sem qualquer pastagem, o que permite maior facilidade no deslizamento de terra" (f. 174).

Nessa linha, afirmam que "o fato foi causado por caso fortuito ou força maior, não havendo que se falar em indenização" e que "restou comprovado nos autos que os recorridos não tinham interesse de realizar a construção de casa no referido lote, tanto que resta demonstrado nos autos que estes realizaram a venda do terreno" (f. 175).

Assinalam que "embora os recorridos tenham tido aborrecimentos com a queda do barranco, não se pode considerar que tais desconfortos, passageiros por sinal e que não mancham de forma definitiva a honra da pessoa humana, caracterizem prejuízo moral passível de indenização" (f. 177).

Ao final, pedem pelo provimento do recurso, inclusive para minoração do valor arbitrado a título de danos morais.

Conheço do recurso, porque presentes os pressupostos para sua admissibilidade.

No que diz respeito ao uso anormal da propriedade, o art. 1.277 do Código Civil dispõe que o proprietário ou o possuidor de um prédio tem o direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela utilização de propriedade vizinha.

Lado outro, quanto ao direito de construir, pela dicção do art. 1.299 do mesmo diploma legal, o proprietário pode levantar em seu terreno as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos administrativos.

Todavia, ainda no capítulo dos direitos de vizinhança, determina o art. 1.311 que não é permitida a execução de qualquer obra ou serviço suscetível de provocar desmoronamento ou deslocação de terra, ou que comprometa a segurança do prédio vizinho, senão após haverem sido feitas as obras acautelatórias, sendo certo que o proprietário do prédio vizinho tem direito a ressarcimento pelos prejuízos que sofrer, não obstante haverem sido realizadas as obras acautelatórias.

Sobre esse aspecto, o Professor Geyson Gonçalves ensina que:

"A previsão do art. 1.311 aponta para uma possibilidade de uso anormal da propriedade, no caso de obra que provoque desmoronamento ou deslocação de terra, em proporções que comprometam a segurança do prédio vizinho. Assim, as obras somente são possíveis após a realização de obras de segurança, que tenham por objetivo evitar os eventuais danos já referidos. É importante notar que a previsão normativa abarca tanto o desmoronamento, que é um fenômeno de fácil observação, por ser um deslocamento abrupto de terra, quanto o deslocamento, que consiste em um fenômeno de depósito paulatino de terra e, por isso mesmo, de mais difícil observação.

[...]

O parágrafo único prevê que a responsabilidade do construtor das obras que possam colocar em risco de desmoronamento ou deslocamento de terra o prédio vizinho independe das precauções que tenha tomado para evitar o dano. Em outras palavras, a responsabilidade do construtor independe da investigação de culpa para ser caracterizada, tanto é assim que mesmo que tenha realizado as obras acautelatórias necessárias, a existência de dano posterior evidencia a obrigação do construtor de indenizar o proprietário atingido." (MACHADO, Antônio Cláudio da Costa (organizador); CHINELLATO, Silmara Juny (coordenadora), Código Civil Interpretado: artigo por artigo, parágrafo por parágrafo, 2. ed. Barueri/SP: Editora Manole, 2009, p. 1.033/1.034)

Assim, examinando o laudo pericial de f. 103/108, ficou destacado que a construção de um muro sub-dimensionado pelos apelantes, associado à ocorrência das chuvas favoreceu a desestabilização do maciço terroso (f. 105) e, desse modo, constatada a responsabilidade dos apelantes em relação ao desmoronamento do lote de terreno dos apelados.

Logo, houve falha no projeto de construção do muro de contenção.

Em resposta aos quesitos 4.2.5 (f. 106) e 4.2.11 (f. 108) o perito concluiu que "o muro executado no local em questão foi sub dimensionado para trabalhar como muro de [contenção] de encosta, havendo falha também na altura do mesmo."

Além disso, no depoimento da testemunha arrolada pelos apelantes ficou consignado o seguinte:

"que nos anos de 2002 e 2003 era membro da defesa civil ligado à Prefeitura desta comarca; que tinha a função de vistoriar locais onde havia desmoronamento para que fossem tomadas providências; que em certa ocasião, foi chamado pelos réus tendo comparecido no local em que moravam e constatado que tinha havido desmoronamento de terras para o terreno da parte de baixo; que é formado em direito e matemática; que não é capaz de dizer qual foi a causa do desmoronamento evidenciado; que ficou sabendo que já havia sido autorizada a obra através do habite-se; que a orientação para os réus, na ocasião foi de que fosse coberto o terreno com lona; que não lembra se havia sido construído muro de contenção no local, na ocasião; que os réus chegaram a colocar a lona, para evitar desmoronamento em razão das chuvas que estavam acontecendo na ocasião. Que já havia uma certa quantidade de terras no terreno de baixo, mas viu que havia pessoas tirando as terras com carrinhos" (f. 148).

Com isso, não se sustenta a alegação dos apelantes acerca da ocorrência de caso fortuito ou de força maior, exatamente porque as obras por eles realizada é que ocasionou o desmoronamento de parte do terreno dos apelados.

Ademais, as chuvas ocorridas no período em questão se situam num patamar previsível, não configurando catástrofe natural, como insistem em argumentar.

No caso, em que pese o Magistrado de primeira instância ter julgado improcedente o pedido de indenização por danos materiais, e quanto a este ponto se conformaram os apelados, como decorrência dos direitos de vizinhança, mostra-se inafastável o dever de indenização pelos danos morais ocasionados pela conduta ilícita dos apelantes.

Na hipótese dos autos, ao contrário do que sustentam os apelantes, os apelados não experimentaram apenas meros aborrecimentos, mas sim o sentimento de indignação e de revolta com a conduta ilícita dos apelantes que frustrou o legítimo desejo de construírem sua casa própria. Por isso, impõe-se o dever de reparação.

Nesse particular, o laudo pericial destacou que:

"4.1.1 No lote de terra de propriedade dos autores, tem condições de ser edificada casa?

R- Enquanto não for construído o muro de contenção no talude desestabilizado é desaconselhável qualquer edificação neste lote." (f. 105)

Quanto ao dano moral experimentado, dentro das circunstâncias de cada caso, é pacífico que se mostra intuitivo e, portanto, insuscetível de demonstração material, falando-se então que o dano moral se prova por si mesmo ou in re ipsa.

Sobre esse assunto, Carlos Alberto Bittar ensina que "o dano moral repercute internamente, ou seja, na esfera íntima, ou no recôndito do espírito, dispensando a experiência humana qualquer exteriorização a título de prova, diante das próprias evidências fáticas. [...] A simples análise das circunstâncias fáticas é suficiente para a sua percepção, pelo magistrado, no caso concreto." (Reparação Civil Por Danos Morais, RT, 2ª edição, pág. 130).

Conforme anota Rui Stoco:

"A causação de dano moral independe de prova, ou melhor, comprovada a ofensa moral o direito à indenização desta, decorre, sendo dela presumido. Desse modo a responsabilização do ofensor origina do fato da violação do nemminem laedere. Significa, em resumo, que o dever de reparar é corolário da verificação do evento danoso, dispensável ou mesmo insofismável, a prova do prejuízo." (Responsabilidade Civil, 4ª ed., São Paulo: Revista dos Tribunais,1999, p. 722)

No que se refere ao montante da condenação, considero que a indenização pelo dano moral deve representar uma espécie de conforto para o ofendido e um desencorajamento do ofensor para igual e nova ofensa, e "mais que nunca há de se estar presente a preocupação de conter a reparação dentro do razoável, para que jamais se converta em fonte de enriquecimento" (CAIO MÁRIO DA SILVA PEREIRA, Instituições de Direito Civil, Forense, 1990, vol. II, p. 243).

Nesse sentido, observo que apesar da dificuldade de mensuração do dano moral, em face de não ser possível adentrar no foro íntimo da pessoa e, tampouco, aferir o tamanho do dissabor, o valor fixado pelo Juiz a quo veio ao encontro da regra de que essa quantia não pode servir como forma de enriquecimento indevido para a vítima do dano moral, mas, na outra ponta, não pode ser ínfimo, ao ponto que, não educar a conduta do infrator e desvalorizar os sentimentos do ofendido.

Todavia, entendo que deve ser minorada a condenação para R$ 3.000,00, considerando as circunstâncias do caso e as condições pessoais dos litigantes, sendo suficiente para reparar o mal sofrido, sem propiciar enriquecimento sem causa dos autores, além de atender ao caráter pedagógico da condenação.

Sobre esse aspecto, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu:

"A indenização por dano imaterial, como a dor, a tristeza ou a humilhação sofridas pela vítima, mercê de valores inapreciáveis economicamente, não impede que se fixe um quantum compensatório, com o intuito de suavizar o respectivo dano.

O quantum indenizatório devido a título de danos morais deve assegurar a justa reparação do prejuízo sem proporcionar enriquecimento sem causa do autor, além de levar em conta a capacidade econômica do réu, devendo ser arbitrado pelo juiz de maneira que a composição do dano seja proporcional à ofensa, calcada nos critérios da exemplariedade e da solidariedade" (STJ, REsp 693172 / MG, de 12.09.2005, relatoria do Ministro Luiz Fux).

Finalmente, ressalto que os pedidos deduzidos em contra-razões pelos apelados não devem ser conhecidos, porquanto esta não se afigura a via própria para manifestar eventual inconformismo contra a sentença.

CONCLUSÃO

Nos termos da fundamentação adotada, em observância ao artigo 93, inciso IX da Constituição da República DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO para minorar o valor da indenização por danos morais para R$ 3.000,00, com correção monetária e juros conforme determinados pela sentença de f. 162/168.

As custas processuais, incluídas as recursais, devem ser repartidas, meio a meio.

Com base no § 3º do art. 20 do Código de Processo Civil, condeno os apelantes ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 15% sobre o valor da condenação e os apelados ao pagamento de honorários advocatícios que arbitro em R$ 500,00, nos termos do § 4º do art. 20 do Código de Processo Civil, admitida a compensação consoante caput do art. 21 do mesmo diploma legal e Súmula 306 do Superior Tribunal de Justiça.

As verbas de sucumbência a que foram condenados os apelantes e os apelados ficam com a exigibilidade suspensa, pois são beneficiários da justiça gratuita.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): NILO LACERDA e ALVIMAR DE ÁVILA.

SÚMULA: DERAM PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO

Data da Publicação: 30/04/2009




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