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domingo, 3 de maio de 2009

JURID - Indenizatória. Danos morais e materiais. Prisão em flagrante [30/04/09] - Jurisprudência


Indenizatória. Danos morais e materiais. Prisão em flagrante. Suicídio do conduzido. Alegação de omissão do estado.

Tribunal de Justiça de Santa Catarina - TJSC.

Apelação Cível n. 2008.070001-8, de Itá

Relator: Des. Pedro Manoel Abreu

RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZATÓRIA. DANOS MORAIS E MATERIAIS. PRISÃO EM FLAGRANTE. SUICÍDIO DO CONDUZIDO. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO DO ESTADO. INEXISTÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE. FATO EXCLUSIVO DA VÍTIMA.

"Quando houver culpa da vítima, há que se distinguir se é sua culpa exclusiva ou concorrente com a do poder público; no primeiro caso, o Estado não responde. No segundo, atenua-se a sua responsabilidade, que se reparte com a da vítima (RTJ 55/50, RT 447/82 e 518/99)" (Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18.ª ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 569).

O suicídio de detento não gera ao Poder Público, por si só, o dever de indenizar os danos materiais e morais reclamados por seus dependentes. Inexistentes elementos probatórios de que houve omissão específica ou culpa em uma de suas modalidades, resta afastada a responsabilidade do Estado, ante o fato exclusivo da vítima.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível n. 2008.070001-8, da comarca de Itá (Vara Única), em que é apelante Inês Terezinha Kehll e apelado o Estado de Santa Catarina.

ACORDAM, em Terceira Câmara de Direito Público, por unanimidade, negar provimento ao recurso.

RELATÓRIO

Inês Terezinha Kehll interpôs apelação cível da sentença que, nos autos da ação indenizatória c/c danos morais e pedido de antecipação de tutela, julgou improcedentes os pedidos inaugurais.

Narrou a recorrente ter ajuizado a presente demanda em face da morte de seu marido por suicídio, quando este se encontrava detido provisoriamente, sob custódia, no Presídio Regional de Concórdia, ocasião em que enforcou-se com uma corda de nylon no interior da cela.

Sustentou que, à época dos fatos, seu esposo mostrava-se abalado e depressivo com a acusação da prática de crimes contra a liberdade sexual que pesava sobre seus ombros e que, embora tenha afirmado a várias pessoas a intenção de atentar contra a própria vida, nenhuma medida foi adotada pelo estabelecimento penal para que o infortúnio não ocorresse.

Verberou ser fato inconteste que no dia 21.6.2004, por volta das 14:00h, Gilberto Paulo Kehll cometeu suicídio quando se encontrava sob custódia do Estado e que, mesmo sob o prisma da teoria da responsabilidade subjetiva, não há como eximí-lo da obrigação de indenizar, vez que a prova dos autos demonstra a sua negligência, bem como a de seus agentes, que nada fizeram para evitar a morte de um dos seus detentos.

Gizou que a prova testemunhal confirmou o comportamento estranho do detento, fato que seria suficiente para determinar o seu acompanhamento. Além disso, Gilberto Paulo Kehll foi posto em uma cela com cordas, permitindo-lhe o uso para ceifar a própria vida.

Asseverou, ainda, que a sentença é contrária à prova carreada aos autos, posto que os agentes prisionais foram alertados por outros detentos sobre a intenção de Gilberto, mas nada fizeram, condenando-o praticamente à morte.

Ao final, pugnou pela reforma da sentença vergastada, para reconhecer os danos morais e materiais devidos.

O recurso foi recebido no seu duplo efeito e as contra-razões pugnaram pela manutenção do decisum.

VOTO

Prima facie, registra-se despicienda a participação do Ministério Público em ações de caráter meramente indenizatório, como o que se apresenta, em vista das sucessivas manifestações daquele órgão nesse sentido.

Ante a inexistência de preliminares a analisar, passa-se à solução do mérito.

Trata-se de pedido de indenização por danos morais e materiais direcionado contra o Estado de Santa Catarina, em razão do suicídio cometido por Gilberto Paulo Kehll nas dependências do Presídio Regional de Concórdia.

A ação funda-se pretensa responsabilização do Estado pela omissão - culpa in vigilando -, eis que este teria permanecido inerte, quando soube que o detento possuía cordas ao seu alcance (utilizadas para varal de roupas, fl. 03), instrumento utilizado para ceifar a própria vida.

Há outro argumento, só lançado na esfera recursal, que por não constar da peça vestibular, não merece consideração, por redundar em fato novo: o de que o Estado conhecia o Estado depressivo do falecido e nada fez. Tal tese não foi lançada por ocasião da inicial, quando já era de conhecimento da parte. E, da inteligência do art. 128, do Código Buzaid, extrai-se que:

Art. 128. O juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões não suscitadas, a cujo respeito a lei exige iniciativa da parte.

Imperioso reconhecer que, fosse a hipótese de causa superveniente, tal solução mostra-se-ia inaplicável. Mas disso não se trata, logo se percebe.

Portanto, limita-se a causa a discutir se o Estado pode ou não ser responsabilizado pela omissão em retirar as cordas do alcance de Gilberto Paulo Kehll.

Como já frisado pela eminente julgadora de primeiro grau, a responsabilidade civil do Estado por ato omissivo é subjetiva, exigindo, por isso mesmo, a demonstração de dolo ou culpa, esta em qualquer uma de suas modalidades. O entendimento é consagrado na jurisprudência pátria. Colaciona-se:

Administrativo. Responsabilidade civil do Estado. Omissão. Falta do serviço. Responsabilidade subjetiva. Morte de policial durante transferência de preso. Não comprovação da culpa estatal (publicizada). Impossibilidade de revisão dos fatos no recurso especial para caracterização da culpa e do imprescindível nexo. Soberania da instância ordinária nas provas. Arts. 302 e 535 do CPC. Não violação.

1. Desenvolvida fundamentação bastante para a compreensão dos motivos afivelados ao convencimento e fonte da conclusão, mostra-se despicienda a exaustão de todas as razões postas, não se consubstanciando ofensa ao artigo 535, II, CPC. Deveras, vezes a basto tem sido exaltado que a finalidade da jurisdição é compor a lide e não a discussão exaustiva em torno de padrões legais e de todos os enunciados do contraditório. Demais, privativamente incumbe ao julgador estabelecer as normas jurídicas aplicáveis ao caso concreto, atividade excluída da vontade dos litigantes. (Resp 197.921/DF, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ 23.10.2000)

2. Se a Fazenda Estadual esmerou-se em combater especificamente todos os pontos da inicial, em sua contestação, não há falar em presunção de veracidade dos fatos narrados.

3. A responsabilidade do Estado por omissão é subjetiva. Jurisprudência predominantes do STF e do STJ. Desde a inicial, vieram os recorrentes discutindo a falta do serviço estatal por omissão, o que é bem diferente de se discutir o fato do serviço para aplicação da responsabilidade objetiva.

4. Ir além, para analisar o que requerido pelos recorrentes em sede de recurso especial, implica revolvimento da matéria fática, uma vez que, em razão da devolutividade vinculada deste recurso, não se pode, a esta altura, ir além para verificar se a omissão do Estado em garantir ao policial assassinado a devida escolta para a transferência do preso teria sido causa determinante para a ocorrência do sinistro. Assim, também não se pode desbordar do quadro fático pré-estabelecido para analisar a existência do necessário nexo causal entre a alegada omissão e o evento fatídico. Recurso especial improvido (STJ, REsp n. 471606/SP, rel. Min. Humberto Martins, j.

Mais que isso, quando

(...) houver culpa da vítima, há que distinguir se é sua culpa exclusiva ou concorrente com a do poder público; no primeiro caso, o Estado não responde; no segundo, atenua-se a sua responsabilidade, que se reparte com a da vítima (RTJ 55/50, RT 447/82 e 518/99) (Di Pietro, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18.º ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 569).

Nessa linha de pensamento, não há negar que o ato partiu de exclusiva vontade da vítima, não resultando adequado responsabilizar o Estado, in casu, porque este teria se omitido quando Gilberto Paulo Kehll utilizava as cordas para amarrar a televisão, como se depreende do depoimento do apenado Leandro Brito, companheiro de cela do falecido, conforme citação da própria apelante (fl. 08):

(...) Declara que, a cordinha servia para amarrar a televisão e já estava na cela quando fui morar (...).

Esta Corte de Justiça tem, aliás, reiterado esse pensamento:

Morte. Detento em estabelecimento prisional. Suicídio. Omissão. O suicídio de detento não gera ao Poder Pública, por si só, o dever de indenizar os danos materiais e morais reclamados por seus dependentes. Inexistentes elementos probatórios de que o de cujos necessitava de cuidados especiais e não demonstrado que houve falha do serviço, resta afastada a responsabilidade do Estado (AC n. 2007.041269, de Chapecó, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros).

E ainda:

Responsabilidade civil. Indenizatória. Danos morais e materiais. Prisão em flagrante. Suicídio do conduzido. Alegação de omissão do Estado. Inexistência de nexo de causalidade. Fato exclusivo da vítima.

1. A pessoa jurídica de direito público responde objetivamente pelos danos originados em evento propiciado por conta de omissão específica, quando tinha o dever de agir e impedir o resultado danoso. Se a omissão for genérica, responderá subjetivamente, cabendo a análise de culpa em uma de suas vertentes.

2. O suicídio de detento não gera ao Poder Público, por si só, o dever de indenizar os danos materiais e morais reclamados por seus dependentes. Inexistentes elementos probatórios de que o de cujus necessitava de cuidados especiais e não demonstrado que houve omissão específica ou culpa em uma de suas modalidades, resta afastada a responsabilidade do Estado, ante o fato exclusivo da vítima (TJ/SC, Ap. Civ. N. 2008.025121-6, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j. 11.9.2008).

Em vista disso, denota-se que o processo não apresenta elementos que embasem solução diferente, sendo de império manter o comando sentencial.

DECISÃO

Ante o exposto, nega-se provimento ao recurso.

O julgamento, realizado no dia 10 de março de 2009, foi presidido pelo signatário, com voto, e dele participaram os Desembargadores Luiz Cézar Medeiros e Rui Fortes.

Florianópolis, 16 de março de 2009.

Pedro Manoel Abreu
Relator

Publicado dia 27/04/09




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