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segunda-feira, 4 de maio de 2009

JURID - Ação de busca e apreensão convertida em ação de depósito. [04/05/09] - Jurisprudência


Habeas corpus. Ação de busca e apreensão convertida em ação de depósito. Descumprimento da determinação de depósito.

Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG.

Número do processo: 1.0000.08.485002-3/000(1)

Relator: PEDRO BERNARDES

Relator do Acórdão: PEDRO BERNARDES

Data do Julgamento: 07/04/2009

Inteiro Teor:

EMENTA: HABEAS CORPUS - AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO CONVERTIDA EM AÇÃO DE DEPÓSITO - DESCUMPRIMENTO DA DETERMINAÇÃO DE DEPÓSITO - PRISÃO DECRETADA. IMPOSSIBILIDADE. 2 - A Constituição Federal prevê expressamente as hipóteses em que se admitirá prisão por dívida: responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de pensão alimentícia e depositário infiel, sendo estas as únicas hipóteses. 3 - Embora o Decreto Lei 911/69 equipare o devedor alienante ao depositário, aquele não é efetivamente um depositário, havendo singularidades entre eles, não se podendo admitir, assim, a prisão daquele que não é formalmente um depositário.4 - O STF, recentemente, posicionou-se no sentido de não ser possível, no sistema normativo brasileiro, a prisão civil por dívidas decorrente de contrato de alienação fiduciária.

HABEAS CORPUS CÍVEL N° 1.0000.08.485002-3/000 - COMARCA DE UBERABA - PACIENTE(S): ARQUIMINIO JOSÉ ALEXANDRE - AUTORID COATORA: JD 4 V CV COMARCA UBERABA - RELATOR: EXMO. SR. DES. PEDRO BERNARDES

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 9ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM CONCEDER A ORDEM.

Belo Horizonte, 07 de abril de 2009.

DES. PEDRO BERNARDES - Relator

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

O SR. DES. PEDRO BERNARDES:

VOTO

Trata-se de Habeas Corpus impetrado em favor do paciente Arquiminio José Alexandre, figurando como autoridade coatora o MM. Juiz da 4a Vara Cível da Comarca de Uberaba que deferiu a conversão da ação de busca e apreensão em ação de depósito e, fixado o prazo para pagar ou apresentar o bem dado em garantia, o requerido permaneceu inerte o que levou o MM. Juiz a decretar a sua prisão.

Alega o impetrante (ff. 02/13), em síntese, que o paciente Arquiminio José Alexandre adquiriu uma motocicleta, através de um contrato firmado com o Banco Finasa S.A., garantido por alienação fiduciária; que houve modificação na condição financeira do paciente, motivo pelo qual não pode pagar as prestações contratadas; que em virtude do inadimplemento contratual o Banco propôs em face do paciente, ação de busca e apreensão; que deferida a liminar de busca e apreensão do bem, a mesma não pode ser cumprida tendo em vista não estar o paciente na posse do bem; que requerido e concedido o depósito por conversão, foi decretada a prisão do paciente; que a prisão do paciente é ilegal, já que o Brasil é signatário do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos que vedam a prisão por dívidas; que a prisão do depositário infiel não mais se compatibiliza com os valores supremos assegurados pelo Estado Constitucional; que o entendimento do STF vem se pacificando neste mesmo sentindo, considerando ilegal a prisão do depositário infiel; que concedida a ordem preventivamente, já que a prisão civil só é possível nos casos de inadimplemento voluntário e inescusável de pensão alimentícia e de depositário infiel; que o devedor fiduciário que não cumpre com a obrigação pactuada e não entrega o bem ao credor fiduciário, a seu ver, não pode ser equiparado ao depositário infiel. Tece outras considerações, cita jurisprudências do STF e, ao final, requer seja concedida a ordem de habeas corpus, a fim de colocar em liberdade o paciente.

Com a inicial vieram documentos de ff. 14/41.

No despacho inicial (f. 45) foi deferida a liminar requerida.

Informações prestadas pela autoridade coatora às ff. 52/53.

A douta Procuradoria de Justiça manifestou-se (ff.57-64) pela concessão da ordem, ao fundamento de que conforme a orientação jurisprudencial do STF, descabe a prisão civil do devedor em hipótese oriunda de contrato garantido por alienação fiduciária.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do habeas corpus.

O pedido de habeas corpus funda-se, na espécie, ao citado despacho, que decretou a prisão do paciente por 6 (seis) meses.

Compulsando os autos, verifica-se que o paciente firmou com o Banco Finasa S.A. um "Contrato de Abertura de Crédito", e que em razão desse pacto foi dada em garantia, por meio de alienação fiduciária, uma motocicleta Honda CG 150 Titan KS 2006, ano 2006, cor preta, placa NG 0112. O referido contrato deveria ser pago em 36 parcelas fixas e consecutivas.

Contudo, o ora paciente não cumpriu o pactuado, deixando de efetuar o pagamento das parcelas contratadas. Em razão de seu inadimplemento, a instituição financeira propôs ação de busca e apreensão do bem dado em garantia.

Recebida a ação, o MM. Juiz de primeiro grau, à f. 25, deferiu a liminar de busca e apreensão. Entretanto, a apreensão do bem não foi possível, tendo em vista que ele não mais se encontrava na posse do ora paciente.

O MM. Juiz, atendendo ao requerimento da instituição financeira, deferiu a conversão da ação de busca e apreensão em ação de depósito, que ao final foi julgada procedente, com determinação de entrega do bem em 24 horas, sob pena de prisão.

Como não foi efetuada a entrega do bem, a prisão foi decretada e o ora paciente recolhido na unidade penitenciária de Uberaba.

Em casos como o presente, vinha me posicionando no sentido de não ser permitida a prisão do depositário infiel, ao fundamento de que o termo "depositário infiel" a que se refere o texto constitucional, não pode ser outro senão o que está estabelecido no artigo 1.265 do Código Civil/1916 ou art.627 e 628 do Novo Código Civil.

Desta forma, deve-se, portanto, restringir o alcance e aplicação da norma constitucional, não se podendo estendê-la a outras situações criadas por leis especiais. Ademais, é inconcebível a equiparação de uma norma à outra, quando esta é restritiva de direitos.

Além do mais, o legislador constituinte de 1988 retirou de seu texto a partícula de restrição "na forma da lei" e, assim fazendo, impede que a figura do depositário infiel seja prevista na legislação ordinária, não mais justificando admitir um conceito mais abrangente do contrato de depósito, para permitir a aplicação, por extensão, do preceito constitucional. Trata-se, agora, segundo a consagrada classificação do professor José Afonso da Silva, de norma constitucional de eficácia plena (de aplicabilidade direta, imediata e integral).

Assim sendo, ao prever a prisão civil, por exceção, do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel, está a Constituição Federal se referindo ao depositário previsto pelo Código Civil. Não se refere, portanto, ao devedor fiduciário.

Além disso, o Brasil é signatário de dois tratados internacionais de proteção aos direitos humanos. Um é o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, de 1966, ratificado no País em 24 de janeiro de 1992, sendo seu texto aprovado pelo Congresso Nacional (Decreto legislativo nº 226/91) e adotado na legislação interna por força do decreto presidencial nº 592 de 6 de julho de 1992. Outro é a Convenção Americana de Direitos Humanos, de 1969 (Pacto de San José da Costa Rica), ratificado sem reservas pelo Brasil, aprovado pelo decreto legislativo nº 27/92, de 25 de setembro de 1992, e incorporado pelo ordenamento jurídico pátrio pelo decreto presidencial nº 678, de 6 de novembro de 1992.

O primeiro, em seu art. 11, dispõe:

"Ninguém poderá ser preso apenas por não poder cumprir com uma obrigação contratual".

O Pacto de San José da Costa Rica, em seu art.7º, estabelece:

"Ninguém deve ser detido por dívidas. Este princípio não limita os mandados de autoridade judiciária competente expedidos em virtude de inadimplemento de obrigação alimentar."

Dentro do sistema jurídico brasileiro, tratados e convenções guardam estrita relação de paridade normativa com as leis ordinárias editadas pelo Estado. Sendo o Pacto de San José da Costa Rica norma de caráter geral, é capaz apenas de revogar normas de caráter também geral. Como o Código Civil e o Código de Processo Civil são leis gerais, tanto o disposto no art.1.287 do CC/1916 quanto nos artigos 902, parágrafo 1º, e 904, do CPC, estão derrogados pelo referido Pacto, que a eles sobreveio.

Destarte, a Lei 4.728/65, que equipara o devedor fiduciante ao depositário com todas as suas responsabilidades, ficou esvaziada em seu conteúdo compulsivo prisional.

A possibilidade da prisão ou não, em se tratando de contrato de alienação fiduciária, já há algum tempo vinha sendo debatida. Contudo, o STJ entendeu pela inadmissibilidade em recente julgado, expressado nos Embargos de divergência em Recurso Especial n. 149.518, cuja ementa é a seguinte:

"ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PRISÃO CIVIL.

Não cabe a prisão do devedor que descumpre contrato garantido por alienação fiduciária. Embargos acolhidos e providos."

Em seu voto, o Min. Ruy Rosado de Aguiar, considerando ilegal o decreto de prisão civil do alienante fiduciário, afirma que

"parece inadmissível submeter o descumpridor de um contrato, o devedor de uma dívida civil às agruras de um regime penitenciário fechado, durante meses, que a lei penal reserva aos delinqüentes mais perigosos, pois à maioria dos autores de crimes são, hoje, aplicadas penas alternativas".

O Min. Nilson Naves, também se posicionou no sentido de não cabimento da prisão civil do alienante:

"(...) a expressão depositário, a que se refere o indigitado artigo 66, juridicamente não se equipara àquela em que civilmente se admite se possa compelir o devedor mediante a prisão a restituir, ou a entregar a coisa. (...) Com efeito, a regra consoante o texto constitucional é a de que 'não haverá prisão por dívida', e a exceção é a prisão do 'responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel' (Constituição, art. 5º LXVII). Daí, no concernente ao depositário, há de se tratar do legítimo depositário, àquele exemplificadamente a que alude o artigo 1.256 do CC, sujeito a ser compelido, se não o restituir, quando exigido, o depósito".

Embora o Decreto Lei 911/69 equipare o devedor alienante ao depositário, aquele não é efetivamente um depositário, havendo singularidades entre eles, não se podendo admitir, assim, a prisão daquele que não é formalmente um depositário, sob pena de se incorrer em ilegalidade.

Em seu voto nos Embargos de divergência supracitados, o Min. Ruy Rosado de Aguiar, relator dos embargos, cita algumas diferenças entre depositário e devedor alienante apontados pela doutrina e jurisprudência:

"O devedor alienante não recebe a coisa para custodiá-la e devolvê-la, mas para dela utilizar-se, não lhe podendo ser exigido que a entregue, salvo se deixar de saldar o débito cujo pagamento garante. O credor é o proprietário, mas não se aplica a regra do res perit domino. Os riscos são suportados pelo devedor. O credor, supostamente proprietário, não pode ficar com a coisa, devendo vendê-la".

Diante de tais peculiaridades, não se pode considerar que o devedor alienante se enquadra nas hipóteses do artigo 5º, inciso LXVII da CF/88.

Apenas do legítimo depositário (artigo 1.265 do CC/1916 e 627 do Novo Código) a Constituição prevê a possibilidade de prisão, não daquele que se "equipara" a ele; assume ele a obrigação de depositário, mas não é depositário.

Neste sentido:

"PROCESSUAL CIVIL - EMBARGOS DE DECLARAÇÃO - HABEAS CORPUS -ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA - PRISÃO CIVIL - IMPOSSIBILIDADE - TORRENCIAL JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE - OMISSÃO - INOCORRÊNCIA.

(...) 2 - Conforme entendimento sólido desta Corte, não cabe prisão civil de devedor fiduciante (EREsp 145.518/GO). 3 - Embargos conhecidos, porém, rejeitados." (STJ - EDHC 29290 / DF - Relator(a): Ministro JORGE SCARTEZZINI - Órgão Julgador: QUARTA TURMA - Data do Julgamento: 22/06/2004 - Data da Publicação/Fonte: DJ 30.08.2004 p.00286).

"RECURSO EM HABEAS CORPUS. INTEMPESTIVIDADE. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DA ORDEM DE OFÍCIO. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA. NÃO-DEVOLUÇÃO DO BEM. PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR-FIDUCIANTE. IMPOSSIBILIDADE.

(...) - A legislação infraconstitucional brasileira não permite a prisão civil do devedor que descumpre contrato garantido por alienação fiduciária. Recurso ordinário em habeas corpus não conhecido. Concedido habeas corpus de ofício." (STJ - RHC 16235 / SP - Relator(a): Ministra NANCY ANDRIGHI - Órgão Julgador: TERCEIRA TURMA - Data do Julgamento 10/08/2004 - Data da Publicação/Fonte: DJ 30.08.2004 p.00279).

"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. PRISÃO CIVIL. INADMISSIBILIDADE. SÚMULA 83 DO STJ. COISA JULGADA. INOCORRÊNCIA.

I. O entendimento firmado no STJ é o de que no contrato de alienação fiduciária em garantia, é incabível a prisão do devedor fiduciante, posto que não equiparável a depositário infiel. (...)" (STJ - AGA 557517 / SP - Relator(a): Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR - Órgão Julgador: QUARTA TURMA - Data do Julgamento: 18/05/2004 - Data da Publicação/Fonte: DJ 23.08.2004 p.00244).

Não obstante os argumentos expendidos, recentemente, o Plenário do Egrégio Supremo Tribunal Federal, no julgamento dos REs 349.703 e 466.343 (03/12/08), manifestou-se no mesmo sentido, assegurando a impossibilidade da prisão civil por dívidas decorrente de contrato de alienação fiduciária, assegurando que a prisão por dívida no Brasil está restrita à hipótese de inadimplemento voluntário e inescusável de pensão alimentícia.

O Supremo Tribunal chegou a tal conclusão em razão do Brasil ser signatário dos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos, já referidos anteriormente.

Entretanto, da análise dos recentes julgados emanado do STF, pode-se observar que há uma discussão acerca do status que deveriam assumir referidos tratados e convenções internacionais de direitos humanos, no ordenamento jurídico brasileiro.

Segundo consta do Informativo n° 531, editado pelo STF, o qual sintetiza o voto do relator, Ministro Marcos Aurélio, prolatado na ocasião do julgamento do HC 87585/TO, predominou a tese de que se deve atribuir o status de supralegalidade aos tratados e convenções internacionais de direitos humanos, nos seguintes termos:

Em conclusão de julgamento, o Tribunal concedeu habeas corpus em que se questionava a legitimidade da ordem de prisão, por 60 dias, decretada em desfavor do paciente que, intimado a entregar o bem do qual depositário, não adimplira a obrigação contratual - v. Informativos 471, 477 e 498. Entendeu-se que a circunstância de o Brasil haver subscrito o Pacto de São José da Costa Rica, que restringe a prisão civil por dívida ao descumprimento inescusável de prestação alimentícia (art. 7º, 7), conduz à inexistência de balizas visando à eficácia do que previsto no art. 5º, LXVII, da CF ("não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel;"). Concluiu-se, assim, que, com a introdução do aludido Pacto no ordenamento jurídico nacional, restaram derrogadas as normas estritamente legais definidoras da custódia do depositário infiel. Prevaleceu, no julgamento, por fim, a tese do status de supralegalidade da referida Convenção, inicialmente defendida pelo Min. Gilmar Mendes no julgamento do RE 466343/SP, abaixo relatado. Vencidos, no ponto, os Ministros Celso de Mello, Cezar Peluso, Ellen Gracie e Eros Grau, que a ela davam a qualificação constitucional, perfilhando o entendimento expendido pelo primeiro no voto que proferira nesse recurso. O Min. Marco Aurélio, relativamente a essa questão, se absteve de pronunciamento. HC 87585/TO, rel. Min. Marco Aurélio, 3.12.2008. (HC-87585)

Por outro lado, o eminente Ministro Celso de Mello, no julgamento do HC 90450 / MG, embora tenha concluído pela inadmissibilidade da prisão civil do depositário infiel, ao examinar o status dos tratados e convenções internacionais de direitos humanos no ordenamento jurídico brasileiro, destacou a existência de três distintas situações, nos seguintes termos:

"(1) tratados internacionais de direitos humanos celebrados pelo Brasil (ou aos quais o nosso Pais aderiu), e regularmente incorporados à ordem interna, em momento anterior ao da promulgação da Constituição de 1988 (tais convenções internacionais revestem-se de índole constitucional, porque formalmente recebidas, nessa condição, pelo § 2/ do art. 5° da Constituição);

(2) tratados internacionais de direitos humanos que venham a ser celebrados pelo Brasil (ou aos quais o nosso País venha a aderir) em data posterior à da promulgação da EC n/ 45/2004 (essas convenções internacionais, para se impregnarem de natureza constitucional, deverão observar o 'iter' procedimental estabelecido pelo § 3° do art. 5° da Constituição); e

(3) tratados internacionais de direitos humanos celebrados pelo Brasil (ou aos quais o nosso País aderiu) entre a promulgação da Constituição de 1988 e a superveniência da ECn/ 45/2004 (referidos tratados assumem caráter materialmente constitucional, porque essa qualificada hierarquia jurídica lhes é transmitida por efeito de sua inclusão no bloco da constitucionalidade, que é 'a somatória daquilo que se adiciona à Constituição escrita, em função dos valores e princípios nela consagrados')".

Após tecer tais considerações, concluiu dizendo que os tratados internacionais em matéria de direitos humanos possuem superioridade jurídica em face da generalidade das leis internas brasileiras, reconhecendo a qualificação constitucional a referidos tratados e convenções internacionais.

Afora essa discussão, a mais alta Corte de Justiça do País, manifestou-se no sentido de que a prisão civil por dívida está restrita à hipótese de inadimplemento voluntário e inescusável de pensão alimentícia, tendo em vista que o Pacto de São José da Costa Rica, subscrito pelo Brasil, torna inaplicável a legislação que com ele seja conflitante, de modo que não há mais base legal para a prisão civil do depositário infiel.

Confira-se:

"HABEAS CORPUS" - PRISÃO CIVIL - DEPOSITÁRIO JUDICIAL - A QUESTÃO DA INFIDELIDADE DEPOSITÁRIA - CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (ARTIGO 7º, n. 7) - HIERARQUIA CONSTITUCIONAL DOS TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS - PEDIDO DEFERIDO. ILEGITIMIDADE JURÍDICA DA DECRETAÇÃO DA PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL. - Não mais subsiste, no sistema normativo brasileiro, a prisão civil por infidelidade depositária, independentemente da modalidade de depósito, trate-se de depósito voluntário (convencional) ou cuide-se de depósito necessário, como o é o depósito judicial. Precedentes. TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS: AS SUAS RELAÇÕES COM O DIREITO INTERNO BRASILEIRO E A QUESTÃO DE SUA POSIÇÃO HIERÁRQUICA. - A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Art. 7º, n. 7). Caráter subordinante dos tratados internacionais em matéria de direitos humanos e o sistema de proteção dos direitos básicos da pessoa humana. - Relações entre o direito interno brasileiro e as convenções internacionais de direitos humanos (CF, art. 5º e §§ 2º e 3º). Precedentes. - Posição hierárquica dos tratados internacionais de direitos humanos no ordenamento positivo interno do Brasil: natureza constitucional ou caráter de supralegalidade? - Entendimento do Relator, Min. CELSO DE MELLO, que atribui hierarquia constitucional às convenções internacionais em matéria de direitos humanos. A INTERPRETAÇÃO JUDICIAL COMO INSTRUMENTO DE MUTAÇÃO INFORMAL DA CONSTITUIÇÃO. - A questão dos processos informais de mutação constitucional e o papel do Poder Judiciário: a interpretação judicial como instrumento juridicamente idôneo de mudança informal da Constituição. A legitimidade da adequação, mediante interpretação do Poder Judiciário, da própria Constituição da República, se e quando imperioso compatibilizá-la, mediante exegese atualizadora, com as novas exigências, necessidades e transformações resultantes dos processos sociais, econômicos e políticos que caracterizam, em seus múltiplos e complexos aspectos, a sociedade contemporânea. HERMENÊUTICA E DIREITOS HUMANOS: A NORMA MAIS FAVORÁVEL COMO CRITÉRIO QUE DEVE REGER A INTERPRETAÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO. - Os magistrados e Tribunais, no exercício de sua atividade interpretativa, especialmente no âmbito dos tratados internacionais de direitos humanos, devem observar um princípio hermenêutico básico (tal como aquele proclamado no Artigo 29 da Convenção Americana de Direitos Humanos), consistente em atribuir primazia à norma que se revele mais favorável à pessoa humana, em ordem a dispensar-lhe a mais ampla proteção jurídica. - O Poder Judiciário, nesse processo hermenêutico que prestigia o critério da norma mais favorável (que tanto pode ser aquela prevista no tratado internacional como a que se acha positivada no próprio direito interno do Estado), deverá extrair a máxima eficácia das declarações internacionais e das proclamações constitucionais de direitos, como forma de viabilizar o acesso dos indivíduos e dos grupos sociais, notadamente os mais vulneráveis, a sistemas institucionalizados de proteção aos direitos fundamentais da pessoa humana, sob pena de a liberdade, a tolerância e o respeito à alteridade humana tornarem-se palavras vãs. - Aplicação, ao caso, do Artigo 7º, n. 7, c/c o Artigo 29, ambos da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica): um caso típico de primazia da regra mais favorável à proteção efetiva do ser humano.( STF - HC 90450 / MG - Minas Gerais - Relator: Min. Celso De Mello - Julgamento: 23/09/2008 - Órgão Julgador: Segunda Turma)

"EMENTA: PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL. DEPOSITÁRIO INFIEL OU DESCUMPRIMENTO DE CONTRATO DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. ALTERAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF (INFORMATIVO/STF 531). CONCESSÃO DA ORDEM. I - O Plenário desta Corte, na sessão de julgamento de 3 de dezembro do corrente ano, ao julgar os REs 349.703 e 466.343, firmou orientação no sentido de que a prisão civil por dívida no Brasil está restrita à hipótese de inadimplemento voluntário e inescusável de pensão alimentícia. II - Ordem concedida." (STF - HC 92817 / RS - RIO GRANDE DO SUL - Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI - Julgamento: 16/12/2008 - Órgão Julgador: Primeira Turma)

"DIREITO PROCESSUAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL. PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA. ALTERAÇÃO DE ORIENTAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STF. CONCESSÃO DA ORDEM. 1. A matéria em julgamento neste habeas corpus envolve a temática da (in)admissibilidade da prisão civil do depositário infiel no ordenamento jurídico brasileiro no período posterior ao ingresso do Pacto de São José da Costa Rica no direito nacional. 2. Há o caráter especial do Pacto Internacional dos Direitos Civis Políticos (art. 11) e da Convenção Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de San José da Costa Rica (art. 7°, 7), ratificados, sem reserva, pelo Brasil, no ano de 1992. A esses diplomas internacionais sobre direitos humanos é reservado o lugar específico no ordenamento jurídico, estando abaixo da Constituição, porém acima da legislação interna. O status normativo supralegal dos tratados internacionais de direitos humanos subscritos pelo Brasil, torna inaplicável a legislação infraconstitucional com ele conflitante, seja ela anterior ou posterior ao ato de ratificação. 3. Na atualidade a única hipótese de prisão civil, no Direito brasileiro, é a do devedor de alimentos. O art. 5°, §2°, da Carta Magna, expressamente estabeleceu que os direitos e garantias expressos no caput do mesmo dispositivo não excluem outros decorrentes do regime dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte. O Pacto de São José da Costa Rica, entendido como um tratado internacional em matéria de direitos humanos, expressamente, só admite, no seu bojo, a possibilidade de prisão civil do devedor de alimentos e, conseqüentemente, não admite mais a possibilidade de prisão civil do depositário infiel. 4. Habeas corpus concedido". (STF - HC 95967 / MS - MATO GROSSO DO SUL - Relatora: Min. ELLEN GRACIE - Julgamento: 11/11/2008 - Órgão Julgador: Segunda Turma).

"EMENTA: HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. DEPOSITÁRIO INFIEL. PRISÃO CIVIL. INCONSTITUCIONALIDADE. O Pleno do Supremo Tribunal Federal iniciou o julgamento do RE n. 466.343/SP, em que se discute a constitucionalidade da prisão civil do depositário infiel. Foram proferidos oito votos no sentido da inconstitucionalidade, ressalvada a prisão do sonegador de alimentos. Há, pois, maioria formada, a justificar a concessão da ordem. Ordem concedida". (STF - HC 91950 / MS - MATO GROSSO DO SUL - Relator: Min. EROS GRAU - Julgamento: 07/10/2008 - Órgão Julgador: Segunda Turma).

Destaca-se que há uma significativa tendência contemporânea que busca conferir equiparação normativa entre os tratados internacionais de direitos humanos e a norma constitucional. Essa tendência, inclusive, culminou, com a edição da EC 45/2004, na equiparação dos tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos com as emendas constitucionais, desde que observados, em seu processo de aprovação, o rito procedimental de elaboração concernente à reforma da Constituição.

Finalmente, não obstante a discussão existente no STF acerca do status dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos, o ponto que merece destaque é que a Suprema Corte, recentemente, revendo seu o posicionamento sobre a matéria, firmou entendimento no sentido de não mais existir no ordenamento jurídico brasileiro, o instrumento da prisão civil nas hipóteses de infidelidade depositária decorrente de alienação fiduciária, o que veio consolidar o meu posicionamento.

Ante o acima exposto, CONCEDO A ORDEM IMPETRADA, confirmando a decisão proferida liminarmente.

Sem custas.

Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): TARCISIO MARTINS COSTA e JOSÉ ANTÔNIO BRAGA.

SÚMULA: CONCEDERAM A ORDEM.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS

HABEAS CORPUS CÍVEL Nº 1.0000.08.485002-3/000

Data da Publicação: 04/05/2009




JURID - Ação de busca e apreensão convertida em ação de depósito. [04/05/09] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

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