Anúncios


terça-feira, 15 de junho de 2010

JURID - Seguro de vida. Cobrança. Segurado casado à época. [15/06/10] - Jurisprudência


Seguro de vida. Cobrança. Segurado casado à época da contratação do seguro. Superveniência de separação.

Tribunal de Justiça de São Paulo - TJSP.

Seguro de vida. Cobrança. Segurado casado à época da contratação do seguro. Superveniência de separação de fato e constituição de união estável, da qual resultou nascimento de dois filhos. Apólice que prevê como beneficiária, na hipótese de falta de indicação expressa, o cônjuge. Pagamento de indenização à companheira. Contestação judicial pela esposa. Inadmissibilidade. Interpretação do contrato nos termos dos princípios gerais do direito. Boa-fé objetiva. Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 992.08.001986-1, da Comarca de São Paulo, em que é apelante MARIA DAS GRAÇAS COSTA BARROS sendo apelado REAL SEGUROS S/A.

ACORDAM, em 32ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores RUY COPPOLA (Presidente) e KIOITSI CHICUTA.

São Paulo, 15 de abril de 2010.

WALTER CESAR EXNER
RELATOR

Apelação com revisão nº: 992.08 001986-1

Apelante: Maria das Graças Costa Barros. Apelado: Real Seguros S/A.

Ação: Cobrança (nº 114149/07).

Comarca: São Paulo - 24ª Vara Cível.

Voto nº 4265

Vistos.

Trata-se de apelação interposta contra a respeitável sentença de fls. 145/147, cujo relatório fica adotado, que julgou improcedente a ação de cobrança de indenização securitária proposta por Maria das Graças Costa Barros em face de Real Seguros S/A.

Irresignada, apela a autora, alegando, em suas razões recursais, preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de defesa, pois não lhe foi dada

oportunidade de manifestação acerca dos documentos juntados pela ré às fls. 107/120 e às fls. 124/132, que influíram no convencimento do magistrado prolator da sentença guerreada. No mérito, sustenta, em síntese, ser inadmissível o reconhecimento da união estável entre o de cujus e sua suposta companheira, mormente pelo fato de que seu casamento com ele não fora desconstituído. Invoca o princípio do pacta sunt servanda, ressaltando que, enquanto cônjuge, é a legítima beneficiária, nos termos da apólice.

O recurso foi recebido em ambos os efeitos e, em contrarrazões, a ré bateu-se pelo improvimento.

É o relatório.

De início, cumpre observar que os documentos mencionados pela apelante em nada afetaram o julgamento do presente feito, eis que se limitam a noticiar a existência de ação consignatória movida por terceiro em face da apelante e de Kátia Batista Peixe.

Como se vê, tais peças são irrelevantes para o deslinde do presente feito, donde se infere a ausência de qualquer prejuízo à recorrente e do propalado cerceamento de defesa, até porque a r. sentença não foi proferida imediatamente após a juntada de tais peças, ficando os autos à disposição das partes, por mais de dois meses, para a preparação de audiência de instrução (fls. 138/143), do que se presume que a diligente advogada teve ciência daquela documentação.

No mérito, igualmente não prospera o apelo.

Conforme se depreende dos autos, a apelante casou-se com Sílvio Barros em 09.07.1966 (fls. 08), que, por sua vez, na condição de membro da Associação dos Advogados de São Paulo (AASP), havia celebrado contrato de seguro de vida com a apelada apenas em fevereiro de 2005 (quando há muito já estava separado da autora), conforme apólice de fls. 16/23, tendo ele falecido em 16.07.2006 (fls. 09), sendo a indenização securitária paga à sua suposta companheira, Kátia Batista Peixe, fato contra o qual se insurge a apelante.

Para o deslinde da questão, cumpre asseverar, num primeiro momento, que a união estável entre Sílvio Barros e Kátia Batista Peixe restou bem caracterizada, seja por conta da farta prova documental carreada, seja por conta das declarações das testemunhas arroladas pela ré, ouvidas na condição de informantes, nos termos do artigo 405, parágrafo quarto, do CPC.

Nesse passo, é possível verificar que o falecido teve dois filhos com sua companheira, nascidos em 01.09.1988 e 22.04.1994 (fls. 35/36) e que ambos adquiriram, conjuntamente, imóvel para moradia, como demonstra o compromisso de compra e venda de fls. 67/70 (datado de maio de 1999), além das diversas faturas em seus nomes recebidas no mesmo endereço, tudo a denotar sua convivência contínua e duradoura.

De outro lado, impende analisar o contrato de seguro, a fim de avaliar quem, efetivamente, seria a legítima beneficiária. Nesse sentido, a cláusula 12 da apólice (fls. 19/20) estipula que, na falta de indicação expressa por parte do segurado, o beneficiário será determinado conforme a tabela acostada, sendo necessário interpretá-la à luz dos princípios que regem o direito contratual.

Cabe anotar, por oportuno, que o segurado aderiu automaticamente ao seguro de vida pelo simples fato de ser membro da AASP, repita-se, quando já separado de fato da autora e vivendo maritalmente com outra mulher, vez que a apólice abrangia a totalidade de seus associados, o que justifica a inexistência de beneficiário expressamente apontado por ele, que, possivelmente, sequer tinha ciência da existência do contrato. E, em que pese a previsão contratual taxativa, é certo que não deve ser interpretada literalmente, sob pena de ofensa à boa-fé objetiva.

Como se vê, a apólice estabelece que, sendo o segurado casado na data do óbito, seria beneficiária a esposa. Ocorre que, no caso em tela, privilegiar a letra do contrato, diante do estado civil do falecido, cujo vínculo marital era apenas formal, seria contrariar a própria intenção do de cujus, pois, quando de sua morte, ele convivia com a companheira havia 17 anos, constituindo união estável, já que, separado de fato, não incidia o impedimento previsto no artigo 1.521, inc. VI, do CPC, nos termos do artigo 1.723, parágrafo primeiro, do mesmo diploma legal.

E, não obstante a previsão contratual a garantir a companheira como beneficiária somente se dissolvida sociedade conjugai anteriormente constituída, restou evidente a descaracterização e a ineficácia do casamento entre autora e segurado, até porque a própria cláusula prevê, ainda, que "o(a) companheiro(a) será equiparado ao cônjuge de conformidade com as leis que regem essa matéria" (fls. 20), acrescentando-se, ademais, que a companheira o falecido pleiteou e recebeu a indenização de boa-fé.

Assim que, tendo em conta a razoabilidade imprescindível à hermenêutica jurídica, não se vislumbra, na conduta da seguradora, afronta ao princípio do pacta sunt servanda, sobre o qual devem prevalecer, na presente demanda, os demais princípios norteadores do direito contratual. Diante disso, é mister que se reconheça a legitimidade da companheira do falecido como beneficiária do seguro de vida, dando-se preponderância ao vínculo materialmente estabelecido entre eles à época do sinistro em detrimento daquele que subsistia tão somente na forma.

Isso posto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

WALTER CESAR INCONTRI EXNER
Relator




JURID - Seguro de vida. Cobrança. Segurado casado à época. [15/06/10] - Jurisprudência

 



 

 

 

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário